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28 DE SETEMBRO DE 2020

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o RBI resultaria «numa maior capacitação para o exercício da liberdade»8, permitindo inclusivamente, que as

pessoas se dediquem a atividades importantes para a comunidade, como é exemplo o trabalho de voluntariado.

Mito das más escolhas pelos mais desfavorecidos e o paternalismo

Uma das teses mais difundidas ao longo dos últimos séculos prende-se com o facto de os mais

desfavorecidos se encontrarem nesta situação de pobreza devido às respetivas escolhas e que, caso estas

pessoas tivessem acesso a um rendimento de cariz incondicional, o gastaria imediatamente em adições ou

superficialidades. Esta linha de pensamento, além de ser discriminatória e paternalista, por «colar» os mais

pobres ou desfavorecidos à incapacidade de tomar boas opções, não apresenta qualquer sustentação empírica.

Ademais, é importante sublinhar as conclusões patentes no livro Just Give Money to the Poor: The

Development Revolution from the Global South9, que estabelecem o seguinte: «quatro conclusões emergem

frequentemente: estes programas são acessíveis, os destinatários usam bem o dinheiro e não o desperdiçam,

as doações em dinheiro são uma maneira eficiente de reduzir diretamente a pobreza atual e têm o potencial de

evitar a pobreza futura, facilitando o crescimento económico e promovendo o desenvolvimento humano».

Os dados conhecidos revelam que quando as pessoas mais desfavorecidas têm acesso a um rendimento

complementar, tendencialmente, optam por caminhos que melhoram a qualidade das suas vidas e comprovam

que «a ideia de que o RBI pode prejudicar os mais desfavorecidos corresponde sobretudo a um preconceito

cultural e social, e não a uma verdade empiricamente comprovada».10

Objeção da preguiça e a armadilha da pobreza

Uma das críticas elaboradas ao RBI está relacionada com a perceção de que um conjunto muito alargado de

pessoas abandonará os seus postos de trabalho para se dedicar ao pleno ócio, uma vez que tivessem à sua

disposição um rendimento básico e incondicional. Novamente entramos no campo do preconceito, uma vez que

este tipo de considerações e teses carecem de sustentação empírica.

Como é referido em Rendimento básico incondicional: uma defesa da liberdade, «(…) se há algo que as

experiências-piloto já feitas sobre o RBI demonstram (…) é que as pessoas não deixam de trabalhar por

receberem um RBI. Qualquer que seja o seu modo de cálculo, o montante do rendimento incondicional será

modesto. Assegurará apenas ao seu beneficiário a possibilidade de ter a sua subsistência garantida. Por isso,

não faz muito sentido que ele eliminasse numa grande parte das pessoas o incentivo para aumentar os

rendimentos e usufruir de um melhor nível de vida através do trabalho. Mais, as experiências já realizadas

mostram que a segurança dada por um RBI encoraja os seus beneficiários a arriscarem a criação do seu próprio

emprego, pelo que o argumento do desincentivo ao trabalho é, no mínimo contestável»11.

Além de as experiências realizadas neste âmbito até ao momento demonstrarem, de igual forma, que apenas

uma pequena percentagem da população ficaria satisfeita com um rendimento básico a título permanente,

devido ao facto explicitado acima de as pessoas almejarem sempre a melhor qualidade de vida possível.

Outro especto relacionado com a questão do desincentivo ao trabalho é a denominada «armadilha da

pobreza». Este conceito aplica-se ao facto de as prestações sociais existentes no atual sistema de apoio social,

se extinguirem aquando dos beneficiários encontrarem trabalho. Ora, o que a realidade portuguesa na prática

abarca é o seguinte: salários baixos (ainda mais baixos se estivermos a falar de pessoas sem grandes

qualificações que constituem quase na totalidade a franja da população mais desfavorecida); prestações sociais

baixas mas similares aos valores pagos pelo trabalho não qualificado; e pela conjugação destas duas premissas,

uma situação em que é melhor para os beneficiários não trabalhar ou trabalhar não declaradamente para não

se ver sem as prestações sociais de que beneficia (depois de todos os esforços para ultrapassar a burocracia

associada à atribuição destes benefícios fiscais).

Em suma, a estrutura do atual sistema de apoio social, desincentiva ao trabalho. Não o RBI. Como vimos

acima, o RBI empodera e confere liberdade e poder negocial aos trabalhadores que podem «lutar» por salários

8 Roberto Merril, Sara Bizarro, Gonçalo Marcelo e Jorge Pinto, Rendimento básico incondicional: uma defesa da liberdade, p. 39. 9Dos autores Joseph Hanlon, Armando Barrientos e David Hulme. 10Roberto Merril, Sara Bizarro, Gonçalo Marcelo e Jorge Pinto, pp. 55-56. 11Roberto Merril, Sara Bizarro, Gonçalo Marcelo e Jorge Pinto, pp. 138-139.