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94 | II Série A - Número: 058 | 5 de Janeiro de 2011

Por outras palavras, os responsáveis pela situação do banco pretendem ainda beneficiar da decisão de nacionalização, responsabilizando o Estado por pagamentos que a sua acção e gestão do banco nunca permitiria assegurar. Uma parte desses pagamentos relaciona-se com a promessa de aquisição de acções que, nunca tendo sido cotadas em Bolsa, eram valorizadas nos termos de contrato estabelecido entre o banco e a pessoa, garantindo uma mais-valia arbitrária que foi entretanto paga ou que é agora reclamada.
Acresce que o banco, apesar de ter continuado a actuar em situação de falência, foi suportado desde então por empréstimos para assegurar as suas operações e liquidez, por parte da CGD e por instruções do Estado.
Mas a utilização desses empréstimos, no valor total de cerca de 5 mil milhões de euros, está ainda por esclarecer satisfatoriamente.
De facto, o BPN teria, no momento da nacionalização, segundo informação do Ministro das Finanças ao parlamento, depósitos no valor de cerca de 5 mil milhões de euros. Os recursos de clientes seriam, no primeiro semestre de 2009, pouco depois da nacionalização e de se terem tornado conhecidas as dificuldades do banco, de 3,6 mil milhões, valor que se manteria em Novembro desse ano. O Ministro das Finanças assegurou no parlamento, a 27 de Novembro de 2009, que o BPN teria então mais 35 mil clientes do que ano anterior.
No entanto, apesar de o valor destas perdas de depósitos ter sido de cerca de 2 mil milhões, os empréstimos necessários para o BPN rapidamente ultrapassaram muito mais do dobro desse valor, cerca de 5 mil milhões: em Março de 2009, três meses depois da nacionalização, tinham sido emitidos 3 mil milhões em títulos de dívida; em Novembro desse ano o valor total dos empréstimos, incluindo empréstimos para liquidez, alcançava os 4 mil milhões; em Janeiro do ano seguinte a dívida chegava a cerca de 4,5 mil milhões; e, em Abril com a emissão de mais 1000 milhões de dívida, o total chegaria aos 5,5 mil milhões. Em todas estas emissões de dívida nunca foi estabelecida qualquer garantia colateral, excepto a do próprio Estado — uma garantia que já representa, por cada contribuinte, cerca de mil euros.
Entretanto, Faria de Oliveira, presidente da administração da CGD, assegurou a 20 de Janeiro de 2010, à Assembleia da República, que a Caixa não seria penalizada pelos prejuízos decorrentes desta operação e que ―O desejo da CGD ç receber [o pagamento da dívida] no momento da venda ou encontrar formas contratuais que assegurem o reembolso‖.
Mas o procedimento que estará a ser delineado para transferir a responsabilidade dos empréstimos deixa a maior dúvida, tanto acerca da protecção do interesse nacional como acerca da sua viabilidade. Uma das possibilidades que foi tornada pública seria a venda do BPN com o compromisso de liquidação posterior da dívida, de modo faseado ao longo de uma dezena de anos, na suposição duvidosa de que a sua operação geraria meios suficientes para tal pagamento. Em alternativa, a operação poderá assentar na constituição de três veículos financeiros do Estado, para comprar e depois procurar vender três tipos de activos: bens imobiliários; activos autónomos, como o Banco Efisa, o BPN Cabo Verde, as operações no Brasil e outras; e, finalmente, os activos tóxicos, que alcançarão o valor de 2,5 mil milhões. Um total de cerca de 4 mil milhões de euros seria mobilizado para comprar esses activos, mais uma vez com um empréstimo da CGD, saldando então o BPN esta sua dívida para com este credor. Deste modo ardiloso, a dívida seria simplesmente transferida para o Estado.
De toda esta operação, ou de outra semelhante com os mesmos propósitos, assegurou o Ministro das Finanças, em 2010, que não resultaria prejuízo superior a cerca de 200 milhões de euros. Mas, como é sabido, o Ministro não atendeu a solicitações que a comissão parlamentar lhe dirige desde o dia 15 de Setembro para prestar esclarecimentos sobre a evolução do dossier da privatização, sobre os seus efeitos nas contas públicas e nomeadamente sobre este cálculo de prejuízos.
Assim, podem identificar-se actualmente dois riscos sistémicos para a economia nacional. O primeiro é o risco da falta de transparência e de verificabilidade dos actos do Estado. Depois do fracasso dos reguladores do sistema financeiro, depois da acumulação dos efeitos das fraudes e abusos de confiança desenvolvidos no quadro da actuação do BPN ao longo dos anos recentes, depois de um processo de nacionalização baseado em informações erradas ou negligenciadas sobre o valor real do banco, a recusa de informar detalhadamente o país acerca da forma como o banco foi gerido, como acerca das decisões financeiras tomadas, alimenta a incerteza, e é sempre a falta de transparência que protege o privilégio de interesses particulares contra o interesse público.