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41 | II Série A - Número: 171 | 28 de Abril de 2012

que têm vindo a ser noticiados ao longo dos últimos anos. A praxe tem sido, com efeito, um lugar de exceção onde todas as violências são permitidas.
O caso de Ana Sofia Damião, que denunciou em 2003 as agressões de que tinha sido alvo durante a praxe no Instituto Piaget de Macedo de Cavaleiros, colocou o problema na agenda mediática. Contudo, o desenvolvimento deste caso, em que o inquçrito feito pelo Instituto concluiu que terá havido ―exageros‖ e que decidiu sancionar os agressores e a agredida de igual forma, acabou por revelar que há uma tendência para a proteção corporativa destes acontecimentos que legitima o abuso e inibe as denúncias. Também em março de 2003, é feita mais uma denúncia pública. Ana Santos, da Escola Superior Agrária de Santarém, fez uma queixa na polícia e escreveu uma carta ao Ministério do Ensino Superior. O então presidente do Conselho Diretivo abriu um inquçrito, mas faz saber, no momento em que o anunciou, que tambçm tinha recebido ―bosta no corpo‖ nos seus ―tempos de estudante‖ e que essa era uma tradição da escola.
Em 2007, o País foi confrontado com as consequências dramáticas de mais dois casos ocorridos numa praxe. Um estudante da Escola Superior Agrária de Coimbra, ferido a 28 de novembro, ficou paraplégico em resultado da sua participação na praxe. A escola lamentou o ocorrido, o Ministro apelou à responsabilidade das instituições mas, aparentemente, tudo ficou na mesma. Também nesse ano, um outro aluno, em Elvas, ficara paraplégico depois de um acidente no âmbito da praxe. Os organizadores das praxes negaram qualquer responsabilidade e fizeram saber que ―só participa quem quer‖.
Um ano depois, a imprensa deu a conhecer mais um caso preocupante. Diogo Macedo, da Universidade Lusíada de Famalicão, morreu no hospital depois de uma praxe, que ninguém explicou. A Universidade Lusíada terá alegadamente ameaçado de expulsão qualquer aluno que prestasse declarações à jornalista que investigava o assunto. O silêncio escondeu a história. O processo judicial, movido pela mãe, tinha já sido arquivado.
O que é preocupante é a ausência de consequências depois de conhecido cada novo caso de humilhação e violência ocorrido no âmbito da praxe. Pior. A cada caso que é denunciado, segue-se um conjunto de declarações de participantes da comunidade académica que apresentam estes acontecimentos como exceções ou exageros. Estes sucessivos casos testemunham uma cultura de violência que se foi tornando parte integrante da praxe académica, que faz da hierarquia o modo de relação entre as pessoas, e da obediência a obrigação absoluta dos mais fracos. A banalização da praxe como único meio de receção ao estudante do 1.º ano e os mecanismos que a instituem, de forma informal, como ―obrigatória‖ em muitas instituições, reforçam a violência desta prática.
Como é evidente, a maioria dos estudantes não gosta da humilhação. Em fevereiro de 2006, um estudo feito pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) aos alunos do 1º ano da licenciatura em Sociologia revelou que a esmagadora maioria dos estudantes considera que a praxe ―dura demasiado tempo, é intensa, humilhante, degradante, cansativa, geradora de problemas de saúde e prejudicial para a organização da vida pessoal e do estudo‖. Um inquçrito de que a imprensa deu notícia em maio do mesmo ano, feito por uma equipa do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, mostrou que 72% dos estudantes pensam que a praxe deve ser facultativa e que 68% considera que se deve repudiar qualquer forma de violência física ou simbólica.
No entanto, as denúncias escasseiam e as poucas que existem são, muitas das vezes, inibidas pelas instituições. Nesse contexto, todos os sinais políticos que possam ser dados no sentido do repúdio destas práticas de violência assumem-se como extremamente relevantes para desencadear um combater à vergonha e ao isolamento. Em 2009, o então Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior Mariano Gago solicitava ao Conselho de Reitores «a melhor colaboração dos responsáveis [das instituições universitárias] no sentido do combate às praxes que, embora afirmando uma intenção de integração dos novos alunos, mais não são do que práticas de humilhação e de agressão física e psicológica». O combate a esta cultura de violência e humilhação no seio das instituições de ensino superior tem que contar com as instituições e os seus participantes.
Isto mesmo é reclamado no recente abaixo-assinado que está atualmente a ser promovido por dezenas de professores da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Estes docentes dão o seu testemunho - «docentes desta faculdade observaram diversas práticas associadas á chamada ―praxe acadçmica‖ que se apresentaram como atos de humilhação, de atemorização e de atentado à dignidade dos/as estudantes.
Apesar do repúdio e do temor que alguns/as estudantes sentem em relação a estas práticas, as queixas