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3376 | II Série A - Número 082 | 28 de Março de 2003

 

público, nomeadamente por força do princípio da unidade do Estado e da obrigação que lhe incumbe de assegurar a defesa nacional, nos termos do artigo 273º da Constituição, não foram transferidos para as regiões autónomas, daí necessariamente decorre que não é possível transferir para "os órgãos de governo próprio" das regiões autónomas os poderes inerentes à dominialidade daqueles bens previstos no Decreto-Lei 468/71 e abrangidos pela previsão do artigo 36.º, n.º 1, cuja constitucionalidade se está a apreciar.

Por tudo quanto se deixa dito, há que concluir pela inconstitucionalidade da norma contida no n.º 1 do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, na redacção que lhe é dada pelo artigo 1.º do Decreto n.º 30/IX da Assembleia da República, dado que opera uma transferência para os órgãos de governo próprio das regiões autónomas de poderes do Estado inerentes à dominialidade dos terrenos do domínio público marítimo, insusceptíveis, por força do princípio da unidade do Estado e da obrigação que lhe incumbe de assegurar a defesa nacional, nos termos do artigo 273º da Constituição, de transferência para as Regiões Autónomas.

III - Decisão

Nestes termos, o Tribunal Constitucional pronuncia-se:

a) pela inconstitucionalidade da norma constante do n.º 8 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, na redacção que lhe é dada pelo artigo 1º do Decreto da Assembleia da República n.º 30/IX, por violação do princípio da reserva de lei decorrente das disposições conjugadas dos artigos 165.º, n.º 1, alínea v), e 84.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa;
b) pela inconstitucionalidade da norma constante do n.º 1 do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, na redacção que lhe é dada pelo artigo 1.º do Decreto da Assembleia da República n.º 30/IX, na medida em que se refere ao domínio público marítimo, por violação do princípio da unidade do Estado decorrente das disposições conjugadas dos artigos 6.º, n.º 1, e 273.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.

Lisboa, 11 de Março de 2003
Gil Galvão
Maria Helena Brito
Maria Fernanda Palma
Mário Torres
Benjamim Rodrigues
Luís Nunes de Almeida
Artur Maurício
Paulo Mota Pinto
Alberto Tavares da Costa
Bravo Serra
Pamplona de Oliveira , com declaração que junto.
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (com declaração relativa à alínea a).
José Manuel Cardoso da Costa

Declaração de voto

Votei a decisão, embora com a divergência relativa à fundamentação que muito esquematicamente se traduz no seguinte:

Quanto à primeira alínea da decisão, entendo que a norma em análise infringe também o princípio da legalidade exactamente nos termos invocados, a este propósito, pelo Presidente da República.
Quanto à segunda alínea, entendo que o fundamento da inconstitucionalidade material é outro, pois, tomando por mera deficiência a técnica legislativa que transparece da norma ao pretender atribuir a órgãos das Regiões Autónomas os poderes pertencentes à pessoa colectiva Estado, o vício de inconstitucionalidade não radica - salvo o devido respeito por opinião diversa - na violação do princípio da unidade do Estado, mas na violação do princípio da legalidade; é que o núcleo essencial dos poderes relativos ao domínio público necessário do Estado não pode ser entregue às Regiões Autónomas por força do disposto nos artigos 84.º, n.º 2, 111.º, n.º 2, e, a contrario, pela alínea h) no n.º 1 do artigo 227.º, todos da Constituição.

Pamplona de Oliveira

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Declaração de voto

1 - Em meu entender, o n.º 8 que o Decreto n.º 30/IX da Assembleia da República veio acrescentar ao artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 468/71, de 5 de Novembro, deveria ser interpretado de forma a que a deliberação nele referida fosse entendida como a deliberação de construir a estrada; com esse sentido, não me teria pronunciado pela inconstitucionalidade.
O acórdão, todavia, perfilhou uma interpretação diferente, na verdade também permitida pela letra do preceito.
Assim sendo, e tendo em conta a definição da norma objecto do presente processo com o sentido definido pela maioria do Tribunal, pronunciei-me no sentido da sua inconstitucionalidade, mas por fundamentação diversa da que fez vencimento.
2 - O fundamento do acórdão, no que respeita ao n.º 8 do artigo 3.º, assim entendido, é o de que a reserva de lei, em matéria de definição dos limites do domínio público, constitui uma reserva de "densificação total", com exclusão da intervenção normativa de outras entidades, e não uma reserva de mera "densificação parcial", como a que existe quando a lei se limita a definir as bases gerais ou o regime geral de determinado assunto, consentindo o seu desenvolvimento através de decreto-lei ou de actos regulamentares.
A verdade, porém, é que o n.º 8 do artigo 3.º não contém um reenvio normativo, não faz uma remissão para normas legais ou regulamentares de carácter secundário. O efeito do n.º 8 do artigo 3.º é, sim, o de atribuir aos governos regionais um poder de decisão concreta para determinar, em relação a cada estrada regional ou municipal que no futuro venha a ser construída na proximidade de águas públicas, se a largura da margem deve estender-se para lá da estrada a construir.
Trata-se, pois, de um poder discricionário, não de um poder regulamentar, o que assume a maior relevância do ponto de vista do alcance e das implicações do princípio da reserva de lei.
Com efeito, a exclusão de poderes normativos secundários, nomeadamente sob a forma de regulamentos independentes, não acarreta em si mesma uma proibição constitucional de atribuição de poderes discricionários aos órgãos da Administração.
A relação entre normas não é equiparável à relação entre norma e acto. O reenvio para normas de grau inferior diz respeito à estrutura do sistema de fontes e tem por objecto uma função que as normas superiores podem reservar