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2019 | II Série A - Número 041 | 04 de Março de 2004

 

O projecto de lei n.º 1/IX do Partido Comunista Português propõe a não punibilidade da interrupção da gravidez efectuada por médico, ou sob a sua direcção, em estabelecimento de saúde oficial ou oficialmente reconhecido quando realizada nas primeiras 12 semanas de gravidez a pedido da mulher para preservação do direito à maternidade consciente e responsável.
Prevêem-se ainda outras alterações ao artigo 142.º do Código Penal, matéria não visada pela iniciativa popular.
O projecto de lei n.º 89/IX do Bloco de Esquerda propõe a não punibilidade da IVG efectuada por médico, ou sob a sua orientação, em estabelecimento de saúde oficial ou oficialmente reconhecido, a pedido da mulher nas primeiras 12 semanas de gravidez. Propõe também outras alterações em matéria não abrangida pela iniciativa popular de referendo.
Com o projecto de lei n.º 405/IX , o Partido Socialista visa a não punibilidade da interrupção da gravidez efectuada por médico ou sob a sua direcção, em estabelecimento oficial ou oficialmente reconhecido com o consentimento da mulher grávida, a pedido da mulher e após uma consulta num Centro de Acolhimento Familiar, nas primeiras 10 semanas de gravidez, para preservação da sua integridade moral, dignidade social ou maternidade consciente.
Propõe ainda outras alterações em matéria não abrangida pela iniciativa popular de referendo.
Encontra-se ainda pendente o projecto de lei n.º 409/IX do Partido Ecologista "Os Verdes", apresentado em 30 de Janeiro de 2004, propondo a despenalização da IVG realizada nas primeiras 12 semanas.
O PS apresentou ainda o projecto de resolução n.º 203/IX para a realização de um referendo sobre a descriminalização da interrupção voluntária da gravidez realizada nas primeiras 10 semanas.
Sendo a pergunta exactamente igual à apresentada pelos cidadãos subscritores da iniciativa popular.
Com efeito, o Partido Socialista propõe a consulta ao eleitorado sobre a pergunta seguinte:

"Concorda que deixe de constituir crime o aborto realizado nas primeiras 10 semanas de gravidez, com o consentimento da mulher, em estabelecimento legal de saúde?"

Não se tratando, por ora, de analisar a pergunta a submeter ao eleitorado, pois disso apenas se poderá tratar, importa, no entanto, perante estes dados analisar a conformidade da iniciativa popular referendária, com o disposto no n.os 3 e 4 do artigo 17.º da Lei n.º 15-A/98, de 3 de Abril.
De facto, nos termos do n.º 3 do artigo 17.º desta lei, a explicitação da pergunta a submeter ao eleitorado deve ser instruída com a identificação dos actos em processo de apreciação na Assembleia da República.
Ora, na altura em que começou a desenvolver-se a iniciativa referendária já se encontravam pendentes na Assembleia da República dois projectos de lei visando a despenalização da IVG - a iniciativa do PCP e a do BE.
Assim, importará saber se face à redacção da lei, a pergunta teria de ser reportada aos dois projectos de lei ou a um só, e no caso afirmativo, que consequências daí resultam para o projecto de lei com que os peticionantes instruíram a pergunta.
De facto, o que será submetido à consulta popular não é um determinado projecto de lei, não é sequer, o projecto de lei apresentado pelos peticionantes, mas tão só o conteúdo material de uma questão a incluir, ou não, em letra de lei, seja qual for o projecto em causa.
Com efeito, tal como diz Gomes Canotilho (em Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª edição) o referendo não tem por objecto actos normativos, ou projectos de actos normativos. Trata-se, segundo este autor, de uma decisão-regra, que posteriormente será objecto de uma lei ou de uma convenção internacional.
Relativamente ao projecto do PS, que é o que mais se identifica com a iniciativa popular referendária, parece claro que a pergunta apresentada pelos peticionantes pode ser reportada a esse projecto. A pergunta apresentada pelo PS, tal como atrás já se afirmou, é igual à apresentada pelos peticionantes e vice-versa.
E a isto não obsta o facto de o conteúdo do projecto de lei do Partido Socialista conter outras matérias. Já que, tal como decidiu o Tribunal Constitucional, no acórdão que se cita, "nem todos os aspectos do regime que se pretenda estabelecer têm obrigatoriamente de constar da pergunta formulada. É o que acontece, por exemplo, no caso dos autos, com a consulta em centro de aconselhamento familiar, prevista no projecto de lei n.º 451/VII, que não ficará afastada pelo facto de não se encontrar mencionada na pergunta".
De facto, tal como se diz no acórdão, afigura-se importante "importante - até para que a pergunta possa ter uma mínima correspondência com o objecto da iniciativa legislativa - que dela constem, por exemplo, referências à iniciativa da mulher e ao facto de a interrupção da gravidez se efectuar em estabelecimento de saúde."
Mas nada obstará a que, no caso de a resposta ser afirmativa, outros aspectos do regime, também constantes dos projectos de lei do PCP e do Bloco de Esquerda, possam vir a ser contemplados na lei.
Seria impeditivo da aplicação do n.º 3 do artigo 17.º da Lei n.º 15-A/98 o facto de os outros dois projectos de lei preverem a despenalização até às 12 semanas, e conterem ainda outras previsões, nomeadamente quanto a prazos?
Que sim, responderão os que entenderem que não há correspondência entre a pergunta que se reporta às 10 semanas e os projectos de lei que prevêem as 12 semanas.
Que não, responder-se-á se se entender que a lei, no n.º 4 do artigo 17.º, ao exigir a apresentação do projecto de lei quando não se encontre pendente acto sobre o qual possa incidir referendo, apenas reporta essa exigência à inexistência de acto visando de uma forma geral, aquilo que os peticionantes pretendem ou não pretendem. Sem que tal exigência diga respeito a soluções que, em sede de especialidade, possam ser adquiridas na iniciativa legislativa pendente.
A Lei n.º 15-A/98, de 3 de Abril, ao admitir no seu artigo 4.º, que possam ser objecto de referendo iniciativas legislativas ainda em apreciação, poderá permitir que se conclua que pode ser colocado ao eleitor solução mais minguada do que a constante daquela iniciativa, para que seja levada em consideração, na hipótese de resposta afirmativa, na elaboração do diploma na especialidade.
Mas a resposta à questão de saber se estamos perante o caso do n.º 3 ou do n.º 4 do artigo 17.º terá de passar averiguação da natureza da exigência da instrução da pergunta com a indicação dos actos em apreciação.
Tal acontece porque se quis, nesse caso, que não fosse apresentado pelos peticionantes um projecto de lei?
Ou tal se destinou apenas a tornar mais fácil o exercício da iniciativa popular?
Ou seja: a compaginação entre a democracia representativa e a democracia directa estará na base da exigência