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II SÉRIE-A — NÚMERO 174

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Não fosse já o declínio acima mencionado suficientemente preocupante, a ele acrescem fenómenos

crescentes, que podendo ser confirmados um pouco por todos os meios de comunicação social nacionais, dão

conta de episódios frequentes de inoperatividade e mesmo negligência no recurso ao direito à saúde, como de

resto comprovam os episódios vividos de grávidas que, sem serviços na sua área de residência, têm de fazer

centenas de quilómetros para ter os seus filhos, ou as intermináveis listas de espera para consultas e cirurgias.

À imagem da realidade acima apresentada, também as urgências continuam sendo palco de um caos

completo, sejam elas gerais ou de especialidade, sendo já apenas sofrível verificar que perante tantos alertas

médicos e sociais quanto à gravidade que tal encerra, se mantém inalteradas as carências em ginecologia ou

obstetrícia, onde se acentua uma vez mais a falta de profissionais, a falta de motivação dos existentes pelas

más condições de trabalho que lhes são dadas, circunstância aliás mensurável pelo aumento de pedidos de

escusa de responsabilidade hospitalar dos mesmos.

No que respeita aos médicos de família, em 2016, o Primeiro-Ministro anunciou que tudo seria feito de modo

a garantir que em 2017 todos os portugueses tivessem acesso a um profissional desta especialidade. Estamos

em 2023 e tudo se mantém igual, com o Primeiro-Ministro a ser o mesmo e a haver 1,3 milhões de portugueses

sem este acompanhamento.

Neste âmbito, o Relatório de Primavera, de 2022, realizado pelo Observatório Português dos Sistemas de

Saúde (OPSS) voltou novamente a considerar que falta definir uma estratégia para fixar profissionais no SNS e

proporcionar-lhes carreiras profissionais condignas e motivadoras, bem como que «é preciso melhorar as

condições de trabalho, flexibilizar contratos, fomentar a investigação e possibilitar a progressão na carreira.»

É um verdadeiro sufoco diário, aquele em que o sistema nacional de saúde vive e que, pese embora a excelsa

dedicação e empenho de todos quantos compõem as suas fileiras, dando tudo quanto da sua vida têm,

sacrificando-a em prol da vida dos seus concidadãos, não consegue já respeitar a dignidade humana e social

dos que nele trabalham e que dele precisam.

O regime de dedicação exclusiva, que em 2009 garantia a um profissional que laborasse sob os seus

desígnios, auferir mais 45 % de remuneração base, é apenas uma recordação de um passado ainda não muito

distante, tendo sido extinto por mero capricho ideológico, assente em dogmas difíceis de entender em pleno

século XXI, a seu tempo assentes no entendimento de que não acrescentava valor ou melhorava a produção

no sistema mas que o tempo de hoje, como é visível, demonstra ser uma visão no mínimo disparatada.

Com esta opção, em 2009, pareceu identificar-se que o problema do SNS não era resolúvel com a dedicação

exclusiva; até poderia ser discutível, caso essa visão fosse garantística quanto à contratação dos recursos

humanos então já em falta.

Acontece que em 2023, uma vez mais, a falta de contratualização não só se manteve como continua a

acentuar-se, numa rampa deslizante também ela incapaz de garantir o acesso à saúde na dimensão que

humanamente se deseja e constitucionalmente se consagrou. No entanto, é claro que incentivos com

remunerações mais dignas poderiam levar muitos a optar pela dedicação exclusiva e, consequentemente, pelo

SNS.

Os médicos tarefeiros custam ao sistema nacional de saúde cerca de 142 milhões de euros, valor este que

se contabiliza como o mais elevado de que há registo, indexando-se a subida de despesa do Estado com esta

opção num montante de 50 milhões de euros em seis anos. Exponenciação esta que permite com clareza

compreender que hoje não há organização e que a estratégia para uma gestão eficiente e eficaz do SNS não é

mais que uma utopia, pela presença de gastos excessivos em «pensos rápidos» e não numa «profilaxia» a

curto, médio e longo prazo.

O novo Estatuto do SNS — Decreto-Lei n.º 52/2022, de 4 de agosto —, que, face ao qual, diga-se para

sinalizar, o Chega já apresentou uma proposta de alteração, que foi chumbada, continua a obrigar os clínicos

que se encontrem em cargos de direção a fazerem-no em dedicação exclusiva.

Contudo, uma vez mais, não se conseguindo garantir a valorização do que representam os domínios da

responsabilidade médica, sobretudo, aquela exercida em cargos de gestão, encontram-se reunidos os preceitos

ideais para que se continue a assistir à fuga destas valências dos profissionais hipoteticamente mais preparados

para as exercerem.

Ainda neste âmbito, também juridicamente ressalvam as mais fundadas dúvidas, nomeadamente, pela

possível violação da alínea b) do n.º 2 do artigo 58.º da Constituição da República Portuguesa, pela aparente

colisão com a previsão de que a qualquer trabalhador e consequente direito ao trabalho deve estar assegurada

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