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35 | II Série A - Número: 104 | 31 de Março de 2015

A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS E O ÂMBITO DO PERIGO

Quanto às situações reveladoras de perigo, previstas no artº 3º da Lei de Protecção, elas abrangem, de acordo com o seu nº 1, quer a violação de direitos fundamentais, como a integridade física ou psíquica e a dignidade da criança, quer a ausência de cuidados básicos ou mesmo situações que se traduzem em desrespeito por um conjunto de direitos, mais recentemente reconhecidos, de que é exemplo a falta de afeição, a que se refere a al. c) do nº 2 do artº 3º. Tal não se verificou, porém, de forma expressa, relativamente ao direito à continuidade das relações afectivas. A consagração legal do direito da criança à preservação das suas ligações psicológicas profundas, nomeadamente no que concerne à continuidade das relações afectivas estruturantes e de seu interesse tem sido, há mais de duas décadas, reconhecida com base na interpretação sistemática das normas vigentes (cf. Armando Leandro in "Infância e Juventude" 90/1, págs. 9-34 e número especial 91, págs. 263-284). O reconhecimento deste direito da criança resulta do aprofundamento dos conhecimentos científicos, adquiridos a partir das evidências comprovadas por especialistas da infância, designadamente nas áreas da Medicina, da Psicologia e das Ciências Sociais, os quais asseguram que o respeito por esse direito é indispensável para a saúde mental da criança e para o desenvolvimento harmonioso da sua personalidade. Na verdade, como referem Bowlby (1988) e Berger (1998), "a relação precoce afectiva entre bebé e mãe, ou outra figura de vinculação, pautada pela segurança, a protecção e regulação emocional, marca o desenvolvimento psicológico do indivíduo, os sentimentos existenciais básicos de confiança e segurança em si próprio e no outro". A criança desenvolve, assim, através das interacções com as pessoas que lhe prestam cuidados, modelos internos de vinculação, ou seja, como sublinha Soares (2001), «um conjunto de conhecimentos e expectativas sobre o modo como essas figuras respondem aos seus pedidos de ajuda e protecção [...] e sobre o self, em termos do seu valor próprio» (Soares, 1.2001). Estamos face ao embrião da personalidade de cada sujeito. Gomes-Pedro (1982) salienta que «os bebés são geneticamente propensos à interacção com outras pessoas, desde os primeiros segundos de vida. O seu equipamento sensorial é reactivo aos estímulos e muitos dos seus sistemas de comportamento são prontamente activados por tais estímulos». Mais sublinha que «o melhor ingrediente do desenvolvimento humano adequado está no afecto e nas relações securizantes que se estabeleçam». (cf. "Um Projecto de Esperança", 2005 Carneiro, R. et al.).

São as relações de afecto que garantem a segurança e os vínculos que medeiam a organização de uma arquitectura neuronal e sináptica afim daquelas relações desde os primeiros dias de vida (Gomes-Pedro, 2007).