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II SÉRIE-A — NÚMERO 10

O Sr. Deputado Luís Capoulas leu o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, elaborado pelo relator do PSD, Mário Raposo, partido que tem nessa Comissão uma maioria absoluta e que aprovou o relatório (com votos a favor apenas do PSD).

A verdade é que a esse parecer contrapõem-se outros pareceres, inclusivamente de destacados militantes do PSD, como é o caso do Dr. Rui Machete.

O que é que o parecer dá Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, subscrito pelo relator do PSD, deputado Mário Raposo, com votos exclusivamente do PSD, diz? Diz, em resumo, que o legislador dispõe de liberdade para recrutar, para limitar, o círculo de interesses que devem ser protegidos em sede de recurso contencioso.~

Numa linguagem mais simples, o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, apenas votado pelo PSD, diz que o legislador pode dizer quais são os interessados, pode definir quais são as fronteiras dos interessados em relação aos quais o tribunal pode definir uma legitimidade processual activa e o círculo dos interesses que devem ser protegidos por lei.

A verdade é que, se o incidente de suspensão teve um carácter excepcional, hoje esse carácter excepcional está extremamente esbatido na lei e na jurisprudência porque, no direito português, ao carácter excepcional tem vindo a sobrepor-se a defesa das garantias dos administrados, a sua protecção legal e o papel mais relevante, mais interveniente, do próprio Supremo Tribunal Administrativo.

Aliás, é neste quadro que o Dr; Rui Machete, vosso distinto companheiro no PSD, define que, quanto a Constituição traz para a sede actual a garantia constitucional do recurso contencioso, tem exactamente — e cito o Dr. Rui Machete — como função impedir que o legislador considere insusceptíveis de recurso para os tribunais só certas categorias de actos definitivos e executórios ou restrinja o âmbito do recurso a apenas determinadas partes do acto ou a alguns dos vícios, por razões políticas ou outras.

O que se nos depara é que, apesar da opinião de reputados constitucionalistas do seu partido, por razões político-partidárias, por razões de interesse directo do PSD, está a criar-se um regime excepcional de privilégio para os reservatários, a fim de impedir que os interessados recorram para os tribunais.

Isto é hoje pacífico nas teses gerais sobre direito constitucional de constitucionalistas do vosso próprio partido e também é pacífico nas teses de constitucionalistas de diferentes quadrantes que, à luz do actual texto constitucional, analisaram o artigo 47.° e o n.° 2 do artigo 14.° da proposta de lei.

Não sendo constitucionalistas, temos o dever de não estarmos cegos perante a evidência e a evidência é que, perante centenas de acórdãos de suspensão da execu-toriedade dos actos administrativos, perante o facto de o Supremo Tribunal Administrativo ter assumido e aceite, como parte legítima do processo, todas as empresas cooperativas e todos os agricultores que detenham a posse da terra, com ou sem contrato de exploração, o Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação, o seu ministro, o Governo e o PSD encontraram uma solução para impedir que todos eles recorram aos tribunais.

Dir-se-á haver uns tantos que podem recorrer, esses tantos são os que têm contrato de uso da terra, de concessão de exploração, de arrendamento, etc. No entanto, como atrás, no artigo 28.°, se diz que em relação a esses não podem ser demarcadas reservas, logo esses não têm qualquer interesse em recorrer para o tribunal, pelo que se conclui que ninguém pode recorrer para os tribunais.

É, evidentemente um artigo brutal, descarado, que põe em causa princípios elementares do Estado de direito democrático. É ainda um artigo profundo, claro e retundamente inconstitucional.

Daqui não há que sair e espero que daqui não saiam também outros órgãos de soberania que têm de ponderar sobre a constitucionalidade desta lei.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Armando Cunha.

O Sr. Armando Cunha (PSD): — É para responder ao Sr. Deputado Rogério Brito.

Creio que o Sr. Deputado Rogério Brito disse que a providência cautelar de suspensão de executariedade do acto não tem natureza excepcional. Tira essa conclusão do facto de, em sucessivos e numerosos acórdãos, o Supremo Tribunal Administrativo ter dado razão àqueles que a recuperaram?

É este o seu pensamento, Sr. Deputado?

O Sr. Rogério Brito (PCP): — Não!

O Orador: — Então não se justifica a minha intervenção. Não o compreendi bem...

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — O raciocínio foi o meu pois, na minha intervenção, tinha levantado uma questão que constatei, pela reacção dos Srs. Deputados presentes, não ser bem assim.

É natural que eu procure argumentar quando a redacção do PSD para este artigo diz que «só podem ser suspensos ... {imperceptível) administrativos, cumpridos os requisitos prévios» — o que, já por si, é uma selecção daqueles, que podem ver o seu círculo de interesses protegido — «se, estando preenchidos esses requisitos, o requerente explorar uma área cuja pontuação seja inferior à pontuação de quem pede a reserva».

É evidente que, como sabemos, todas as cooperativas têm mais de 91 000 pontos. Se todas têm mais de 91 000 pontos, nunca nenhuma delas, qualquer que seja o caso, pode recorrer a tribunal em virtude da aplicação deste novo texto, porque a pontuação da sua área é sempre superior à daquele que pede reserva.

Mas este é um aspecto menor! Como, atrás, a lei afirma que não podem ser entregues reservas em áreas dadas para a exploração ao abrigo dos diferentes contratados que a lei prevê, então esses nunca terão também interesse em recorrer porque não vão ter lá reservas. Os outros, como não têm esses contratos não podem recorrer! Logo, o texto do artigo não se aplica de facto.

O que daqui se deduz é que ninguém pode passar a ver protegidos os seus interesses ao nível do Supremo Tribunal Administrativo.