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II SÉRIE-A — NÚMERO 49

cadernetas, elementos respeitantes aos outorgantes, ect., tudo numa perda de tempo e de energia, já para não falar dos atrasos na resolução de problemas, o que se reflecte necessariamente na vida económica, mormente nas unidades empresariais.

O notário não é, obviamente, o único factor de complexidade e de frustração que afinal constitui a teia burocrática que nos rodeia — basta pensar no funcionamento das repartições de finanças e das conservatórias dos registos predial e comercial.

Nalgumas das últimas, um registo de simples constituição de uma sociedade ou de uma compra e venda chega a demorar cinco a seis meses, sendo certo que só a partir do registo a sociedade comercial tem existência jurídica.

A necessária aproximação das nossas estruturas administrativas às da generalidade dos países europeus leva forçosamente a concluir que tudo está por fazer na chamada «reforma administrativa», não tendo o actual Governo demonstrado a mínima capacidade para a levar a cabo.

Antes pelo contrário, tem-se agravado sucessivamente nos últimos anos todo o aparelho administrativo da segurança dos direitos, com consequências cada vez mais gravosas para a vida dos cidadãos em geral e das empresas em particular.

3 — Problema não menos relevante é o dos custos dos actos notariais, dependentes na maior parte dos casos do valor do acto e atingindo somas exorbitantes e sem relação com o serviço prestado pelo Estado.

Os exemplos poderiam multiplicar-se e constituem, sobretudo para as pequenas e médias empresas e também para os particulares, um pesadíssimo custo, que nada justifica se mantenha.

4 — Este projecto não visa atacar o problema geral, e de fundo, que só o poder executivo tem condições e competência para enfrentar. De qualquer modo, cremos inadiável alterar o deplorável estado de coisas numa área vital —a do notariado—, com preocupações mais acentuadas na criação e adaptação da existência jurídica das empresas.

5 — Pode dizer-se que o fulcro da modificação agora proposta assenta numa diversa visão e função do notário. Como se verá, ele passa a ser o eixo em volta do qual girarão todas as acções a desenvolver pelo interessado: só com ele terá o cidadão, ou um seu representante, de contactar, só ele promoverá as acções burocráticas necessárias e só a ele terá de pagar-se a taxa devida para a prática das formalidades. Por outro lado, a oferta de serviços notariais tornar-se-á adequada às necessidades, acabando com o actual sistema do numerus clausus e tornando clara a natureza da actividade notarial; é evidente o atraso permanente do Estado, só criando notários quando o tempo já impõe duas ou três vezes mais.

Até aos anos 40 o notariado seguiu a evolução geral característica dos demais países latinos de cultura jurídica romano-germânica. Então, gerou-se um desvio, agora claramente inconveniente, ao integrar os notários na Administração Pública, deixando de ser profissionais livres para se tornarem comuns empregados do Estado. A lei deixou apenas dois resíduos do estatuto anterior: o da livre escolha do notário e o da sua remuneração com base em emolumentos pagos pelos interessados ao Estado, pela via da chamada «participação emolumentar». Acontece que o moderno notá-

rio é, essencialmente, um jurista, com qualificação científica, dotado de fé pública e profissional livre; deve aconselhar, interpretar e conformar legalmente a vontade dos intervenientes, nos actos e contratos em que intervenha, por força da lei ou da vontade das partes, conferindo-lhes carácter de autenticidade.

6 — Os notários passarão, pelo sistema proposto, a ter interesse permanente em angariar clientela, em concorrer disciplinadamente, sem obstáculos de índole normativa, porque quanto mais e melhor fizerem, mais remunerados serão. A ambivalência da função notarial, pública e privada, determina intransigentes rigores na preparação técnica, na disciplina e responsabilidade civil que se lhes impõe; mas também uma obediência normativa privatística em tudo o mais que não importe é essencial garantia da fé pública. Porque ao Estado e à colectividade só esta importa defender sem tibiezas e sem equívocos.

7 — É um notariado novo que devemos criar em Portugal. Sê-lo-ia já nos termos enunciados. Mas o presente projecto atribui-lhe missões acrescidas; porque, não o esqueçamos, o nosso futuro económico na Europa para que se caminha vai depender da agilidade, da eficiência, da maior racionalidade da nossa vida.

8 — Além de os interessados, ou os seus representantes, irem apenas a uma entidade, o notário, só se pagará, por tudo, um emolumento nesse mesmo notário. A simplificação é total para o público; a abertura do notariado a quem queira e tenha condições científicas para o efeito garante a existência de um número suficiente para trabalhar aceleradamente, porque em concorrência disciplinada. Como profissional livre deverá auferir, sem limites definidos previamente, os proventos que correspondam ao volume da sua actividade. Por fim, e pela sua relevância, deve assinalar-se que o regime transitório assegurará aos notários em funções a permanência do seu actual estatuto profissional, se essa for a sua opção.

Prevê-se, por outro lado, a manutenção pelo Estado de um serviço público de notariado nos locais onde, eventualmente, não haja concorrentes interessados.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a deputada abaixo assinada, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresenta o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.° Com observância dos requisitos de acesso que forem estatuídos, é inteiramente livre o direito de estabelecimento dos notários.

Art. 2.° — 1 — O notário é o jurista, profissional liberal tecnicamente qualificado, que tem por função aconselhar, interpretar e conformar legalmente a vontade dos intervenientes nos actos e contratos nos quais lei especial exigir a sua intervenção, conferindo-lhe autenticidade ou fé pública, e certificar os factos ou situações que a pedido das partes devidamente comprove.

2 — O notário é determinado pela livre escolha dos interessados, é remunerado pelos mesmos através de uma comparticipação emolumentar e exerce a sua função em nome próprio e sob sua responsabilidade, com independência e imparcialidade, obedecendo à lei e à vontade das partes.

Art. 3.° Mediante impulso dos interessados, cabe ao notário obter todos os documentos de natureza não fiscal necessários à celebração do acto notarial e praticar todos os actos e diligências necessários, prévios ou complementares à outorga dos mesmos, de modo a legalizar a situação jurídica emergente daquele acto.