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10 | II Série A - Número: 092 | 3 de Abril de 2014

Esse pretexto é agora também utilizado para justificar a privatização destes serviços de transporte, ainda que seja uma argumentação falaciosa.
O grosso da dívida das empresas públicas de transportes provém de encargos financeiros. Em 2012, os juros da dívida foram responsáveis por 86.3% dos prejuízos destas empresas. Há mais de uma década que os encargos financeiros superam largamente os prejuízos operacionais, sendo que, na maior parte destas empresas, a taxa de cobertura das despesas operacionais por receitas está muito acima da média europeia e supera já os 100%.
As dívidas das empresas de transporte não têm uma origem operacional, mas sim nas décadas de subfinanciamento público crónico. É sabido que as indemnizações compensatórias, além de erráticas e atrasadas, nunca foram suficientes para cobrir as despesas operacionais e muito menos os investimentos de infraestruturação. A falta de financiamento foi sendo compensada por empréstimos bancários associados, em muitos casos, a derivados especulativos.
A privatização da gestão dos serviços de transporte não resolverá nenhum destes problemas, pelo contrário. Aprofundará as medidas de aumento de preços, de redução de trabalhadores e de corte nos serviços prestados, reduzindo a oferta, com evidentes consequências negativas para a sociedade. Existe uma clara alteração de visão sobre a função destes serviços: em vez de um serviço social que consiga garantir a todas as pessoas, independentemente do seu estrato social, a capacidade para se deslocarem de forma rápida, cómoda e barata, passa a dominar uma visão economicista do setor.
A primeira dessas consequências negativas sentir-se-á sobre a mobilidade da população, que ficará prejudicada, quer pelo aumento de preços, quer pela redução de oferta. A segunda, sobre o ambiente, criando uma pressão para o uso do automóvel individual, quando o sentido deveria ser o contrário: democratizar o acesso aos transportes públicos, em detrimento do automóvel individual. A terceira, sobre os trabalhadores destas empresas de transportes, colocados sobre uma pressão acrescida para o despedimento e redução de pessoal. A quarta, sobre a coesão territorial que deteriora, criando um país mais dividido.
No documento intitulado Modelo de Abertura à Iniciativa Privada dos Serviços Públicos de Transporte de Passageiros de Lisboa, de fevereiro de 2014, refere-se que “a gestão do serviço público de transporte de passageiros apenas será entregue a operadores privados, no todo ou em parte, caso se observe uma forte evidência de que essa entrega significará uma melhoria no cumprimento dos objetivos [»] mencionados”.
Foram definidos como objetivos: 1) promover a eficiência na prestação do serviço; 2) reduzir os encargos do Estado; 3) assegurar o cumprimento das obrigações de serviço público de acordo com elevados padrões de qualidade e segurança.
Ora, a abertura a privados da Carris e do Metropolitano não cumprirá, como se percebe, nenhum desses objetivos, porque representará o aprofundamento da política de aumento de preços e de degradação dos serviços, como já se verificou. Falha, por isso, o objetivo de garantir um serviço público com padrões de qualidade e segurança, assim como o da eficiência na prestação do serviço.
Falha também o objetivo de redução de encargos do Estado, uma vez que o Estado garantirá uma renda anual ao operador privado, considerando, para além disso, ficar com a dívida atualmente existente na Carris e no Metropolitano de Lisboa.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo rejeitar a privatização ou concessão do serviço público de transportes de passageiros da Carris e do Metropolitano de Lisboa a operadores privados.

Assembleia da República, 4 de abril de 2014.
As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Cecília Honório — Catarina Martins — Luís Fazenda — Helena Pinto — João Semedo — Mariana Aiveca.

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