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3372 | II Série A - Número 082 | 28 de Março de 2003

 

(art. 165º, n.º 1, alínea v), da CRP).

Neste sentido (veja-se Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 6ª edição, pgs. 724 e 725, Coimbra, 2002), existirá uma reserva de densificação total, já que a Constituição exige que determinadas matérias sejam disciplinadas na sua totalidade pela lei e não apenas uma mera reserva de densificação parcial, verificada quando a lei se limita a definir as bases ou o regime jurídico geral, consentindo o seu desenvolvimento quer através de decreto-lei, quer através de actos regulamentares. É claro que, como afirma o citado autor, "rigorosamente todas as reservas são "relativas" porque deixam aos órgãos concretizadores (administrativos ou jurisdicionais) uma margem maior ou menor de intervenção. Todavia, há uma grande diferença entre uma reserva de lei limitada a uma reserva de bases (cfr. arts. 164º/ i,165º/f), g), n), t), u) e z) ou até uma reserva de lei reconduzível a uma reserva de regime geral (cfr. art. 165º/d), e), h) e uma reserva de lei definidora de um regime jurídico global, como é o caso, por exemplo, da disciplina jurídica das eleições para os titulares de órgãos de soberania. Nesta última hipótese, a reserva será "absoluta" no sentido de a extensão da competência materialmente reservada à lei implicar a restrição radical da intervenção normativa de outras entidades (ex.: do "legislador-governo", do "governo-regulamentador"").

Ora, a Assembleia da República, ao remeter, nos casos previstos no n.º 8 do artigo 3º, a aplicação da regra contida no respectivo número 7 - isto é, a fixação do limite da margem em termos diversos do disposto nos números 2 a 5 do citado artigo 3º - para "deliberação" casuística dos respectivos governos regionais, sem fixar quaisquer critérios substanciais, abdicou da própria fixação dos critérios de definição dos limites da margem nos casos nele previstos, o que não é constitucionalmente admissível.

Consequentemente, há que concluir que a norma constante do n.º 8 do artigo 3º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, na redacção que lhe é dada pelo artigo 1º do Decreto n.º 30/IX, viola o princípio da reserva de lei decorrente das disposições conjugadas dos artigos 165º, n.º 1, alínea v), e 84º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa.

7. A constitucionalidade da norma constante do n.º 1 do artigo 36º

7.1. No que se refere à segunda questão de constitucionalidade suscitada - a da norma constante do n.º 1 do artigo 36º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, na redacção que lhe é dada pelo artigo 1º do Decreto n.º 30/IX da Assembleia da República - verifica-se que, embora o requerente, inicialmente, faça menção aos poderes do Estado que passariam para as regiões autónomas no âmbito do domínio público hídrico, vem, de seguida, circunscrever a sua dúvida sobre a constitucionalidade da norma em causa ao âmbito do domínio público marítimo, dado o facto de este ter, "por natureza, um interesse relevante para a defesa nacional".

Assim, em relação à questão da constitucionalidade da citada norma constante do n.º 1 do artigo 36º, limitar-se-á a respectiva apreciação ao caso em que os poderes conferidos ao Estado pelo Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, se exercem no âmbito do domínio público marítimo.

7.2. Importa, então, começar por fixar o sentido do conceito de "domínio público marítimo".

É entendimento pacífico, em Portugal, que o denominado domínio público marítimo integra, além das águas territoriais, com os seus leitos e os fundos marinhos contíguos (previstos na alínea a) do n.º 1 do artigo 84º e cujos limites são fixados por lei, nos termos do n.º 1 do artigo 5º, ambos da Constituição), as águas do mar interiores e, ainda, as demais águas sujeitas à influência das marés, bem como os respectivos leitos e margens, desde que estes terrenos pertençam ao Estado (artigos 1º, 2º, 3º e 5º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro). É o que resulta da alínea a) do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 477/80, de 15 de Outubro, em que, para efeitos de inventário do património do Estado, se consideram integradas no domínio público do Estado "as águas territoriais com os seus leitos, as águas marítimas interiores com os seus leitos e margens e a plataforma continental" e nesse sentido se exprime também a doutrina (veja-se, por exemplo, Freitas do Amaral e José Pedro Fernandes, Comentário à Lei dos Terrenos do Domínio Hídrico, Coimbra, 1978, pg. 39 e Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, Tomo II, 9ª edição, Coimbra, 1980, pgs. 900 e 901).

Torna-se, assim, manifesto que o domínio público marítimo resultante do disposto na lei compreende, nomeadamente por razões de necessária acessoriedade - as margens são indispensáveis para possibilitar a utilização das águas -, as faixas de terreno, legalmente qualificadas como margem, que sejam contíguas a águas do mar ou às demais águas sujeitas à influência das marés, desde que esses terrenos estejam na pertença do Estado, o qual, por sua vez, beneficia de uma presunção juris tantum de que os mesmos são propriedade pública (cfr. artigos 5º e 8º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro).

7.3.Definidos os terrenos que integram o domínio público marítimo e cujo regime é regulado pelo Decreto-Lei n.º 468/71, importa ainda, antes de analisar a questão de constitucionalidade aqui em causa, verificar se o domínio público marítimo mantém a sua natureza estadual ou se, ao invés, terá sido objecto de transferência para as regiões autónomas. E isto porque, se acaso o domínio público marítimo do Estado tiver sido objecto de transferência para as regiões autónomas, tal facto não deixará de ser relevante para a decisão que se tomar quanto aos poderes que lhe estão associados.

Com efeito, de acordo com o disposto no artigo 112º do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (Lei 61/98, de 27 de Agosto), "1. Os bens do domínio público situados no arquipélago pertencentes ao Estado, bem como aos antigos distritos autónomos, integram o domínio público da Região.