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6 DE JANEIRO DE 1996

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Na anterior redacção do artigo 284.°, a resposta seria mais claramente negativa. Visava-se, sobretudo, possibilitar a revisão antes de decorrido o quinquénio sobre a última alteração, mediante deliberação por maioria particularmente exigente. Por essa razão a Resolução n.° 18/92 estabelecia a vontade de assunção imediata de poderes de revisão constitucional, não delimitando, sequer, o objecto da mesma.

Com a modificação, operada em 1992, que distingue entre as duas formas de revisão, permite-se agora a possibilidade de revisão extraordinária a todo o tempo sem que, aparentemente, se interrompa o decurso do prazo de revisão ordinária. Os processos de revisão são, por isso, totalmente independentes. Enquanto apenas se poderá realizar uma revisão ordinária por legislatura, a revisão extraordinária poderá, em abstracto, ser realizada várias vezes em cada legislatura desde que a Assembleia da República delibere nesse sentido, para cada uma delas, pela maioria de quatro quintos exigida.

A questão que subsiste é, porém, a de saber se ainda assim será quando, simultaneamente, possam ocorrer duas revisões, ordinária uma e extraordinária outra. Ou, dizendo de modo diverso, se iniciada a sessão legislativa durante a qual é possível a assunção de poderes de revisão ordinária, possível é também que, concomitantemente, se assumam poderes de revisão extraordinária actuando em paralelo.

Como vimos, sem embargo de apenas a partir da última revisão ter sido expressamente consagrada a distinção, boa parte da doutrina aceitava já a concorrência conceptual dos dois tipos de revisão, por todos sendo de referir Gomes Canotilho e Vital Moreira quando afirmavam que «a Constituição pode também ser submetida a revisão extraordinária antes de decorrido o quinquénio sobre a última revisão [...]» Constituição da República Portuguesa Anotada, 2." ed., 2.° vol., p. 557).

E se esta era já tese defensável em face da formulação a esse propósito omissa do artigo 284°, por maioria de razão o é hoje diante da sua nova redacção. Por isso a afirmação, repetida agora pelos mesmos autores, quando, aludindo à possibilidade prevista no n.° 2 daquele preceito, adiantam tratar-se «de uma válvula de segurança para permitir antecipar a revisão, desde que esta se tome imprescindível e inadiável» {Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.º ed., p. 1051).

Ora, a ser assim, haverá que concluir que a ocorrência de uma revisão extraordinária dependerá sempre de um duplo pressuposto: formal ou de legitimação enquanto dependente de uma maioria particularmente qualificada de Deputados; maleriai ou de motivação, enquanto vinculada a exigências de imprescindibilidade e de inadiabilidade. Mas, se assim é, então entre revisão ordinária e revisão extraordinária não se estabelece qualquer relação de alternatividade exclusivamente dependente da discricionária ou política vontade dos Deputados apenas limitada pelo decurso do tempo, antes se firma uma relação de diversidade de tal modo que à limitação temporal que condiciona a revisão ordinária corresponde a limitação de oportunidade que vem condicionar a revisão extraordinária. Dir-se-á, pois, que apenas com fundamento na sua imprescindibilidade e inadiabilidade poderá usar-se do recurso à revisão extraordinária. Mas, se é, então, certo que sem aquele fundamento não haverá revisão extraordinária, certo continuará a ser que, verificado ele, logo esta poderá ocorrer, ainda que em simultâneo com a revisão ordinária? Julgamos que sim. É que, a nosso ver, aquele requisito de inadiabilidade e imprescindibilidade não se esgota na sua vocação de pressuposto externo para a realização da revisão

extraordinária. Mais do que isso, ele enforma a própria natureza desta, condicionando, por isso, o seu objecto, ele mesmo considerado. Mas, então, são a inadiabilidade e a imprescindibilidade de revisão que a impõem salvaguardadas pela particular maioria qualificada exigida à própria revisão ordinária. Por isso que deva ela, então, esgotar o seu objecto no âmbito daquele critério, do mesmo modo que deva considerar-se ilógico ter-se por «inadiável e imprescindível uma revisão constitucional sem uma definição das matérias carecidas dela» (Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit., p. 1052) e sem o respectivo fundamento.

Ter-se-á, assim, que à revisão extraordinária não basta uma vontade de quatro quintos dos Deputados em efectividade de funções. Isto é, a estabilidade constitucional não cede perante uma vontade política estritamente formal. Como valor, a estabilidade constitucional aceita ceder diante de critérios externos de natureza material, que, todavia e ainda assim, apenas adquirirão validade prática quando sufragados por uma maioria particularmente qualificada.

A revisão extraordinária não ocorre, pois, sempre que quatro quintos dos Deputados assim querem, mas tão-só quando razões de imprescindibilidade e de inadiabilidade o impõem e, então, quatro quintos dos Deputados nela aceitam em acordar.

Porém, a ser assim, tão certo é poder apenas a revisão extraordinária ocorrer verificado aquele duplo requisito, como certo continua a ser que, verificado ele, nada obsta a que a revisão tenha lugar, nem mesmo a ocorrência simultânea de um processo de revisão ordinária. Ponto é que aquela maioria de quatro quintos se não esgote num exercício formal de legitimação, antes, indo mais longe, se assuma como maioria sindicante face ao julgamento de oportunidade que fundamenta a excepcionalidade da revisão. Isto é, não basta àquela maioria que o seja, é essencial que ela se forme em torno da conclusão positiva face à questão da imprescindibilidade ou inadiabilidade da própria revisão. Por isso que, na resolução que desencadeia o processo, seja de exigir a indicação do objecto da revisão e dos fundamentos que justificam a natureza imprescindível e inadiável desta.

Ora, tudo isso, embora de forma que, há-de reconhecer--se, pouco exuberante, não deixa de constar do projecto de resolução em apreço.

Parece, pois, não ser de excluir a possibilidade da ocorrência, agora, de uma revisão constitucional extraordinária independentemente da questão de saber se este é tempo de revisão ordinária (cf., a título de exemplo, Jorge Miranda, «O Tratado de Maastricht e a Constituição Portuguesa», in Brotéria, Cultura e Informação, vol. 136, n.° 4, Abril, 1993, pp. 379 e 380).

Já o conteúdo do projecto de resolução se nos afigura menos exigente. Embora sejam invocadas, de uma forma genérica, as disposições constitucionais adequadas, julgaríamos preferível a formulação adoptada pela Resolução n.° 18/92 e a invocação expressa do artigo 284°, n.° 2. Do que se trata é de assumir poderes de revisão extraordinária e não de «realizar uma revisão extraordinária».

Nestes termos, nada de particularmente relevante cumpre relatar no que se refere às «consequências da aprovação da resolução», a não ser que daí resulta a reabertura da questão da permissibilidade do referendo para lá dos limites do artigo 118.° da Constituição em vigor, questão que, embora submetida a debate e decisão parlamentares em 1992, não está excluída dos poderes da nova Assembleia.

Por outro lado, aprovada a resolução, outras questões não deixarão de suscitar-se para o tempo da respectiva legislatura, nomeadamente a de saber se o objecto da proposta de revisão

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