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16 DE DEZEMBRO DE 2020

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 804/XIV/2.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE NO ÂMBITO DAS NEGOCIAÇÕES DO TRATADO DA CARTA DE ENERGIA DEFENDA A SUA REFORMULAÇÃO PROFUNDA GARANTINDO A SALVAGUARDA DO MEIO

AMBIENTE E A PROTEÇÃO DA SAÚDE PÚBLICA

Em vigor desde dezembro de 1994, o Tratado da Carta de Energia (TCE) é um acordo de investimento que

envolve diversos países da Europa e Ásia Central e que tem como principal objetivo o incentivo aos investimentos estrangeiros diretos e o comércio global do sector energético.

Tendo em conta que o panorama mundial atual mudou consideravelmente desde meados da década de 90 do século passado e que foi declarada a incompatibilidade do mecanismo de arbitragem estado-investidor (ISDS) pelo Tribunal de Justiça da União Europeia – «o caso Achmea» –, a Comissão Europeia apresentou, em maio deste ano, uma proposta de reformulação, ou modernização, do tratado1.

Contudo, na grande maioria dos casos, as negociações para este acordo decorreram longe do conhecimento e do escrutínio das populações que, em última análise, são quem mais sofre as consequências gravosas do TCE no seu estado atual.

Para além disso, está iminente a quarta ronda de negociações do acordo2, pelo que é premente uma avaliação séria e profunda dos benefícios e prejuízos resultantes do TCE, nos moldes atuais, para o nosso País e para a Europa, sobretudo quando a União Europeia pretende tornar-se a primeira região mundial na corrida da neutralidade climática, através de mecanismos como o Pacto Ecológico Europeu e a proposta relativa à Lei Europeia do Clima3. De facto, nenhum tratado internacional parece ser tão contrário aos pilares defendidos no Acordo de Paris. Na sua redação atual, o TCE protege as indústrias de combustíveis fósseis como nenhum outro, além de ameaçar a sustentabilidade ambiental e as finanças públicas dos Estados signatários4. No pressuposto que as ações e decisões dos Estados signatários façam prevalecer o bem estar das populações e do clima – regulando o combate às alterações climáticas, tornando a energia acessível ou protegendo outros interesses públicos –, em detrimento dos lucros (obtidos e esperados) destes investidores, podem eles processar esse Estado, através do mecanismo ISDS, uma arbitragem entre investidores e Estados pouco transparente, levada a cabo por uma Justiça paralela e em desacordo com o Estado de direito5.

Importa recordar que o TCE é responsável pela maior parte dos processos ISDS, sendo o seu crescimento na ordem dos 437%, entre 1998 e 20196. A título de exemplo de como este tratado beneficia os investidores privados em detrimento das populações, até ao final de 2019 foram cobrados a vários governos, ou estes concordaram em pagar, mais de 52 mil milhões de dólares norte-americanos por danos, sendo estes valores inteiramente oriundos do erário público. Curiosamente, este mesmo valor é o «investimento anual necessário, globalmente, para fornecer energia a todas as pessoas que não (lhe) têm acesso»7. Mais, o valor combinado dos casos ISDS pendentes, ao abrigo do TCE no final de 2019, ascendia aos 32 mil milhões de dólares norte-americanos. Curiosamente, estima-se que «bastam» 25 mil milhões para que África se adapte às mudanças climáticas8. E neste mesmo sentido, é ainda relevante considerar que 97% dos investidores que processaram Estados ao abrigo do TCE, até final de 2012, eram empresas de combustíveis fósseis ou envolvidas em projectos de energia poluentes9.

Em relação ao clima, de forma mais específica, não há como ignorar o alerta da Dr.ª Yamina Saheb, perita na área energética e principal autora dos relatórios do IPCC – The Intergovernmental Panel on Climate Change – e que trabalhou no secretariado do TCE. Segundo um recente relatório da sua autoria10, a estimativa do volume

1 Beyond Control, Beyond Reform – The EU's Energy Charter Treaty Dilemma.pdf; https://www.plataforma-troca.org/a-uniao-europeia-e-o-tratado-para-aquecer-o-planeta/ 2 https://www.plataforma-troca.org/o-tratado-carta-da-energia-em-15-minutos/. 3 https://www.annacavazzini.eu/statement-on-the-modernisation-of-the-energy-charter-treaty/. 4 Cfr. https://www.plataforma-troca.org/a-uniao-europeia-e-o-tratado-para-aquecer-o-planeta/. 5 Cfr. https://energy-charter-dirty-secrets.org/pt/#section6. 6 https://www.plataforma-troca.org/o-tratado-carta-da-energia-em-15-minutos/. 7 https://energy-charter-dirty-secrets.org/pt/#section1. 8 https://energy-charter-dirty-secrets.org/pt/#section1. 9 https://www.plataforma-troca.org/o-tratado-carta-da-energia-em-15-minutos/. 10 https://www.openexp.eu/sites/default/files/publication/files/ect_rapport-numerique.pdf.