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3375 | II Série A - Número 082 | 28 de Março de 2003

 

afirma, nomeadamente, que "a política de Defesa Nacional tem como um dos objectivos a Segurança e Defesa do território nacional em toda a sua extensão, que abrange o Continente, Açores e a Madeira. Na definição dessa política, devem inscrever-se os seguintes elementos matriciais, considerados como Espaço Estratégico de Interesse Nacional Permanente: o território que se define, nas suas referências cardeais, entre o ponto mais a Norte, no concelho de Melgaço, até ao ponto mais a Sul, nas ilhas Selvagens; e do seu ponto mais a Oeste, na ilha das Flores, até ao ponto mais a Leste, no concelho de Miranda do Douro; o espaço de circulação entre as parcelas do território nacional, dado o seu carácter descontínuo; os espaços aéreo e marítimo sob responsabilidade nacional, as nossas águas territoriais, os fundos marinhos contíguos, a zona económica exclusiva e a zona que resultar do processo de alargamento da plataforma continental". Por sua vez, no capítulo sobre as ameaças relevantes, é afirmado que "é, por isso, de interesse estratégico prioritário, para Portugal, que a Defesa Nacional dê prioridade, no quadro constitucional e legal: às acções de fiscalização, detecção e rasteio do tráfico de droga nos espaços marítimo e aéreo sob jurisdição nacional, auxiliando as autoridades competentes no combate a este crime [...]". Tudo isto leva a que as Forças Armadas devam ter "capacidade de vigilância e controlo do território nacional e do espaço interterritorial, nele se incluindo a fiscalização dos espaços aéreo e marítimo nacionais."

Podemos deste modo concluir que, designadamente por força do princípio da unidade do Estado e da obrigação que lhe incumbe de assegurar a defesa nacional, nos termos do artigo 273º da Constituição, não é possível a transferência para os governos regionais de determinados bens, nomeadamente os que integram o domínio público marítimo, domínio público necessário do Estado. Assim sendo, os Estatutos Político-Administrativos das Regiões Autónomas não operaram qualquer transferência desses bens do domínio público marítimo, que continuam, assim, a ser bens do Estado.

7.4. Assente que o domínio público marítimo, no qual se integram os leitos das águas do mar e, por conexão necessária, as respectivas margens, cujo regime se encontra previsto no Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, se mantém domínio público do Estado, importa agora verificar se a norma contida no n.º 1 do artigo 36.º daquele diploma é compatível com a Constituição. Como se referiu já, é o seguinte o teor do citado n.º 1: "Os poderes conferidos pelo presente diploma ao Estado cabem nas Regiões Autónomas aos respectivos órgãos de governo próprio".

Ora, é corolário necessário da não transferibilidade dos bens do domínio público marítimo do Estado a impossibilidade de transferência dos poderes que sejam inerentes à dominialidade, isto é, os necessários à sua conservação, delimitação e defesa, de modo a que tais bens se mantenham aptos a satisfazer os fins de utilidade pública que justificaram a sua afectação.
Esta tese, indubitavelmente correcta, foi recentemente desenvolvida no parecer que a Comissão do Domínio Público Marítimo elaborou precisamente sobre o n.º1 do artigo 36º do Decreto-Lei n.º 468/71, que ora nos ocupa. Nesse parecer (n.º 5945, de 18 de Janeiro de 2002, publicado no Boletim da Comissão do Domínio Público Marítimo, n.º 116, 2002, pgs. 12 a 17), a Comissão afirma que: "como decorre de tudo o que já se deixou dito, também a redacção proposta para este artigo 36º não pode merecer o acordo desta Comissão, dado que ela significa, de forma ainda mais clara e directa do que as propostas anteriores, a total regionalização das áreas dominiais que, como dissemos repetidamente, fazem parte do domínio público do Estado que se encontra integrado no sistema de Defesa Nacional e, portanto, não regionalizável, conforme esclarecem os Estatutos Político-Administrativos das Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores. [...] Perante preceito tão drástico, até a própria defesa jurídica da dominialidade e da titularidade dos direitos de propriedade pública respectivos relativamente às margens - poderes que têm, nos processos de delimitação do domínio público marítimo, a sua expressão mais relevante - seriam subtraídos à autoridade do Estado. [...]
Outro tanto se não diria da transferência de poderes secundários, que não afectasse a autoridade suprema do Estado nesta matéria, porque seriam configurados como delegação administrativa de competências nos órgãos ou serviços das Regiões Autónomas. De resto, tal possibilidade já foi encarada favoravelmente por esta Comissão, no seguimento de uma sugestão da Região Autónoma dos Açores, da qual resultou o Parecer nº 5880 [...]."

Por outro lado, o próprio Tribunal Constitucional já considerou, no seu Acórdão n.º 458/93, de 12 de Agosto de 1993 (Diário da República, I Série-A, de 17 de Setembro de 1993), que os órgãos dos governos regionais "não dispõem de competência em matérias de segurança interna ou externa do Estado" e que a lei não pode "delegar a favor das regiões autónomas competências próprias da soberania, sob pena de violação do artigo 113º da Constituição".

É, assim, possível afirmar, como o fazem Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa, Anotada, Coimbra, 1993, pgs. 733 e 858), que existe uma "reserva de governo da República", nomeadamente em matéria de "relações externas, defesa, [...] gestão do espaço aéreo e marítimo", e que não podem ser transferidas para as regiões funções como as de "defesa nacional [...] do controlo do espaço aéreo e do domínio público marítimo". Torna-se, portanto, claro que a autonomia das regiões não afecta a soberania do Estado, devendo, para tal, ser "reservados ao aparelho de Estado todos os poderes tidos por constitucionalmente necessários para que o sistema funcione unitariamente [...]" (Carlos Blanco de Morais, A Autonomia Legislativa Regional, Lisboa, 1993, pag. 405).

Entre os poderes expressamente conferidos ao Estado no Decreto-Lei n.º 468/71 e que se pretende, por força do disposto no n.º 1 do artigo 36º, em apreciação, transferir para "os órgãos de governo próprio" das Regiões Autónomas, encontram-se, seguramente, poderes inerentes à dominialidade, necessários para a sua conservação, delimitação e defesa. Ora, tendo-se concluído, como vimos, que as margens das águas do mar integram, nos termos previstos na lei, o domínio público marítimo e que os bens deste domínio