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3 DE NOVEMBRO DE 2012

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administração local. A sua aplicação está a criar inúmeros problemas no quotidiano dos municípios, impôs

dificuldades ao nível da gestão, tornando-a menos ágil e flexível, colocando mesmo em causa o cumprimento

das suas competências e conduzindo à sua paralisação. Em muitas autarquias há diversas equipas

paralisadas, por falta de materiais, impossibilitando a execução de funções ao nível da manutenção urbana,

dos espaços verdes, da conservação das vias rodoviárias ou da manutenção de refeições e transportes

escolares. Em suma a aplicação desta lei, traduziu-se na asfixia do funcionamento das autarquias,

condicionando negativamente a sua intervenção e a capacidade de resolução dos problemas junto das

populações. Aliás, vários municípios assumiram publicamente o incumprimento da Lei dos Compromissos e

dos Pagamentos em Atraso, para poderem dar a resposta necessária às respetivas populações. Mesmo a

publicação de um Despacho que permite aos municípios considerar os montantes a transferir pelo Ministério

da Educação ao abrigo dos programas das refeições e dos transportes escolares, não resolve o problema.

A Associação Nacional dos Municípios Portugueses (ANMP) expressou veementemente a sua oposição à

Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso ainda no processo de discussão deste diploma.

Reiterando essa posição, as conclusões do XX Congresso (Extraordinário) da ANMP realizado no passado dia

29 de setembro, defendem a revogação da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso. Entendem

que esta lei se trata de um “diploma absurdo, completamente alheio ao bom senso que deve imperar,

elaborado por quem desconhece a realidade, que paralisia a gestão municipal e que arrisca resumir a gestão

municipal à gestão de tesouraria e os eleitos adjuntos de tesoureiros”, e afirmam ainda, que caso se mantenha

a obrigatoriedade da aplicabilidade desta lei, os municípios terão de suspender “as atividades municipais em

aspetos fundamentais nos serviços que prestam às populações”.

No plano da administração local não se pode ignorar a ingerência da Lei dos Compromissos e dos

Pagamentos em Atraso na autonomia administrativa e financeira do Poder Local Democrático, consagrada na

Constituição da República Portuguesa. Acresce ainda as dúvidas de inconstitucionalidade, suscitadas pela

ANMP, no que respeita à intromissão na autonomia do Poder Local Democrático e à equiparação dos eleitos

autárquicos a dirigentes municipais. Neste sentido, a Procuradoria-Geral da República pediu a declaração de

inconstitucionalidade da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, remetendo para o Tribunal

Constitucional.

A Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso tem também criado profundas dificuldades no setor

da saúde. Os estabelecimentos de saúde integrados no Serviço Nacional de Saúde defrontam-se com

constrangimentos diários, decorrentes da aplicação desta lei, a acrescer aos sucessivos cortes orçamentais.

Por exemplo, hoje as direções hospitalares têm dois caminhos, ou são responsabilizadas pelo não

cumprimento da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso ou pelo não tratamento dos doentes.

Muitos gestores hospitalares assumiram publicamente que a aplicação da lei não é compatível com a missão

dos hospitais, referindo mesmo a impossibilidade do seu cumprimento. Nos hospitais e centros de saúde

registam-se faltas de material clínico; nos hospitais há restrições na realização de cirurgias ou na dispensa de

medicamentos aos utentes. Há relatos da ocorrência de racionamento na dispensa de medicamentos, que se

traduz na divisão de embalagens, na dispensa de medicamentos somente para 15 dias – quando

anteriormente a dispensa era por um período mais alargado –, ou mesmo dificuldades no acesso dos utentes

a determinados medicamentos.

O dia-a-dia demonstra que a aplicação da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso aos

estabelecimentos públicos de saúde gera novos obstáculos na prestação de cuidados de saúde adequados

aos utentes. Segundo uma listagem das entidades da Administração Pública que se encontram em

incumprimento da Lei dos Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, publicada pela Direção Geral do

Orçamento referente ao mês de agosto, dos 59 serviços considerados incumpridores pelo Governo, 14 são

serviços da área da saúde, nomeadamente as cinco Administrações Regionais de Saúde, Unidades

hospitalares e institutos públicos.

O próprio Governo, perante a força dos factos e as inúmeras denúncias de entidades públicas –

particularmente das autarquias, dos estabelecimentos de saúde e de instituições de ensino superior –, acabou

por ter que reconhecer, embora a contragosto, os sérios problemas verificados na aplicação da Lei dos

Compromissos e dos Pagamentos em Atraso, com a publicação do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de junho,