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II SÉRIE-A — NÚMERO 43

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justa do ponto de vista da distribuição do emprego existente. É, também, uma ferramenta para melhorar as

condições de trabalho, para permitir uma melhor conciliação entre as várias esferas da vida (libertando tempo

para atividades pessoais, familiares e associativas) e, se bem conduzida, para promover uma distribuição mais

igualitária do trabalho reprodutivo e doméstico, combatendo a desigualdade de género na distribuição do

trabalho na esfera privada.

Em Portugal, trabalham-se horas a mais. De acordo com o Eurostat, os portugueses trabalham 41,3 horas

semanais (média de trabalho prestado a tempo inteiro), enquanto a média da União Europeia é de 40,4 horas.

Os portugueses trabalham mais uma hora por semana (54 minutos) do que a média dos parceiros da União

Europeia. Os países onde o horário de trabalho é mais curto são a Suécia (39,9 horas), França (39,4 horas),

Holanda (39 horas) e Itália (38,7 horas). Mas se isto é assim relativamente ao horário legal de trabalho, o número

real de horas semanais dedicadas ao trabalho é bem superior, tendo em conta todo o trabalho suplementar e

as horas extraordinárias não remuneradas, as várias formas de flexibilidade da organização do tempo de

trabalho, os períodos de deslocação entre a casa e o trabalho – alongados pela periferização geográfica dos

trabalhadores com salários mais baixos –, ou a invasão do tempo de descanso dos trabalhadores através de

dispositivos móveis e da exigência (ilegal) de uma conectividade permanente.

No período da troika, a orientação que predominou foi a de cortar rendimento e, simultaneamente, aumentar

o tempo de trabalho, particularmente o tempo de trabalho não pago. Isso aconteceu aumentando o horário de

trabalho na Administração Pública (um aumento entretanto revertido na anterior Legislatura), estimulando pela

lei o trabalho suplementar através do seu embaratecimento (que permanece na lei), da eliminação de 3 dias de

férias no setor privado (corte que continua também a constar do Código de Trabalho) e do aumento anual da

idade de reforma, que prolonga o tempo de vida dedicado ao trabalho.

Como se sabe, e ficou comprovado no período austeritário, o alongamento de horários não se traduz em

acréscimos de produtividade. Pelo contrário, como vêm afirmando vários estudos, designadamente da OIT,

«horários de trabalho longos reduzem potencialmente a produtividade e a performance das empresas (…). Por

outras palavras, horas adicionais tendem a produzir efeitos decrescentes em termos de produtividade» (World

of Work 2014: Developing With Jobs, da responsabilidade da Organização Internacional do Trabalho),

No ciclo da chamada «geringonça» (2015-2019) foi possível, entre outras medidas, reverter cortes salariais,

aumentar o salário mínimo e repor as 35 horas na Administração Pública. Não se justifica, pois, que se continue

a adiar a redução do horário de trabalho para o conjunto dos trabalhadores. A situação torna-se mais

incompreensível quando o Governo do PS, ao mesmo tempo que anuncia um debate nacional sobre a semana

dos 4 dias de trabalho, mantém na «Agenda do Trabalho Digno» não apenas esta desigualdade (um período

normal de trabalho de 40h para o privado, mais longo que no setor público) mas ainda as medidas de

prolongamento do horário de trabalho que vêm da troika (com o corte nos dias de férias e o estímulo ao trabalho

suplementar por via do seu embaratecimento).

A experiência portuguesa e internacional de outros processos de redução do horário de trabalho faculta-nos

o conhecimento suficiente para perceber como é que um processo deste tipo pode ser conduzido. Em Portugal,

a redução para as 40 horas, em 1996, permitiu a criação de 5% de emprego líquido no primeiro ano e 3% no

segundo. Em França, a aplicação das Leis Aubry (a primeira de 1998 e a segunda de 2000) que reduziram o

horário de trabalho paras as 35 horas, foi objeto, em 2014, de uma «Comissão de Inquérito sobre o impacto

societal, social, económico e financeiro da redução progressiva do tempo de trabalho», aprovada por

unanimidade e presidida por Thierry Benoit, Deputado UDI (partido de centro-direita). Desse relatório, constam

várias conclusões:

• «A redução do tempo de trabalho decidida pela lei de 1998 contribui para que a economia francesa criasse

mais empregos do que teria criado sem esta lei. O número de 350 mil é o mais comummente admitido», do total

de 2 milhões de empregos criados entre 1997 e 2001;

• «Esta redução não coincidiu com uma degradação da competitividade do nosso país – nomeadamente

porque ela foi acompanhada de uma aceleração dos ganhos de produtividade. A França permanece assim

atrativa e localiza-se regularmente no trio dos países com mais investimento direto estrangeiro»;

• «A redução do tempo de trabalho, comparada com outras políticas públicas desenvolvidas para estimular

o emprego, nomeadamente aquelas que assentam na redução das quotizações sociais sem condições, aparece

como menos dispendiosa para as finanças públicas, tendo em conta o número de empregos que permitiu criar»;

• A redução para as 35 horas «permitiu o relançamento e o dinamismo do diálogo social»;