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Quinta-feira, 13 de Dezembro de 1990
II Série-C — Número 9
DIÁRIO
da Assembleia da República
V LEGISLATURA
4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1990-1991)
4.° SUPLEMENTO
SUMÁRIO
COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO
Acta da reunião de 30 de Novembro de 1990
Prosseguiu o debate, na especialidade, na Comissão de Economia, Finanças e Piano, das propostas de lei n.™ 163/V — Orçamento do Estado para 1991 e 164/V — Grandes Opções do Plano para 1991.
Sobre o orçamento do Ministério da Justiça intervieram, além do Sr. Ministro da Justiça (Laborinho Lúcio) e da Sr." Secretária de Estado do Orçamento (Manuela Leite), os Srs. Deputados Octávio Teixeira (PCP), Luís Filipe Madeira (PS), José Magalhães (Indep.) e Guilherme Silva (PSD).
Sobre o orçamento do Ministério do Planeamento c da Administração do Território intervieram, além do Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território (Valente de Oliveira) e dos Srs. Secretários de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território (Nunes Liberato), do Planeamento e do Desenvolvimento Regional (Isabel Mota) e do Orçamento (Manuela Leite), os Srs. Deputados lida Figueiredo e Vítor Costa (PCP), Mendes Costa (PSD), Gameiro dos Santos (PS), Antunes da Silva (PSD), Carlos Luís e Júlio Henriques (PS), Casimiro Pereira (PSD) e Feiro Rodrigues (PS).
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0 Sr. Presidente (Alberto Araújo): — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, está aberta a reuniáo.
Eram 10 horas e 45 minutos.
Srs. Deputados, continuando a apreciação, na especialidade, das propostas dc lei n.°* 163/V —Orçamento do Estado para 1991 c 164/V— Grandes Opções do Plano para 1991, vamos debater as questões relativas ao Minstério da Justiça.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Ministro da Justiça (Laborinho Lúcio): — Srs. Deputados, farei uma intervenção rápida, à semelhança do que aconteceu já quando da primeira discussão no seio da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, para relevar no orçamento do Ministério da Justiça dois aspectos fundamentais: um, a que atribuiria uma visão global positiva, e, outro, onde referiria o aspecto menos positivo da proposta de lei do orçamento relativamente ao Ministério da Justiça.
No que se refere à visão global positiva, gostava de sublinhar que há, de facto, um reforço de verbas atribuídas ao Ministério da Justiça que podem ser analisadas, de uma forma sintética, num aumento do domínio do funcionamento cm 1,4 % do orçamento do Gabinete de Gestão Financeira, e, de uma forma que mc parece notável, tendo em conta o passado e nomeadamente algum passado recente, num aumento de 35,7 % no Orçamento do Estado. Relativamente ao PIDDAC, verifica-se um aumento de 8,7 % no Gabinete dc Gestão Financeira e dc 32,6 % no Orçamento do Estado.
Significa isto que existem alguns aspectos significativos da política do Ministério da Justiça e da passagem de uma política dc concepção e de programa para a sua realização concreta que permitem, durante o ano de 1991, avançar, claramente, cm aspectos que ao longo dos anos foram considerados essenciais e que agora, feliz e finalmente, podem vir a conhecer concretização.
Referiria apenas alguns deles — certamente que depois, durante o debate, terei a ocasião de fazer referencia a outros— que me parecem particularmente importantes.
Por um lado, no que se refere ao acesso ao direito, que, como sabem, é um lema que ao longo do tempo tem constituído preocupação dc todos nós, vai ser possível, a partir de uma previsão de despesa realizável, a passagem dc 25 000 contos previstos em 1990 para 85 000 contos, previstos cm 1991. Isio que, aparentemente, tem uma linguagem estritamente numérica, vai concretizar-se cm acções que vão permitir a instalação de gabinetes dc consulta jurídica, durante o ano dc 1991, cm todos os círculos judiciais que tenham já os respectivos uibunais de círculo instalados. Evidentemente que a sua concretização depende também da abertura, que tem sido notável, até aqui, da Ordem dos Advogados, mas, verificada ela, é possível que, no prazo de um ano, passemos dc dois gabinetes dc consulta jurídica, que existem actualmente em Lisboa c no Porto, para 18 gabinetes de consulta jurídica em todo b País, o que permite, portanto, com legitimidade moral e política, garantir que no ano seguinte todo o país estará coberto com gabinetes de consulta jurídica.
Por outro lado, no domínio das instalações dos tribunais e na recuperação das suas instalações degradadas, contaremos, em 1991, com um total de 3,464 milhões de contos, ao mesmo tempo que, no domínio do equipamento dos
uibunais e, sobretudo, na modernização desse equipamento, verificamos uma passagem de 246 000 contos para 680 000 contos, o que significa um aumento de 183 %. Isto, por outro lado, legitima também, de novo, moral c politicamente, a garantia de que, até final de 1994 — tendo em conta, evidentemente, os programas plurianuais —, todo o parque judiciário português estará definitivamente recuperado.
Trata-se, portanto, de uma acção que, sendo concreta no presente c não sc constituindo apenas em projecto de intenção, se legitima como programa realizável a um prazo, nesta altura, já à vista e curto.
Ao mesmo tempo, também no desenvolvimento do equipamento informático e, sobretudo, no arranque definitivo, na prática, da instalação do sistema de informatização dos uibunais, dispomos, para o ano de 1991, dc uma verba significativa de 658 000 contos.
No domínio dos registos e do notariado, além de um ouuo tipo dc acções não analisáveis do ponto de vista orçamental, verifica-se, no domínio das despesas de funcionamento, um aumento de 26 % e no PIDDAC um aumento de 150%. Isso significa que, nas instalações, podemos ter uma passagem de previsão de 183 000 contos em 1990 para 345 000 contos cm 1991, sendo certo que no domínio da informatização do sistema dc registo e notariado o aumento é de 342 %, visto que passamos de 159 000 contos cm 1990 para 261 500 contos cm 1991. Isto vem permitir lodo um tipo de consequências práticas, que serão consideráveis quer na qualidade, quer na celeridade dc resposta desta área dc serviços de justiça, que, evidentemente, nos tem preocupado a todos.
No domínio dos serviços prisionais, além daquilo que suponho ser já do conhecimento dos Srs. Deputados e que sc analisa na nova filosofia do sistema prisional que o Ministério da Justiça vem implementando e que foi recentemente anunciada, em termos estritamente orçamentais, tenho o gosto dc referir que, finalmente, sc resolveu o problema da alimentação dos reclusos, passando a verba prevista, diária e pessoal, de 300$ para 500$, o que significa um esforço dc 750 000 contos para o ano de 1991, mas que vai permitir que, dc uma vez por todas, se atinja o nível elevado na qualidade da alimentação das pessoas que sc enconuam em reclusão.
Por sua vez, no PIDDAC para os serviços prisionais, que era já um dos PIDDAC mais elevados do Ministério da Justiça, há um aumento dc 12 %, o que significa a disponibilidade de 2,3 milhões de contos para o ano de 1991.
No domínio do Instituto dc Reinserção Social está a complciar-sc, finalmente, a sua lotai implaniação cm iodo o país —portanto, em todos os círculos judiciais c com capacidade dc resposta a todas as comarcas do País—, tendo sido aí previsto, cm matéria dc despesas de funcionamento, um aumento, também significativo, de 31,5%.
No domínio da Polícia Judiciária, a implementação da nova lei orgânica, recentemente aprovada c enuada cm vigor, determina que se lenha previsto, como despesas de funcionamento, um aumento de 125,6 % e que o PIDDAC, que lambem era já elevado, conheça ainda um aumento dc 5,1 % para 1991.
No âmbito da Direcçâo-Gcral dos Serviços de Informática, importa salientar, por um lado, o aumento dc 29 % nas despesas de funcionamento e no PIDDAC a verba de 658 000 contos, incluída justamente para garantir o suporte prático de enuada em funcionamenio do novo sistema informático.
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Poderia dizer-vos ainda aqui que, no conjunto das verbas que se prendem com a problemática da modernização do funcionamento do sistema judiciário, sc inscreve a previsão, para 1991, a concretizar a curto prazo, da instalação dc sistema de fax em todos os tribunais do País e a sua ligação em rede, com os efeitos benéficos de celeridade de resposta que, obviamente, daí resultam e que não valerá a pena estar a explicitar em concreto.
Prcvê-sc a instalação no prazo, agora, de quatro a cinco meses, mas obviamente durante o primeiro semestre dc 1991, do sistema de gravação áudio em todos os tribunais, o que vai permitir, por um lado, uma maior fidedignidade no registo da prova e, por outro lado, uma clara aceleração na realização dos julgamentos em relação aos quais seja necessário requisitar a documentação respectiva. E, ao mesmo temo, durante o ano de 1991 proceder-se-á à instalação da primeira tranche de 1200 microcomputadores cm todos os tribunais, o que significa, portanto, o primeiro passo concreto dc implantação do sistema de informatização dos tribunais.
Ainda nesse domínio, evidentemente que se prosseguirá o conjunto das migrações do sistema já implantado. Posso dar-vos como exemplo o facto dc, durante 1991, transitar para o Tribunal de Polícia do Porto o sistema de informatização já em funcionamento no Tribunal de Polícia dc Lisboa e que já permitiu um ganho de produtividade na ordem dos 30 %. Do mesmo modo, a própria informatização da gestão dos tribunais e a informatização processual prosseguirá em termos de estudo, sendo aí, evidentemente, difícil de prever, nesta altura, que o ano de 1991 conheça já uma avanço no terreno significativamente importante.
Dc todo o modo, lembro que, por exemplo, os Alemães demoraram, pelo menos, 10 anos a estudar o seu sistema informático. Nós ainda temos alguns anos a haver para concorrermos com o sistema informático judiciário alemão ...
Gostaria que não tomassem esta indicação de alguns aspectos importantes como a lista esgotada de acções do Ministério da Justiça; felizmente que cia é muito maior, porventura nüo caberia especificamente na razão dc ser desta reunião. Por isso dispenso-me, nesta primeira intervenção, dc referir várias outras soluções que têm, evidentemente, dependência daquilo que são as previsões orçamentais, mas que não seriam muito justificadas, porventura, nesta intervenção inicial. De qualquer modo, certamente que terei o gosto de o fazer quando tiver o prazer de responder às questões que mc sejam colocadas pelos Srs. Deputados.
Referi-vos também no início desta breve exposição que além deste aspecto global positivo, que era importante referir aqui, há uma aspecto que consideramos menos positivo — e suponho que aí colhemos facilmente o acordo de todos vós. Rcfiro-mc ao facto dc não ser ainda desta feita que, no orçamento, se mostra definitivamente resolvido o problema da definição do regime jurídico do sistema dc gestão financeira do Ministério da Justiça.
Tem havido, evidentemente, uma situação de arrastamento ao longo do tempo. Gostaria, todavia, que me permitissem —justamente com a mesma fundamentação moral com que sou o primeiro a reconhecê-lo, o que também não seria difícil, visto que isso é objectivo c patente—, dizer que a situação não está ainda definitivamente resolvida, mas que tem havido passos decisivos no sentido dc encontrar a melhor solução e, ao mesmo icmpo, enquanto ela não for encontrada, ir atenuando os efeitos negativos da sua ainda não previsão legislativa.
Como tiveram a ocasião de verificar, no artigo 16.°, n.° 2, da proposta dc lei do Orçamento diz-se que até 31 de Março a situação jurídica estará definitivamente resolvida. É esse o propósito do Govemo, concretamente do Ministério da Justiça, mas gostaria de vos deixar o ponto da situação.
Não se trata de arrastar o problema de orçamento em orçamento, mas de vos dar, claramente, o conjunto de regras que estão neste momento a ser implementadas e, por outro lado, o conjunto de razões que determinam que ainda não tivesse sido desta vez que o problema seja apresentado como resolvido definitivamente.
As dificuldades que se suscitam são de duas ordens fundamentais, a primeira das quais resultando do facto de haver a afirmação, partilhada por todos, que o Gabinete de Gestão Financeira cobre a globalidade da receita. Simplesmente, é essencial que, dc uma maneira clara, fique definido o que constitui a globalidade da receita para efeitos dc filosofia orçamental e o que deve ficar excluído dessa globalidade de receita. Levanta-se a questão de saber se deve entrar ou não no conceito dc globalidade de receita as receitas próprias do advogado, nomeadamente as custas de parte — parece que não. Por outro lado, c fundamental definir de uma maneira rigorosa o estatuto jurídico próprio do serviço social do Ministério da Justiça, isto é, qual a sua natureza e qual o seu enquadramento orçamental.
Ora, está neste momento em fase terminal um novo diploma que vem redefinir juridicamente o serviço social do Ministério da Justiça. Não fazia sentido que caminhássemos, por um lado, quanto à definição rigorosa do regime financeiro do Ministério da Justiça deixando de lado a dúvida quanto à definição do próprio regime do seu serviço social.
Por outro lado, importa também, nesta passagem para o Orçamento do Estado de uma parte e na retenção do Gabinete dc Gestão Financeira dc outra parle, definir os limites que, de uma maneira clara, nos digam o que pertence a um nos elementos e o que deve integrar o outro.
Neste momento, é óbvio para nós que pertencerá ao Gabinete dc Gestão Financeira toda a área dos registos c do notariado e a área que se prende com aquilo que pode impropriamente designar-sc de serviços dc natureza judiciária. Digo assim para não se confundir com os serviços judiciários estritamente considerados. E quanto à definição dos serviços dc natureza judiciária, evidentemente que, neste momento, existem aspectos importantes a ter cm conta. Trata-se dc saber se, no fundo, esta noção de serviço dc natureza judiciária deve dirigir-se exclusivamente àquilo que se prende directamente com os tribunais ou se, pelo contrário, dentro da filosofia que neste momento está a ser imprimida à política de justiça, o serviço judiciário deve ser mais reconduzívcl àquilo que consideramos ser o sistema de intervenção judiciária e que pode, portanto, iniciar-se, por exemplo, na própria Polícia Judiciária e terminar na intervenção dos serviços prisionais.
Portanto, isto vem dar alguma razão de ser àquilo que pode considerar-se ter sido o atraso na definição rigorosa do regime financeiro do Ministério da Justiça. E porquê? Porque existe uma realidade, que é conhecida de lodos, que, evidentemente, não tem nem deve ser lida numa perspectiva negativa, mas que ocorreu, como sabem, na última remodelação governamental, cm que foi substituída toda a equipa do Ministério das Finanças e foi alterada a equipa do Ministério da Justiça.
Isto determinou que, nomeadamente nesta área que vos referi anteriormente, da redefinição do sistema judiciário
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se introduzisse, porque havia condições políticas para o poder fazer agora, uma nova filosofia. Dessa filosofia depende, evidentemente, a soluçüo que vier a ser encontrada para este problema e entendemos — e supomos que o entendemos legitimamente — que não deveríamos pôr cm causa uma filosofia de fundo, da qual vai resultar
benefício claro para a administração da justiça, em nome de uma resposta de natureza apesar de tudo mais formal, que seria a da regulamentação definitiva do regime financeiro do Ministério da Justiça.
Perguntaram-me quais são, neste momento, os prazos previsíveis. Aquilo que gostaria de vos deixar como compromisso assumido pelo Governo é que a construção e a publicação do sistema estarão concluídas até final de Março de 1991 e será implementado imediatamente parte do sistema; todavia, para a implementação da totalidade do sistema, caminhando então definitivamente para a unidade e universalidade do orçamento, leremos de introduzir algumas alterações importantes, que suponho também serem conhecidas c compreendidas por todos.
Temos, por exemplo, cerca de 1000 serviços dc registo e do notariado espalhados por todo o país; temos mais dc 2000 serviços periféricos em todo o país e, portanto, há necessidade de introduzir acções complexas dc formação para podermos garantir a possibilidade de elaboração c execução orçamental, ao nível de cada uma dessas unidades, garantindo, por essa via, a resposta aos princípios e às regras da unidade e da universalidade do orçamento.
Todavia, o primeiro limite fixado, até final dc Março — e isso constitui também novidade —, vem demonstrar claramente a intenção do Governo de que, no próximo Orçamento, haja já a possibilidade (porque o tempo que decorre é entre Março e a elaboração do próximo Orçamento) de, de uma vez por todas, ler definidas as regras que agora constituem ainda o tal aspecto menos positivo do Orçamento para o Ministério da Justiça.
Em todo o caso, gostaria de referir que este tipo dc razões que invoquei não vieram pôr cm causa algumas ideias c dos objectivos fundamentais nessa regulamentação do regime financeiro do Ministério da Justiça. A transparência eslá hoje garantida quer no orçamento propriamente dito, quer na documentação que foi distribuída (c suponho que, csic ano, há uma profusão dc documentação distribuída atempadamente aos Srs. Deputados), o que permite que, por um lado, por essa via da informação complementar, venham a ter exactamente a mesma informação que teriam por via orçamental, se o regime financeiro estivesse já todo ele definido nos termos que acabei dc referir, c, por outro lado, ao longo do ano, através dos extractos enviados trimestralmente à Assembleia da República, permitindo, portanto, o controlo da gestão financeira do Ministério da Justiça.
Diria, por isso, a concluir esta minha primeira intervenção, que, a despeito desta deficiência formal, estamos perante um orçamento que permite uma expansão; há óbvia coerência entre os programas do Ministério da Justiça c os respectivos financiamentos e faz, por isso, sentido claro, agora com uma visão concretizada no próprio orçamento, aquilo que, ao longo do tempo, vem sendo dito, no âmbito do Governo, relativamente ao Ministério da Justiça.
Há hoje a possibilidade, finalmente, dc definir e traçar uma verdadeira política, dç justiça para Portugal. Uma política dc justiça só faz sentido se tiver programas que sejam partilhados e conhecidos de todos, numa dimensão de Estado que desde sempre tenho atribuído à intervenção na área da justiça; essa política e esses programas existem
e são conhecidos mas, para terem credibilidade, precisam dc ter o suporte financeiro que os garantam, e ele está garantido no actual Orçamento do Estado para 1991.
Resta-me [içar à disposição âos Srs. Deputados para conversarmos sobre todo o tipo de questões que queiram colocar.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, gostaria de começar por referir que, na minha perspectiva c na do meu grupo parlamentar, o orçamento do Ministério da Justiça para 1991 é uma desilusão. E vou explicar-lhe porquê.
Depois da entrada do Sr. Ministro para o Ministério, tivemos a sensação de que o Governo iria atender, com maior presteza e, em lermos orçamentais, com maiores dotações, para acelerar a modernização de lodos os serviços que dependem do Ministério da Justiça. Aliás, o Sr. Ministro referiu há pouco que, em lermos do Orçamento do Estado, há um crescimento assinalável nas dotações para o Ministério da Justiça. Esta é uma questão que se pode relacionar, depois, com o problema do regime jurídico dos fundos financeiros do Ministério da Justiça, que referirei dc seguida.
Sc nos fôssemos ater apenas àquilo que vem na proposta dc lei do orçamento, ficaria a sensação de que teria sido dado um grande passo, em lermos de recursos financeiros, para que o Ministério da Justiça pudesse avançar com várias acções que há muito se fazem sentir. Porém, analisando o orçamento, na sua globalidade, a situação muda completamente dc figura c, daí, a nossa desilusão.
De facto, em termos do orçamento stricto sensu, aparece-nos um aumento da ordem dos 42 % nas dotações orçamentais, o que seria óptimo. Simplesmente, em termos do orçamento global do Ministério, esse aumento de dotação orçamental fica-se pelos 12,3 %, o que — e não vamos discutir agora a questão da taxa de inflação —, em números redondos, é uma manutenção do nível que existia em 1990. Na prática, não há evolução positiva, cm termos de recursos financeiros, para que sejam dados os avanços necessários em todas as áreas ou pelo menos na maioria das áreas de actuação do Ministério da Justiça.
Aliás, relativamente ao orçamento de funcionamento — o Sr. Ministro há pouco referiu-o e logicamente que, analisando o orçamento, há —, admito que haja áreas em que se verifica um grande aumento, mas, cm termos médios, o orçamento de funcionamento cresce apenas 11,5 %, o que traduz uma estagnação total e compfeta.
Como referi há pouco, esta quesião relaciona-se com um problema que não é menor — c ao qual o Sr. Ministro teve agora oportunidade de sc referir—, que é o dc dois terços do orçamento do Ministério da Jusliça fugirem ao controlo da Assembleia da República: uma questão 6 a da informação que foi prestada pelo Ministério da Justiça à Assembleia da República e aquela que pode ser prestada trimestralmente sobre a execução e outra, completamente diferente, é a da possibilidade dc controlo pela Assembleia da República, desde logo, a partida, cm sede dc discussão do orçamento, a possibilidade dc alteração do orçamemo. Ora, dois terços desse orçamento não são passíveis de alteração por parte da Assembleia — a Assembleia não pode fazer alterações nesses dois terços do orçamento do Ministério da Justiça, que são os dois terços que resultam dos cofres e dos serviços sociais.
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Esia seria uma apreciação geral, ainda que muito breve, sobre a problemática orçamental do Ministério da Justiça.
Um segundo tipo de questões, relacionado com este primeiro, é o seguinte: sendo reconhecido unanimemente que há muito ainda onde investir no Ministério da Justiça (e é necessário fazê-lo, como o Sr. Ministro ainda há pouco o referiu), a existência dessas necessidades e o discurso generalizado de que é necessário acelerar o processo de investimento em várias áreas do Ministério não me parecem compatíveis nem coerentes com o facto de os saldos de gerência dos cofres virem a aumentar de ano para ano.
Julgo que, nesta óptica, o Ministério da Justiça está a privilegiar a rentabilidade financeira dos saldos cm detrimento da sua aplicação em investimento necessário. O facto de, cm Agosto de 1990, de acordo com os elementos que foram distribuídos pelo Ministério à Assembleia, os saldos estarem já em 16 milhões de contos, julgo que é significativo, designadamente se compararmos esse saldo de 16 milhões de contos com o total previsto para investimentos no âmbito do PIDDAC. Isto é, o saldo de gerência significa 150 % daquilo que se prevê investir em 1991 no âmbito do Ministério da Justiça.
Um terceiro tipo de questões relaciona-se com o próprio PIDDAC. Digo-lhe sinceramente, Sr. Ministro, que existem dotações no PIDDAC do Ministério da Justiça que, para mim, são completamente incompreensíveis. Não vou ser exausüvo em acentuar todos os casos que aqui tenho à minha frente, mas daria dois ou três exemplos.
Em primeiro lugar, a questão da informatização do registo civil. Julgo que qualquer cidadão deste país tem consciência da necessidade dessa informatização — basta ter de recorrer amiudadamcnic aos registos civis para se saber dos problemas que existem e dos que podiam deixar dc existir com a informatização. Ora, o que sucede é que, no âmbito da informatização do registo civil, julgo que nem se pode dizer que se anda «a passo dc caracol», porque, de facto, nem se têm dado passos, e continuam a não se dar em 1991.
Concretizando: no orçamento dc 1989 houve uma dotação para a informatização de 1000 contos c no orçamento de 1990 estava prevista uma dotação para a informatização do registo civil de 1000 contos, novamente, com a promessa inscrita no PIDDAC de que esses 1000 contos subiriam, cm 1991, para 37 500 contos. Agora, no orçamento de 1991, verificamos que não estão lá os 37 500 contos mas, de novo, os 1000 contos! As intenções de investimento continuam a existir; o investimento é que não existe!...
Mais do que isso: as intenções de investimento aumentaram porque, no orçamento do ano passado, a intenção de investimento para a informatização global do registo civil era de 80 500 contos e este ano é de 131 500 contos. A intenção de investimento aumentou, portanto, substancialmente, mais de 60 %. Só que, para além da intenção, o investimento não existe, e mesmo a própria intenção vai tendo um arrastamento ao longo do tempo.
A previsão, no orçamento de 1990 para a conclusão da informaüzação do registo civil era 1992; no orçamento de 1991, a intenção dc acabar a informatização do registo civil passa para 1994. Verifica-se, num ano apenas, o atfaso de dois anos!
O segundo exemplo que gostaria dc dar sobre dotações, para mim incompreensíveis, no âmbito do PIDDAC, relaciona-se com o chamado «Programa dc Construção dc Bairros para Funcionários dc Estabelecimentos Prisionais». Admito que aqui se trate de um problema de designação.
pode ser que na elaboração do orçamento do Ministério da Justiça se tenham colocado expressões grandiloqüentes que não têm a ver com a realidade.
Se de facto o programa é mesmo de construção de bairros para funcionários, para mim são incompreensíveis dotações dc, por exemplo, 2000 contos para o estabelecimento prisional de Sintra, ou de 5000 contos para os estabelecimentos prisionais dc Lisboa ou de Leiria, ou de 4000 contos para o de Monsanto, pois isso não dá para construir bairros! Não dá sequer para construir uma habitação! É neste sentido que estas dotações são, para mim, incompreensíveis e que solicito ao Sr. Ministro a informação possível sobre o assunto.
Outra problemática é aquela a que o Sr. Ministro se referiu, há pouco, sobre o programa «Cidadão c Justiça», sobre o acesso à justiça. A questão concreta que gostaria de lhe colocar é a seguinte: em termos orçamentais, como é que isto se reflecte? Isto é, qual é o reflexo orçamental deste programa ou da intenção da sua concretização?
Aliás, na sua intervenção inicial o Sr. Ministro referiu, se bem ouvi, que na questão do acesso à justiça se prevê passar, em 1991, de dois para 18 gabinetes e que, simultaneamente, a verba passaria de 25 000 para 85 000 contos. Se ouvi bem — e admito que tenha havido qualquer lapso de audição —, a questão concreta que lhe coloco é a seguinte: como é que se consegue multiplicar por nove o número de gabinetes e multiplicar por uês a verba disponível para esse efeito?
A minha última questão — sobre a qual tenho dúvidas, talvez por não estar ligado à problemática da justiça — refere-se ao Boletim do Ministério da Justiça. Fiquei um pouco surpreso ao verificar, numa das informações dos elementos que foram fornecidos, que o último número publicado do Boletim do Ministério da Justiça é o n.° 380, relativo a Novembro dc 1988. A minha questão é esta: porquê um atraso de dois anos na publicação deste Boletim?
Para já, Sr. Minisuo, eram estas as questões que gostaria de lhe deixar.
O Sr. Presidente: —Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.
O Sr. Luís Filipe Madeira Q?S): — Sr. Minisuo, não diria, como o meu colega do PCP, que estou desiludido, porque este Orçamento confirma o que cu já pensava do Governo e da sua actuação na área da justiça.
Permita-me dizer-lhe, Sr. Ministro, que já está há nove meses no Ministério e lamento concluir que as esperanças que toda a gente depositou em V. Ex.* sc vão desvanecendo. A sua capacidade dc persuasão no Governo está nitidamente a falhar c a sua consciência das insuficiências da justiça não têm sido suficientes para comover o Governo de forma a obter os meios necessários a corrigir o muito que está mal — que V. Ex.' sabe e nós também.
Este Orçamento é para 1991. Ouvindo, porém, o Sr. Ministro e lendo a justificação, mais parece serem opções do plano a médio prazo: fala-se. mais cm 1994 do que cm 1991. De facto, para 1991 não há grandes perspectivas.
Quanto ao orçamento do seu Ministério, a parte financeira já foi analisada e V. Ex.* reconhece mesmo que ela não é famosa. Além disso, se considerarmos que a maior parte será consumida pelos aumentos normais dos vencimentos do pessoal, pouco fica. Mas vou aqui referir dois ou três pontos que me pareceram especialmente passíveis de um comentário desfavorável.
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0 primeiro refere-se a uma ambição de quem trabalha na justiça há muitos anos. Diz-se, com toda a razão, que em Portugal nao há, efectivamente, direito dc recurso. Os recursos são falácias, uma vez que não há possibilidade dc os uibunais dc recurso se debruçarem sobre a prova, salvo quando cia consta dc documentos críticos.
Não há, portanto, possibilidade de recurso quando os tribunais de recurso não tem possibilidade de se debruçar sobre uma materia de facto. E aqui estamos nós perante uma reivindicação antiga, relativamente à qual o Sr. Ministro, agora, parece vir dizer-nos que vai ter resposta razoável — ninguém quer tudo num dia só, com certeza. Refiro-me ñ informatização, à possibilidade de gravar os julgamentos, etc, enfim, dotar os tribunais dc meios informáticos e áudio-visuais que lhe permitam registar a prova produzida nos julgamentos.
Creio que da parte do Sr. Ministro e do Governo haverá a melhor boa vontade, mas não chega! Por aquilo que se vê no Orçamento, não chega! Não basta comprar os aparelhos c instalá-los nos tribunais. É preciso muito mais do que isso! É preciso, antes de mais, garantir, mas garantir mesmo, com sublinhado, a assistência técnica, eficaz e imediata a esses aparelhos, senão acontece o que sucede hoje com os notários. E eu não creio ser dramático nem exagerado sc lhe disser que, permanentemente, um quarto dos notários portugueses estão paralisados por avaria das máquinas dc fotocópias. Permanentemente! Não é exagero nenhum! Quem use com frequência esses serviços sabc-o bem, chegam a estar semanas parados, apesar dc essa fotocópia poder ser importante, uma certidão urgente, ela não 6 passada porque a máquina está avariada!
Em segundo lugar, e ainda mais delicado, é que nesta questão da gravação áudio-visual é preciso dotar os tribunais de pessoal adequado, a saber funcionar com a máquina e, diria mais, a saber funcionar bem. Porque se a gravação não estiver bem feita, não tem qualquer interesse; não se sabe qual é a testemunha que está a falar, não se sabe quem 6 que está a usar da palavra, tem dc haver, dc facto, um «curso de realização».
Ora, os uibunais estão hoje asfixiados, em grande parte, por carências dc pessoal, que não vejo aqui resolvidas, porque não sc abrem concursos, porque as secretarias judiciais estilo a funcionar —o Sr. Ministro sabe muito bem isso— com pessoal impreparado, pessoal eventual, pessoal contratado a prazo, não havendo sequer pessoal para os serviços judiciais clássicos! Por isso, pergunto: vão os tribunais ser dotados de pessoal habilitado a funcionar com estes aparelhos?
Há que acreditar — c eu acredito — que o Governo vai dotar os uibunais com esta aparelhagem, que é essencial e cu saúdo-o, porque é um gTande passo em frente e, como o Sr. Ministro sabe tão bem como eu, 6 uma reivindicação muito antiga de juízes, de advogados e de cidadãos que querem ter — e têm esse direito — acesso ao direito.
V. Ex.* falou, a propósito do sistema de gestão financeira, da forma dc lhe garantir unidade e transparência e das dificuldades de financiamento — devo confessar que não estava inteiramento atento, peço que me desculpe se sou inexacto ou injusto —, na hipótese, que, aliás, parece que rejeitou, de as custas fazerem parte dessas receitas. Penso que foi apenas uma VúpÓAcsc que não parece concretizável, pois as custas de parte são das partes, não são dos advogados, seria um confisco se o Estado as apreendesse. As custas de parte não são dos advogados!
O Sr. Ministro da Justiça: — Eu disse exactamente o contrário!
O Orador: — Também duvidei que assim fosse, era uma coisa que, de facto, não tinha grande sentido...
Quanto às construções dos palácios de justiça, o orçamento é pouco claro. Fala-nos em 1994, havendo já em 1991 algumas conclusões de obra... Esperemos que sim, não quero ser pessimista, talvez isso esteja nos planos de obras e o Ministério não é responsável por isso, na maior parte dos casos. Porém, ficarão concluídos 13 palácios de justiça, seis tribunais de trabalho, um tribunal de menores c 11 tribunais de círculo. Não sei se aqui onde diz a «conclusão» não quererá dizer «instalação». Este é um relatório da comissão, não é do Ministério, creio que o relator terá falado em conclusão querendo dizer instalação, porque não estou a ver tanta capacidade de construção instalada. Penso que será melhor falar cm instalação com recurso a casas já existentes, etc.
O Sr. Ministro da Justiça:—É «conclusão», Sr. Deputado.
O Orador: — De palácios?
O Sr. Ministro da Justiça: — Sim, sim!
Sr. Deputado, quando falo nos que estão concluídos em 1994, refiro-me a todos cujos projectos técnicos estão concluídos agora ou cm fase dc conclusão c, portanto, é possível concluir vários em 1991, cujos projectos técnicos foram iniciados há três anos c estão em construção. E quando digo que, em 1994, todo o parque judiciário estará recuperado, não significa que não façamos nada até essa altura e que vamos recuperar todo o parque judiciário em 1994. Há um plano de acção do Ministério da Justiça que foi iniciado, pelo menos, há três anos, muitas conclusões de obra aconteceram...
O Orador: — Qual é o atraso, neste momento, Sr. Ministro?
O Sr. Ministro da Justiça: — Relativamente a esse programa, não há atraso! Evidentemente que há um ou outro atraso pontual, mas em termos de programa global não há atraso. Aliás, V. Ex." tem ocasião de verificar, pelos mapas que foram distribuídos, que lemos tanta segurança que isso vai ser assim que até admitimos que, em 1994, haja quatro situações que ainda não estejam definitivamente resolvidas. Portanto, todas as conclusões deste ano são resultados dc acções que foram iniciadas há, pelo menos, três anos; há outras que estão a ser iniciadas este ano, o que vai permitir a sua conclusão em 1994.
Por outro lado, há uma indicação exaustiva dc todas as obras a concluir mensalmente em cada um destes anos, evidentemente que esse «mensalmente» pode ser sujeito a uma ou ouua ligeira correcção. Agora, quando falamos em «conclusão», estamos realmente a concluir a obra, porque haverá outras instalações de obras que já estão concluídas c que se vão verificando progressivamente. Portanto, há que acrescentar às «conclusões» algumas instalações dc obras que já estão também concluídas.
Relativamente ao problema do parque judiciário, mesmo quando sc fala em 1994 não se está a fazer uma promessa no vazio, pois, como tive ocasião dc dizer, essa promessa tem a credibilidade resultante dc tudo aquilo que já foi feito até aqui.
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Aliás, deixaria apenas uma nota, que é importante referir para se ter a noção da dimensão deste problema: o Ministério da Justiça tem na sua dependência, em termos de propriedade e gestão, 1643 edifícios. Não é, como calcula, fácil fazer a gestão global de um património tão extenso, mas é possível, através de programas coerentes e que tenham uma fundamentação também ela financeira, realizar essa obra. Portanto, não c por aí que a esperança do actual Ministro da Justiça se vai desvanecendo.
O Orador: — A minha esperança é mais fundada! Não perco a esperança no Ministro da Justiça, é na sua acção neste governo! Isso é que posso perder e já vou perdendo, francamente...
Por outro lado, nas verbas que aqui vêm, não consegui descobrir nenhuma nem nenhum aumento que consinta interpretar o esforço do Ministério da Justiça no sentido de pôr cobro à situação das questões pendentes em tribunal! Já muitas vezes abordei, assim como outros deputados das várias bancadas, o Sr. Ministro relativamente ao atraso, que é estrutural, das questões pendentes em tribunal, especialmente em alguns tribunais. Já reconhecemos que a média do País não é tão má como isso, embora também tenhamos reconhecido que há zonas muito largas do País, onde é péssima. Por isso, Sr. Ministro, que verbas, que meios financeiros, estão consagrados ao combate à recuperação desses atrasos?
E nesta primeira intervenção, supondo que possa haver outras, quero também referir que era desejo político do meu partido, porque isso corresponde a um interesse nacional, ver consagrado neste orçamento um maior esforço do Governo, na medida em que isso possa ser no orçamento. E o Orçamento é, em muitos casos, o indício do empenhamento político do Governo cm determinado tipo de reformas: na desburocratização dos serviços c registo e de notariados e na redução dos emolumentos que hoje se pagam, designadamente para efeitos de registo, mas particularmente para notariado.
Escrituras simplicíssimas, que se fazem numa página do livro de notas do notário, custam fortunas só porque a empresa que as faz tem um capital social muito elevado: pagam-se centenas ou milhares de contos por uma escritura e não tem qualquer justificação que o Estado cobre esse dinheiro como um verdadeiro imposto e não como emolumento. Mesmo para as grandes empresas isso torna-se, por vezes, difícil, mas para as pequenas empresas inviabiliza, muitas vezes, uma flexibilidade de gestão c de actuação, que é necessária c que é inviabilizada pelo custo elevadíssimo que acarreta fazer as coisas como deve ser, o que leva a que muitas delas «passeiem» pelas margens da legalidade durante longos periodos, sem que o Ministério Público tenha sequer a coragem moral (porque de facto é difícil) de tomar as iniciativas que a lei prevê, porque é doloroso, a empresa não merece, não há intenção maldosa, o que há é custos elevadíssimos que o Estado aplica, repito, inviabilizando que as empresas se adequem à legalidade pela única razão de custos emolumentares, que são falsos emolumentos c são verdadeiros impostos.
Penso que também não seria má ideia, neste sentido, que, para facilitar a vida jurídica à comunidade, cidadãos e empresas, o Governo encarasse esta questão de uma forma positiva.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (Indep.): — Sr. Ministro da Justiça, creio que é de salientar, em primeiro lugar, que foi possível, para analisar o orçamento deste ano, compulsar a documentação enviada pelos serviços do Ministério, em particular os bem elaborados mapas do Gabinete de Gestão Financeira, que permitem uma análise circunstanciada e com o pormenor adequado de alguns dos elementos fundamentais para sc ter uma imagem mais rigorosa da situação financeira da justiça. No entanto, nem o esforço feito nesse sentido nos permite emitir um juízo tranquilizado sobre a questão da organização financeira do Ministério.
Aliás, o Sr. Ministro da Justiça não deixou, cm parte, de reconhecê-lo, apenas não tendo enfatizado — suponho que por razões dc prudente gestão política — que essa é uma situação cm si mesma negativa. Creio que ó por aí que é preciso começar, isto é, o Sr. Ministro fez uma afirmação extremamente determinante que, de resto, fica seguramente registada para todos os efeitos, ou seja, a de que estão reunidos os pressupostos financeiros para o lançamento da sua política e do seu discurso sobre a justiça.
É uma pesada afirmação c é também uma pesada responsabilidade, porque a primeira dificuldade que há na análise do orçamento é saber qual é ao certo o suporte financeiro. Essa é a primeira dificuldade.
Quem analisar a nota informativa do Gabinete de Gestão Financeira, enviada à Assembleia da República, o que é de resto correcto, sobre o valor global da proposta orçamental, por exemplo, dos cofres para o ano de 1991, verá que ela evidentemente sc /ez, como teria de ser, com base numa projecção daquilo que será a evolução dc receitas. Mas fê-lo aplicando uma percentagem dc aumento ao valor de receitas acumuladas até ao final de Dezembro de 1989, deduzido o saldo do ano anterior e obtendo um valor aproximado — sublinha-se, e bem, aliás — de 46 milhões de contos, ao qual é preciso somar o valor do saldo transitado de 1989, que foi de cerca de 10 milhões de contos.
Portanto, todas as análises são feitas em termos, pura c simplesmente, de cálculo aproximado de projecção c, anualmente, tem vindo a verificar-se que os saldos acabam por ser diferentes do que foi perspectivado.
Quanto a isto, poderá dizer-se: «isso é o normal da vida orçamental». Mas, neste caso, não é, pois todos sabemos, e em especial os peritos, que não é assim. Há um grau de flutuação muito superior e o problema da computação das receitas c da rigorosa previsão da sua evolução é um problema muito sério no orçamento da justiça. Creio que foram dados alguns passos no sentido dc conseguir uma maior adesão em relação ao real, mas estamos longe de ter atingido um resultado satisfatório. Acredito que o Sr. Ministro da Justiça não deixará de reconhecer este ponto!
Com efeito, por um lado, continuam a existir receitas incontabilizadas e não projectadas rigorosamente e, por outro lado —como, dc resto, o Sr. Deputado Octávio Teixeira já leve ocasião dc sublinhar, do ponto dc vista técnico-financciro—, coloca-se, muito seriamente, um problema de gestão dos saldos de gerência, pelo que gostaria que o Sr. Ministro nos desse uma informação mais detalhada sobre a problemática das aplicações financeiras do Ministério da Justiça, uma vez que não lhe foi possível fazê-lo em sede de comissão.
Dc facto, há uma verba projectada para aplicações financeiras, mas há activos imobilizados ou não geridos, não rentabilizados, numa quantidade que impressiona,
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designadamente em montantes detidos por serviços periféricos, que, como V. Ex.* sublinhou, são muitíssimos, isto é — para sermos mais exactos —, são milhares.
Ora, como é óbvio, isto impede-nos de dizer, com a segurança que V. Ex.* exibiu e que também é compreensível, que o crescimento é de x %. Qual é a base de que se parte? É insusceptível de ser calculada com rigor!
Um segundo aspecto diz respeito às execuções orçamentais. Penso que é extremamente difícil fazer o controlo da execução orçamental. Assim, em relação à questão do PIDDAC, por exemplo, o mapa enviado pelos serviços revela, cm alguns casos, o esgotamento das verbas disponíveis à data cm que os mapas foram elaborados. Em outros casos ainda se está suficientemente distante da execução plena. Deste modo, gostaria de saber se a execução vai ser possível ou o que é que vai acontecer até ao termo do ano. Qual é o compromisso que o Sr. Ministro assume nesta matéria?
Em relação à questão das verbas, creio que toda a gente terá de ter em atenção a modéstia decorrente da necessidade de recalcular as verbas em função da inflação previsível, o que acalmará um pouco os ímpetos proclamatórios de grandes acréscimos.
No entanto, gostaria de sublinhar que, em meu entender, face ao compromisso e à afirmação governamental que o Sr. Ministro acabou de reiterar, dc estarem reunidos os pressupostos financeiros, e pese embora todas as dúvidas que equacionei e todas as interrogações que ficam lançadas, há dois problemas fundamentais no debate da justiça, tal qual o podemos fazer aqui hoje, pois não se trata dc uma interpelação, mas dc um debate orçamental. Esses problemas são: por um lado, o extraordinário atraso na resolução de certos problemas infra-esiruturais, isto é, em relação às carências, c, por outro lado, o mistério da crise da justiça.
Em relação ao atraso na resolução das carências, devo dizer que quem tiver compulsado os documentos enviados pelo Ministério da Justiça teve oportunidade dc verificar, por exemplo, que os dois relatórios sobre o estado das instalações judiciais e das instalações dos registos e do notariado constituem um balanço circunstanciado, pois referem instalação a instalação, edifício a edifício, e neles o Sr. Ministro teve ocasião de sublinhar que, ao todo, os edifícios são mil seiscentos e tal e que qualquer um de nós pode fazer essa fiscalização, indo lá, telefonando, falando, etc., etc.
É impressionante a quantídade de edifícios que têm a classificação M ou MM (mau, muito mau) ou regular, e é impressionante o número daqueles que têm a classificação de bom, nos juízos dos serviços — repare-se que não pretendo pôr em dúvida, não é disso que quero fazer gala.
Idem, idem, aspas, aspas cm relação a outras questões que dizem respeito ao património. Sc formos falar das casas dos magistrados, não podemos deixar dc referir o lamento deles em relação as casas de função, que nos foi transmitido pelo Sindicato dos Magistrados do Ministério Público e pela Associação Sindical dos Magistrados Judiciais. Também sabemos, e não vale a pena fazer demagogia nessa matéria, que essa situação é negativa c preocupante.
Portanto, o inventário das carências é.descomunal e o estado do património é, de facto, aflitivo. As condições de trabalho dos magistrados —veja-se o relatório deste ano dos serviços do Ministério Público, mas poder-se-ia ver também o dos anos anteriores— é um grosso volume extremamente rigoroso ria descrição das condições de tra-
balho, que continuam a ser penosas em centenas e centenas de instalações judiciais. Isto 6 sabido, é uma realidade!
Assim, o anúncio que o Sr. Ministro faz da conclusão das obras, que vêm indiciadas no quadro n.9 1 anexo ao
relatório da Secretaria-Geral do Ministério da Justiça, dos projectos a concluir, dos 19 palácios de justiça e dos quatro tribunais do trabalho a arrancar e, depois, das quatro instalações dos serviços de registo e do notariado são, tenhamos consciência disso, coisa não larga mas relativamente modesta, até porque há regiões inteiras do País que não foram contempladas.
Aproveito para chamar a atenção, só pontualmente, por razões institucionais e políticas, para a situação das regiões autónomas c sublinho que, em qualquer destas prioridades, não se incluem obras urgentes das regiões autónomas, tanto dos Açores como da Madeira.
O caso do Tribunal de Trabalho do Funchal é contemplado só em parte. Não sei se a solução que está projectada é a mais adequada —francamente, tenho dúvidas que seja— mas alerto que a situação do Palácio da Justiça, como tal, é extremamente grave e que, de qualquer das maneiras, há na Região Autónoma da Madeira, por exemplo, zonas inteiras que carecem dc instalação judicial adequada. Aliás, estão enumeradas e V. Ex.* terá oportunidade de as conhecer, através dos relatórios que estou a compulsar, neste momento, que, aliás, foram transmitidos, como devia ser, pelo Ministério.
Contudo, tenhamos consciência dc que em relação aos Açores a situação é pior, até porque se trata, naturalmente, de uma realidade do arquipélago, em que há subproblemas dentro do problema geral da situação regional. Creio que, cm termos nacionais, é mau e perigoso a verificação desta tendência, porque sabemos que há um conflito em torno da questão da regionalização da justiça e sabemos que se
a República não honra os seus compromissos cm relação às instalações judiciárias, fatalmente se acentuará a ideia — que é um preconceito, mas lambem uma questão políúca grave — dc que só a regionalização da justiça, entendida, na minha óptica, num sentido perverso, poderia resolver esse problema. É uma pecha, e grave, no Orçamento, pelo que creio que V. Ex.1 terá de a reconhecer objectivamente.
O mistério da justiça —e vou abreviar a questão— é este: como é que é que se explica que, sendo as coisas como V. Ex.* diz, reine, neste momento, em termos dc panorama da justiça em Portugal, uma situação de profunda instabilidade, para não dizer mesmo dc crise aberta?
Dispenso-me de pormenorizar a crise na direcção, mas só para que V. Ex." não tenha qualquer suspense c para que não fiquem registados cm acta quaisquer três pontinhos, devo dizer que é evidente que, neste momento, há um conflito com magistrados e com magistraturas, há um problema sério em relação à estabilidade da Polícia Judiciária —creio mesmo que há uma profundíssima instabilidade, muito preocupante—, há, aliás, em geral, um problema de conflitos entre polícias e magistraturas e ainda, quanto a mim, há um problema que se situa num domínio que não é este que estamos aqui a debater estritamente c cm relação ao qual nos sentimos um pouco, mas não totalmente, tolhidos para o debater, que é o problema dc ausência persistente de reformas em domínios absolutamente fulcrais, isto é, em domínios estruturais. Refiro-me, naturalmente, ao domínio processual civil, em relação ao qual gostaria de ouvir um compromisso formal, que tem faltado.
Na verdade, como é óbvio, há uma crise no processo dc aplicação da legislação processual penal, que dispensa
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qualquer referencia alongada, mas gostaria de saber o que é que o Ministério da Jusüça quer fazer e que instrumentos é que tem, também neste plano financeiro, para obtemperar isso.
Por outro lado, há também um problema de dificuldade de cumprimento de promessas em dois domínios, em que o Sr. Ministro foi absolutamente determinante. O primeiro é o do acesso ao direito, em que, francamente, cu teria o maior gosto em poder vir a corroborar o juízo e a prognosc que fez de que irão ser instalados 18 gabinetes de apoio, (18 gabinetes de apoio, 18!...) com a verba que está inscrita neste orçamento do Ministério da Justiça. Só se for na base da colaboração benévola de não sei que juristas, uma vez que V. Ex.' não pretende —ao que parece— criar qualquer corpo de responsáveis públicos pela administração desses serviços. Francamente, desejaria que viesse do céu esse apoio, mas tenho um profundo ccpücismo cm que o Governo tenha esse elemento de sorte, como o Sr. Primeiro--Ministro gosta de sublinhar.
Por outro lado, também não vejo como é que algumas das promessas que V. Ex.' fez cm relação à nova filosofia do sistema prisional possam ser cumpridas. Aliás, pelos dados que vieram também anexados ao orçamento ou que foram entregues ulteriormente, verifica-se que continua a dar-se a triste progressão da taxa de suicídios, pelo que gostaria de saber, em particular, o que o Ministério pretende fazer nessa matéria a título preventivo, obviamente, pois só a esse título nos interessa.
Gostaria ainda que se referisse, com pormenor, não apenas às questões alimentares, que são importantes, pois o aumento da verba é uma exigência já de há muitos anos, mas também que aludisse aos indicadores preocupantes sobre o consumo de droga em meios prisionais. Trata-sc de uma matéria em relação à qual penso que não é necessário ler os dados que aqui estão, uma vez que qualquer um, se se der a esse trabalho, o poderá fazer, mas gostaria, igualmente, que se referisse a este aspecto.
Quanto à Polícia Judiciária, descontadas as questões de gestão c intendência, a questão política da crise da direcção parece-me intolerável, não se pode manter, ou seja, a Polícia Judiciária não pode continuar com uma direcção praticamente demissionária durante meses a fio.
A este propósito, refiro a enuevista dada pelo Sr. Di-rector-Geral da Polícia Judiciária a O Jornal, no dia 16 dc Novembro, c não sei o que é que o Sr. Ministro da Justiça pode fazer face aquele tipo dc declarações. Aparentemente, não pode fazer nada, pelo menos, é o que revelam estas semanas de espera em relação a uma atitude governamental .... mas pode fazer alguma coisa seguramente em relação a algumas das verbas fundamentais para investimentos. Deste modo, gostaria que o Sr. Ministro pudesse analisar, com um pouco mais de detalhe, como é que encara a questão da expansão territorial da PJ. Não percebo alguns dos critérios de expansão territorial. Não percebo por que é que se contemplam umas zonas e não outras. Qual foi a prioridade real e objectiva utilizada para esse efeito?
Na verdade, tenho alguma apreensão em relação aos meios logísticos ao alcance da PJ, sobretudo agora que se anunciou a criação de uma direcção especificamente votada ao combate à corrupção c a outros aspectos financeiros que exigem perícias, capacidade c meios técnicos que não vejo contemplados nestas dotações. Salvo, naturalmente, melhor leitura, não vejo onde é que possa ter errado e, assim, gostaria muito dc ser esclarecido sobre este aspecto.
Por razões de economia e dc paciência dos Srs. Deputados, sou obrigado a deixar dc lado as questões relacio-
nadas com o Instituto de Reinserção Social, que muito me apraz que possa ter alguma extensão; mas também aí me parece que há algum optimismo excessivo.
A situação dos Institutos de Medicina Legal, cuja crise não creio que tenha sido travada, é calamitosa em Lisboa e é preocupante no Porto. Mas dizer isto é muito pouco, pelo que gostaria que o Sr. Ministro, com o tempo que tem em abundância, o que não é o meu caso, pudesse dedicar-sc com um pouco mais de pormenor à análise desta matéria.
Para já e por razões óbvias são estas as considerações que lhe deixo, Sr. Minisuo.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Ministro, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Penso que as intervenções que ouvimos até agora registam algumas verdades por todos reconhecidas. A primeira é a de que, efectivamente, há problemas graves estruturais na justiça em Portugal, acumulados durante muitos anos e que o Governo vai procurando suprir. A segunda respeita ao País que somos e à carência de meios de que, efectivamente, dispomos.
Assim, em relação ao reforço geral do orçamento do Ministério da Justiça para este ano, referiu-se aqui um aumento da ordem dos 12 % em termos globais e isso é, realmente, o reconhecimento de que, para fazer frente a todas as situações, há que fazer uma distribuição o mais equitativa possível pelos vários departamentos. Não podem verificar-sc os aumentos que todos gostaríamos que acontecessem, mas trata-se de uma situação que não podemos ultrapassar só com a vontade c com o desejo que todos temos.
O que me parece importante, e que se regista neste orçamento do Ministério da Justiça — e aproveitaria para salientar alguns aspectos já referidos pelo Sr. Deputado José Magalhães —, é o facto de o Sr. Ministro da Justiça e o Sr. Secretário dc Estado terem revelado toda a disponibilidade, não só agora nesta Comissão de Economia, Finanças e Plano, como, já antes, na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para prestarem todos os esclarecimentos acerca do Orçamento dc Estado para 1991 na área da justiça, mas, sobretudo, pelo conjunto de elementos que, quero registar, pela primeira vez vêm com uma vastidão invulgar. Sempre foram fornecidos elementos evidentemente, mas desta vez, relativamente ao orçamento do Ministério da Justiça, lenho de salientar, foram muito exaustivos e de uma transparência total.
Mas, dizia eu, o importante é registarmos a gestão acertada c selectiva nos reforços de áreas devidamente escolhidas, nos aumentos mais significativos na área do Ministério da Justiça. E aqui é que me parece que sc trata de uma política efectivamente de justiça: na escassez dc meios, saber fazer-se a distribuição pelas áreas mais sensíveis e mais carentes e, dada a situação, parece-mc manifesto o acerto deste orçamento do Ministério da Justiça para 1991.
O Sr. Deputado Luís Filipe Madeira referia, há bocado, um pouco nesta linha, as suas preocupações relativamente à menor celeridade dos processos — todos sabemos que há, efectivamente, essa situação —, dizendo que não
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descortinava, no orçamento do Ministério da Justiça para 1991, medidas concretas que pudessem dar resposta a essa situação.
Ora, parece-me que não 6 verdadeira essa afirmação, porque, por exemplo, se repararmos, como o Sr. Ministro referiu, na instalação de fax em todos os palácios da justiça e se repararmos que, na área da informatização, há um aumento de 342 %, é óbvio que são medidas que vão, necessariamente, rcflectir-se numa maior aceleração da justiça.
É evidente que no Orçamento de Estado não estão consignadas medidas de outra ordem, relativamente à simplificação processual e outras, que são medidas que têm uma sede própria, de reforma processual, que não a do Orçamento do Estado. Agora, as medidas de informatização c de melhoria de instalações, tudo isso, necessariamente, se reflecte nas condições de trabalho e de exercício da justiça, com repercussão na sua celeridade.
O Sr. Deputado José Magalhães fez aqui uma referência, e registo a sua preocupação em relação às regiões autónomas, designadamente em relação à Região Autónoma da Madeira.
Efectivamente, há carências na área de instalações da justiça, mas queria dizer-lhe que, neste momento, talvez seja na Região Autónoma da Madeira que se verificam, no domínio da justiça, obras de maior vulto, designadamente, como é sabido, a instalação da nova cadeia, que é uma obra de grande vulto.
No que diz respeito aos palácios da justiça, há dois cm construção, o de Ponta do Sol e o de Porto Santo, e há melhorias nas instalações do Palácio da Justiça do Funchal e a instalação, em edifício adquirido pelo Ministério da Justiça, de alguns juízos que estão instalados neste Palácio. Penso que isso vai...
O Sr. José Magalhães (Indep.): — V. Ex.' vai ficar satisfeito com isso?
O Orador:—Nunca estamos satisfeitos, obviamente!
Não estou a dar esta referência como ficando esgotadas as carências da justiça, em termos de instalações, na Madeira, mas estou a registar que, efectivamente, há um esforço no sentido de dar resposta a algumas delas, pelo menos às mais prementes.
Esta era a referencia que queria deixar feita no que diz respeito às instalações da justiça na Região Autónoma da Madeira.
Sr. Ministro, V. Ex.* afirmou — e já aqui foi salientada essa sua afirmação —, que, efectivamente, este orçamento lhe dará meios para executar o seu programa e para executar uma política de justiça identificada com os seus objectivos. Dc qualquer forma, queria deixar-lhe aqui uma pergunta, que é a seguinte: do seu ponto dc vista, quais as áreas deste orçamento que, com vista ao seu programa c à sua política, ficam mais a descoberto c, portanto, quais eram as áreas que pretenderia que tivessem sido contempladas com outros meios. Pergunto isto para termos uma perspectiva do quadro mais sensível dc insuficiências, do seu ponto de vista, no orçamento do Ministério da Justiça para 1991.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Agradeço as várias questões que me colocaram e, se me permitem, gostaria de fazer uma breve inuodução.
eventualmente abrangente do conjunto das questões que me foram postas, para, depois, analisar cada uma delas especificamente.
Creio que estamos todos dc acordo —e tenho tido ocasião dc o verificar nas várias vezes em que tenho podido intervir sobre a temática da justiça — em que a justiça é, obviamente, uma das questões de Estado. Isso significa duas coisas fundamentais: a primeira delas é que o responsável pela pasta da justiça deve ter, sobre o tema, um discurso de Estado, um programa de Estado e uma responsabilidade dc Estado.
Pela minha parte, tenho tido o cuidado, cm todas as intervenções, de acentuar sempre essa tónica, fugindo ao discurso demagógico, que pode encher o olho e o ouvido, mas que não vai permitir que, a médio e a longo prazos, o sistema tenha sido substancialmente modificado.
Todos reconhecemos que, por toda a parte e não apenas cm Portugal, o problema da administração da justiça é, hoje, um problema complexo. Tive ocasião, ainda recentemente, dc participar numa conferência de Ministros da Justiça da Comunidade Económica Europeia cm que um dos temas centrais era o problema da lentidão da resposta da justiça e onde ficou claramente provado, por exemplo, que neste momento se encontram numa situação bastante mais preocupante do que a nossa a Espanha, a Itália e a França, para não falar já na Grécia, que normalmente se utiliza como exemplo, quando não temos outra referência para, dc alguma forma, solicitarmos a nossa inclusão que não seja na cauda dc qualquer classificação.
Todos sabemos que é um problema complexo, todos sabemos que é um problema actual e todos sabemos que é urgente a adopção de medidas que não só rentabilizem o funcionamento do sistema, como permitam, inclusivamente, a mudança, no sentido verdadeiramente sociológico e político do termo, do próprio sistema.
Mas sc este discurso dc Estado é um discurso que tenho tentado assumir permanentemente, o [acto da justiça ser uma questão de Estado determina também, creio eu, que, por parte da oposição, a crítica seja também uma crítica de Estado, não uma crítica conjuntural, virada para a obtenção de efeitos imediatos, mas uma crítica estrutural virada, sempre que possível, para a realização de espaços dc consenso e dc políticas comuns e, por isso, dc Estado, de intervenção, na área da justiça
Compreenderão, por isso, que não me estimula positiva ou negativamente o facto dc ser posto perante a situação dé provar sc eu, concretamente, sou um ministro que garanta esperança ou um ministro que desiluda expectativas.
Entendo que reduzir a questão dc Estado, que é a justiça cm Portugal, à capacidade pessoal deste concreto ministro, seria a negação absoluta, porventura, absurda, da afirmação dc que a justiça é, efectivamente, uma questão dc Estado.
Não tenho qualquer dúvida dc que quem assumir a pasta da justiça dentro dc quatro anos ficará, porventura, ligado à consumação definitiva da mudança de um sistema de jusüça em Portugal. E nessa altura, porventura, no recôndito de algum lugar onde possa viver com a minha própria intimidade, não deixarei de sentir, então, sim, para comigo próprio, uma ponta dc orgulho dc, no momento exacto, ter pensado mais na justiça do que em mim próprio.
Em lodo o caso, qualquer ministro é humano e gostará também, ele próprio, dc ver que, na realização concreta dos seus projectos, foi capaz de ter adoptado, no momento exacto, as medidas acertadas. E teria o gosto cm vos poder trazer aqui, sc não fosse excessivamente extensa, a lista das acções concretas que já foram realizadas c que, por-
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ventura, não são do conhecimento dc todos por razões que, evidentemente, escapam à própria oposição, como ó óbvio.
Mas sc 6 facto que há hoje uma série de sectores onde, por um lado, os problemas, porque estão resolvidos, não estimulam a intervenção política, há outros onde, embora não estejam os problemas resolvidos, há ainda a garantia dc fazer valer a esperança, porque as acções concretas realizadas legitimam, como disse há pouco, moral e politicamente, a manutenção dessa esperança.
Quando me dizem que o orçamento do Ministério da Justiça é uma desilusão, evidentemente não adiro a essa ideia, tendo cm conta aquilo que era possível e realizável no ano de 1991, a que ele sc refere. Evidentemente que, para o ano de 1991, não está, neste momento, garantido ao Ministério da Justiça um orçamento que lhe permita resolver todos os problemas do sistema de justiça cm Portugal, mas também suponho que seria uma péssima gestão dos dinheiros públicos a apresentação à Assembleia da República dc um orçamento que, para um ano só, fosse prever todas as verbas inaplicáveis e que são necessárias à satisfação dc todos os problemas do sistema de justiça em Portugal!
Tendo em conta o ano a que se dirige, o orçamento, não sendo, evidentemente, óptimo — não creio que algum dos meus colegas do Governo que por aqui tenha passado se tenha mostrado totalmente satisfeito com o orçamento de que dispõe —, é o possível, em termos de gastos públicos globalmente considerados e em termos de prossecução de um programa de mudança para o funcionamento de um sistema de justiça em Portugal. Aliás, como todos os Srs. Deputados sabem, num país c num estado cm que não abunda a disponibilidade financeira, é preciso, e nós somos capazes de o fazer, colmatar algumas lacunas na previsão do financiamento através, por um lado, do rigor da programação e, por outro, da capacidade dc executar o fundamenta) e dc o fazer em termos de projecção de mudança para o futuro e, ainda, suscitando a imaginação de que, apesar de tudo, nós, portugueses, somos titulares.
E, portanto, nesse conjunto que deve ser considerada a capacidade que este orçamento detém para que seja possível, honestamente, afirmar uma mudança no sistema dc justiça, e, ao mesmo tempo, dar passos decisivos na definição dc uma nova política de justiça.
Posso dizer-vos, por exemplo, para referir um aspecto que foi considerado por várias das vossas intervenções, que, quanto à implantação dos gabinetes de consulta jurídica, há formas maleáveis de o conseguir e posso, por exemplo, dizer-vos que, ainda este mês, será inaugurado o Gabinete de Consulta Jurídica de Guimarães, como extensão do Gabinete de Consulta Jurídica do Porto, e que, na sua instalação e no seu funcionamento, foi conseguido, através dc um trabalho político dc procura dc consensos, o empenhamento decisivo, que aqui vale a pena reconhecer, da Câmara Municipal dc Guimarães e da Ordem dos Advogados.
O importante não está em estimular negativamente o Ministério da Justiça pela disponibilidade ou não dc verbas que lhe permita que, a custas suas, instale todos os gabinetes dc consulta jurídica. A política passa não apenas por uma relação binária entre financiamento c acção, mas também por uma realização consensual de explicitação no terreno do que é uma política dc Estado, fazendo intervir vários parceiros, eles próprios, no fundo, os cidadãos beneficiários c titulares originários da própria administração àa justiça.
O caso concreto de Guimarães é um excelente exemplo disso. Os outros, porventura, seguirão um caminho semelhante e é bem possível que, dentro de pouco tempo, sem o orgulho provinciano, no sentido negativo do termo, do Ministério da Justiça ter por si financiado tudo, haja, antes, o orgulho nacional de ver a sua comunidade, toda ela, empenhada na realização de problemas estruturais fundamentais, como são os do bom funcionamento da justiça e o da capacidade de a tornar cada vez mais acessível ao cidadão comum.
Verificaremos, por isso, que não é multiplicando por nove o número de gabinetes que temos de multiplicar por nove o respectivo financiamento. Teremos é dc multiplicar, porventura, por um número bastante superior, a nossa capacidade de encontrar empenhamentos comunitários colectivos na solução de problemas que são essenciais.
No fundo, é a intervenção da sociedade civil, é a capacidade do Ministério da Justiça ter a gestão política do problema, mas nem sequer é desejo do Ministério da Justiça colher os louros políticos daquilo que, no fundo, deve ser partilhado por todos, porque todos tiveram capacidade de intervenção e porque o Ministério da Justiça teve a capacidade de levar os outros ao desejo e à disponibilidade dessa intervenção.
Tenho como claro para mim, portanto, que a proliferação dc gabinetes no fundo, a jurídica está garantida, não é um projecto de meras intenções, é uma acção que, em conjunto, vamos realizar, suportando, evidentemente, o Ministério da Justiça, todas as despesas do pagamento das respectivas consultas. Simplesmente aqui, mais uma vez, não há que multiplicar por nove — os gabinetes que temos em funcionamento são os de Lisboa c do Porto—, porque é perfeitamente normal que um gabinete dc consulta jurídica que venha a ser instalado em Anadia tenha um encargo financeiro bastante inferior àquele que tem, obviamente, o Gabinete dc Consulta Jurídica do Porto ou de Lisboa.
Tive ocasião, há dias, de ter o prazer de ser cu a encerrar o I Congresso sobre a Administração e o Cidadão, que, evidentemente, tinha como vertente essencial a desburocratização, onde tive ocasião de referir que não podemos ter uma concepção burocratizada da desburocratização. Isto é, desburocratizar não é sobres simplificar, pois são dois conceitos completamente diferentes.
A burocracia — todos o sabemos, porque, felizmente, temos uma noção cultural das coisas — começou por ser um valor em si mesmo e não podemos hoje, numa euforia dc desburocratização, vir, inclusivamente, a pôr cm causa interesses e direitos fundamentais, como sejam, nomeadamente, os da certeza c da segurança do comércio jurídico.
Desburocratizar tem uma vertente formal, a vertente mais imediata, que é a de diminuir a documentação e racionalizar os circuitos; mas tem também uma vertente substantiva, muito mais profunda, e que é a da devolução ao cidadão do seu próprio direito de participação. No fundo, desburocratizar, nesse sentido, é criar o Estado dos cidadãos; é, portanto, fazer transferir para o cidadão a dimensão ética que a própria burocracia continha no início.
Nesse domínio, há programas vastos que estão a ser desenvolvidos pelo Ministério da Justiça. Lembraria o Programa Cidadão e Justiça, que, como é evidente, os Srs. Deputados conhecem, que tem, neste momento, uma profusão c uma generalização em todo o país, que 6 conhecido de todos e que permite que o Ministério da Justiça esteja a ser permanentemente chamado a intervir, resolvendo problemas, encaminhando, dando informação c permitindo, portanto, que sc estabeleça uma relação
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definitiva entre, por um lado, o cidadão e, por outro, o sistema de administração de justiça.
Gosiaria de relevar este aspecto, porque, sendo óbvio, foi implementado, ainda há pouco tempo, de uma forma inimaginável. E que, no fundo, um dos graves problemas do funcionamento do sistema dc justiça em Portugal é que ela tem sido também um sistema verdadeiramente autista, que olha para dentro, reflecte para a sua própria interioridade e que se esgota mais nas relações entre as várias classes profissionais envolvidas do que propriamente na relação verdadeira de Estado entre, por um lado, o sistema e, por outro, o cidadão.
Essa abordagem cultural da temática da justiça está construída, passou e hoje, felizmente, a justiça é uma questão da ordem do dia, e não apenas pelos aspectos negativos que acabaram de ser referidos.
Um outro aspecto fundamental, no domínio da desburocratização — porque se a burocracia é um instrumento, a desburocratização não deixa também de ser instrumental —, que atinge o seu objectivo e que se traduz numa capacidade de responder melhor e mais rapidamente, será, evidentemente, conseguido através da implantação das novas tecnologias. E, Srs. Deputados, não é coisa de menos a instalação de 1200 microcomputadores, o equipamento de todos os tribunais com sistemas dc telefax e de gravação áudio!
Posso dizer-vos que, no próximo mês de Janeiro, será implantado nos tribunais cíveis, de polícia e de família de Lisboa o sistema de rede multibanco para pagamento de todo o tipo de despesas a efectuar directamente cm tribunal. E os Srs. Deputados que têm contacto com o tribunal e que conhecem a via sacra do levantamento das guias, do seu depósito na Caixa Geral de Depósitos e da posterior remissão do dinheiro para os cofres do respectivo tribunal sabem o que isto significa em termos de desburocratização, dc conforto e de comodidade para as pessoas envolvidas.
Logo que o sistema esteja testado — e o leste será fácil de concluir—, migrará para o Porto e será progressivamente instalado, primeiramente em todas as capitais de distrito e, progressivamente, nas sedes dc círculo judicial.
Não é também acção de menos, tendo sobretudo em conta os resultados daí advenientes. .
Exactamente no mês de Fevereiro será instalada no Tribunal Cível de Lisboa uma central para a prática dc acios externos, que irá permitir uma maior realização na prática daquilo que, no fundo, juridicamente se chama a comunicação dos actos processuais, uma racionalização do funcionamento dos serviços e, portanto, uma maior rapidez na sua implementação.
Dir-me-ão: mas isso vai acontecer? Vai acontecer cm Janeiro, em Fevereiro, em Março, mas vai acontecer exactamente na linha daquilo que já aconteceu, por exemplo, relativamente à emissão do bilhete de identidade este ano, em Lisboa, numa experiência que foi de total sucesso e que vai ser não só multiplicada nos próximos anos, como institucionalizada e implementada em sistema através da descentralização do Centro de Identificação Civil e Criminal. Por ouuo lado, vai ser implementada a partir, por exemplo, dc uma_outi"a experiência, que tive ocasião de anunciar aquando da interpelação ao Governo na área da justiça, acontecida no termo da última sessão legislativa. E ainda esta sessão legislativa não linha tido início c já o dtçloma estava publicado c em vigor, terminando com a obrigatoriedade do trato sucessivo no registo da propriedade e permitindo que hoje, no prazo de um mês, se faça aquilo que, até aqui, demorava anos a fazer.
Por outro lado ainda, vai acontecer na linha do diploma, que apenas aguarda publicação e já foi aprovado em Conselho de Ministros, que permite, na constituição de sociedades, um rápido acesso ao Registo Nacional dc Pessoas Colectivas para obtenção do registo da denominação. Não como agora, isto é, a partir de três nomes indicados inicialmente, que poderiam já estar cobertos e justificavam um outro pedido, que, depois, esperaria pela resposta, que era demorada. Após a enuada em vigor do diploma que referi isto poderá ser feito pelo telefone — de uma cabina telefónica, se assim se pretender—, perguntando se a designação está disponível, reservando-a durante 48 horas e confirmando depois a reserva, nomeadamente por telefax, sendo certo que, através do telefax, o próprio advogado pode fazê-lo directamente do seu escritório, do mesmo modo que o notário o pode fazer do seu cartório para o Registo Nacional de Pessoas Colectivas.
Além disso, nesse mesmo decreto, o preâmbulo mostrará que, dentro de algum tempo e em progressão —estas mudanças têm de ser gradativas —, o próprio notário terá um papel determinante, permitindo que a racionalização dos circuitos do Ministério da Justiça, que se ligam a conservatórias do registo comercial, aos notariados e ao Registo Nacional de Pessoas Colectivas, venha a permitir que a constituição de sociedades comerciais passe dos meses de auaso que vai conhecendo em alguns sectores para um período que não ultrapassará 15 dias.
Estas são acções concretas, são medidas tomadas que estão cm funcionamento, e certamente que os Srs. Deputados me farão a justiça de reconhecer que várias outfas foram já tomadas e que são, obviamente, do vosso conhecimento, não havendo, pois, necessidade de estar aqui a referi-las em pormenor.
É neste sentido, e apenas ncsie sentido, que é possível falar numa política de justiça c numa série de programas para a área da justiça. E que, só por si, a política dc justiça pode consubstanciar-se num discurso, enquanto que o programa é, no fundo, a concretização e a responsabilização da acção cm função do discurso previamente elaborado.
Agora, Srs. Deputados, não acredito, nem nenhum de VV. Ex." acreditará, que alguma política dc justiça possa ser conduzida sem um discurso prévio. Aliás, já não é correcto —e isto não representa nenhuma referência a qualquer das vossas intervenções aqui produzidas, mas a outras exteriores que são conhecidas — dizer-se que apenas há um discurso para a justiça, referindo depois somente a palavra c esquecendo, porventura por ignorância, as acções concretas já tomadas ou fingindo que essas acções não estão cm curso ou não decorreram já. Essa é a dimensão de menor Estado na intervenção crítica que se faz quando se pretende, porventura, destruir o próprio discurso para a justiça em Portugal. É que também é natural que, do ponto de vista conjuntural, seja importante que não haja, em Portugal, um discurso para a justiça e que não se afirme, porventura agora, a existência de uma verdadeira política de justiça para o nosso país.
Por outro lado, vivemos, neste momento, a implantação da grande revolução do sistema judiciário cm Portugal, a qual tem que ver com a instalação dos tribunais dc círculo, mas, sobretudo — e volto a sublinhar isto, pois, a partir de algum momento, será pouco correcto fingir que se não conhece essa diferença —, com o facto de que a estrutura fundamental não é a do tribunal de círculo mas a do círculo judicial.
Neste momento, como os Srs. Deputados sabem, a panuda aprovação pela Assembleia da República, esta já cm
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vigor o diploma que alterou a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais e que fez com que hoje já se não divulgue urna opinião crítica relativamente ao problema da acumulação dos serviços nos tribunais de círculo. O problema das competências foi resolvido e está a funcionar naturalmente.
Está também em fase terminal de preparação o respectivo regulamento, que irá introduzir aspectos essenciais de
mudança. Dar-vos-ia apenas um exemplo: é que as secretarias de cada tribunal de comarca passarão a funcionar como secretarias do tribunal de círculo, o que vai permitir que, dentro do círculo judicial, lodos os actos sejam imediatamente praticados pela secretaria do tribunal de comarca respectivo, impedindo a existencia de cartas precatórias, desburocratizando o funcionamento e permitindo a rápida possibilidade dc chegar ao cidadão que tenha de ser citado, notificado ou, de qualquer modo, integrando a posição dc sujeito passivo dc um acto dc comunicação processual.
Mas, mais do que isso, o diploma irá também prever, embora com um ligeiro deferimento no tempo —é necessário alterar a lei do processo civil nesse domínio—, que as próprias secretarias da comarca possam ser receptoras da documentação, o que permite que as partes, nomeadamente os advogados, possam, na sede da sua comarca, entregar a documentação a dirigir ao tribunal dc círculo.
Trata-se dc um dado inovador fundamental, que não custa dinheiro, que não pressupõe a existência dc um financiamento prévio previsto em orçamento, mas que resulta, por um lado, da imaginação de quem quer fazer e — permitam-me a ¡modestia — de quem, no Ministério da Justiça (felizmente, são), conhece o sistema, as suas carências c tem soluções para resolver a maior parte dos problemas fundamentais.
O Sr. José Magalhães (Indep.): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (Indep.): — Sr. Ministro, gostaria apenas de sublinhar o que representa dc distância, cm relação ao modelo originário dos tribunais de círculo, aquilo que V. Ex.° aqui acabou de anunciar.
Na verdade, quanto tempo perdemos, quanta incerteza foi lançada, quanta instabilidade junto dos protagonistas da vida forense e até dos próprios cidadãos sc gerou nestes anos, entre o anúncio do projecto originário — que, aliás, tivemos ocasião de discutir com V. Ex." enquanto director do Centro de Estudos Judiciários e cm termos que, dc resto e na circunstância, foram extremamente úteis — e o resultado que naturalmente representa a tentativa dc colmatar os principais vícios e dificuldades inerentes à ideia de centralização.
Aquilo que V. Ex.°, em tom pacífico, acabou dc anunciar é apenas a quebra da ideia conccntracionária, «totalitária», dos tribunais dc círculo c a manutenção dc prerrogativas e de papel fundamentais para as comarcas.
Dc qualquer modo, o único aspecto que, neste momento, sublinho é o tempo que se perdeu.
Obviamente que isso só pode significar congratulação cm relação ao emendar de müo. Porém, que não se reescreva a história como se tudo tivesse sido projectado regularmente c como se isto não tivesse feito sangue! Com efeito, fez algum (em sentido figurado)...
\0 Orador: — Sr. Deputado, eu lembro a diferença e a distância que vão entre a qualidade que VV. Ex." — não quero, como é evidente, incluir-me aí— têm como políticos eméritos deste país e aquilo que eram no acto em que nasceram. No fim de contas, se VV. Ex." não tivessem vivido a aventura de ter nascido, certamente que não eram hoje quem são.
Risos gerais.
É exactamente o que acontece com o círculo judicial. Este governo teve a possibilidade de dar à luz o círculo judicial, embora, como é evidente, com todas as dificuldades de crescimento que uma aventura de vida e de nascimento sempre impõem. O que é facto é que cá estamos a fazer chegar o círculo judicial ao estado adulto, sabendo que sc não tivesse nascido — eventualmente menos bem, quando nasceu —, estaríamos ainda hoje, porventura, a procurar, na velha e tradicional comarca, a resposta de mudança ao funcionamento do sistema judiciário português.
Portanto, vale a pena valorizar, na perda que o caminho veio determinando, aquilo que é a conquista dcfiniüva e a assumpção da grande revolução do sistema judiciário português. Aliás, como sabem, esta solução é hoje relativamente pacífica c ela será, a meu ver, absolutamente pacífica quando esta ideia do círculo, que não se implementa de um momento para o outro — os Srs. Deputados concordarão comigo — e que é necessário estender progressivamente, estiver totalmente implementada. Quando assim for —o esforço que sc está a fazer nesse domínio é notável — será aqui que está a grande mudança do sistema judiciário e será certamente por esta via que iremos resolver, de uma forma paradefinitiva (infelizmente nunca será definitiva), os problemas totais da administração da justiça pelos tribunais em Portugal.
Agora, o que é facto é que não poderemos ficar — não ficamos, nem estamos a ficar— na ideia de que vamos esperar a implantação definitiva dos círculos para só então ter resolvidos os grandes problemas. E aqui vem à colação a situação daquelas zonas críticas do funcionamento do sistema judiciário em Portugal.
Há um aspecto importante — e sublinho o facto de o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira o ler também referido — e que se inscreve outra vez no discurso de Estado, mesmo crítico, sobre a justiça. É que não podemos dizer, de uma forma ligeira, porventura leviana — c tal não foi dito —, que a justiça funciona mal cm Portugal, fazendo disto uma afirmação de conclusão definitiva.
Sc fôssemos analisar comarca a comarca —esse seria um argumento que eu próprio nâo quereria utilizar, porque é também um argumento sobressimplificante do problema —, diríamos que, na esmagadora maioria das comarcas portuguesas, a justiça responde a tempo e bem. Simplesmente, há zonas críticas, com uma grande dimensão demográfica, onde os problemas se avolumam c onde, realmente, as coisas funcionarão razoavelmente em determinados lados, enquanto noutros funcionam mal.
Neste momento, é possível isolar como zonas porventura mais críticas, pois isto não significa que não haja outras, as zonas de Vila Nova de Gaia, de Almada, do Algarve c a Boa Hora, em Lisboa — portanto, o funcionamento dos tribunais criminais na capital. No entanto, é, ao mesmo tempo c por exemplo, importante verificar que, já no domínio do Palácio de Justiça e, portanto, nos tribunais cíveis dc Lisboa, a resposta se situa, tendo em conta uma
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média europeia e em termos de qualidade, bastante acima daquilo que acontece na generalidade dos outros países.
E isto para não falar no Porto — uma zona que, como sabem, 6 também uma zona complexa do ponto dc vista judiciário—, onde os tribunais cíveis têm o serviço em dia, funcionam normalmente e respondem, com qualidade e rapidez, às questões que nessa área se colocam.
Simplesmente, em lermos de acções concretas para o Porto, onde os sectores do direito administrativo e do direito criminal levantam problemas, vamos ter a funcionar, no fim do mês de Fevereiro, o novo edifício para os tribunais correccionais. Vamos ter, na mesma altura, instalado e a funcionar o novo tribunal administrativo dc círculo e, porque foi já feito o levantamento das carências, vamos instalar mais quatro juízes e mais três magistrados do Ministério Público, o que garante que, no prazo de um ano, o tribunal esteja em dia. Do mesmo modo, concluir-sc-ão as obras no tribunal de São João Novo, o que irá permitir que os tribunais criminais passem, também eies, a funcionar cm termos correctos naquela cidade.
Quanto a Lisboa, posso anunciar-vos que foi ontem aprovada uma resolução em Conselho de Ministros que permite a aquisição de um edifício para instalação definitiva dos tribunais de instrução criminal e do Departamento de Investigação e Acção Penal, quc,: no prazo máximo de um ano, estará concluído e em funcionamento. Trata-se de um edifício em open space, em fase adiantada de construção c que vai resolver definitivamente um problema que ainda há relativamente pouco tempo era considerado como um problema de resolução diferida no tempo e de difícil resposta.
Neste momento, para as zonas críticas que referi, está já em fase adiantada de estudo, porventura envolvendo
vários departamentos governamentais para obtenção de uma
resposta mais célere, a possibilidade da criação de juízos auxiliares — mas através dc uma filosofia nova de tribunal temporário ou tribunal de crise— para trabalharem em Almada, no Algarve, como complemento do Tribunal da Boa Hora c em Vila Nova de Gaia.
Com a publicação do novo regulamento da Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais serão criados os novos círculos judiciais de Loulé e de Famalicão, o que também dará ao próprio Tribunal dc Círculo dc Faro uma capacidade de resposta mais rápida, logo que este venha a ser instalado. Pelo mesmo diploma será também instalado o Tribunal de Menores c de Família-dc-Faro.
Todas estas acções são concretas, de imediatíssimo prazo, não se tratando de meros projectos de intenção a longo termo.
Mas há mais. Sendo certo que vários tribunais ainda têm grandes deficiências de instalações, facto é que, neste momento, decorrem processos de recuperação e dc restauro na esmagadora maioria dos tribunais portugueses. E quando falamos em 1994, tudo isto é a projecção dc variadíssimas acções em curso neste momento.
Certamente que os Srs. Deputados alentaram no desdobramento das verbas do PIDDAC, pelo que terão constatado que, sendo evidente que se trata dc um PIDDAC globalmente reduzido, não deixa de ser dc rigorosa gestão. Este aspecto leva-nos a afirmar que, analisando os programas plurianuais, este PIDDAC permite diferir no tempo a garantia de que, quer no arranque, quer no projecto técnico, quer na adjudicação e início de obra, quer ainda na conclusão da obra, é rigorosamente prevista a linha que vai conduzir à total recuperação do parque judiciário em 1994.
Só que, para o parque estar totalmente recuperado em 1994, é necessário —e está previsto— que, no fim
de 1991, parte significativa deste já o esteja.
Mas porque o Ministro da Justiça não pode, não deve,
nem quer ser apenas um gestor de património, é fundamental que essa política c essa filosofia dc recuperação essenciais sejam acompanhadas de medidas concretas que contribuam para melhorar a qualidade de funcionamento do serviço.
Respondo, agora, à parte da intervenção do Sr. Deputado José Magalhães em que falou na implementação do Código de Processo Penal.
Neste momento, está em fase terminal dc estudo um problema — evidentemente candente, não facilmente resolúvel mas que vai ser resolvido — que tem a ver com a criação dos tribunais permanentes. Isto vai permitir que, na generalidade do País, os tribunais tenham um horário de funcionamento que possibilite que a aplicação do direito processual penal vá ao ponto último daquilo que, no fundo, é a garantia dos direitos c liberdades do indivíduo.
Do mesmo modo está cm fase final de conclusão, e será apresentado a Conselho de Ministros muito brevemente, o diploma que, na prática, vem consagrar definitivamente o que já previa o Código Penal e que tem a ver com o seguro social de apoio à vítima de crimes.
Em casos de crimes graves, sobretudo homicídios c ofensas corporais graves, aquele seguro permitirá a antecipação provisória da indemnização a que a vítima terá direito, sobretudo se vítima de um crime cometido por incertos ou por alguém que não tenha capacidade financeira para suportar a própria indemnização.
Nesta linha inscreve-se, também, a passagem à prática da Lei Orgânica da Polícia Judiciária.
Tive ocasião de falar com os membros da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias aquando da situação de greve ocorrida na Polícia Judiciária. Nessa altura, os Srs. Deputados terão sublinhado que se tratava dc uma demonstração inequívoca do meu discurso de Estado sobte a justiça, porque eu próprio tive o prazer dc tomar a iniciativa dc solicitar a reunião da comissão, a fim de dar--Ihes conta da situação que ocorria naquela polícia.
Essa situação foi superada. Hoje, há um clima de progressiva estabilização na Polícia Judiciária. Relativamente à respectiva direcção, não a tenho como demissionária. O que acontece é que o Sr. Director-GeraJ da Polícia Judiciária, que não pediu a demissão, diz que sairá. Aliás, isso é o que acontece a qualquer director-geral ou membro do Governo. Por exemplo, eu próprio não me considero minimamente demissionário, embora esteja permanentemente disponível para deixar o Governo. Suponho que o mesmo sucederá a qualquer dirccior-geral. Portanto, cabe ao ministro da tutela a decisão dc manter ou dc retirar aquele dirccior-geral.
O actual director-geral da Polícia Judiciária teve um papel muito importante naquilo que foi a grande reformulação, sobretudo no domínio das tecnologias c do preenchimento do quadro de pessoal. E se é certo que na políüca nem sempre há gratidão, é bom que as pessoas que, dc algum modo, não a consideram uma injustiça, acabem por tentar, cada vez mais, essa conciliação entre a política c a justiça.
Por outro lado, ainda neste domínio da criminalidade e da relação directa com o Código dc Processo Penal, neste momento, já está em fase inicial de preparação toda a reformulação da legislação rclaüva à droga. Está em fasR, final de revisão o Código Penal, que será apresentado à
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Assembleia da República durante esta sessão legislativa, e estamos ainda a trabalhar aceleradamente no domínio da previsão da punição ou não e em que termos do cheque sem cobertura.
Relativamente ao sistema prisional, é evidente que um primeiro aspecto fundamental é o de ter uma política para este.
O Sr. José Magalhães (Indep.): — Sr. Ministro, não sei se V. Ex.* tenciona ou não voltar à questão da Polícia Judiciária. É que, se, porventura, considera a questão encerrada, gostaria de lembrar-lhe que deixou cm aberto as questões relacionadas com a expansão territorial c seus critérios objectivos e, também, a questão dos meios para o combate a certos segmentos da criminalidade, designadamente a altamente sofisticada e altamente organizada, cm particular a corrupção. Nessa matéria, ainda hoje os jornais trazem novos dados sobre as carências, designadamente no que diz respeito à dispersão da equipa que tratava dos casos dos escândalos relacionados com o Fundo Social Europeu, etc, etc
O Orador: — Sr. Deputado, eu ainda estava na fase dc intervenção inicial. É que há tanta matéria na área da justiça que, depois, vou demorar algum tempo a responder a cada uma das questões que me foram colocadas.
No entanto, não deixarei cair nenhuma das questões ...
O Sr. José Magalhães (Indep.): — Excelente!
O Orador: —.... só que, infelizmente, é esta a realidade. Há cinco ou seis anos, certamente, haveria pouco a dizer sobre acções concretas na área da justiça, enquanto que, hoje, infelizmente, demoro muito mais tempo. Mas suponho que, apesar de tudo, excluída a maçada dc ouvir--me, há, pelo menos, o gosto, generalizado c por todos nós partilhado, de haver razão para justificar esta minha intervenção mais profunda, embora esteja a fazer uma abordagem superficial e sintética dc cada uma das várias acções que os Srs. Deputados irão conhecendo ao longo do tempo.
Relativamente ao sistema prisional — suponho que, nesse domínio, mais uma vez, os Srs. Deputados partilharão da minha ideia —, é fundamental c muito importante que, antes de reiniciar as acções, seja definida a política respectiva.
Os Srs. Deputados sabem bem que, ao longo dc anos, de décadas, dc séculos mesmo — neste caso, nem estou a exagerar —, sc construiu a ideia de que o sistema prisional é unitário e uniforme.
Pois bem, neste momento, estamos a dar o grande passo no sentido da demonstração clara de que o sistema prisional é pluriforme e diferenciado. É necessário construir um sistema prisional a partir do tipo dc recluso c não incluir todo o recluso no típo único de sistema prisional.
Este é um trabalho que exige reflexão, porque tem de ser rigoroso c, portanto, exige algum diferimento no tempo. Nesta altura os Srs. Deputados sabem e eu próprio lenho o gosto pessoal cm verificar que, no discurso dc algumas outras entidades, aquela classificação já começa a ser conhecida.
Estamos a trabalhar na distinção clara entre a comunidade prisional jovem, a integrada, a tipo e a prisão dc segurança específica. Para isso, encontrámos a imaginação e a plasticidade suficientes para responder, dc forma bastante mais barata, a exigências bastante maiores. Neste
momento está já em fase de arranque o novo pavilhão da Cadeia de Santa Cruz do Bispo, está cm fase de projecto a aldeia prisional de Sintra, que, no fundo, vai ser utilizada como comunidade terapêutica para o problema da toxicodependência, estando também em fase de lançamento a comunidade terapêutica de Santa Cruz do Bispo.
Evidentemente, decorrem ainda outros projectos, como seja o de médio prazo, que tive ocasião de referir e que tem a ver com a instalação da comunidade prisional em São Fiel. Decorre também um outro projecto de curto prazo, para arrancar daqui a 10 meses, que tem a ver com a instalação, em Viseu, da primeira comunidade prisional jovem.
Neste último vai ser tida em consideração toda a temática trazida a esta sede, relativamente ao problema da droga. Mas quanto a esta, explicitá-la-ia quando chegar a altura de responder à questão específica que me foi colocada neste domínio.
Por outro lado, está em curso o processo dc consultas quanto à privatização da gestão das oficinas do sistema prisional. Sc este projecto encontrar acolhimento junto das empresas privadas que estão a ser contactadas, significará também um salto qualitativo, o qual permitirá que, tendo começado mais tarde, tenhamos começado no ponto certo.
Superámos já a ideia da privatização das prisões, que foi deixada cair, mas dela ganhámos o que nos ficou de positivo: a privatização do que é privalizável dentro do sistema prisional. Portanto, isto garantirá, obviamente, não só uma maior remuneração para os reclusos como uma maior capacidade de integração na sua posterior vida livre.
No domínio da reinserção social e sem optimismos exagerados, poderei adiantar-vos que, neste momento, estamos com uma carência de instalações não superior a cinco círculos judiciais. No resto, o Instituto de Reinserção Social está instalado em todo o país, a funcionar e bem.
Independentemente disso, está em curso um projecto que vai fazer a fusão do Instituto de Reinserção Social com a Direcção-Gcral do Serviços Tutelares de Menores. Isto permitirá a intervenção dc um único corpo num mesmo domínio, não a partir da pessoa mas a partir daquilo que é o eventual desvio relativamente à sociedade e a inserção, a socialização ou a reinserção social num meio.
Esta fusão permitirá a rentabilização de custos e da capacidade dc resposta e permitirá que, mais uma vez, o sistema institucional sc prepare para responder ao sistema comunitário.
No próximo dia 5, em sede de Plenário, terei o maior gosto em estar com VV. Ex.** para a discussão, na generalidade, do diploma que, finalmente, cria as comissões de protecção de menores, a fazer proliferar por todo o país. Espero que, nessa altura, aquela minha ingenuidade a que me referi várias vezes c que, progressivamente, tenho vindo a perder, me permita, ainda, contar com uma unanimidade da Câmara. E que creio tratar-se de mais uma medida fundamental, cm termos dc concepção do Estado na administração da justiça, a qual tem sido reivindicada por todas as bancadas do Parlamento e a que, agora, vai ser dada resposta.
Certamente surgirão algumas divergências quanto a pontos de pormenor, mas gostaria muito de poder festejar convosco a possibilidade de, todos juntos e nessa dimensão de Estado, partilhar medidas fundamentais que, também neste domínio, estão a ser adoptadas.
Outro exemplo é o que levará à apresentação em Conselho de Ministros, no início do próximo ano, dc um diploma que altera a legislação sobre adopção. Este diploma
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vem abrir, claramente; o caminho para a adopção internacional e vem criar normas que facilitem o processo de adopção, quando circunstâncias objectivas determinem que essa é a boa solução para as situações concretas.
E que, nesta matéria, o Governo tem como princípio que a regra base é a da paternidade biológica, salvo nas situações de excepção em que, claramente, a adopção é a alternativa àquela paternidade. Nesses casos, o sistema deve estar munido de instrumentos que permitam que, rapidamente, possa chegar-se à adopção, não pondo em causa problemas de normal crescimento' e desenvolvimento da criança que, eventualmente, possa estar sujeita ao processo de adopção.
No domínio da medicina legal, neste momento, há três fases a desenvolver: uma, no imediato; outra, que julgo poder ser a curto prazo, é ainda outra que será a médio prazo, cm termos de desejo de rapidez de solução, embora, porventura, possa considerar-se para' o curto prazo, se quisermos situar-nos cm termos economicistas.
A curto prazo —admitirei um prazo de três meses, embora sem compromisso definitivo, pois, como calculam, estou mais interessado no rigor da solução do que, propriamente, na demonstração clara de que não errei por 15'dias—, haverá a publicação de um diploma pelo qual todo o serviço de medicina legal sairá da tutela dos tribunais, sendo devolvido aos centros de saúde e aos hospitais. Isto significa, por exemplo, que nunca mais teremos a situação degradante de a vítima dc ofensas corporais ser inspeccionada cm pleno tribunal, em cima de uma mesa, ou em péssimas condições de humanidade, sem a possibilidade de ver reconstituída a situação interior
e colocada, apenas, como objecto de uma peritagem.
A partir da aprovação desse diploma, todo o acto de perícia médico-legal passa a ter lugar nos hospitais c nos centros de saúde e virá a ser completado —o que não acontecia até agora — com o acto médico que sc sucederá ao de perícia médico-legal. Portanto, depois de a pessoa ser objecto de um exame, passa a ser sujeita a um trabalho médico de intervenção, que vai reconstituir o curativo e que vai devolvê-la ao exterior com a dignidade humana garantida desde o primeiro momento. Esta é, portanto, a primeira fase.
A segunda fase será a da implementação, progressiva c gradual, de gabinetes médico-lcgais nas sedes dos círculos judiciais, a partir da concepção interdisciplinar do funcionamento do círculo.
Neste momento está em fase adiantada a possibilidade dc instalação do gabinete médico-legal de Faro e estamos a estudar uma idêntica possibilidade relativamente a Penafiel e a Anadia — neste último caso, não o referido gabinete mas a extensão profissional do Instituto dc Medicina Legal dc Coimbra— e, ainda, ao Hospital dc São Francisco Xavier.
Não posso dar-vos prazos para esta situação, visto que pertencem à segunda fase a que, há pouco, mc referi. Portanto, só após a entrada nessa segunda fase poderemos definir com rigor os prazos da sua implantação.
A terceira fase será justamente a da revisão total do funcionamento dos institutos de medicina legal.
Mas porquê a terceira fase, quando actualmente há problemas concretos? Exactamente porque tem de sc partir de um processo indutivo, arrancando daquilo que são os microcosmos dos sistemas de medicina legal em cada comarca para os cosmos intermédios dos gabinetes de medicina legal, pára depois chegarmos à cúpula final dos próprios institutos de medicina legal. De qualquer modo,
o processo dc estudo é, evidentemente, simultâneo. O processo da sua implantação é que terá de ser pro-
gressivo.
No domínio dos registos e do notariado, evidentemente uma área complexa, a perspectiva do Ministério da Justiça, neste momento, desdobra-se também em dois sistemas de intervenção.
O primeiro, mantendo o sistema tal como ele funciona, dirige-se, sobretudo, à melhoria das instalações e aos equipamentos. Sublinharia aqui perante VV. Ex." o facto dc as conservatórias do registo comercial do Porto estarem já condignamente instaladas e ainda sujeitas a um processo imediato de recuperação de espaço para ficarem definitivamente instaladas. Foi também adquirido um edifício para o qual transitarão rapidamente as conservatórias do registo de automóveis do Porto. Nesse domínio, portanto, aquilo que ainda há pouco icmpo era motivação de algumas contestações de rua está resolvido em termos de instalações.
Por outro lado, está a correr neste momento um processo de recuperação de todo o parque de instalações do registo e do notariado da Grande Lisboa, ao mesmo tempo que decorre o processo progressivo da instalação de meios de tecnologia moderna, nomeadamente meios informáticos, através da migração agora para outras áreas do registo predial, da experiência já em funcionamento na Conservatória do Registo Predial de Oeiras. Nas conservatórias do registo comercial dc Lisboa, o processo está já também em fase dc implementação.
Simplesmente, este é o processo que, mantendo o sistema, o melhora no seu funcionamento.
Dentro dc dias, eu próprio ou o Sr. Secretário de Estado— dependerá da opção que considerarmos em função
das delegações de competências —, proferiremos um despacho criando um grupo de trabalho que irá, de uma vez por todas, afrontar o problema dos registos e do notariado cm Portugal e que terá dois mandatos.
O primeiro desses mandatos consistirá em ir produzindo gradualmente e enviando ao Ministro da Justiça todo o tipo dc conclusões que, a pouco e pouco, forem sendo extraídas no sentido de melhorar significativamente, quer do ponto dc vista da exigência, quer do ponto dc vista da formalidade, todos os actos de registo e do notariado actualmente existentes. Tal mandato vai ser feito sem qualquer limitação c, sc a conclusão que vier a ser partilhada por nós for a dc que deveremos optar por mecanismos dc privatização, estamos abertos a fazê-lo.
Entendemos é que a privatização não é uma bandeira, antes devendo ser a conclusão de um processo rigorosíssimo de mudança. Se chegarmos à conclusão dc que esse processo rigorosíssimo dc mudança conduz a soluções de privatização, não leremos dúvidas em o fazer. Não queremos é antecipar, para parecer bem c não frustrar as expectativas imediatas, aquilo que no fundo tem dc ser dilatado no tempo para que seja realmente bem feito, cm vez dc apenas ficar na aparência da respectiva bondade.
Não vos falarei dc toda a vasta acção que está a ser desenvolvida, no âmbito do Ministério da Justiça, em matéria de formação, mas gostaria de referir que, independentemente de todos os circuitos de formação que são conhecidos dos Srs. Deputados, como, por exemplo, o Centro de Estudos Judiciários, a Escola de Polícia Judiciária, o Centro Permanente de Formação de Oficiais de Justiça e a Escola de Administração Penitenciária paia os Serviços Prisionais, eslá, neste momento, em curso, já com sucesso visível imediatamente, uma acção de formação que envolve todos os secretários judiciais dos nossos
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tribunais e que irá versar, sobretudo, as áreas da gestão do tribunal e do atendimento do público, o que vai permitir, por um lado, uma maior rentabilização c economia no funcionamento normal das instalações c, por outro, a abertura, de uma forma mais respeitosa, do funcionamento de um sistema de justiça ao próprio cidadão.
No domínio dos registos e do notariado, terá brevemente início o primeiro curso, a ministrar cm colaboração com a Faculdade de Direito de Coimbra, c está a ser programado um curso de formação dirigido aos oficiais do registo e do notariado.
Antes de dar resposta às questões concretas, e por me parecer que já atingi alguma legitimidade para vos falar, então, de uma acção de longo prazo — que diria antes ser de médio prazo, porque mesmo do ponto dc vista economicista será de médio prazo —, gostaria dc salientar que, dentro de pouco tempo, será criado um grupo ou um conjunto de grupos de trabalho com o objectivo dc laborar na constituição de uma verdadeira revolução na área daquilo que até aqui se chamava «a jurisdição comercial».
O mandato levará pontos de referência, que serão, sobretudo, estes: ultrapassar a própria noção dc direito comercial; partir como ponto de referencia da actividade económica, ela própria considerada; caminhar para a construção de um direito substantivo civil económico, e, simultaneamente com a construção desse direito civil económico, criar um direito processual civil económico que seja determinado exclusivamente por regras dc segurança e certeza, por um lado, e de eficácia c celeridade, por outro, definidas pelo dinamismo da própria actividade económica. Ao mesmo tempo visar-se-á toda a reformulação — também numa concepção de diversidade do sistema c não de uniformidade do sistema — da organização judiciária, caminhando para as unidades de resposta neste domínio, onde funcionem, simultaneamente, tribunais, serviços dc registo c do notariado, centros de peritagem, centros dc arbitragem e gabinetes de consultadoria técnica e jurídica.
Trata-sc, como é evidente, de um processo dc médio prazo, cuja construção e instalação demorará mais de um ou dois anos, mas o que é certo é que não existe nenhum bom sistema de hoje que nào tenha sido anos atrás para ser construído e instalado. Este é o tal momento cm que é importante decidir para o futuro, independentemente dc deixar ou não o nome e a imagem pessoal ligados à relização concreta.
Demoraria muito mais tempo nesta explanação, mas, como tenho o prazer de vir várias vezes à Assembleia da República, terei ocasião de a pouco e pouco ir falando das outras realizações do Ministério da Justiça.
Permito-me dizer, mais com algum sentido dc humor do que com alguma ironia, que, apesar de tudo, há sempre um gosto pessoal em poder ter projectos e capacidade para os conseguir realizar. Creio bem que, se tivermos uma perspectiva dc Estado relativamente ao que, neste momento, se passa na área da justiça em Portugal, teremos, porventura, a preocupação do muito que não está bem, mas também alguma satisfação dc sentir que muito vai estando bem melhor do que há relativamente pouco tempo ainda estava.
É evidente que, ao responder a cada uma das questões que me colocaram, me dispensarei — a não ser que algum dos Srs. Deputados entenda que deverei ser um pouco mais explícito na resposta — de repetir algumas das coisas que disse entretanto c que, aqui ou ali, foram caminhando para a tentativa dc levar ao vosso conhecimento a posição do Ministério da Justiça perante lais questões.
Disse já, referindo-me à questão colocada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, que, nesta pespectiva, o orçamento não é uma desilusão, sendo certo que também não é uma ilusão. É, antes, uma concretização, é a realidade possível para um projecto possível. É o orçamento suficiente para permitir que, na sua ligação à determinação dc fazer, ao envolvimento global dos responsáveis na área do Ministério da Justiça para executarem e, sobretudo, à imaginação — porque muita imaginação é necessária neste domínio—, se execute este projecto para 1991. Tenho, evidentemente, a confiança de que o que formos capazes de fazer em 1991 e o grande sinal dc mudança que, neste momento, é possível dar possam permitir, então sim, que o Orçamento do Estado para 1992 seja um orçamento mais dilatado, porque então também as acções em curso para a realização serão mais exigentes nesse domínio.
É óbvio que o Orçamento cresce menos do que aquilo que é a aparência da simples comparação entre orçamentos do Estado. É igualmente óbvio que, quando analisamos a globalidade do orçamento do Ministério da Justiça, cresce menos.
Há, todavia, um facto para o qual gostaria dc chamar a vossa atenção: é que, a despeito disso, não deixámos de fazer a comparação entre o Orçamento do Estado para 1991 e o Orçamento do Estado, corrigido, para 1990. Do ponto de vista técnico, como sabem, isso é que é correcto, mas, independentemente dc isso ser ou não correcto do ponto de vista técnico, já que viríamos discutir aqui o Orçamento não apenas na sua feitura técnica mas também na sua relação com a política c, assim, na sua relação com a capacidade dc financiamento das acções, nós, mais uma vez na linha da ideia de que as questões têm de ser colocadas seriamente, trouxemos aqui não uma leitura puramente financeira do Orçamento mas, sim, uma leitura política dc programas e dc capacidade de execução de programas. Daí que tenhamos feito a comparação entre o Orçamento para 1991 c o Orçamento corrigido para 1990.
Sc, porém, quisermos analisar a disponibilidade, em termos políticos, de apoio às medidas do Ministério da Justiça, teremos, nessa perspectiva, dc nos remeter a uma comparação entre orçamentos iniciais, sendo óbvio que, nessa altura, a projecção seria significativamente maior.
Por outro lado, o crescimento da verba destinada ao Gabinete de Gestão Financeira, obviamente menor do que a de anos anteriores, tem duas razões de ser. Uma delas, pragmática, consiste, no fundo, na possibilidade de termos feito uma análise orçamental que não subavalia significativamente as receitas, apenas as subavaliando na área de contenção — c essa mínima subavaliação deve ser feita cm qualquer orçamento.
Diremos, pois, que sc uata de um orçamento equilibrado, havendo um decréscimo significativo nas receitas do Gabinete dc Gestão Financeira, o que, aliás, sc pode verificar pela progressão constante da vária documentação que vos foi distribuída.
Há aí, portanto, uma contenção de previsão orçamental que resulta da disponibilidade própria do Gabinete de Gestão Financeira c não dc uma perspectiva política no sentido de diminuir a possibilidade do Orçamento nesse domínio. Ainda assim, porque o orçamento do Gabinete dc Gestão Financeira dc anos anteriores era elevado, o facto dc haver progressão tem dc ser compatibilizado também com a relatividade da elevação que em relação ao Orçamento do Estado tal gabinete permitia.
Nessa medida, creio que não poderemos ter um orçamento dc desilusão, da mesma maneira que não devemos
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ter um orçamento demagogicamente apresentado. Penso que temos um orçamento razoável e possível para determinar a mudança e levar a cabo o conjunto das acções essenciais
que entendemos dever empreender.
No que respeita ao problema dos saldos, diria que eles não vêm aumentando. Infelizmente — tomara eu que assim não acontecesse! — aquele que era apresentado como projecção em Julho-Agosto permite-nos, neste momento, com rigor, ter apenas a noção de que o saldo será, no fim do ano, de 3,4 milhões e não da ordem dos 16 milhões dc contos que admitíamos poder acontecer. Isto por haver, de facto, uma quebra significativa das receitas. Tive ocasião, em reunião com a Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias, dc atribuir essa quebra à época que na altura vivíamos (estávamos no Verão e é tradicional registar-se todos os anos, em Agosto e Setembro, uma significativa quebra de receitas). O que é facto é que essa tendência não só se manteve como baixou. Neste momento, há também, portanto, uma significativa quebra na previsão do saldo.
Relativamente ao PIDDAC e às chamadas «dotações incompreensíveis», como o Sr. Deputado teve ocasião dc referir, V. Ex." isolou a informatização do registo civil c constatou nessa área a existência de 1000 contos em 1989, também 1000 contos em 1990 c ainda 1000 contos em 1991. Efectivamente assim é. Simplesmente, temos dc fazer agora uma perspectiva global da informatização dos registos e do notariado. Nessa perspectiva, constatamos que temos o registo civil, de uma maneira universal, a funcionar normalmente e a responder praticamente no próprio dia e sem atrasos significativos.
Entendemos, pois, que deveríamos canalizar o investimento mais para a área do registo predial e do notariado. Se a previsão global é de 261 000 contos, a globalização da previsão para os registos e do notariado é também, portanto, dc 261 000 contos.
A questão dos 1000 contos previstos para o registo civil, colocada pelo Sr. Deputado, surge efectivamente como um bom exemplo e uma boa questão, cujo esclarecimento é importante, mas não como uma demonstração de ineficácia da intervenção do Ministério na área dos registos c do notariado. Ela está já em curso, aliás, nos registos centrais em Lisboa e é essa implementação que irá permitir não só aquela atribuição de previsão cm PIDDAC dc 261 000 contos como também a garantia da sua execução.
Em relação aos bairros para funcionários dos estabelecimentos prisionais, tomara cu que, mesmo que fosse com prefabricados, pudesse ter 2000, 3000 ou 4000 contos!... É evidente que assim não sucede. O que acontece é que este é exactamente um dos casos típicos em que temos uma primeira previsão dc PIDDAC no sentido dc avançar para a constituição dos bairros para funcionários dos estabelecimentos prisionais. Se este fosse um orçamento para os próximos cinco anos, estaria perfeitamente de acordo com a preocupação do Sr. Deputado. Trata-se, contudo, dc um orçamento para 1991. E óbvio que nesta matéria o orçamento para 1992 será bastante mais expressivo, porque, nessa altura, estaremos já na fase das construções c do desenvolvimento da implantação dos bairros para os funcionários dos serviços prisionais.
No que sc refere ao acesso ao direito, colocou v. Ex.1 a questão da multiplicação por nove c por três, mas suponho que deixei respondida esta temática na minha intervenção inicial.
Relativamente ao Boletim do Ministério da Justiça, tem V. Ex." toda a razão, porque, de facto, esse 6 um dos
problemas de muito mau funcionamento na área do Ministério da Justiça, cm relação ao qual assumo, quer a conclusão quer a responsabilidade pela situação. Dou, evidentemente, uma explicação e espero que, dentro de muito pouco tempo, tenhamos a questão totalmente resolvida. Porque este atraso se veio verificando progressivamente, ia-se tendo a noção, à medida que ia aumentando o atraso, de que se estava num nódulo que leria de ser suprimido, cm vez de simplesmente modificado.
O que, neste momento, está em estudo — e creio que, por já nos encontrarmos numa fase final desse estudo, a solução poderá ser alcançada senão ainda este mês pelo menos no mês dc Janeiro— é a reformulação total da filosofia do Boletim do Ministério da Justiça. Tentaremos caminhar para a publicação dc lodos os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, porque a própria vivência democrática assim o exige c para que toda a gente conheça iodas as decisões do Ministério da Justiça.
Tentaremos caminhar para a publicação de todos os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, porque a própria vivência democrática assim o exige, para que toda a gente conheça todas as suas decisões. Isso passará por um boletim mais informal, um boletim de informação, mas de informação muito mais voltada para o conteúdo da informação do que para a demonstração exterior, formal e gráfica da informação. Vamos utilizar um sistema que é já utilizado em toda a parte, ou seja, a folha policopiada, que é distribuída profusamente.
Podemos até informatizar o sistema e, a partir daí, teremos informatizada a informação de todos os acórdãos do Supremo Tribunal dc Justiça. Por essa via, o Boletim do Ministério de Justiça passará, provavelmente, a ser Irimcnsal e incluirá os estudos c a problemática própria da justiça, deixando dc ser apenas um boletim informativo cm matéria de jurisprudência.
O atraso na solução de um problema grave é aqui, se me permitem, legitimado pela procura alternativa de uma solução que leve a uma outra realidade e não à manutenção, menos má, de um sistema que se deixaria funcionar como tinha funcionado até aqui.
Relativamente à intervenção do Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, depois dc supor que V. Ex.° já tenha, outra nçx, reactivado a sua esperança no actual Ministro da Justiça e de admitir que, afinal dc comas, a expectativa pode continuar a ser gerida, não vou ao ponto de lhe pedir que acabe por decidir, com trânsito cm julgado, que afinal valeu a pena c que este Ministro da Justiça já fez muito, mas, na intimidade da nossa relação, porventura V. Ex.° não deixaria mesmo de o reconhecer. Permita-me que eu seja o primeiro a aceitar que esta Comissão não seria o local adequado para esse reconhecimento.
Agora do que não há dúvidas é que, havendo grandes expectativas para 1994, há também grandes expectativas para 1991, que são todas estas que cu acabei de referir, que são muitas e que são novas, sendo importante a nota da novidade. Porque a ideia clara do Ministério da Justiça não é a dc fazer funcionar melhor o que está, é deixar o que está bem — que esteja — c fazer funcionar diferentemente o que estava c, portanto, a novidade 6 fundamental porque é assim que sc afirmam polílicas e é assim que se dá expressão dc futuro a essas políticas.
Com efeito, o que sc vai fazer em 1991 é também a garantia clara, a somar às garantias que já vêm dos anos anteriores, dc que, dc facto, 1994 será, sobretudo na área do parque judiciário — foi para aí que cu projectei 1994, porque tudo o resto, dc uma maneira geral, estará
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conseguido antes disso, embora não tudo cm 1991 —, uma perspectiva da concretização da esperança c, ao mesmo tempo, dc manutenção da esperança. Eu n5o acredito muito na esperança que se esgota. No que acredito c na esperança que se vai alimentando, progressivamente, e que vai possibilitando que cada realização concreta permita projectar, para o futuro, uma melhoria ainda mais significativa dos sistemas que temos por missão gerir.
Fico feliz por verificar que a preocupação do Sr. Deputado é, agora, sobretudo — e 6 uma preocupação que eu partilho, embora sem pessimismo — a da preparação dos nossos funcionários para poderem intervir nas novas tecnologias. Repare, Sr. Deputado, como esta preocupação de V. Ex.", que é uma preocupação legítima, 6 já também a confissão da acção concreta. V. Ex.*, neste momento, está preocupado em saber como funciona o novo sistema, já não está preocupado com aquilo que há-de ser o novo sistema.
Neste momento V. Ex.* tem os telefaxes, tem a gravação audio, tem os micros — não os tem agora mas vai lê-los a breve trecho — c, portanto, a sua preocupação é saber como rentabilizar tudo isso. Essa também é a nossa preocupação c daí que as adjudicações para instalação dos micros tenham garantido logo a formação, no próprio local, aos vários funcionários que vão estar envolvidos.
No domínio do telefax espero que a capacidade pessoal dos nossos funcionários seja suficiente para o fazer funcionar. Já pedimos aos vários tribunais para começarem a fazer o levantamento dc todo o lipo de documentação que pode passar a ser comunicada por telefax para, assim que for publicado o diploma específico da lei do processo que vem permitir a utilização do telex c do telefax para a comunicação dos actos, podermos gerir alguma disfunção que, eventualmente, venha a acontecer. Isto é, se o telefax estiver montado antes dc publicado o diploma, c evidente que todos estuo de acordo em que há uma área imensa da documentação que pode, perfeitamente, passar a ser comunicada por fax, independentemente da comunicação dos actos específicos do processo. Está também cm fase final o diploma que o vai permitir e isso vai, obviamente, levar-nos a uma situação de grande melhoria c dc grande solidariedade no funcionamento do sistema.
É evidente que, quando da instalação do sistema dc gravação áudio, iremos ter os processos dc formação concomitantes. Aí pode acontecer —c cu antecipo uma critica que pode ser dirigida ao Ministério da Justiça e com a qual conviverei bastante bem — que ainda seja necessário legislar mais profundamente, quer no âmbito do processo civil quer no âmbito do processo penal, sobre a utilização do sistema áudio.
Neste momento não estou preocupado, dc uma forma constrangedora, quanto a ler isso já cm funcionamento logo que esteja instalado o sistema áudio. O importante é que há condições para instalá-lo, o importante é que ele c fundamental, o importante é que cie é exigido há muito tempo e lemos de avançar para a sua instalação.
Estamos, obviamente, a trabalhar na revisão das leis do processo civil c do processo penal. Espero que elas sejam concomitantes, mas não ficarei excessivamente preocupado sc não houver essa concomitância, embora não possa é haver uma dilação que torne o sistema apenas uma peça dc adorno do tribunal c que, por isso, não venha a ser utilizado. Aí é importante que todos nós, e aqueles que trabalham no terreno, tenhamos a noção de que há um período de experimentação, onde vai, porventura, haver falhas, onde vai haver algumas dificuldades. Estaremos,
nessa altura, no fundo, a viver a crise da novidade c do crescimento, mas já teremos deixado dc lamentar-nos por aquilo que não muda c que cria uma sensação dc depressão na gcslão do sistema judiciário.
Já falei do problema das zonas críticas c da resposta que o Governo está a preparar nesse sentido, como já falei também da desburocratização dos registos e do notariado.
Relativamente ao problema dos emolumentos, evidentemente que tudo isso está também relacionado com a temática inicial, ou seja, a definição do regime financeiro do Ministério da Justiça.
Temos, evidentemente, de caminhar, por um lado, para uma nova perspectiva do funcionamento dos registos e do notariado — aliás, o grupo de trabalho que referi há pouco não deixará, logicamente, de tocar nestes elementos — e isto passa tudo pela temática da maior ou menor privatização dos registos e do notariado e, portanto, o problema será analisado aí.
Neste momento, como é evidente, não há condições para fazer uma redução nesta área. No entanto, ela não deixará dc ser tomada cm consideração, do mesmo modo que o problema das custas judiciais será dc novo trazido à colação deste domínio quando houver uma reformulação do processo civil, que está a decorrer e sobre a qual lerei ocasião dc falar já dc seguida.
Relativamente à questão levantada pelo Sr. Dcpulado José Magalhães sobre o problema dos saldos c da diferença existente entre o projectado c os saldos obtidos, é evidente que cies resultam dentro da oscilação do próprio sistema. Desde logo porque todas as quesiões que o Sr. Dcpulado colocou — e que são questões que têm toda a legitimidade c toda a correcção— deixam a dificuldade de resposta que resulta da situação, ainda não definitivamente resolvida, da posição do regime financeiro do Ministério da Justiça.
Temos, pois, como pano de fundo, a situação que tive a ocasião dc expor inicialmente — que, obviamente, não posso deixar dc assumir aqui perante vós — c as várias questões que V. Ex.* colocou decorrem dessa indefinição ainda existente no domínio do regime financeiro do Ministério da Justiça.
Todavia, V. Ex.' foi o primeiro a reconhecer que através quer dos contactos progressivos que são estabelecidos com a Assembleia da República, quer da documentação que foi trazida há uma diminuição da margem de indefinição. E óbvio que, depois, as questões que colocou são aquelas que sc mantêm no domínio dessa margem de indefinição.
E evidente que o problema da previsão dos saldos, porque está ligado ao problema de previsão dc receitas, tem o constrangimento da maleabilidade dessa previsão de receitas, nomeadamente cm tudo o que sc passa na área do registo c do notariado, que é, justamente, onde sc coloca o problema da unidade c da universalidade do orçamento c, portanto, só através da instalação dos respectivos serviços orçamentais c do seu funcionamento poderemos ter uma garantia rigorosa dc toda a receita a recolher, para também podermos ter uma projecção rigorosa do saldo final a apurar.
Rcsla-mc, apenas, dizer que é justamente pelo facto das questões que V. Ex." nos pôs terem legitimidade que temos dc fazer a mudança. Estamos a fazer essa mudança e espero que na discussão do próximo Orçamento de Estado o problema esteja definitivamente resolvido.
0 Sr. José Magalhães (Indep.): —Não pode ser mais específico quanto às aplicações financeiras?
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O Orador: — Sim, sim, mas falaria das aplicações financeiras um pouco mais adiante.
De qualquer modo, posso dizer-lhe que a informação concreta que tenho, neste momento, é a de que, por exemplo — c julgo que V. Ex.* se refere aos depósitos a prazo que resultam dos saldos existentes —, recentemente, justamente por razüo da diminuição das receitas, houve necessidade de fazer um levantamento de 3,4 milhões de contos nessa área dc suporte e dc balanço, para essa previsão das receitas. Como a receita veio baixando, progressivamente, para aquém da previsão inicial, é justamente essa verba a prazo que permite resultar aqui como consequência da aplicação financeira interna.
É também por haver essa indefinição que não podemos utilizar esse suporte financeiro disponível, dirigindo imediatamente acções concretas, pois temos de ler esse balanço final para sabermos até que ponto podemos ter acesso a ele para garanür a possibilidade da gestão global do Ministério da Justiça
O Sr. José Magalhães (Indep.): — Sr. Ministro, esse é o nosso problema fulcral, é isso que os nossos colegas da Comissão de Economia, Finanças e Plano têm mais dificuldade em perceber, pois é um sistema que viola, desde logo, as regras basilares em termos de estrutura do Orçamento de Estado, tal qual ela flui da própria Consütuição.
Compreendo que representa uma apreciável margem de manobra e que não é por acaso que os cofres não são reformados e que este sistema não foi substituído, até agora, por um outro. É que ele confere uma apreciável flexibilidade, mas também confere uma apreciável indefinição e, logo, uma correspondente impossibilidade de fiscalização por parte da Assembleia da República e coloca também problemas com a Direcção-Geral da Contabilidade Pública e com o Ministério das Finanças. Isto é, há ali um reservatório dc contornos relativamente indefinidos, que no passado assumiu foros de escândalo e originou, aliás, as correspondentes medidas, que foi, ulteriomente, tendencialmente corrigido, mas que nos surge ainda com a apreciável flutuação que V. Ex.', muito rigorosamente — e sem ironia —, acabou de situar.
A situação, por exemplo, da entrega de «trocos» em relação a centenas de serviços é uma situação absurda! ... E, além dc mais, ilegal, como é óbvio! Mas, além de ser ilegal, é sobretudo absurda!
Não é possível fazer uma gestão moderna, racional, razoável, nesses parâmetros. Não é possível!... V. Ex.* não pode responder, rigorosamente, pelas receitas! ...
Por outro lado, há activos imobilizados no valor dc muitos milhões dc contos c, por outro lado, não sei sc a políüca dc aplicações financeiras é do nosso tempo! ... Parece-me que é uma perda de recursos, em muitos domínios. Precisaria, naturalmente, de ter mais dados sobre o assunto para poder dizer isto com toda a segurança e com lodo o ênfase, mas creio que isso é preocupante.
O Orador: — Sr. Deputado, não estou preocupado, no Ministério da Justiça, em mudar o que está bem!...
O Sr. José Magalhães (Indep.): — Claro! ...
O Orador: — Se, neste momento, a preocupação do
Ministro da Justiça é mudar essa situação é porque, evidentemente, cia não eslá bem.
E é óbvio que as questões que V. Ex.° colocou são questões pertinentes para as quais a resposla é, exactamente.
a resposta do fuluro imediato, ou seja, a da modificação do regime financeiro do Ministério da Justiça.
Devo dizer-lhe que eu próprio, neste momento, preferiria — e é nesse sentido que caminhamos —, por todas as razões e logo por razões de ética de gestão, ter um sistema muito mais rigoroso na previsão das receitas do que ter um sistema pouco rigoroso na previsão global das receitas e que, portanto, me obriga a ter fundos imobilizados para poder cobrir o que possa ser, entre a previsão e a concreta cobrança das receitas, o défice que daí resulte.
E óbvio que estamos todos de acordo quanto à necessidade de mudar, que estamos todos dc acordo quanto ao não funcionamento correcto do actual sistema, mas também estamos de acordo relativamente a dois pontos: o primeiro é que, progressivamente, mantendo a incorrecção inicial, o sistema tem sido melhorado, tem sido transparente e a preocupação éúca que está por trás tem sido claramente trazida à superfície por nós próprios e o segundo é que estamos agora numa fase final de regulação definitiva.
Poderei dizer —e assumo a responsabilidade— que, perante a necessidade dc acelerar muito mais este processo e a necessidade de pôr em funcionamento o sistema global da jusüça, dei prioridade a esse outro. Se não tivéssemos implementado todas as medidas que estamos a implementar, se não tivéssemos desenvolvido um esforço grande para fazer funcionar o sistema global c se cu me tivesse preocupado mais prioritariamente com esta área, teríamos hoje, porventura, este problema resolvido ou cm vias imediatas de solução, mas Unhamos atrasado, provavelmente mais um ano, a mudança do sistema de justiça.
Foi essa a prioridade por que optei, assumo-a claramente! Tinha dc optar entre duas situações, ambas cons-trangentes c ambas exigentes. Decidi optar por aquela em vez desta e trazer à Assembleia da República o trajecto e o caminho que estamos a percorrer, neste momento, para resolver esse tipo dc situação.
V. Ex.° colocou, depois, duas questões fundamentais, uma das quais tem a ver com o atraso na resolução dc problemas estruturais. Quanto ao problema das instalações, dado que tive ocasião dc responder anteriormente, espero que possamos passar-lhe por cima.
Relativamente às casas dos magistrados, estamos a estudar, neste momento, nomeadamente com as associações sindicais, um sistema totalmente diferente de atribuição de casas ou de subsídios aos magistrados.
O que começa a prefigurar-sc, na nossa perspectiva, é algo de que eu posso deixar alguns tópicos essenciais. A primeira hipótese que se põe é a de caminharmos, progressivamente, para um sistema que não seja o da atribuição da casa propriamente dita, ou seja, no fundo, manter o património que o Ministério da Justiça tem, neste momento, e geri-lo correctamente, nomeadamente dispensando o magistrado do pagamento dc renda ainda que simbôüca.
Portanto, não sc desenvolveria o sistema em que o Ministério da Justiça concede casa ao magistrado para habitar e introduzia-se um outro sistema de subsídio, calculado não uniformemente a partir deste, mas, sim, através dc vários padrões convergentes, como seja a fixação dc plafonds fictícios de rendas para várias zonas do País, o desconto percentual do respectivo vencimento do magistrado e a cobertura da diferença por parte do Ministério da Justiça.
Isto criaria um sistema geral e abstracto aplicável a todos, objectivamente conhecido, que aumentaria a participação do Ministério da Justiça e que flexibilizaria a situação em função das diferenças existentes no mercado
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de habitação nas várias regiões do País. É um trabalho que está cm curso, feito conjuntamente com as respectivas associações e esperamos chegar rapidamente a bom termo.
Admitimos também a possibilidade dc, paralelamente — mas, porventura, já no âmbito dos serviços sociais do Ministério da Justiça —, vir depois a considerar outro tipo de soluções para a temática global da habitação.
Quanto às condições de trabalho dos magistrados, é evidente, Sr. Deputado, que se isolarmos as situações onde há más condições de trabalho para os magistrados, então só encontraremos esses casos. Mas, mais uma vez aqui, temos dc ter uma visão universal e, ao mesmo tempo, dinâmica do sistema.
Temos hoje, felizmente, muitos tribunais com instalações e condições de trabalho excelentes. Há pouco tempo tive ocasião de visitar — e refiro este exemplo porque o visitei, mas, felizmente, há muitos outros— todo o distrito da Guarda, que, cm termos do Ministério da Justiça, é composto por 12 concelhos e 11 comarcas. Em todo o distrito da Guarda há três situações negativas, mas todas elas já cm fase de solução, isto é, já com projecto concluído ou adjudicação feita. Em todos os outros casos, as instalações são excelentes e funcionam bastante bem. Em alguns casos, é necessário fazer algumas obras dc recuperação, mas, como VV. Ex." sabem, nós criámos — c essa foi mais uma acção concreta— equipas móveis de conservação, que vão actuar a montante, portanto nos tribunais que estão bem instalados e a funcionar, para impedir a sua degradação.
Esse é também um projecto e um programa que vai contribuir para a recuperação definitiva e para a concessão de reais condições dc trabalho. É óbvio que há algumas situações cm que esse constrangimento existe. Todos nós as conhecemos e é para elas também que estamos à procura de soluções.
Posso dar-vos, todavia, um exemplo que mostra a dinâmica verdadeiramente notável, que não posso, apesar de tudo, deixar de reconhecer, embora não a auibua a mim próprio, do Ministério da Justiça, que é composto pelo Ministro e por uma quantidade imensa de pessoas extraordinariamente empenhadas. É em nome dessas pessoas que refiro aqui aquilo que é a dinâmica hoje verdadeiramente notável do Ministério da Justiça.
A situação concreta de Setúbal é disso um bom exemplo: o problema de Setúbal já se arrastava há muito tempo. Pois bem, na reabertura dos tribunais, portanto após as férias, visitámos o tribunal de Setúbal, onde estavam a decorrer obras de readaptação e de restauro de todo o edifício. Deixámos aí a maqueta para o novo Palácio da Justiça e anunciámos que essas obras se iniciariam no primeiro semestre deste ano de 1991. Pouco tempo depois disso surgiu a notícia de que, mercê das obras dc recuperação que estavam a decorrer no tribunal de Setúbal, tinha caído do tecto um pouco de estuque que atingiu uma senhora.
Ora, tendo este acidente levantado a questão de haver, eventualmente, alguma insegurança na manutenção dos serviços naquele local, o tribunal foi, apenas no espaço dc um mês, transferido para as instalações já adquiridas para a instalação do tribunal de circulo, que, por sua vez, foram sujeitas a obras urgentes. Portanto, neste momento, todo o tribunal está a funcionar num outro local.
Contudo, é curioso mas ainda há relativamente poucos dias um determinado responsável deu como exemplo do mau funcionamento dos tribunais o tribunal dc Setúbal,
que, nessa altura, já nem sequer se encontrava a funcionar
nesse local... Depois, esse mesmo responsável teve de procurar uma outra situação, porque aquela já não era exemplo!...
Quer dizer, até já vamos mais depressa do que o próprio discurso, isto é, quando alguém discursa sobre uma realidade, já podemos dizer que ela mudou, o que significa que temos alguma falência dc informação quanto àquilo
que se vai dizendo.
Essa situação é uma demonstração daquilo que é possível fazer quando há, dc facto, uma dinâmica dc mudança. Como é óbvio, as obras dc readaptação estão a ser concluídas e o tribunal regressará ao seu local inicial até estar pronto o novo tribunal (o que se espera que venha a acontecer dentro dc dois anos). Nessa altura, será instalado o tribunal dc círculo naquele que agora está ocupado pelo tribunal de comarca.
Por outro lado, hoje, há obras na maioria dos tribunais. Portanto, não sc trata dc um processo vertical, cm que se escolhem cinco ou seis zonas de intervenção; é um processo horizontal, com várias obras de recuperação em vários tribunais.
Nas regiões autónomas a situação é, felizmente, bastante diferente daquela que o Sr. Deputado trouxe aqui como preocupação (suponho que, no fundo, era uma preocupação solicitando uma informação e não tanto uma preocupação de crítica imediata).
Na Madeira, neste momento, temos cm curso — como, aliás, já foi dito aqui pelo Sr. Deputado Guilherme Silva — não só a solução do edifício 2000 como as obras para Ponta do Sol e Porto Santo, além dc outras que sc prendem com a área de registos c do notariado, onde, aliás, está agora a fazer-sc uma informatização que envolve não só o Ministro da República como também os próprios advogados locais, os conservadores e notários locais, criando ali uma experiência piloto, que depois poderá c deverá ser extrapolada para os Açores c para o continente.
Nos Açores já foi inaugurado o tribunal da Horta; está cm vias dc ser inaugurado, muito brevemente, o da Praia da Vitória e o da Povoação; quanto a Vila Franca do Campo e Ribeira Grande já estão em execução os projectos que vão levar à sua realização relativamente próxima; está cm negociação a aquisição de terreno para o tribunal da Graciosa e cm inicio dc elaboração o projecto para Santa Maria.
No fundo, nós não podemos faz.cr uma leitura directa entre o que está mal e a ausência dc resposta do Governo da República. Temos é de fazer a leitura enue o que está mal, o que está novo, o que está cm vias de e aquilo que se encontra no inicio do projecto.
Há, pois, uma preocupação para as regiões autónomas, que não é, evidentemente, menor do que aquela que dirigimos ao continente. Por outro lado, cm Ponta Delgada foram já adquiridas novas instalações para o tribunal dc trabalho; para Nordeste estão a ser melhoradas as instalações e cm Lagoa vai ser iniciado o respectivo projecto.
Portanto, para as regiões autónomas há exactamente a mesma perspectiva horizontal dc intervenção que há para o continente.
O Sr. José Magalhães (Indep.): — Sr. Ministro, eu aludi à análise dos quadros I e n, que se encontram anexos ao ofício da Secrctaria-Gcral do Ministério, relativos à construção e gestão das instalações. No quadro I faz-se referencia às situações dc Porto Santo e da Ponta do Sol, não sc aludindo a qualquer outra; no quadro n, relativo ao
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arranque de novas instalações, não é feita qualquer referência as obras que agora mencionou, por razões que tem a ver com a diversidade do estádio de implementação,
que cm alguns casos 6, como sc pode ver pelo que
mencionou, extremamente incipiente.
O Orador: — Sim, Sr. Deputado, mas todas as instalações começam por ter uma fase incipiente, que é a que diz respeito à procura de terreno, à elaboração do projecto. Mas, Sr. Deputado, o procurar o terreno é, no fim de contas, o início da instalação.
O Sr. José Magalhães (Indep): — Sabemos que sim, Sr. Ministro, só que suponho que isto ultrapassa o horizonte de 1994 que V. Ex.° mencionou (a não ser que não represente, caso que imporia registar).
O Sr. Ministro da Justiça: — Em princípio não, Sr. Deputado, porque esse horizonte de 1994... Repare, Sr. Deputado, esse tipo de construções inscreve-se numa área com capacidade dc resposta bastante grande. Posso dizer-lhe, por exemplo, que ainda há relativamente pouco tempo tive ocasião de lançar a primeira pedra do Tribunal de Alvaiázere, que estará concluído este ano. Portanto, há resposta para um determinado tipo de construção e que é o de capacidade rápida. Portanto, o facto de, hoje, estarmos à procura de terreno não impede que a construção esteja concluída até 1994. Significa é outra coisa: é que quando falamos de arranque de instalações já não estamos a inscrever estas situações em que se procura o terreno, equipas para elaborar o anteprojecto, etc, porque entendemos que a capacidade de resposta já é tão grande que não vale a pena ter esta tentação dc mostrar quantidade. Hoje, o rigor é perfeitamente demonstrável. Aquilo que virá a ser apresentado, explicitamente, para o ano já está a funcionar nesta altura. Só que, Sr. Deputado, não há necessidade de incluí-lo! Isso seria, porventura, fazer propaganda. Neste momento, ela é, felizmente, desnecessária na área do Ministério da Justiça.
Portanto, a preocupação nacional existente dc haver uma menor intervenção nas regiões está ultrapassada. Aliás, neste momento, estamos mesmo a estudar a possibilidade de criar c instalar — instalação essa que ocorrerá mais tarde c que resultará apenas da análise quantitativa da resposta — os tribunais administrativos de círculo das duas regiões autónomas.
Por outro lado, o Sr. Deputado falou de algumas situações dc crise, ou de algumas crises que ocorrem no sistema de justiça, entre magistrados, entre a Polícia Judiciária e a magistratura, falando na ausência dc reformas estruturais. Creio que algumas das situações que têm vindo a público resultam dc vários fenómenos, alguns deles, felizmente, perfeitamente à margem do Ministério da Justiça. E digo «felizmente» porque isso contribui para o conecto funcionamento das instituições. Como é evidente, a independência do poder judicial tem dc ser assumida na sua totalidade c é óbvio que o poder judicial, como poder de Estado que é, tem também, porventura, as suas «mortes» internas (como tem, aliás, o poder legislativo, o executivo, o Presidente da República, c, enfim, todos os órgãos de soberania). E mal seria se o Ministério da Justiça interviesse nesse domínio!... Agora, é importante saber quais dos problemas que sc geram dentro dc um órgão de soberania podem, eventualmente, ter a sua raiz num outro órgão dc soberania, portanto, c no caso concreto, no Governo c, especificamente, no Ministério da Justiça. Ora, creio que,
neste momento, há algumas questões que podem suscitar debates, confrontações de ideias, mas isso é salutar porque é a partir daí que os sistemas podem melhorar e progredir.
Estou alento ao que está a acontecer, no domínio das
várias magistraturas, quanto a essas manifestações dc diversidade de opinião. Naquilo que for da área de intervenção do Ministério da Justiça não deixarei dc tomar (consensual ou não consensualmente, quando for caso disso) as medidas que considerar adequadas.
Posso dizer-vos, por exemplo, que, neste momento, está em discussão o estatuto dos magistrados judiciais e apresentarei dentro de muito pouco tempo à Assembleia da República uma primeira revisão da Lei Orgânica do Ministério Público a fim dc fazer o ajustamento às alterações constitucionais que entretanto ocorreram. Como sabem, também nesse domínio discutem-se questões com projecção constitucional; portanto, será interessante fazer aqui esse debate não apenas na perspectiva constitucional, que, como é óbvio, não é menor, mas também na perspectiva dc política de funcionamento do sistema de justiça.
A relação entre a Polícia Judiciária e a magistratura foi claramente melhorada com a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, na medida cm que aí ficaram definidos pontos essenciais para o funcionamento dc um qualquer sistema democrático. Em relação a isso, Srs. Deputados, peço-vos que me permitam ter algum orgulho, porque, no fundo, era cu o Ministro da Justiça c a Polícia Judiciária dependia directamente de mim; mais uma vez, a dimensão dc estado da justiça presidiu à feitura daquela Lei Orgânica. Das mãos do Ministro da Justiça saiu uma intenção de controlo directo sobre a Polícia Judiciária.
Portanto, aquilo que nunca foi considerado, pelo menos cm termos dc debate público, uma verdadeira questão estrutural do regime democrático ficou consagrado na Lei Orgânica da Polícia Judiciária; ficaram também clarificadas as relações a estabelecer entre a magistratura judicial, a magistaiura do Ministério Público e a Polícia Judiciária. Como é evidente, é um processo que tem os seus contenciosos, que não é de fácil gestão, mas que vai, progressivamente, melhorando. Hoje, podemos verificar que a situação é diferente —mas para melhor! — do que era ainda há relativamente pouco tempo. E é óbvio que melhorará ainda mais quando conseguirmos, a partir da nova lei orgânica e daquilo que é a coordenação cada vez mais necessária e conseguida dos vários órgãos de polícia criminal sob a direcção funcional do Ministério Público, a resposta total à dimensão dos quadros c à própria reestruturação da Polícia Judiciária. São, portanto, problemas que estão a ser analisados, para os quais se estão a encontrar respostas. Mais uma vez ai a Lei Orgânica da Polícia Judiciária surge como uma das necessidades premcM&s, repetida ao longo dos anos. Esta foi mais uma acção concreta conseguida no âmbito do Ministério da Justiça.
Relativamente às reformas que teve ocasião de referir, diria o seguinte: quanto à aplicação da lei processual penal, não sei sc a intervenção que fiz anteriormente foi suficiente para responder a algumas das questões que colocou. Suponho que a questão que referi relativamente aos tribunais permanentes, bem como aquela que se prende com o parque judiciário, c que tem a ver com a instalação do tribunal dc instrução criminal e com o DIAP em Lisboa (mas que depois será transferido para o Porto), respondem, cm termos instrumentais, àquilo que sc considera poder ser, desde que os instrumentos operativos estejam a funcionar na proporção daquilo que são os pressupostos da própria lei, uma boa lei processual penal.
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É nesse senlido que se está a caminhar c estas são as acções concretas.
Porventura, o Sr. Deputado terá outro tipo de questões a colocar.
O Sr. José Magalhães (Indcp.): — Sr. Ministro, creio que estamos um pouco balizados pelo tempo para podermos aprofundar este debate, que seria, obviamente, gostoso c que duraria não só o dia como, provavelmente, o fím-dc--semana.
A única coisa que queria saber é se isso pressupõe um compromisso em relação à resolução das questões remuneratórias associadas ao funcionamento dos tribunais permanentes. Como sabe, as experiências existentes que visam assegurar as normas constitucionais têm funcionado na base da dádiva — mas menos dádiva do que se julga — de magistrados e funcionários. Isso é grave e insiabilizador, Sr. Ministro! Suponho que isso representa um compromisso da parte do Ministério.
O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Deputado, a solução ainda não foi encontrada, porque esse é o problema principal, mas não é, com certeza, por falta de agentes de intervenção. E, obviamente, uma solução dessa natureza pressupõe um esforço financeiro muito grande. E aí estamos a jogar, justamente, com a capacidade de, por um lado, ter esse suporte e a capacidade imaginosa, por outro, porque, como calcula, infelizmente, nós não temos isso, pelo que, suponho, estamos todos de acordo, também. E que nós não temos possibilidade de ter a quinta essência dos sistemas porque os sistemas, no fundo, são relativizados à capacidade global dos próprios países onde eles têm dc ser implementados.
Suponho, por exemplo, que ninguém vai pensar que vamos ter todos os tribunais a funcionar até às 10 da noite em todo o país. Aliás, teríamos um investimento, aí, que reverteria contra nós próprios; seria, com efeito, uma delapidação dos dinheiros do Estado para um serviço que, no fundo, não funcionava.
Portanto, estamos a procurar soluções alternativas, isolando, primeiro, áreas dc grande compressão, que seriam sobretudo Lisboa e Porto, depois, outras onde existe um número significativo de magistrados c dc funcionários que podem actuar cm sistema dc rotatividade c, finalmente, outras que podem funcionar em sistema dc turnos.
Ora, este tipo de soluções vem a ser justificado pela necessidade de encontrar uma capacidade dc resposta financeira e, portanto, remuneração objectiva pelo trabalho praticado, mas, ao mesmo tempo, sem uma sobrecarga significativa para a globalidade do Orçamento do Estado.
Espero poder apresentar até Março esse projecto, que não é, em princípio, um projecto legislativo, presumo eu, pois trata-se de um projecto de gestão interna, mas, se o for, obviamente que será com o mesmo gosto.
Neste momento, o trajecto permitc-me ter alguma esperança, com algum optimismo, dc que o problema possa estar definitivamente resolvido até Março.
Relativamente à Lei Processual Civil — este é outro ponto, para nós todos, caro, agora já não cm termos orçamentais, c importante relativamente ao qual nós devemos ter a contenção suficiente para não querer mostrar trabalho, apenas, para cumprir um compromisso anterior.
O ponto da situação, neste momento, é o seguinte: como os Srs. Deputados sabem, foi apresentada uma versão pela Comissão de Revisão do Código dc Processo Civil. Essa versão podia perfeitamente ser apresentada à Assembleia
da República c o Governo tinha cumprido, assim, o seu papel porque, no fim dc contas, tinha apresentado uma proposta de lei, ou um pedido de autorização legislativa, para legislar em área do processo civil.
Porém, nós entendemos que ela devia ter mais uma circulação pelas várias classes interessadas. Dessa circulação vão, com certeza, resultar alterações e, neste momento, posso adiantar-vos uma possibilidade de solução —mas gostaria que a tomassem, apenas, como possibilidade de solução, pois esta, efectivamente, não consubstancia um compromisso no sentido de ser a opção definitiva — que, como tal, está em estudo e se traduz na atribuição à área do direito processual civil dc uma realidade que, no fundo, existe no direito civil que é a noção do supletivo. Isto é: nós passamos a ter um código do processo civil-mãe e um outro código do processo civil facultativo que irá ser, porventura, o código da aceleração, com uma claríssima redução dc custas.
No fundo, um processo simplificado mas sem o acento tónico negativo que o processo simplificado veio a conhecer c que já está previsto actualmente.
Portanto, um processo de partes que corre entre as partes e que justifica a intervenção do tribunal numa fase terminal, em que a audiência preparatória leva a expurgar o que não imporia, c, através do princípio da cooperação, a reunir o que finalmente vai ser sujeito a julgamento c seguido, imediatamente, da sessão de julgamento. E como pressuposto, evidentemente, o acordo entre as partes envolvidas para que isto decorra assim.
Só que isso surgirá como um diploma à parte e, então, neste momento, a tendência pode vir a ser a dc fazermos uma revisão ao Código do Processo Civil, mas uma revisão significativa, introduzindo, sobretudo, aquilo que de mais inovador for considerado como possível de implementar, neste momento.
Portanto, fazer uma revisão, que será um novo código, mas um código revisto c não um código dc grande mudança definitiva, e termos este outro que, actuando relacionado com aquele outro supletivo, possa servir também ele próprio como teste para uma mudança futura definitiva que nos leve num ou noutro dos sentidos.
Dc qualquer modo, são instrumentos dc disponibilidade ao serviço do cidadão que recorre aos tribunais c, portanto, nessa medida, porventura, o código simplificado será aprovado por decreto-lei c, evidentemente, que o Código dc Processo Civil virá, aqui, à Assembleia da República em qualquer das formas que podem ser utilizadas pelo Governo para esse efeito.
Por outro lado, o Sr. Deputado disse que há promessas que não sc cumprem e eu suponho que isso, utilizando uma terminologia própria dos direitos das obrigações, é parte integrante dc algumas promessas, pois a promessa tem sempre uma parte possível dc incumprimento. O problema é reduzir o risco c levar um dia à noção dc que toda a promessa se cumpre.
Todavia, o problema é saber como a promessa é feita, porque muitas vezes promete-se, outras vezes diz-se que 6 possível c outras vezes ainda diz-se que se desejará que ... Portanto, o problema é saber distinguir as coisas.
Quando falo dc acesso ao direito já comecei por dizer, no início, que depende, evidentemente, da própria Ordem dos Advogados que está nisso empenhada, e, portanto, não é por aí que haverá obstáculo, mas depende também do concerto com a Ordem dos Advogados c depende ainda do concerto com as autarquias locais.
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Entendo que, com toda a gente que está envolvida num processo desta natureza, há possibilidade de o fazer por parte do Ministério da Justiça. Portanto, é previsível que sim c quando falei em 18 foi porque fiz ajustar os gabinetes de consulta jurídica aos círculos judiciais que já têm os respectivos tribunais instalados ou que virão a ter nessa altura.
Relativamente ao sistema prisional...
O Sr. José Magalhães (Indep.): — Peço desculpa, Sr. Ministro, gostaria que não deixasse de concluir, também aí com compromisso. E que, como V. Ex." sabe, os problemas que os gabinetes tem tido são problemas dc funcionamento, são problemas de Financiamento e, logo, problemas de prestação de serviços por parte dos virtuais prestadores. É impossível, assim, em absoluto, garantir a vitalidade.
Contudo, sei que é possível, através de compromissos de negociação com câmaras municipais, com a Ordem dos Advogados, com advogados até, singularmente tomados, designadamente para determinadas comarcas mais distantes, etc, conseguir soluções para que possamos dizer todos: «Há um esquema a funcionar na comarca de Vinhais.»
O Orador: — Não há!
O Sr. José Magalhães (Indep.):—Eu sei.
Não é isso que está em causa. A questão é que, designadamente em relação aos grandes centros urbanos, para se conseguir fazer afluir aos gabinetes de consullâ jurídica e para se assegurar um patrocínio oficioso decente cm processo penal —c V. Ex." sabe que não existe— seria necessário investir cm meios financeiros e numa estrutura estável de prestação de serviços, em esforços c outros elementos que estão longe dc estar assegurados.
E, portanto, impressiona-me —digo-lhe francamente—, até porque V. Ex." conhece perfeitamente bem qual é a situação, que se fale em abstracto de 18 centros como se fosse tudo igual quando não é nada igual, que sc abstractize também a situação concreta dos grandes círculos, designadamente a situação de Lisboa, que me parece particularmente grave, sem esquecer, também. Porto c Coimbra, c que se não tenha cm conta que os centros serão uma coisa sc tiverem uma estrutura pessoal, estável, activa, um pouco como existem nouuos sistemas parecidos com o nosso, bem próximos alguns e outros distantes, como os Estados Unidos, etc, c se tiverem o que tem. Estão pagos, por exemplo, os montantes devidos aos prestadores dc serviços aqui, no Gabinete de Lisboa? Quer dizer até dívidas há, não é?
O Orador: — Não, não há, Sr. Deputado. Evidentemente que depende da margem de tempo que V. Ex.* considerar para a dívida.. Neste momento, o que está a acontecer é que, logo que chega a folha com a indicação do montante correspondente às consultas prestadas, o prazo de pagamento é mínimo. Houve, de facto, atrasos, em tempos, mas hoje essa situação está resolvida.
Agora, o próprio sistema tem dc ser implantado dc maneira que conheça alguma plasticidade. Eu creio que — e é nesse sentido que estamos a caminhar— a participação do Ministério da Justiça deve ser, sobretudo, uma participação de organização e dc apoio financeiro c, portanto, dc pagamento ao funcionamento dc um sistema que, pela sua própria natureza, deve estar fisicamente desligado dos uibunais.
Ora, é isso que está a fazer-se, e o caso concreto de Guimarães é um exemplo claro disso, embora esse caso concreto seja um exemplo que invoco, se quiser, pois não quero colocar força na expressão, mais com orgulho nacional do que com orgulho pessoal, porque é um caso típico de disponibilidade total da respectiva câmara municipal que cede espaço, cede funcionários e ela própria se empenha na organização do serviço.
Evidentemente que isso é importante e é óbvio que noutras situações não será assim, mas a nossa ideia é a de utilizar nomeadamente funcionários que vêm de fora, que criam uma estrutura exterior ao próprio tribunal e que o Ministério da Justiça acompanha pagando, financiando e dirigindo a própria organização e, ao mesmo tempo, evidentemente, envolvendo cada vez mais interessadamente a Ordem dos Advogados até para garantir essa melhoria.
Aliás, uma das demonstrações do nosso empenhamento é, por exemplo, a profusão de folhetos que, no âmbito do Programa Cidadão e Justiça, nós distribuímos sobre o acesso ao direito e sobre a possibilidade dc funcionamento dos gabinetes de consulta jurídica. E por que não temos uma leitura masoquista do funcionamento, não estamos a criar o problema junto do cidadão para, depois, lhe dizer que não há capacidade de resposta.
Portanto, há, obviamente, uma organização paralela dessas duas perspectivas.
Relativamente ao sistema prisional, nós não podemos, como o Sr. Deputado sabe, estabelecer uma relação directa de causa-efeito entre o funcionamento do sistema prisional c as laxas dc suicídio. É claro — e cada uma das situações é profundamente estudada por nós — que não há uma relação causa-efeilo entre a prisão c o suicídio, imediatamente. Alguns exemplos, c são vários, como seja a situação dc suicídio no momento da entrada na prisão, mostram isso mesmo. Esta situação já determinou — e está a acontecer — que haja especiais cuidados dc acompanhamento para o recluso que dá entrada na prisão. Mas não há uma relação de causa-efeito.
Por outro lado, o problema do suicídio na prisão, hoje, está também muito relacionado com o problema da droga na prisão. E isso —passaria à segunda questão que mc colocou c abordaria ambas na mesma resposta — levou o Ministério a adoptar já dois tipos dc medidas essenciais ou, se quiser, três tipos de medidas essenciais.
Um deles, é uma preocupação, o mais constante possível dentro do próprio sistema dc acompanhamento dos reclusos, de evitar contacto com a droga.
O segundo levou a uma mudança, também aí, de perspectiva. Inclusivamente tive ocasião de participar, há relativamente pouco tempo, na última reunião do grupo Pompidou, do Conselho da Europa, onde Portugal incluiu um projecto próprio, que foi aceite, que teve como efeito o facto, que me parece positivo, de ter feito com que todo o grupo Pompidou reformulasse o seu discurso sobre a relação entre a droga e a prisão.
Como V. Ex.1 sabe, a relação entre a droga e a prisão era considerada uma relação binária, se quiser, tendo a droga dc um lado e a prisão do outro. E o discurso de sempre era de que a prisão não é bom local para responder ao problema da droga.
Hoje, a realidade é completamente diferente, porque a realidade tem essa vantagem de anular os discursos, porque é sempre mais forte que cies e o que acontece é que, hoje, por toda a parte — e nós não somos excepção —, a percentagem dc reclusos com contactos com o problema da droga é enorme, rondando, normalmente, os 40 %.
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Isto leva a tomar triangular a relação que era, até aqui, binária, como disse há pouco. E triangular porque nós deixámos hoje de ter o problema da droga na prisão e passamos a ter o problema da droga que, também, se verifica na prisão. Isto é, o problema da droga não é um problema da prisão mas, sim, da sociedade, da comunidade, que também lem expressão no interior do sistema prisional. Então, não deve ser apenas o sistema prisional a encontrar a solução para a situação dos reclusos com contacto com a droga.
Daí, a iriangularizaçao da relação, fazendo intervir agora, através dc soluções que estão a ser encontradas, quer pelo Ministério da Justiça quer no âmbito do projecto vida, outro tipo de soluções alternativas como sejam o da criação dc equipas exteriores à prisão que trabalham dentro da prisão e, noutros casos, a assistência directa dos serviços dc saúde exteriores à prisão dentro da própria prisão.
Trata-se de um processo que está a ser implementado nesta altura que, também, evidentemente, não se põe a funcionar de um dia para o outro, mas que está agora numa fase de aceleração c que rapidamente nos permitirá ter resposta.
Por outro lado, relativamente ao problema prisional propriamente dito, está cm fase de instalação c a entrar em funcionamento, dentro dc pouco tempo, o centro dc atendimento c de despiste do estabelecimento prisional dc Lisboa, depois a instalação das comunidades terapêuticas que referi há pouco, a um prazo mais curto a dc Santa Cruz do Bispo e, a um prazo menos curto, a dc Sintra, porque, aí, houve uma filosofia arquitectónica diferente porque entendemos dever ir para um sistema de aldeamento e não para um sistema dc pavilhão, dado que aquele sc ajusta muito mais ao tipo de resposta que importa dar.
Por outro lado, também logo que possamos estar no terreno com as comunidades prisionais jovens, obviamente, que elas não são vocacionadas para o tratamento diferenciado do problema da droga nas prisões.
E quando nós tivermos o sistema implementado e, porque estamos à frente, ele será implementado primeiro, nós seremos a experiência pivot no âmbito dc todo o sistema prisional dos Estados europeus que, no fundo, aceitaram esta nossa perspectiva e nos encarregaram dc, nomeadamente em Maio, na próxima conferência cm Oslo, lhe apresentar o próprio projecto português para ser discutido, apreciado e analisado no âmbito da totalidade dos países que integram o grupo Pompidou que, como sabem, são não apenas os do Conselho da Europa, nomeadamente os Estados Unidos e o Canadá que, aqui, têm experiências avulsas dc tipo diferente, mas que aceitaram, também eles, participar nesta análise e neste esforço de implementação que nós estamos a desenvolver, agora.
Relativamente ao problema do critério da expansão territorial da Polícia Judiciária que V. Ex." colocou, e bem, c que me permite levar o programa e a política do Ministério da Justiça nessa expansão.
Nós temos, neste momento, duas situações. Uma, que era aquela que existia antes da nova orgânica da Polícia Judiciária e outra que é a que a nova lei orgânica da Polícia Judiciária vem prever. E, como tem ocasião dc verificar, desde já, as inspecções só poderão ser criadas dc novo a partir de decreto-lei e já nem sequer por despacho ou portaria do Ministro da Justiça.
Portanto, com uma dignidade que obriga a uma reflexão que tem dc ter por detrás dc si uma filosofia própria dc um diploma legislativo com a dignidade dc um decreto-lei
e não apenas uma filosofia de gestão, porventura mais ou menos atrabiliária, esperaria que menos atrabiliária.
Dc qualquer modo, a ideia é caminhar para um aumento dc direcções centrais onde isso sc justifique. E, como se verifica, é o caso da criação da direcção central de Faro, mantendo as direcções centrais de Coimbra, Porto, Lisboa e Évora, mas aí para ajustar aos quatro distritos judiciais existentes no País. E, a partir das direcções centrais, desenvolver capacidades de mobilidade de intervenção, mantendo as inspecções onde isso se justifique mais claramente — estou a lembrar-me da situação de Leiria, que é um caso específico onde é importante instalar inspecção, estando a decorrer a obra para o conseguir — e ao mesmo tempo rentabilizar as outras que já estavam instaladas anteriormente.Não se trata de caminhar para uma proliferação de instalação física de inspecções, mas garantir, isso sim, uma capacidade de maleabilidade e de mobilidade que permita uma resposta específica centrada, também, e mais uma vez, na sede do círculo judicial ainda e sempre naquela ideia da interdisciplinaridade do círculo judicial ou do núcleo interdisciplinar de resposta para a administração da justiça.
Dizendo dc outro modo, não vamos instalar inspecções da Polícia Judiciária a pedido. Vamos instalar inspecções da Polícia Judiciária onde entendermos que tecnicamente, com rentabilização de funcionamento c de recursos, tenhamos a noção de que c necessário instalar para garantir um combate mais eficaz à criminalidade.
Por outro lado, e relativamente à Direcção Central de Combate à Corrupção, ela existe por duas razões fundamentais. Primeiro, porque é uma demonstração clara do empenhamento do Governo no combate à corrupção c, portanto, numa afirmação de que tem dc haver uma estrutura especializada de investigação, com os poderes próprios da investigação da Polícia Judiciária e na dependência directa do Ministério Público, dc desenvolver esse combate. Esta tem sido uma determinante permanente nossa e esta direcção central vai ser o núcleo de resposta nesse sector.
Evidentemente que para que esta Direcção Central de Combate à Corrupção funcione ela tem dc ler recursos humanos c técnicos próprios.
Simplesmente, há dois caminhos paralelos e convergentes para o conseguir. Por um lado, dar à referida Direcção Central os quadros específicos próprios que estão previstos na nova lei orgânica c que serão englobados no processo dc descongelamento do próximo ano.
No entanto, temos para nós que uma direcção central com esta função deve recorrer muito ao sistema de requisição temporal, dc destacamento temporal ou dc requisição por acção, dado ser importante que não crie, cia própria, um núcleo fechado e virado para dentro em que, a certa altura, uma qualidade específica do técnico que trabalha acabe por criar dentro da Polícia Judiciária um nódulo que pode, elc próprio, perder credibilidade.
Assim, é fundamental que haja uma permanente abertura e transparência de uma direcção central deste tipo de intervenção para garantir que as idas e vindas permitem o permanente refrescamento e a transparência total de intervenção. Isso passará por protocolos a estabelecer quer com a Inspccção-Geral dc Finanças quer com o Banco de Portugal para o trabalho com peritos específicos que venham a actuar em várias zonas de intervenção desse domínio.
Não é, portanto, aí que deve cstabclccer-se uma relação directa e imediata entre previsão financeira, por um lado,
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e capacidade de resposta, por outro. Aí é evidente que ela 6 fundamental para a primeira vertente e está prevista c nesta outra resultará daquilo que no fundo é a intervenção de vários outros departamentos para trabalharem neste domínio.
Relativamente à medicina legal penso já ter dado resposta anteriormente.
No que se refere à questão, que é uma questão complexa, colocada pelo Sr. Deputado Guilherme Silva, e que é a de saber quais as áreas que ficam mais a descoberto, eu digo que é complexa porque é francamente difícil responder — vou explicar porquê, e nessa explicação dar--lhe-ci a resposta à questão que colocou.
Comecei por dizer que não sendo, na minha perspectiva, este orçamento um orçamento dc desilusão nem de ilusão, também não é, obviamente, o grande orçamento que eu ou qualquer outro Ministro da Justiça desejaria ter para o seu Ministério. Também não desejaria a totalidade do Orçamento do Estado, porque há limites, mas se tivesse maior disponibilidade certamente poderia lançar mais rapidamente outro tipo de projectos.
No entanto, o problema é saber até que pomo é que este orçamento permite lançar aquele conjunte de projectos que são essenciais para uma política de justiça iniciada, que é credível e que vai mudar o sistema e, nesse aspecto, não tenho dúvidas que sim.
Simplesmente, sabendo nós, como sabíamos, que o orçamento nunca podia ser a totalidade do desejável, optámos não por fazer uma opção vertical, isto é, dizer aquilo, neste, naquele c naqucloutro departamento, deixamos excluído e a descoberto para valorizarmos estes outros.
E porque neste momento há uma política de justiça — e isso está claramente demonstrado através das várias intervenções que tenho tido ocasião de ter — que, por um lado, arranca numa visão horizontal de intervenção do sistema e, por outro lado, arranca de uma concepção de sistema e dc subsistemas, nós partilhámos os benefícios c, portanto, os prejuízos também horizontalmente.
Assim, neste momento, não podemos dizer que há um sector a descoberto ou que há um sector especialmente privilegiado. Evidentemente que há desproporções pelo peso de cada um dos sectores, mas nessas desproporções é considerado, no fundo aristotélicamente, a desigualdade para garantir a igualdade. Daí que cu não sinta que haja zonas que sc possam considerar a descoberto no Ministério da Justiça. Há, sim, essa visão horizontal porque não acreditamos numa política e num sistema dc mudança que caminhe com distorções de capacidade dc intervenção.
E fundamental que, progressivamente, todo ele vá tendo a sua implantação, e, justamente a partir dessa filosofia, não temos todas as áreas totalmente cobertas cm função do que seria o ideal, mas não temos nenhuma área descoberta de modo que possamos referir prioridades de departamentos. Temos evidentemente prioridades de acções que não em matéria de departamentos, como, aliás, resultou da minha intervenção inicial em que tive o cuidado de passar pelas várias áreas de intervenção essencial do Ministério da Justiça
O Sr. José Magalhães (Indep.): — Sr. Ministro, a retenção dc 10 % do orçamento do Ministério não vai afectar nenhum sector específico? Vai ser repartida aristotélicamente?
O Orador: — Em lermos gerais e abstractos a retenção dc 10% é também geral e abstracta c, numa primeira leitura, aplíca-se a todos os serviços, mas é evidente que quando ela surgir e quando tivermos necessidade de implementar as acções há uma gestão política dos 10 %. Mas é para isso que existe cada ministério ou ministro, isto é, para fazer a gestão concreta das dificuldades que vão surgindo ao longo dos respectivos mandatos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr." Secretária de Estado do Orçamento.
A Sr.* Secretária de Estado do Orçamento (Manuela Leite): — Sr. Presidente, Sr. Ministro: Gostaria dc esclarecer um ponto que me parece poder ter ficado menos claro após a intervenção do Sr. Deputado Octávio Teixeira. De acordo com a intervenção daquele Sr. Deputado, poderia parecer que só uma parte do orçamento do Ministério da Justiça vem a esta Assembleia da República e ainda por cima uma parte relativamente reduzida. Como sabe, todo o orçamento deste Ministério é aprovado por esta Casa, já que esta irá, em sede da sua aprovação, poder discutir e aprovar não só o Orçamento do Estado como os orçamentos privaüvos, e daí que não seja uma parte, mas a totalidade do orçamento do Ministério da Justiça que está em causa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Serei muito rápido, começarei por uma questão que decorre desta segunda intervenção do Sr. Ministro e que gostaria de analisar com mais pormenor, mas, antes disso, duas ou três notas «prévias».
Quanto à questão da desilusão, posso reafirmar-lhe o que disse anteriormente e que a nossa desilusão é cm relação ao orçamento e não em relação ao Ministro, que não está neste momento em questão.
Por outro lado, em relação às críticas conjunturais ou estruturais, devo dizer que ninguém tem dúvidas que a análise dc um orçamento tem de ter em conta questões estruturais a todos os níveis, desde a política stricto sensu para o respectivo ministério até às questões estruturais de recursos humanos e dc infra-estruturas. E, como, neste momento, estamos em sede dc discussão na especialidade, a análise tem dc ser encaminhada para essa questão fundamental sem perder dc vista todas as outras. Assim, como no problema da burocratização haverá causas muito profundas que não serão objecto de apreciação, mas também aí existe a questão da burocratização instrumental.
Pcrmila-mc um pequeno parêntesis que envolve uma pergunta muito concreta sobre uma questão específica. Um exemplo concreto dc burocratização é aquele caso, já aqui focado por diversas pessoas e inclusive pelo Sr. Ministro, do chamado edifício 2000 no Funchal. Tanto quanio julgo saber, apesar de se ter gasto bastante dinheiro por nele se irem integrar serviços do Ministério da Justiça, do Ministério das Finanças e do Tribunal dc Contas, prolonga-se ad etemum a discussão sobre quem irá coordenar as obras de instalação. Quem o deveria fazer não me interessa, mas o que é necessário, do ponto dc vista do meu grupo parlamentar e independentemente de quem coordene, é que aquele edifício seja rentabilizado em termos da sua utilização efectiva, até porque há condições concretas de funcionamento de certos tribunais — e o Sr. Deputado Guilherme Silva sabe isso melhor do que
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eu —, como, por exemplo, os tribunais de trabalho, em que as pessoas não têm medo que lhes caia em cima caliça mas uma coisa muito mais pesada.
Este é apenas um exemplo dos problemas burocráticos que podem ser ultrapassados, julgo cu, muito rapidamente. No entanto, a burocracia, em termos instrumentais, 6 aquela que poderia ter algum interesse maior, face ao facto dc estarmos a discutir um orçamento na especialidade.
Antes dc introduzir a terceira nota que tenho aqui gostaria dc deixar uma declaração que deveria ter feito logo de início e que é o facto, que considero muito positivo, de o Ministério ter fornecido um imenso volume dc informação cm relação ao seu orçamento. Esta é uma nota dc justiça que não queria deixar dc fazer.
Fiz a análise do orçamento do Ministério da Justiça pelos elementos que tenho disponíveis. Por isso quando o Sr. Deputado Guilherme Silva c o Sr. Ministro levantaram o problema da escassez dc meios para mim havia, e não sei se haverá, neste momento, uma perspccüva dc diferença completa entre este Ministério e a generalidade dos outros. E essa diferença era que neste Ministério não há ou não havia escassez de recursos financeiros por causa do problema dos saldos. Isto é, haveria muitos recursos financeiros que poderiam ser utilizados para além dos que estão orçamentados c a minha análise parte dessa perspectiva. E é essa questão, do que ainda há, que gostaria de ver referida.
Por outro lado, não compreendo que o caso concreto, que levantei, da informatização do registo civil possa ser considerado uma questão conjuntural. Este é um problema que é cm si estrutural, porque as insuficiências c as deficiências do registo civil, cm termos da capacidade dc resposta, c muito concretamente ligada ao problema da informatização, são muitas, mesmo quando a verba que está cm causa é ridícula cm termos financeiros — 130 000 contos.
No entanto, o que se verifica é que, apesar dc essa verba ser diminuta, há um compasso de espera de dois anos, isto é, no Orçamento do Estado para 1990 o Governo previa a informatização total até ao fim dc 1992, mas passados dois meses prevê que essa informatização sc faça até final dc 1994, o que significa um arrastamento dc dois anos numa questão que mc parece ser dc grande prioridade.
Irei agora ao problema suscitado por esta segunda intervenção do Sr. Ministro c que c o dos saldos. Sc é verdade, c não quero pôr em dúvida a afirmação que V. Ex.° fez sobre a evolução dos saldos verificada entre os valores que lemos nestes documentos que sc referem até 30 dc Setembro c os que o Sr. Ministro apresenta agora, possivelmente deixarei de considerar o orçamento do Ministério da Justiça como uma grande desilusão, mas, sim, como uma grande preocupação.
E explico porquê. Em Setembro temos um saldo acumulado de 16 milhões de contos que vinha numa evolução dc anos anteriores dc aumento crescente deste saldo e sc, dc um momento para o outro, esse saldo salta de 16 para 3 milhões —isto em dois meses— cu fico assustado mas, mais do que isso, V. Ex.° referiu para esse problema da redução do saldo a forte dimuição dc receitas que, primeiramente, leria sido considerado como um problema conjuntural, digamos, sazonal, da época dc verão, mas afinal não é.
Sinceramente, com os mapas que tenho presentes não mc parece existir qualquer relação com essa redução significativa do saldo para 3 milhões dc contos. O que significa que se se projectar os 3 milhões dc contos para
final do ano, quer dizer que em termos de execução financeira houve um défice no orçamento do Ministério da Justiça, isto é, dc 7 milhões de contos cm 1990, na medida em que se passou um saldo de 10 milhões de contos cm 1989. Mas esta redução não se coaduna com a evolução das receitas que aqui vem discriminada. Porque a evolução das receitas tem vindo a acelerar. Quer dizer, a menor aceleração da evolução de receitas, cm relação a 1990, foi nos primeiros meses c não nos últimos meses.
O Sr. Ministro, há pouco, sc bem percebi, referiu que houve um decréscimo das receitas nos últimos meses. Com a evolução de receitas do Gabinete de Gestão Financeira que tenho aqui presente, pelo menos até Setembro, isso não se coaduna com essa afirmação, na medida cm que as receitas até têm vindo a acelerar nos últimos meses em relação a igual período do ano passado. E não têm vindo a desacelerar,como foi afirmado.
Dc qualquer modo, quanto a este problema do saldo, solicitava alguma informação que fosse possível, neste momento, mais esclarecedora, mas com a síntese possível, porque, sinceramente, por um lado, creio que põe em causa o próprio Orçamento que é apresentado, isto é, se se projectar esta tendência que o Sr. Ministro referiu em relação às receitas do Gabinete dc Gestão Financeira para 1991 isto é muito preocupante. Por outro lado, não mc parece que, com base nos elementos que aqui lemos até Setembro, se possa nestes dois meses de Outubro c Novembro ter tido uma quebra tão grande. Por isso, necessitaria de uma análise profunda para detectar as suas causas reais.
O Sr. Presidente: — Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Deputado, desde o princípio que tive a noção que quando falou num orçamento dc desilusão sc estava a referir ao Orçamento do Estado c que deixaria, eventualmente, para mais tarde, isto é, para uma interpelação ao Governo a sua perspectiva dc maior ou menor desilusão com o Ministro da Justiça.
Tenho pena que os processos tecnológicos não permitam ainda que quando sc transporta para a acta aquilo que dizemos fique lá a imagem do sorriso e de um relativo sentido dc humor com que se dizem coisas leves c, às vezes, quando depois as lemos, ficamos com a noção que se disseram coisas pesadas.
Faço esta introdução para deixar o sorriso na acta, porque fico um pouco com esta ideia: é que V. Ex.' diz que é um orçamento de desilusão c eu digo que não é um orçamento dc desilusão. Portanto, concluiria com o tal sorriso e, só nesse sentido, ainda bem que não é V. Ex." o Ministro da Justiça, porque, com este orçamento, provavelmente, V. Ex." faria pouco e cu tenho a esperança dc fazer bastante, apesar de tudo. Mas sublinho outra vez o sorriso para que esta frase fique, enfimcom algum senlido dc humor ligeiro c ténue, isto c, que seja apresentado como tal!
Sr. Deputado, em relação ao «edifício 2000» não se tratou propriamente dc uma questão de burocracia. Não foi isso que impediu a utilização já imediata do «edifício 2000». E que só agora está concluído o projecto para as instalações c é agora que vamos imediatamente iniciar a execução concreta da instalação.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, dá-me licença que o interrompa?
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O Orador:—Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, estão previstas, neste orçamento, as verbas para essa instalação no «edifício 2000?
O Orador: — Estão previstas verbas para parte da instalação, portanto, para o início da instalação e para o tempo que é previsível que esta demore. Porque o problema da coordenação está feito, está assente, está definido, funcionando o Ministério da Justiça como pivot, nomeadamente a prestão de contas, quer com o Tribunal de Contas, quer com as finanças, que, no fundo, vão ter um sector instalado ali.
Por sua vez, também é ali que ficará instalado o tribunal do uabalho. Portanto, espero que não caia entretanto! ... Porquê? Porque está prevista a sua instalação. Por outro lado, e em relação ao registo civil, faria duas referências à intervenção do Sr. Deputado.
Por um lado, nunca houve um assunção do que era a informatização do registo civil que iria ser feita e que importaria esse suporte financeiro — era a informação dos registos centrais. Mas ainda assim, a ideia era que a partir da informação dos registos centrais se caminharia para a intervenção do registo civil. E o Sr. Deputado diz, c diz bem, que se, no fundo, a previsão é de 30 000 contos porquê então não fazer isso?
Repare que é uma opção discutível como são todas as opções, mas repare que temos, dc facto, a noção dc que na área dos registos c notariado é o registo civil o que funciona melhor, até pela própria natureza das funções que lhe estão cometidas. Portanto, aí não há um problema social, não há um problema de relação com o cidadão em termos de rapidez e de aceleração de resposta. Mas isso acontece já mais significativamente na área do registo predial, do notariado e do registo comercial.
Depois, Sr. Deputado, como podíamos com os 30 000 contos resolver o problema do registo civil?! Não atribuo qualquer intenção desse tipo à sua intervenção, mas isso tinha da nossa parte qualquer coisa de demagógico, isto é, para mostrarmos uma coisa que levava as pessoas a dizer, sim senhor, está feito, Unhamos feito a prioridade negativa. Isto é, tínhamos colocado como prioridade inicial aquilo que é o menos prioritário de tudo. Portanto, retiramos o efeito espectacular que podia surgir da informatização imediata do registo civil e desviamos essa verba para uma capacidade dc intervenção mais significativa nas outras áreas que são mais prementes. Portanto, aí o problema é de opção e, apesar de tudo, devo dizer que é uma boa opção por isso mesmo.
Não há tanta preocupação. E evidente que depois cia virá a seguir c será relativamente fácil. Não é, felizmente, por 30 000 contos que o Ministério da Justiça vai depois deixar de ter capacidade de resposta. Ora, o importante era ter a garantia da informatização dos serviços centrais porque é essencial para garantir o funcionamento útil da própria informatização e depois caminhar nas outras áreas mais prementes, como seja a do comercial, a do predial e a do notariado.
Relativamente ao problema dos saldos, independentemente daquilo que foi necessário retirar e que referi há pouco, tendo em conta o desequilíbrio relativamente às receitas efectivas e as receitas previstas, há ainda, também, as transferências para o Orçamento do Estado que se computam, nesta altura, em 2,5 milhões contos e que resultam também do próprio orçamento do Gabinete dc Gestão Financeira.
Por outro lado, há uma comparação que é fundamental e, portanto, não torna preocupante o orçamento —pode tornar, de alguma maneira, preocupante a situação exterior ao Ministério e que determina uma redução significativa das receitas — mas unhamos como taxas comparativas uma média de receita, em 1989, de 50 % e temos uma média de receita, em 1990, dc 4 %.
Portanto, por esta via, sendo certo e há sempre, evidentemente, um pecado original que já reconheci várias vezes — que é o de não termos ainda os instrumentos necessários para podermos ter a total previsão rigorosa da receita, sobretudo, pelo sector dos registos e do notariado.
Portanto, com este pecado original, de que nos vamos tentar penitenciar e do qual pretendemos ser absolvidos a partir do ano que vem, temos a explicação para essa siluação. Dc facto, se há uma média dc receita de 50 % cm 1989, e se a previsão da receita para o orçamento seguinte arranca com alguma cautela —daí a acusação anterior que se fazia de subavaliação dessa previsão—, evidentemente, quando o concreto nos dá uma baixa de 50 % para 4 %, vamos ter de encontrar aí a resposta para essa diminuição do saldo que parece uma projecção significativa e que pode dar a aparência de que se perspectiva e se prospecciona em termos perfeitamente descontrolados.
Há um mecanismo exterior que o Ministério não domina. É evidente que nesta altura é importante saber o que é que determinou essa quebra de receita, mas é um problema exterior que pode eventualmente transformar-se cm problema interior. No entanto, neste momento, é um problema exógeno ao problema orçamental que temos de analisar para encontrarmos as respectivas respostas.
Evidentemente que quando verificámos que houve um período, durante este ano de 1990, em que a meta de receitas estabilizou em 17 % e a certa altura dá-se uma quebra sigificativa, vindo a estabilizar-se em 4 %, nós considerámos, no fim de Setembro ou Outubro, que haveria uma retomada da média anterior e, enfim .... isso explicar--se-ia, porque é óbvio que deve haver uma margem para a diminuição de receita no Ministério da Justiça, porque houve um boom de crescimento na área de constituição dc empresas, etc, que provocou um aumento enorme e que vai progressivamente cair.
Portanto nós liamos esta queda com essa filosofia. A partir de agora pretendemos encontrar a explicação para o período do Verão onde esse abaixamento se verifica. Temos agora uma situação dc estabilização nessa baixa da receita real.
Pode haver razões dc conjuntura para isso. Admito que, por exemplo, em toda a área da actividade comercial se possa sentir a siluação dc instabilidade internacional relacionada com a crise no Golfo e que as pessoas estejam um pouco na expectativa de saber aquilo que vai acontecer para poderem investir quanto c em quê — admitamos que é isso!
Temos de fazer uma primeira leitura nos primeiros três meses de 1991 para sabermos, nessa altura, onde estabiliza a receita e depois então procurarmos razões esuuturais — se elas se mantiverem com uma estabilidade cada vez maior — o que anula a possibilidade dc encontrar explicações conjunturais.
Todavia, creio que, neste momento, ainda é cedo para passarmos a uma análise estrutural da diminuição de receita porque parece que ainda há boas razões dc natureza conjuntural que podem efectivamente justificá-la.
Agora, retiraria a noção de orçamento preocupante e deixaria colocar como preocupante esta questão que é
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exterior ao Ministério da Justiça e que vai obviamente justificar, por um lado, ainda uma maior aceleração na regularização do regime financeiro c, por outro lado, num redimensionamento das regras de projecção orçamental, se, de facto, tivermos de partir para uma estabilização dc receita baixa.
Inclusivamente, vai levantar toda a questão da autonomia financeira do Ministério da Justiça. Ainda hoje é discutível saber se isso é um bem ou não. Durante muito tempo foi considerado como um bem. Não vou questionar que o não seja, mas é importante termos uma noção da evolução financeira e económica para saber se esta é a boa postura financeira do Ministério da Justiça no âmbito global do Orçamento do Estado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP). — Sr. Presidente, há pouco esqueci de me referir à Sr." Secretária de Estado do Orçamento.
A Sr." Secretaria de Estado do Orçamento tem razão e não tem, porque sabe perfeitamente que, cm relação àquilo que não é o orçamento do Ministério stricto sensu, aprovamos apenas as verbas globais. Esse é o grande problema porque não aprovamos os anexos, mas só aprovamos os mapas.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr." Secretaria de Estado do Orçamento.
A Sr." Secretária de Estado do Orçamento: — Da
mesma forma que o Orçamento também aprova verbas relativamente globais ... os mapas de orçamento privativos também têm o mesmo tipo dc desdobramento.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Resta-me agradecer, em nome da Comissão de Economia, Finanças e Plano e da Comissão de Direitos, Liberdades c Garantias, a vossa presença.
Eram 14 horas.
O Sr. Presidente (Octávio Teixeira): — Srs. Deputados, . está reaberta a reunião.
Eram 15 horas e 37 minutos.
Srs. Deputados, vamos dar início aos nossos trabalhos. Está em discussão, na especialidade, o orçamento do Ministério do Planeamento e da Administração do Território. Começaria por agradecer a presença do Sr. Ministro c dos Srs. Secretários dc Estado, e perguntava ao Sr. Ministro se quererá fazer uma intervenção inicial dc apresentação do orçamento do seu Ministério.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território (Valente de Oliveira): — Sr. Presidente, muito obrigado, mas suponho que a apresentação geral que tive ocasião de fazer, quer na Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, quer na Comissão de Economia, Finanças e PJano, foi suficientemente prolongada para não ser necessário repeli-la. Se desejarem que faça agora uma apresentação geral, fá-la-ei com todo o gosio, no entanto, sendo esta a minha quinta vinda às Comissões de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, Economia, Finanças c Plano c Educação c Investigação Científica, cu iria seguramente repelir aquilo que disse então. Em todo o caso, se quiserem que faça alguma referência particular sobre algum capítulo, fá-la-ei com certeza.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, nesse caso a mesa aguarda inscrições.
Pausa.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.* Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.' Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, em resposta à questão que levantou no sentido de saber se nós, deputados, queremos ou não que V. Ex.° faça alguma intervenção inicial, gostaria de dizer que, se não há nada de novo relativamente à conversa que tivemos na Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, naturalmente que poderemos começar a colocar questões. No entanto, cabe ao Sr. Ministro informar-nos se altera algo no que tem a ver com as finanças locais, tendo em conta o debate que se fez na última reunião. Esta é, sem dúvida, uma questão importante a ser colocada antes de iniciarmos o debate que seguidamente iremos ter.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Sr. Presidente, farei então uma introdução relativa, exclusivamente, àquilo que imporia ao sector das finanças locais.
Como o Sr. Presidente c os Srs. Deputados certamente sc recordam, o Governo, neste particular, apresentou várias propostas relativamente a alguns dos artigos que contêm alterações quando comparados com os respectivos artigos dos anos anteriores. Em primeiro lugar, por solicitação, indicação c vontade da Associação Nacional dos Municípios Portugueses foi actualizado e, consequentemente, aumentado o valor do imposto sobre veículos. Há uma proposta nesse sentido, cujo montante a ser orientado para os municípios foi, naturalmente, acordado com a Associação Nacional de Municípios, mantendo-se, portanto, o que nessa ocasião acordámos.
Em segundo lugar, há também uma proposta no sentido de afectar o fruto da cobrança das den-amas. Há um pedido dc autorização legislativa contido no Orçamento do Estado para se vir a afectar o fruto da cobrança das derramas de acordo com os locais onde sc produz a riqueza que está em causa, gerando-se assim mais meios para os respectivos municípios.
Finalmente, dentro das grandes rubricas, o Governo apresentou uma proposta que diz respeito à aplicação da Lei das Finanças Locais, tal como está, tendo apresentado igualmente, no relatório, uma referência em que é introduzido um novo exercício — c na ocasião tive oportunidade dc justificar essa introdução, lendo feito também breve referência, no Plenário, à lógica e à oportunidade dessa alteração.
A subida do FEF é efectivamente muito invulgar, são 22,7 %, e, quando verificamos que a subida, por força da paridade ou por força da associação feita à taxa dc evolução da previsão do IVA, era tão grande, decidimos fazer uma tentativa de acomodação de vários crescimentos e, consequentemente, uma distribuição dc acordo com novos critérios, que nos têm sido insistentemente recomendados pelos municípios cm que o FEF é a principal das suas receitas dentro do espírito de percquaçâo que vem a ser este fundo.
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Nessa ocasião, ensaiámos uma série de critérios que promoviam, de facto, uma alteração dessa distribuição,
tendo sido proposto, em consequência, um cenário alternativo no relatório do Orçamento do Estado que é, agora, submetido à vossa consideração, logo dizendo que, só se houver por parte das forças políticas representadas no Parlamento um consenso quanto à solução de alteração dos critérios da Lei das Finanças Locais, nesse particular — e, repilo, só se houver uma expressiva vontade das forças representadas no Parlamento —, estaremos na disposição de o fazer. Caso exista alguma contrariedade da vossa parte, faremos então aquilo que está na lei e a proposta seguirá os seus trâmites.
É evidente que não faremos nada que não tenha uma expressiva sustentação no Parlamento. Caso exista, efectivamente, uma limitada expressão dessa vontade, então esta matéria ficará tal como está na proposta que o Governo apresentou, ou seja, a Lei das Finanças Locais tal como eslá definida neste momento. No fundo, para retomar a discussão, lai qual ela foi acabada na reunião da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, é esta a nossa disposição: caso os Srs. Deputados exprimam um generalizado apoio à alteração, nós faremos do quadro de referência que vem no relatório uma proposta; caso os Srs. Deputados se manifestem ncgaüvamcnte, mantém-sc a proposta original e não se faz qualquer espécie de alteração e a situação reconduz-se à extrema simplicidade de que, a partir desse momento, trataremos de fazer uma proposta de alteração da Lei das Finanças Locais, que, naturalmente, irá apenas ter repercussões no Orçamento do ano que vem.
Consequentemente, tudo dependerá daquilo que os Srs. Deputados resolverem na generalidade. Nós não insistimos, na certeza de que VV. Ex." sabem, tão bem como eu, as respostas que a Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente recolheu, sabem o que sc passou e saberão certamente o que decidir. Como disse, não iremos forçar nenhuma votação nesse sentido, desde que ela não corresponda ao assentimento expressivo do Parlamento.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Vítor Costa.
O Sr. Vítor Costa (PCP): — Sr. Ministro, cu irei fazer uma intervenção sobre investigação e ciência porque penso ser esta a Comissão adequada. Simplesmente, ao não ver aqui presente o Sr. Secretário de Estado, eventualmente a nossa discussão poderá estar prejudicada. Todavia, não deixarei dc colocar algumas questões.
Aparte inaudível.
Registo a boa vontade do Sr. Ministro.
Em relação à investigação e desenvolvimento, recordo algumas palavras que ouvimos, o ano passado, da boca do Sr. Ministro quando discutimos o Orçamento do Estado dc 1990, na especialidade, onde se registou que o crescimento das verbas investidas cm ciência e tecnologia continuava a ser claramente insuficiente. O Sr. Ministro registou isso. De facto, em 1984 — e. vou citar números que o Sr. Ministro na altura referiu —, registou-se 0,4 % do PIB, em 1990 esse valor foi de 0,68% e, este ano, pelos números que o Sr. Secretário dc Estado fez o favor
de distribuir na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, esse valor aponta para uma percentagem do PIB dc 1,08 %. O Sr. Ministro reconhecerá que estamos ainda a anos-luz da média de 2,5 %, que seria a média ideal, apesar dos milhemos programas que felizmente vão surgindo. Assim, poderemos dizer que este Orçamento, apesar do parecer que a Subcomissão de Ciência e Tecnologia votou, com votos favoráveis apenas por parte do PSD, é claramente insatisfatório.
Todavia, as questões que quero colocar, Sr. Ministro, são dc natureza de rigor. O Sr. Secretário dc Estado distribuiu-nos um mapa e, por mais esforços que eu e o meu grupo parlamentar tenhamos feito para encontrar, na proposta dc lei n.° 163, verbas que suportem esse mapa, dc facto não conseguimos fazer com que a «cara desse com a careta». É que encontrámos realmente uma grande diferença dc verbas. E só quero dar um exemplo: no caso do LNETI, que tem aqui inscrito neste mapa, no P1DDAC tradicional e contrapartidas, uma verba de 1,981 milhões de contos, de facto, o que encontrámos na proposta de lei — pelo menos, aquilo que eu consegui encontrar — foi uma verba de 831 000 contos. É natural que existam aqui questões relacionadas com o PEDIP, com o FSE e com essas coisas todas! Mas é por essa razão que estamos aqui a discutir o Orçamento na especialidade.
Este ano, dc facto, os deputados têm de fazer, em grande escala, o papel de detectives orçamentais! De facto, têm dc contratar equipas dc detectives para ver onde é que estão as verbas e para juntar daqui e dalém!
E era neste sentido que gostaria dc questionar o Sr. Ministro, dada a ausência do Sr. Secretário de Estado. É que, dc facto, as verbas são muito diferentes! Há rubricas que não aparecem referidas cm lado nenhum na proposta dc lei. Por exemplo, aquilo que é chamado o Instituto Superior dc Saúde — o Instituto Ricardo Jorge — não aparece em lado nenhum. No PIDDAC aparece inscrita para esse Instituto uma verba dc 214 000 contos, só que, procurando na proposta dc lei, em lado nenhum encontro referido o Instituto Superior dc Saúde! E estou a dar exemplos que marquem o sentido da minha intervenção. Eu penso que o IPO tem dotações para investigação! Procurei o IPO em todo o lado! Não encontro!
Por outro lado, o Sr. Secretário dc Estado refere aqui também «ensino superior — universidades — valor estimado para o funcionamento de actividades dc investigação e desenvolvimento— 13,244 milhões de contos». Simplesmente, fui buscar os números, para investigação, que o Sr. Ministro Roberto Carneiro nos forneceu na Comissão c esses números referem uma verba 3,248 milhões àe contos! Eu não digo que esteja tudo errado! Agora, nós, dc facto, temos dc votar uma lei e temos de verificar sc os números que nos são fornecidos na Comissão condizem ou não com o que está inscrito na proposta dc lei.
A meu ver, esta situação é preocupante, especialmente porque desconhecemos o que sc passa com algumas verbas que aparecem, nomeadamente as dos programas ligados aos fundos estruturais, porque sabemos que — c já agora aproveito o facto dc estar aqui o Sr. Ministro porque poderá dar um esclarecimento— programas como o Ciência, cm 1990 vão injectar no nosso sistema, ao nível dos programas dc investigação c desenvolvimento, verbas vultosas, de milhões dc contos, e nada se sabe sobre os projectos concursados, por exemplo, através do Programa Ciência. Que sc saiba ainda nenhum foi aprovado... Isto 6 lamo mais preocupante, porque sabemos que dc vários projectos — e fico-me apenas pelo Programa Ciência, para falar no que está mais na ordem do dia, que está a concurso, apesar dc não se conhecer o regulamento ...
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O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — É mais dinheiro! Está mais nutrido!
O Orador: — Não sei se está! Mas se o Sr. Ministro o diz!... Pelo menos, os papéis dizem que sim, falam em milhões, embora, concretamente, para o ano de 1990, no MNOP, estivessem inscritos 2,8 milhões de contos e ainda nada esteja decidido.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: —Já está!
O Orador: — Ah, já está?!... Então, é uma boa notícia. É porque, relativamente às instituições que tiveram dc abrir concursos públicos para a aquisição de equipamentos, está a esgotar-se a validade desses concursos e ainda não sabem se o seu projecto foi ou não aceite. E evidente que isto tem a ver com o Orçamento — admito cu, mas talvez possa não ter.
Estas são as questões que, cm termos gerais, pretendia colocar, na área da ciência e da tecnologia, ao Sr. Ministro c à equipa ministerial que está presente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Costa.
O Sr. Mendes Costa (PSD): — Gostaria de questionar o Sr. Ministro sobre a decisão da nossa comissão, que deliberou consultar todos os municípios sobre os critérios de distribuição do FEF (Fundo dc Equilíbrio Financeiro). Não sei se o Sr. Ministro tem presente os resultados dessa consulta.
A comissão criou um gTupo dc trabalho que elaborou um relatório com esses elementos, relatório esse que apresenta três propostas fundamentais: há municípios que querem os critérios actuais, há outros que querem os novos critérios c há outros ainda que têm uma posição coincidente com a Associação Nacional dos Municípios Portugueses.
No entendimento do PSD, esta pergunta não sc colocou aos municípios, porque os 180 milhões não estavam em discussão c aquilo que o FEF aponta são 157,5 milhões dc contos. Portanto, isto fugia ao critério da Lei das Finanças Locais. Mas, no nosso entendimento, as respostas são significativas da vontade dos municípios que dependem mais do Fundo dc Equilíbrio Financeiro, isto é, os municípios mais pobres, os do interior, aqueles que não gerem receitas próprias ou gerem com menor intensidade.
Sc o Sr. Ministro não conhece o documento, faculto--the csic meu exemplar para que possamos estudar aqui a maneira dc sermos solidários com os municípios mais pobres.
O Sr. Alberto Araújo (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Trata-se dc sermos solidários. Os municípios que são mais ricos não querem prescindir dessa riqueza e os mais pobres, cada vez serão mais pobres, cada vez farão menos obras. No entendimento do PSD, não há um critério dc justiça social. O FEF, como diz a própria expressão, é para equilibrar as finanças dos municípios.
O Sr. Alberto Araújo (PSD): — Não deixa dc ser fundo de equilíbrio!
O Orador: — Gostaria que o Sr. Ministro pudesse responder-nos a esta temática porque, no entendimento do
PSD, é realmente de atender aos que estão de acordo com os novos critérios, pois temos conhecimento e todos sabemos que a aplicação integral da Lei n.° 1/87 vai penalizando os municípios gradualmente. Por isso, foi nosso entendimento que a lei só era aplicada em cinco anos, embora haja municípios que têm crescimento zero, e que, em termos reais, vão perder 11 %, que é a fracção esperada. Portanto, é nossa obrigação estudarmos bem esta questão da distribuição do FEF.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Começarei exactamente como começou o Sr. Deputado Mendes Costa, mas, em vez dc perguntar ao Sr. Ministro se conhece os dados, vou fornecer-lhos. É porque no relatório técnico que acompanha o Orçamento diz-se que os novos critérios são formalmente propostos se se verificar que existe um apoio significativo à solução apresentada por parte dos municípios c da sua Associação representativa e cu não tenho qualquer dúvida de que as respostas ao inquérito que a Assembleia da República fez são mais do que elucidativas! E são-no por uma razão simples: porque posições coincidentes com a Associação Nacional de Municípios, de um total de respostas dc 226, foram 144, ou seja, 63,7 %. E a posição da Associação Nacional de Municípios não é só a história dos 180 milhões de contos, história que não vou discutir agora, aqui...
O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Mas deve discutir! Foi para isso que sc inscreveu!
O Orador: — Ó Sr. Deputado, gostaria de ouvi-lo também sobre isto e espero que se inscreva para dar também o seu contributo, que é sempre bem-vindo.
Mas o que estava a dizer é que a Associação Nacional dc Municípios, para além de falar nos tais 180 milhões de contos, disse que, atendendo à forma como este processo decorreu — e não vou falar nos episódios que o Sr. Ministro já conhece—, em 1991, perante este estado de coisas, os municípios deveriam poder optar pelo maior dos FEF atribuídos.
Não vamos discutir a questão técnica, que já discutimos, porque ela é importante mas quando estas questões são colocadas a tempo e horas, isto é, quando, por exemplo, os novos critérios são colocados à discussão dos interessados c da própria Assembleia da República atempadamente, por forma que dc tempo a fazer-se uma análise aprofundada dos critérios ... É porque, de facto, chegámos a situações que considero verdadeiramente caricatas!...
O Sr. Deputado Mendes Costa disse há pouco que não podemos defraudar as expectativas dos municípios do interior, que são os que dependem mais do FEF. Ora bem, mas não deixa de ser curioso — e o Sr. Ministro nunca conseguiu esclarecer isto— que, pela aplicação dos tais novos critérios —e o Sr. Ministro vem dizer que vai defender esses tais municípios, como disse o Sr. Deputado Mendes Costa —, aconteça, por exemplo, o seguinte: os municípios dos Açores estão numa situação dc desenvolvimento muito atrás da maioria dos municípios do continente, que estão mais distantes do centro, que a própria dispersão é muito maior.... há uma grande insularidade. Portanto, os municípios dos Açores perdem com a passagem da aplicação dos critérios da Lei n.° 1/87 para a aplicação dos novos critérios.
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Posso dar-lhe os números .... 6 só uma questão de fazer as contas. Segundo creio, perdem cerca de 100 000 contos de uma lei para a outra, no Orçamento para 1991.
Também não deixa de ser curioso que, por exemplo, cm relação aos municípios da Guarda, que são os tais «pobrezinhos» que o Sr. Mendes Costa referiu, os tais «do interior», também percam com a passagem de uma lei para a outra. Isto é que são situações que, de facto, não entendemos muito bem. Ou, melhor, entendemos é muito bem que isto foi feito tão à pressa — e os erros que foram aparecendo são disso sintomáticos — que não foram devidamente ponderados todos estes critérios, de forma a chegarmos a uma solução que pudesse ser harmoniosa.
Portanto, em relação a esta matéria, Sr. Ministro, quer em função das respostas dos municípios quer em função da posição da própria Associação Nacional de Municípios, parece-me que a solução mais sensata seria a de, para 1991 c com carácter transitório, abrir a possibilidade aos municípios de escolherem o melhor dos FEF propostos.
Esta é a nossa posição, Sr. Ministro, c vamos naturalmente bater-nos por cia, porque se o Governo considera que em matéria dc finanças locais há necessidade de alterações então vamos estudar uma nova Lei das Finanças Locais. Vamos avançar com isso, Sr. Ministro!
De facto, até estranho —já disse isso da outra vez e volto a dizê-lo — que o PSD tenha anunciado cm Plenário, cm Maio desto ano, que o grande pacote autárquico iria aparecer, designadamente no que se refere a atribuições, competências e Finanças locais, ainda este ano, e que iria aparecer ainda antes de o Orçamento do Estado ser discutido e que, de facto, isso não tenha acontecido c só tenham aparecido meras propostas avulsas com objectivos que não vou aqui classificar, porque a análise que fizemos das repercussões que isto tem nos municípios poder-nos--iam levar a conclusões pouco agradáveis.
Portanto, Sr. Ministro, em relação ao FEF estamos conversados. Aliás, o Sr. Ministro disse que, eventualmente, para as derramas ia surgir uma nova filosofia. Não pomos em causa que apareça uma nova filosofia para as derramas, mas tem de haver também uma nova filosofia para as finanças locais, e não podemos estar, cm pleno debate de Orçamento do Estado, a discutir propostas avulsas.
Vamos discutir isto seriamente, mas vamos fazê-lo na altura própria — e julgo que há tempo, mais do que suficiente. A própria Lei das Finanças Locais, como sabe, também tinha, ela própria, definido um carácter de aplicação transitória dos critérios de distribuição do FEF. Ora, tanto quanto sei, 1990 foi o primeiro ano, em que eles foram aplicados.
Como o Sr. Ministro se recordará, apontou-se para um horizonte de cinco anos para se averiguar da maior ou menor justiça dá Lei n.° 1/87. Os cinco anos acabam para o ano. Por que é que estamos a fazer isto à pressa, Sr. Ministro? Sinceramente, não estou a ver qual é a necessidade dc fazermos isto à pressa e considero, naturalmente — tive já o cuidado de dizê-lo aquando da discussão do Orçamento do Estado na generalidade —, que o que se diz aqui no relatório técnico não me parece que seja muito razoável. Vamos debruçar-nos seriamente sobre o assunto e não vamos, com manobras destas, tentar dividir os municípios, que foi o que nitidamente sc pretendeu. Por acaso, até lemos os resultados deste inquérito que i'vzemos aos municípios..., mas os governadores civis também fizeram. Para quê? Será que o Governo — se é verdade o que disse, isto é, que fez um estudo aprofundado, que ensaiou todas estas hipóteses — não estaria assim tão
seguro da sua própria proposta que se sentisse na necessidade dc justificar um inquérito por via dos governadores civis e depois, como as respostas não apareciam e viu o PSD, a pressionar um inquérito pela própria Assembleia da República?!
O Sr. Antunes da Silva (PSD):—O Sr. Deputado também faz parte do grupo de trabalho!
O Orador: — Ó Sr. Minisuo, digo isto porque estamos abertos a discuür estas questões na altura própria, com tempo suficiente e ouvindo os interessados por intermédio da sua associação representativa.
Vou colocar-lhe ainda mais umas questões, o que, aliás, já fiz em sede de discussão na generalidade. Mas vou ter de repetir —vai deseulpar-me— porque durante este período, contrariamente ao que foi dito, não vislumbrei alteração significativa da situação.
E outra questão que quero colocar-lhe está relacionada com os programas operacionais, aliás, a Sr.1 Secretária de Estado, certamente, deve recordar-se dela. Alguns programas operacionais estão a funcionar, apesar de terem começado todos tardiamente por razões que conhecemos, mas tive oportunidade de dizer que, alguns deles, designadamente os da zona do vale do Tejo, os da lezíria c do médio Tejo, entre outros, praticamente ainda não foram aprovados pelas unidades dc gestão. As unidades dc gestáo, nessa altura, não estavam em funcionamento pelas razões que üvc oportunidade de apontar, mas desde essa altura até agora não houve qualquer progresso significativo. Ora bem, sabemos que a nova filosofia dos fundos financeiros diz-nos que as verbas ou são uülizadas agora ou não poderão ser transferidas para os anos seguintes. Na altura, a Sr." Secretária de Estado deu a entender que não haveria esse risco c é por essa razão que frontalmente lhe pergunto se há ou não esse risco. É que os presidentes das câmaras estão preocupadíssimos!...
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: —O risco de quê?!
O Orador: — O risco de as verbas afectas ao financiamento desses programas operacionais não poderem ser transferidas para o ano seguinte sc não houver, entretanto, tempo suficiente para avançar com os projectos — c para muitos deles, se calhar, não vai haver mesmo, porque estamos já no princípio do mês de Dezembro.
Há ou não possibilidade de essas verbas serem transferidas? Os lais adiantamentos dc que sc falou que iam seguirnão tenho conhecimento de que tenham chegado às câmaras, Sr." Secretária de Estado! Recordo até um requerimento que fiz no início deste ano aos Srs. Minisuos do Planeamento e da Adminisuação do Território e das Finanças cm resultado da constatação que fiz de que durante este ano as câmaras foram confrontadas com esta situação difícil: como tinham pagamentos cm atraso de verbas dos fundos comunitários que deveriam ter recebido, então, contactavam as comissões dc coordenação regionais, que lhes diziam: «Bem, não temos aqui dinheiro, mas parece-me que o dinheiro já chegou ao Tesouro.» Aliás, o Sr. Ministro dizia que o dinheiro já cá estava. Falavam para o Tesouro c este dizia: «Não, não! A verba já foi para as comissões dc Coordenação regionais! [...]»
Perante esta situação de grande ambiguidade, üve. o cuidado dc fazer um requerimento a perguntar o que é
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que estava a passar-se e até hoje ainda não recebi qualquer resposta. Será que, mais uma vez, em relação a isto, as verbas que estão no Tesouro e os adiantamentos ainda não se fizeram para as câmaras? Parece-me que esta é uma situação que pode ser extremamente grave, pelo que gostaria de ser esclarecido.
Sr. Ministro, uma outra questão liga-se ao facto de o Governo utilizar sempre o mesmo argumento —e mais uma vez sc serviu dele — para justificar a alteração dos critérios. Assim, o Governo diz que as receitas próprias de alguns municípios têm aumentado de uma forma estrondosa. Por acaso, o Sr. Ministro tem informações acerca do ano de 1990? Sabe, por exemplo, que algumas das receitas tiveram uma quebra substancial em 1990, designadamente a contribuição autárquica, a sisa e as derramas? Tem conhecimento disto, Sr. Ministro?
Na verdade, as informações que nos chegaram de alguns
municípios, isto é, daqueles que já tiveram o cuidado de fazer esse levantamento, são extremamente preocupantes, até porque já lá vão dois anos de reforma fiscal e ainda não há código de avaliações ...
São estas as questões que gostaria de ver esclarecidas pelo Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: —Tem a palavra a Sr.° Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, tendo em conta a intervenção inicial que V. Ex." produziu e também a intervenção do Sr. Deputado Mendes Costa, cm primeiro lugar, gostaria de dizer que a proposta que o PCP aqui apresenta, e que já oportunamente foi debatida com o Sr. Ministro, é de solidariedade com os municípios, cm especial com os municípios mais pobres. Como o Sr. Ministro bem sabe, a Associação Nacional de Municípios Portugueses também defende, muito justamente, uma proposta idêntica à nossa c os resultados do inquérito feito às câmaras municipais, por proposta do PSD, revelam o mesmo espírito de solidariedade.
De facto, os resultados obtidos, que já foram aqui referidos, revelam que 66 % das respostas dos municípios defendem a posição da Associação Nacional de Municípios Portugueses.
O Sr. Mendes Cosia (PSD): — Não é assim!
A Oradora: —É assim, Sr. Deputado! E vou proceder à leitura da conclusão do inquérito para que tudo fique bem claro!
Assim, diz-se aqui: «(...] dos que responderam, 6,6 % optaram pelos critérios da Lei n.° 1/87, sem referir a opção da Associação Nacional de Municípios Portugueses; 27,4 % optaram pelos novos critérios; 66,6 % defendem a posição da Associação Nacional de Municípios Portugueses [...]» — que, no seu primeiro ponto, como o Sr. Deputado sabe, diz expressamente: «a necessidade de fixação do Fundo de Equilíbrio Financeiro em 180 milhões de contos a distribuir dc acordo com a Lei das Finanças Locais». Logo, podemos concluir que 66 % das respostas dos municípios vão no sentido de considerar esta questão como fundamental.
E é esta também, Sr. Ministro, a posição que o Grupo Parlamentar do PCP defende, isto é, a questão da solidariedade com os municípios, com a posição da Associação Nacional dos Municípios Portugueses e também com a maioria das respostas ao inquérito que já referi.
Ora bem, Sr. Ministro, cabe agora ao Governo, face a estas interrogações aqui colocadas e às respostas dos municípios, decidir em respeito, nomeadamente, da posição dos municípios, que coincide com a posição da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Isto é, para encerrar esta questão, há que respeitar a posição da maioria dos municípios e a posição da Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Em relação a uma outra questão que também envolve o debate das finanças locais neste Orçamento e, embora, correndo o risco de repetir o que já aqui foi dito a esse propósito, gostaria de deixar bem claro que, em nosso entender, é mais do que justo atribuir aos municípios portugueses os 180 milhões de contos do Fundo de Equilíbrio Financeiro para 1991, até porque todos sabemos como têm sido feitas as subavaliações do IVA e os
prejuízos que têm causado aos municípios, os quais se estimam em mais dc 30 milhões de contos, só nestes últimos anos, ou seja, desde 1987 até hoje.
Portanto, cm relação à proposta governamental, apenas pretendemos que a situação actual, muito prejudicial para o municípios, seja revista e reposta a situação anterior, tendo por base a Lei das Finanças Locais, que assenta no pressuposto do cálculo do IVA que, simplesmente, tem sido sistematicamente subavaliado, o que deu origem à situação actual que estamos a viver.
Impõe-se, pois, fazer justiça aos municípios, pelo que a nossa proposta, que vai nesse sentido, tenta também dar resposta à questão levantada pelo Sr. Ministro com o objectivo dc saber como financiar os aumentos. É exactamente com as verbas resultantes dos aumentos do IVA, que foram recebidos pelo Governo durante estes anos, que não constavam nos orçamentos iniciais e que, por isso, defraudaram os municípios portugueses em mais de 30 milhões de contos. Sr. Ministro, fazer isso é fácil e claro! Basta querer fazer justiça aos municípios e cumprir integralmente a Lei das Finanças Locais!
Ainda quanto a outros aspectos relativos ao Orçamento do Estado, gostaria de dizer também, por exemplo, que o artigo 25.°, que trata da contribuição autárquica, insiste em manter uma situação que viola a Lei das Finanças Locais, nomeadamente o seu artigo 7.°, que diz que os municípios serão compensados pelas isenções de impostos. Ora, o artigo 25.° esquece que os municípios serão compensados pelas isenções previstas no artigo 7.° da Lei das Finanças Locais. Isto, Sr. Ministro, não é cumprir a lcü... Portanto, impõe-se que o Governo faça esta alteração ao Orçamento se não o fizer sentir-nos-emos na necessidade dc apresentar uma proposta com esse objectivo, para que a Lei das Finanças Locais seja também cumprida nesta matéria.
Aliás, acontece exactamente o mesmo no artigo 26.°, que estabelece novas isenções de sisa, uma vez que, nos termos do artigo 7.° da Lei n.° 1/87, de 6 de Janeiro — que é preciso cumprir—, os municípios têm de ser compensados por tais isenções (tal como pelas anteriores). No entanto, ainda não o foram, pelo que o Estado tem uma dívida para com as autarquias, isto é, tem de as compensar pelas isenções de sisa e de outros impostos que ocorreram ao longo destes anos e a que os municípios têm direito, nomeadamente o da contribuição autárquica.
Sr. Ministro, o Governo insiste lambem no cumprimento do artigo 44.°, isto é, na regularização das dívidas dos municípios à EDP.
Dc facto, é inadmissível que o Governo, por um lado, não cumpra a Lei das Finanças Locais, ou seja, não
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compense, não pague aos municípios aquilo a que eles têm direito nos termos da lei, e que, por outro lado, retenha verbas que lhes são devidas, sem que haja, sequer, previamente, uma decisão dos tribunais nesse sentido.
Acontece, aliás, o mesmo em relação ao espírito e à letra do artigo 45.° da proposta de lei do Orçamento do Estado, onde o Governo retira verbas às autarquias —e algumas das quais, aliás, nem sequer têm gabinetes—, decidindo que elas paguem directamente à EDP ou fazendo--lhes uma retenção indevida, insistindo, assim, no que já tinha feito aprovar na proposta de lei do Orçamento do
Estado do ano passado.
Um outro aspecto que tem vindo a ser levantado com justeza, nomeadamente pelas autarquias e, em especial, pelas freguesias, diz respeito à necessidade de construção de sedes para as juntas de freguesia. Não se admite que, 16 anos após o 25 de Abril, em muitos distritos do nosso país, sobretudo em muitos concelhos, ainda haja um número elevadíssimo de freguesias sem sede, onde os presidentes das juntas utilizam os próprios carros para dar despacho aos assuntos e receber os munícipes. Na verdade, o carro de muitos presidentes de juntas de freguesia faz de sede dessas juntas!... Em outras freguesias não é o carro mas 6 a cozinha da casa dos presidentes das juntas que serve de sede. Ora, isto não pode continuar!
Até mesmo no distrito do Porto há ainda hoje concelhos em que cerca dc metade das juntas de freguesias não têm sedes. Outras têm sedes, mas as casas estão a cair e não têm o mínimo de condições. Impõe-se, portanto, alterar esta situação no mais curto espaço dc tempo. Esta é uma das reivindicações que quer a ANAFRE, quer a Associação Nacional de Municípios Portugueses, quer a generalidade das juntas de freguesia têm vindo a fazer e a verba proposta de 450 000 contos é insuficiente, Sr. Ministro! É necessário aumentá-la, pelo que apresentamos uma proposta concreta nesse sentido. Entendemos que o Governo deveria rever esta polítíca de adiar a construção das sedes das juntas dc freguesia.
Quanto à questão da transferência de novas competências para os municípios, já todos lemos uma opinião clara a esse respeito. Pensamos que, desde que as autarquias estejam de acordo com a transferência das novas competências e desde que seja cumprida a Lei das Finanças Locais, nomeadamente o artigo 3.°, que prevê a transferência das novas competências c também dos respectivos encargos, não existe qualquer problema.
No artigo 51.°, o Governo insiste na participação na reforma educativa, através de novas competências por parte dos municípios, sem estabelecer claramente que meios financeiros é que vâo ser transferidos. Esta situação não pode continuar! Mas, dc facto, cia é prática corrente e, neste momento, o Governo coloca os municípios «entre a espada e a parede» ao dizer: «Querem que sc construa aí a escola secundária ou a escola C+S ou a escola preparatória? Então, dêem o terreno ou entrem com 30 % do capital!» E pronto! Os municípios, perante uma situação destas, sentem-sc «encostados à parede» e, abdicando, por vezes, de satisfazer outras necessidades urgentes da população, que são da sua competência, enquanto estas são da competência do Ministério da Educação, e sem que lhes seja dado meios financeiros adequados, satisfazem novamente encargos da responsabilidade do Governo. Aliás, como todos sabemos, com os centros dc saúde passa-se a mesma coisa! ...
Sr. Ministro, isto não pode continuar!
Por último, e para concluir, gostaria de saber se V. Ex.' quer alterar a Lei das Finanças Locais. Se quer, então, vamos fazer um debate com princípio, meio e fim e de forma correcta. Envie, atempadamente, para a Assembleia da República uma proposta de lei, mas só depois de ouvir a Associação Nacional de Municípios Portugueses e de estudar as diferentes propostas e alternativas que forem apresentadas. Creio que poderemos encontrar a solução que melhor sirva a autonomia c o reforço das competências e da descentralização administrativa, em benefício das populações, mas, sobretudo, em defesa do poder local.
Assim, este ano, em pleno debate da proposta de lei do
Orçamento do Estado, deixamos aqui este desafio claro:
distribuam os 180 milhões de contos, cumpram integralmente a Lei das Finanças Locais, tal como está, e discutam connosco as alterações à mesma
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Antunes da Silva.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Sr. Ministro, vou referir-me também à questão do FEF, mas devo confessar--lhe que, em relação a esta matéria, estou um pouco confuso!...
Em primeiro lugar, tive também o prazer de receber o relatório elaborado no âmbito da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente e, embora gostasse de o fazer, chego à conclusão de que não posso acreditar no que lá sc diz... O Sr. Deputado Gameiro dos Santos, na intervenção que produziu, disse que não estavam em causa os 180 milhões de contos do FEF relativamente a 1991. E ainda bem que disse isto, porque ajuda a desmistificar esta situação, pois, de acordo com este documento, a posição da Associação Nacional de Municípios Portugueses foi elaborada na base dos 180 milhões dc contos.
Ora, se assim é, e se os 180 milhões de contos não estão cm causa, não podemos dar como boas as respostas que se apoiam na posição da Associação Nacional dos Municípios Portugueses.
Mas sobre isto, e para que não se diga que estou a contrariar os 180 milhões de contos, gostaria só de lembrar aos Srs. Deputados o seguinte: o valor do FEF de 1986, comparando-o com o proposto para 1991, duplicou, o que não deve passar despercebido a ninguém, muito menos aos responsáveis pelos municípios portugueses.
Mas, a partir desta situação, e uma vez que não estão cm causa os 180 milhões de contos, não posso tomar como boa esta última relação que nos aparece quanto às sondagens feitas pela Associação Nacional de Municípios. Assim sendo, verifico, a partir destes números, que, de facto, a maioria dos municípios que responderam a este questionário apoiam — e bem, na minha óptica! — a proposta alternativa para distribuição das verbas do FEF.
O Governo, muito louvavelmente, mas, na minha óplica, tardiamente, apercebeu-se de que a actual Lei das Finanças Locais aprofundava os fossos e as assimetrias entre as regiões do País. Repito: fê-lo tardiamente, mas... mais vale tarde do que nunca! Porque não aproveitar estes novos critérios?
Aqui, faço mais uma crítica ao Governo, que é a seguinte: parece-me haver pouca determinação na aprovação desta proposta alternativa. No relatório geral do Orçamento do Estado para 1991 diz-se, relativamente a
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esta matéria, que, se se verificar um apoio significativo à solução apresentada, os novos critérios serão formalmente propostos.
Se a memória não me falha, o Sr. Ministro hoje utilizou, esta fórmula: «expressiva manifestação de apoio». Sr. Ministro, cm termos de Parlamento, a maioria do PSD é, para mim, já essa «forma expressiva de apoio»! Porém, sempre teremos de perguntar: vamos questionar as outras aprovações que são feitas pela maioria PSD?
É louvável esta posição do Governo de apresentar esta proposta alternativa. Contudo, espero que haja maior determinação para que possamos aprová-la.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado
Carlos Luís.
O Sr. Carlos Luís (PS): — Sr. Ministro, à semelhança do que aconteceu com o Sr. Deputado Vítor Costa, também vou questioná-lo sobre o problema da investigação e tecnologia.
Sr. Ministro, na última reunião que tivemos solicitámos o parecer do Conselho Superior de Ciência e Tecnologia, o qual V. Ex.° se comprometeu a enviar. Recebemo-lo passados dois ou três dias, mas acontece que o parecer enviado não é o desse Conselho mas, sim, o de uma sua comissão permanente.
Pergunto, portanto, a V. Ex.* se essa comissão, que não tem vínculo jurídico ao Decreto-Lci n.° 22/87, está devidamente mandatada pelo Conselho Superior de Ciência e Tecnologia ou se foi, de facto, arranjada à pressa para emitir um qualquer parecer.
Sr. Ministro, verificamos que, à semelhança do que tem acontecido com a comunidade científica — e V. Ex.* tem conhecimento disso, segundo penso—, os órgãos da comunicação social escrita c falada e, inclusivamente, a televisão têm noticiado amplamente uma viva contestação a este Programa Ciência.
V. Ex.*, no dia 1 de Abril, anunciou este programa numa universidade do interior, mais concretamente, na Universidade de Vila Real, na presença do comissário europeu Bruce Millan, como sendo o salva-vidas da ciência a poder dar satisfação às múltiplas necessidades que a comunidade científica c os centros tecnológicos têm.
Passados uns meses a contestação já existia de norte a sul do País: vinha dos centros universitários, da JNICT, do LNETI, enfim, dos mais variados centros de investigação e da comunidade científica, em particular dos reitores, dos professores universitários e de nomes sonantes da investigação. Contestava-se a distribuição das verbas, porque havia uma mutação. O próprio Decrcto-Lei 22/86 diz, no seu preâmbulo, «que deve haver um desenvolvimento global e harmonioso do País cm todas as ciências, não privilegiando umas em detrimento de outras». Verifica-se, de facto, que o Programa Ciência não é esse «maná» que V. Ex.* teve oportunidade de anunciar ao País, na Universidade de Vila Real, em 1 de Abril.
V. Ex* anunciou 55 milhões de contos, o que já era um bolo significativo em relação às verbas anteriores e que constitui um facto que também constatamos! Mas o que é certo é que, logo de imediato, a mesma comunidade científica verificou que os projectos a que linha dado início, nomeadamente a partir dc 1987, sofriam estrangulamentos no Programa Ciência, que visa, sobretudo, a criação dc infra-estruturas c a formação dc pessoas.
Sendo assim, não se vêem verbas significativas para financiar os projectos que tinham lido início com os
programas anteriores. Para além disso, também existia aqui uma grande mutação, porque não se privilegiavam determinadas áreas, como, por exemplo, a das ciências sociais (excepção feita à gestão e à economia).
Sr. Ministro, verificamos igualmente que — e V. Ex.* terá oportunidade de me responder também a esla questão — poderá haver uma duplicidade de financiamentos e um trabalho paralelo, inclusivamente de outros programas comunitários. Refiro-me, em concreto, ao PEDIP. É provável que nesta conexão universidade/empresa haja, neste momento, investimentos também num programa paralelo que não é da sua área. Refiro-me ao PEDIP e ao Programa Ciência. Sendo assim, penso que poderá haver desperdícios de energia, dc dinheiro c de recursos humanos.
Tendo o Programa Ciência como um dos principais objectivos corrigir as assimetrias, que tão amplamente têm sido avocadas na Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, pergunto a V. Ex.* como é que irá compatibilizá-lo, quando cerca de 65 % da comunidade científica reside precisamente em Lisboa e quando V. Ex.' e o seu Ministério pensam criar dois parques científicos ou tecnológicos no litoral, em zonas mais favorecidas e desenvolvidas, concretamente em Lisboa e no Porto.
Como é possível estabelecer esses contratos empresa/ universidade em Vila Real, em Beja, cm Évora, em Faro, na escola superior de educação e nos institutos politécnicos? Como é que é possível, de facto, satisfazer essa necessidade, uma vez que esse programa veio precisamente a ser co-financiado com verbas que visam essencialmente corrigir essas assimetrias, nomeadamente do FEDER c o do FSE (c é daí que vem o maior bolo para o Programa Ciência)? Como é que V. Ex.* vai compatibilizar e reduzir essas assimetrias, quer ao nível das infra-estruturas quer ao nível da formação, da ciência e da tecnologia? Irá redistribuir os cientistas sediados, nomeadamente em Lisboa, Porto, Coimbra e Aveiro, e enviá-los para Vila Real dc Trás-os-Montcs, para a Guarda, para Castelo Branco, para Évora e para Faro?
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — E com «guia de marcha»! ...
O Orador: — Com «guia de marcha»?! Redistribuí-los!
Irá V. Ex.*, uma vez que não tem tempo suficiente — material e espacial — para formar cientistas, enviá-los para as regiões da periferia? Como é que V. Ex.* poderá dar cabimento a este programa, que é ambicioso e que tem merecido uma enorme contestação, como V. Ex.* sabe, da parte da comunidade científica, muito cm particular de organismos expressivos, como seja o caso da JNICT?
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Quer contestar o Programa Ciência?
O Orador: — Da maneira como ele foi elaborado, penso que sim, presumo que...
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — A JNICT contesta o Programa Ciência, que foi por si elaborado? Essa é que cu nunca tinha ouvido! ...
O Orador: — Não! Contesta o parecer consultivo da JNICT.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Deve estar mal informado, Sr. Deputado!
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O Orador: — É uma pergunta que faço, e que gostava que o Sr. Ministro esclarecesse.
Pergunto: o Conselho Superior foi favorável — eu rcfiro--me a todos os sectores e não só a um em concreto— a este parecer e mandatou esta comissão permanente para dá-lo.
Para terminar, Sr. Ministro, pergunto-lhe: não acha impossível criar um desenvolvimento harmonioso e global do País sem que exista um diálogo permanente e constante com esta gente, que, inclusivamente, nüo tem pedido aumentos salariais, que não tem tido qualquer aumento de bens a nível da comunidade pública, mas que tem reivindicado tão-só meios suficientes para a manutenção de muitos laboratórios e de muitas sedes de investigação, meios esses que lhe têm sido truncados?
O Sr. Presidente: —Tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Henriques.
O Sr. Júlio Henriques (PS): — Sr. Ministro, Srs. Secretários dc Estado: Eu gostaria de colocar algumas questões importantes para a vida do poder local, como é o caso da que tem a ver com o do Fundo de Equilíbrio Financeiro, que tem afectado gravemente a sua vida quotidiana. Assiste-se, hoje em dia, àquilo a que se tem chamado «um problema dc asfixia financeira». Mas já lá irei!...
A questão do Fundo dc Equilíbrio Financeiro, que 6, porventura, a mais consistente, leva-me também a deixar aqui expressa a minha opinião. Face àquilo que aqui foi dito, parece-me que é incontroverso que, dos 226 municípios que responderam ao inquérito feito, 63,7 % ou, melhor, 144 pronunciaram-se pelo cumprimento da lei, em harmonia, aliás, com a tese da Associação Nacional de Municípios Portugueses e 82, o equivalente a 36,3 %, no sentido da aplicação dos novos critérios.
Creio que não é excessivo solicitar ao Governo que acolha a nossa proposta, no senüdo de que, no mínimo, seja atribuída a cada uma das municipalidades a maior das verbas constantes no anexo 10 ou na proposta alternativa de novos critérios. Essa proposta alternativa — c é bom dizê-lo — foi milimelricamente elaborada, por tal sorte que 183 municípios resultariam beneficiados da aplicação dos novos critérios, o que representaria 60 %, e 122 perderiam com essa mesma aplicação, o que equivaleria a 40 %.
Mas isso não é, a meu ver, o mais importante. O mais curioso, em termos de interesse do Governo e do partido que o apoia, é a circunstância — que o meu colega Gameiro dos Santos járeferiu há pouco — de se introduzir (e porventura bem) o factor altimétrico para se concluir que na zona mais alui de Portugal, uma das mais pobres da Beira Interior — o distrito da Guarda —, 9 em 14 dos municípios resultariam prejudicados. É espantoso!
Mas um outro dado que ajuda a explicar as coisas é o de que no distrito de Santarém 12 cm 21 municípios também resultariam prejudicados. Porém, o que é curioso é que dos 12 prejudicados só um tem presidência do PSD, que é o de Vila Nova de Ourém.
De facto, vê-se claramente a intenção que presidiu à elaboração desta proposta alternativa.
O Sr. Deputado Antunes da Silva, meu querido conterrâneo, pediu-me licença para interromper. Faça favor.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Obrigado pela interrupção, Sr. Deputado Júlio Henriques.
Era apenas para pedir um esclarecimento, pois não sei $e percebi bem.
O Sr. Deputado propõe que seja a maior das verbas entre uma c outra proposta em discussão?
O Orador: — Proponho que a cada município seja atribuída a maior das verbas constantes nos dois mapas que se encontram no anexo 10 ao Orçamento do Estado ou, no caso de ser maior, a da alternativa, o que, nos tempos que correm e quando se fala de tantos milhões representa uma verba insignificante. Essa verba ronda os 6 milhões de contos, mas é inferior a 4 % ao valor da verba inscrita para o Fundo de Equilíbrio Financeiro.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Sr. Deputado, eu não queria discutir, mas tão-só esclarecer-me melhor. Por isso tomei a liberdade de pedir para interrompê-lo, o que agradeço.
O Orador: — Por outro lado, gostaria que alguém me explicasse aquilo que considero uma coincidência curiosa: é que, cm numerosos casos dos tais novos critérios, aparece como crescimento, cm termos percentuais, relativamente ao FEF de 1990, a verba de 22,66 %, ou seja, precisamente aquela que surge globalmente na proposta de lei do Orçamento do Estado.
Em numerosos municípios o aumento da verba do FEF dc 1990 para 1991 é, em rigor, de 22,66 %, o que, a meu ver, dá menor credibilidade ao estudo elaborado. De resto, sustento esta minha opinião no facto de me terem passado pelas mãos coisas como esta: uma primeira proposta de aumento para a Câmara do Sardoal, distrito de Santarém, no valor de 100 % e uma segunda hipótese de aumento no valor de 70 %, quando, afinal, o aumento é de 38,9 %!...
De facto, isto foi, dc forma incontroversa, apressadamente elaborado!
Outras questões, igualmente importantes, são as que têm a ver, por exemplo, com as indemnizações compensatórias que a Lei n.° 1/87 expressamente refere. É que não se vê inscrita na proposta dc lei do Orçamento do Estado para 1991 qualquer verba que possa ressarcir os municípios daquelas receitas, que perdem por decisão do Governo, porventura correctamente assumida, em matéria de algumas isenções, como seja nos casos da sisa e da contribuição predial.
Por outro lado, e cada vez com maior insistência, assistimos à transferência de novas responsabilidades para os municípios sem que os meios necessários as acompanhem. Hoje mesmo tive ocasião de olhar rapidamente para um diploma elaborado no uso de uma autorização legislativa e que prevê o suporte financeiro do funcionamento das assembleias distritais também pelos municípios.
Espero bem que o Governo, que está a legislar sobre a matéria, venha a corrigir este aspecto, pois, dc facto, os municípios nao possuem meios financeiros que permitam sustentar a dedução que já lhes é feita de 1,4 %, e destinada a suportar funcionários da Administração Central ao nível dos gabinetes dc apoio técnico e —como há pouco referia a Sr." Deputada Ilda Figueiredo— também a retenção de verbas destinadas ao pagamento de supostas dívidas à EDP.
Por conseguinte, creio que não se devem retirar aos municípios as verbas para sustentar as assembleias distritais.
Queria ainda referir ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários dc Estado que segundo penso, a verba para a construção de novas sedes de freguesia é insignificante —de 1990 para 1991 cresceu apenas 50 000 contos —, sendo enormes as carências que sc sentem em todo o país.
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Por fim, quero realçar que a proposta de lei do Orçamento do Estado para 1991 contempla urna verba de 150 000 contos para calamidades e, em geral, problemas de excepcionalidade, sendo a mesma, de todo em todo, insignificante, já que a nada responderá. Com efeito, penso que bastará uma trovoada mais forte e lá se irão os 150 000 contos...
O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Isso não é correcto!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Casimiro Pereira.
O Sr. Casimiro Pereira (PSD): — Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: O debate sobre as finaças locais já vai longo; em todo o caso não posso deixar de fazer aqui alguns comentários e também uma ou duas perguntas.
De facto, os municípios portugueses não estão satisfeitos com a situação; nunca estiveram c presumo que nunca irão estar. Isto porque a situação é complexa, os recursos são limitados e, na generalidade, as câmaras têm sempre necessidades e ambições de ir mais além. Por conseguinte, esta polémica irá sempre existir.
Em todo o caso, queria aqui perguntar ao Sr. Deputado Júlio Henriques, autarca experiente, sc considera que, por exemplo, em 1983 e 1984 foram concebidos, através do Orçamento do Estado e relativamente às finanças locais, «esses esquemas milimétricos» para prejudicar alguns e beneficiar outros.
Posso dar muitos exemplos, mas dou-lhe só este: nesse ano de 1983, quando era Ministro da Administração Interna o Sr. Engenheiro Eduardo Pereira e Secretária de Estado da Administração Autárquica a Sr." Dr." Helena Torres Marques, o meu municipio foi beneficiado em 1000$ relativamente a 1982, com uma inflação de cerca de 30 %, a qual, nas câmaras, com declarações de dívida e os materiais a subir desalmadamente, era classificada pelos técnicos que me davam apoio em cerca de 40 % a 45 %!
Portanto, face a eventuais dificuldades que tinha, o Governo sentiu a necessidade de alterar os critérios.
Também nesse tempo, por exemplo, o Sardoal, a Chamusca e tantas outras câmaras tiveram, nesse ano, um aumento de 33 %. O Sr. Deputado sabe que foi isto que se passou — aliás, passou-se um pouco por todo o país.
Por conseguinte, quem tem a responsabilidade de governar procura, seguramente, as melhores soluções denuo das dificuldades e da complexidade da situação.
Não perfilho, de maneira nenhuma, a opinião de que os municípios estão «asfixiados». Na verdade, o que os municípios não conseguem é ver satisfeitas todas as suas necessidades e ambições. Isto irá ser sempre assim, mas o que é facto é que os municípios já estiveram bem pior — e falo por aquilo que sei e conheço.
Sr. Ministro, concretamente em relação ao chamado «imposto municipal sobre veículos», gostaria de saber sc vai ou não haver uma actualização e, na hipótese afirmativa, em que âmbito. Além disso, queria saber sc a Associação Nacional de Municípios solicitou ou não essa actualização e em que percentagem o fez.
Também quanto às sedes dc junta de freguesia, queria dizer que durante muito tempo, e tendo a consciência de que as juntas de freguesia estavam mal instaladas — muitas mais aqui há uns anos atrás do que agora, pois, apesar de tudo, todos os anos se vão resolvendo várias situações—, os governos da altura, quando eram solicitados a colaborar na resolução desse problema, diziam que esse
não era um assunto da sua competência, tendo sido um ministro do PSD, o engenheiro Eurico de Melo, que definiu isso. Aliás, tal aconteceu também quanto às instalações da GNR e da PSP, relativamente às quais não havia soluções, tendo sido governos do PSD que as encontraram.
Foi também aqui muito criticado o problema dos contratos-programa.
Nós sabemos que os recursos são efectivamente limitados, mas devo dizer, até porque também tenho experiência nesse campo, que os autarcas aproveitam muito bem o «bolo» que todos os anos vai ficando disponível pelo Orçamento do Estado e percebem as situações. Aliás, alguns, que teriam até de esperar mais quatro ou cinco anos para ver resolvidos os problemas das escolas, dos postos médicos, dos centros de dia, etc, colaboram com o Governo, definido as suas políticas e avançando.
Portanto, se queremos encarar as coisas com sentido de equilíbrio temos de perceber que se impõe que colaboremos todos na resolução dos problemas. De facto, embora ninguém seja obrigado a isso — até porque pode acontecer que esperem mais um, dois ou três anos para verem resolvidos os problemas —, o certo é que os recursos serão assim mais bem aproveitados.
Digo isto apenas porque, na Assembleia da República, mais do que em qualquer outra instituição, temos a obrigação de perceber que «Roma e Pavia não se fizeram num dia» e que, por muito boa vontade que haja, não é de um momento para o outro que se resolvem todos os problemas. Penso que temos obrigação de reconhecê-lo! No entanto, o que muitas vezes vemos é as oposições a comportarem-se como se, dc facto, de um lado estivessem os bons (a oposição), que resolveriam tudo com uma varinha de condão, e do outro estivessem os maus, isto é, os do Governo e os que o apoiam, que não querem resolver os problemas e que são os grandes inimigos dos autarcas ou que entram cm esquemas de compadrio com aqueles que lhes são mais afectos.
Quando olhamos para a proposta do Governo relativa ao FEF, vemos que, se há dificuldades, elas acontecem em relação a todos os partidos. Além disso, julgo poder afirmar, seguramente, que se há quem tenha razão de queixa são mais os autarcas do PSD do que a generalidade dos autarcas da oposição.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Embora nesta altura do debate tal pareça um pouco estranho, eu gostaria de intervir sobre as Grandes Opções do Plano. É que, aparentemente, só há dois temas cm debate, embora, como é evidente, importantes: as finanças locais e a investigação científica e tecnológica.
Na verdade, estive à espera de verificar se, depois da «fulgurante» intervenção do Sr. Engenheiro Angelo Correia, teria havido um renascimento do interesse pelo debate das Grandes Opções do Plano, desde a discussão na generalidade até agora. Verifico, porém, que não, portanto vou tentar dar um contributo, certamente modesto a esse debate.
Já tive, aliás, ocasião de manifestar-me, na perspectiva cm que vou fazê-lo, a outros níveis, e devo dizer que a primeira vez que o fiz foi directa e frontalmente junto do Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território e também do Sr. Ministro das Finanças, aquando
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da entrega formal do documento das GOP ao PS, passava já mais de uma semana sobre a data em que ele tinha sido divulgado junto de outras instâncias nacionais.
Contudo, penso ser a altura de reiterar o posicionamento que então defini, até porque julgo que, entretanto, nada se passou de suficientemente significativo no debate, que foi praticamente inexistente, que permitisse alterar qualquer das posições então manifestadas.
Em primeiro lugar, quero salientar alguns factos, que
são os que passarei dc imediato a expor.
O ano dc 1991 vai ser mais um ano em que o País vai poder dispor de uma parte de verbas bastante avultada — 1500 milhões de contos que a Comunidade Europeia põe à disposição dc Portugal através dos fundos estruturais c no contexto do Quadro Comunitário dc Apoio...
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Não é só para 1991!
O Orador: — Bem, esse é um dos anos em que vai ser possível termos essa parte no contexto desse Quadro Comunitário de Apoio (QCA), o que significa que, no conjunto desse período e tal como é dito no próprio documento, cerca de 30 % do invesümento global vai ser viabilizado por esse método, com as contrapartidas internas correspondentes, o que, como é evidente, representa muito dinheiro.
Na verdade, o total das transferências financeiras da Comunidade para Portugal atinge os 250 milhões de contos em 1991, com mais 19 % em 1990, ano em que a verba atingiu os tais 210 milhões dc contos. Só no P1DDAC, o montante dc 261 milhões de contos com o cumprimento da programação dos investimentos que estão acordados no quadro comunitário de apoio constitui para o Governo uma preocupação fundamental, enquanto que nas GOP sc diz que o PIDDAC registará um crescimento de 19 % e que os aumentos verificados nos vários ministérios estão, sobretudo, associados a acções co-financiadas pela Comunidade Europeia.
Por conseguinte, tudo isto é assumido pelo Governo no texto das GOP — aliás, isto são factos concretos; não há aqui ideologia.
De qualquer modo, quero ainda fazer aqui um pequeno sublinhado: é que aqui, na Assembleia da República, os Srs. Deputados do PSD dividem, sistematicamente, a história do País, da economia e da sociedade portuguesa dos anos 80 em duas fases distintas — o antes c o depois do Prof. Cavaco Silva. Ora, como atacam sistematicamente o PS pela evolução económica até 1986, é então bom que também o PS fique como único responsável pela entrada do País na Comunidade Europeia, facto que veio depois permitir o acesso a estes avultados fundos, estes grandes apoios, que permitem a este governo — e esperemos que a outros futuros muitas inaugurações, muitas auto-cstradas, muito desenvolvimento e muito crescimento!...
O Sr. Antunes da Silva (PSD):— O PSD também assinou o Tratado de Adesáo!
O Orador: — Bem, nesse caso, o PSD quer então compartilhar apenas os aspectos positivos do bloco central, rejeitanto os negativos!...
Ontem disse-se no Plenário que fora o Primciro-Minislro dc então que tinha determinado ludo c que, portanto, tudo o que se não fez na área da segurança social foi por culpa dele, ou seja, do Dr. Mário Soares.
Por conseguinte, pressuponho que com essa intervenção fazer significar que o processo de adesão à CEE é da pura e exclusiva responsabilidade do PS... Nós agradecemos e temos muito orgulho nisso'.
Estas foram as realidades. Vamos agora às questões que já não são realidades, ou seja, que correspondem a linhas que, quanto a nós, consubstanciam autênticos défices das GOP c que, apesar de já ter tido oportunidade de relatá--los ao Sr. Ministro, ficará bem, no quadro desta Comissão
— alé porque isto fica gravado—, voltar a sublinhá-los.
Em primeiro lugar, pensamos que existe nas GOP um défice de realismo cm relação a um conjunto de perspectivas que são apontadas para o próximo ano.
Foi dito e redito que o cenário macroeconómico para 1991 que é apresentado nas GOP não sc diferencia da última versão do chamado quantum, depois da qual houve gravíssimos acontecimentos internacionais — que, aliás, estão ainda a suceder — que não levaram a qualquer alteração substancial nas projecções macroeconómicas.
Posteriormente, o Governo veio mudar, no quadro do debate do Orçamento, algumas projecções macroeconómicas, dizendo que foram lapsos e apresentando-os como tal no quadro dc uma errata, o que é extremamente estranho, dado que são alterações de monta — dou como exemplo o consumo público. Aliás, há a sensação de que o Governo muda de projecções macroeconómicas como se muda de camisa, o que é um pouco estranho do ponto dc vista do funcionamento institucional. Mas, no que respeita às projecções, sobretudo as que têm a ver com a concentração das diferenças entre as GOP e o quantum no comércio externo de bens e serviços, com aumentos mais fortes nas GOP do que no quantum relativamente às exportações e às importações, continuamos a dizer que é uma situação manifestamente incompreensível para qualquer economista — dc resto, do ponto dc vista político, também não mc parece que lenha grande justificação!...
Continuamos a reafirmar que a taxa de inflação prevista não é realista. A passagem desta de 10 % previstos nas GOP para 10,75 % inscritos no Orçamento não melhorou significativamente a situação.
Consequentemente, tudo o que está a passar-se a m-M internacional vai no sentido de afirmarmos que, no essencial, o quadro macroeconómico continua a ser preocupante c irrealista.
Por outro lado, o segundo défice apresentado pelas GOP é um défice de profundidade na análise da situação presenui do País. É por que nas GOP esta é indicada com um optimismo que considero perfeitamente insustentável e, até, de alguma forma desmobilizador. De facto, quando não se encara a realidade como ela é e se pretende que seja como gostaríamos, julgo que essa atitude não contribui para mobilizar quem tem dc ser mobilizado, mas que, pelo contrário, dá uma ideia de facilidade que não mc parece poder existir.
Quem ler as GOP poderá concluir que tudo vai no melhor dos mundos. Esquece-se que sc, efectivamente, há indicadores econômicos que evoluíram positivamente
— nunca negámos essa realidade —, como é o caso dos quantitativos respeitantes ao investimento e ao crescimento do emprego, por outro lado, nos últimos anos, outros houve pouco saudáveis e negativos quanto à evolução do País.
Como já tive ocasião de dizer ao Sr. Ministro das Finanças, aquando da minha primeira intervenção em sede do debate das propostas dc lei na generalidade, a estrutura produtiva não evoluiu positivamente, nem cm termos de participação dos diversos sectores e empresas no valor
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acrescentado nem em termos da participação no emprego dos diversos sectores e empresas. Não se alterou o peso de determinados sectores e empresas, em que a vantagem comparativa por excelência são os salários baixos. Pelo contrário, se analisarmos alguns indicadores indirectos, poderemos extrair ilações extremamente preocupantes sobre essa evolução estrutural.
Por outro lado, em termos de tipo c qualidade do emprego, é sabido que a situação também não melhorou. É que, quanto a vínculos e direitos dos trabalhadores, a situação não 6 melhor do que era há quatro ou cinco anos, a começar pelos contratos a prazo que, hoje em dia, são bastante mais importantes percentualmente do que o eram nessa altura — 19 % actualmente contra 13 % em 1985.
É evidente que avaliamos positivamente o aumento quantitativo do emprego, mas não podemos deixar de manifestar muita preocupação com o que se passa cm termos de qualidade do emprego, até porque este é um problema que afecta o futuro das próprias empresas e a capacidade de formação e de desenvolvimento do nosso tecido produtivo.
Sem que isso se deva à crise do Golfo, porque foi antes de esta se desencadear, também ao nível de alguns indicadores de conjuntura mais vulgares se verifica que subiu a taxa de inflação, em vez de descer como tinha sido prometido. A evolução das contas públicas também não foi das mais positivas durante 1990 e, embora o ano não esteja encerrado, em matéria da evolução da balança de bens e serviços as últimas informações são um pouco contraditórias relativamente à expectativa muito optimista sobre a balança de transacções correntes, que nos foi transmitida cm sede do debate na generalidade. Mas cá estaremos, nos próximos meses, para ver o que acontecerá.
Por outro lado, se é verdade que houve aumento nos salários reais, é também verdade que o aumento dos impostos não foi feito com equidade, que houve um aumento grande das desigualdades sociais, que houve uma transferência de valor muito grande de alguns portugueses para outros c que os quadros da distribuição do rendimento nacional, embora não mostrem tudo, mostram uma parte do que acabo de dizer.
Também é verdade que, cm áreas socialmente prioritárias, como a saúde, a educação ou a habitação, o panorama é extremamente preocupante.
Há ainda um terceiro problema no que toca às GOP.
Para além de conterem esta deficiência de análise do presente, este excesso de optimismo, as GOP têm também, um défice de humildade e de capacidade de autocrítica cm relação ao passado.
E que se agora, à semelhança de há alguns anos atrás, se vem dizer que o nosso modelo de especialização atribui demasiado peso a actividades de trabalho intensivas e com uma compeli ti vidade externa que assenta frequentemente em custos salariais baixos, então seria preciso extrair algumas conclusões destas afirmações. Se a situação continua a ser esta, certamente haverá um papel negativo da sociedade civil, mas o Estado também não é completamente neutro nem tem uma mera função de árbitro nesta matéria.
Qual foi, então, o papel desempenhado pelo Estado Português c, cm particular, pelo Governo Português nos últimos anos no sentido de combater esta situação?
É porque a situação não pode ser analisada como se este diagnóstico não tivesse sido já feito, há alguns anos atrás, e como se nada se tivesse passado entretanto. Não se retiraram conclusões sobre as políticas que o Governo
seguiu nos últimos anos. Mais ainda: julgo que houve políticas erradas nos domínios económico e social que não transformaram suficientemente as estruturas produtivas mas que, pelo contrário, estimularam a conservação e incentivaram adiamentos de mudanças muito importantes aos níveis microcconómico e estrutural.
Em quarto lugar, há um défice de credibilidade nos objectivos que são apontados, porque todos os anos são os mesmos, não se notando uma grande melhoria na passagem das palavras aos actos objectivos, que, obviamente, são consensuais.
Quando se refere a «afirmação de Portugal no mundo», a «modernização e o crescimento sustentado da economia»,
a «dimensão social e a qualidade de vida dos cidadãos», não há um só português que esteja contra estes objectivos.
No entanto, o que se passou nos anos anteriores parece constituir um desmentido às promessas que são feitas para o próximo ano, porque, na verdade, mantém-se a mesma linha.
Por exemplo, fala-se na necessidade de «mobilizar vontades e energias, a partir de objectivos c estratégias claramente definidas». Ora, se o Sr. Ministro perguntar aos agentes económicos e sociais, da agricultura ou da indústria, se consideram que está claramente definida a estratégia para o País, se fizer um inquérito como o que foi distribuído junto dos municípios, certamente que ainda será mais esmagadora a percentagem das respostas que vão num sentido não muito positivo para o Governo, porque os sinais que o Governo transmite aos agentes económicos são altamente contraditórios c pouco claros.
Por fim, julgo que também há um défice de compreensão do que deveriam ser umas GOP anuais.
É que, para além de não ter sido assumida qualquer capacidade de autocrítica cm relação ao passado c de haver irrealismos quanto ao futuro imediato, no texto há análises c propostas que fazem tábua rasa do que foram as responsabilidades do actual governo, apresentam-se linhas de orientação estratégica, por exemplo, sobre a modernização produtiva e a nova especialização internacional, sobre a estrutura empresarial c a modernização produtiva, sobre o papel do Estado c dos parceiros sociais na modernização, sobre a perspectiva regional, tudo exemplos de perspectivas contraditórias com o que se tem passado na prática.
Há, pois, uma desarticulação entre o texto c a realidade — aliás, para confirmá-lo basta-nos analisar alguns aspectos deste texto.
Tomemos, por exemplo, o «novo contexto internacional e comunitário». Este contém pontos polémicos e lacunas significativas como a da questão espanhola levantada, em sede do Plenário, pelo meu camarada Manuel dos Santos. No entanio, quanto a mim, esta é a parte mais interessante das GOP. Este texto leria pleno cabimento numas GOP de médio prazo e, a curto prazo, para 1991 nao deixa de ser indubitavelmente muito interessante. Mas que respostas concretas dá o Orçamento para 1991 àquele texto, aquele conjunto enorme de desejos, de afirmações, de altíssimos objectivos estratégicos? Verifica-se uma inconsequência toial na relação entre o texto c a política concreta que daí deveria derivar.
Há uma enorme desproporção entre as ilações passíveis de tirar da grandeza de uma análise de tal maneira globalizante c as respostas contidas no quadro das acções propostas.
No debate, na generalidade, afirmou-se que as GOP não passavam de «música celestial», não fui eu próprio a
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afirmá-lo, mas, depois; acabei por «entrar nessa orquestra celestial». Essa afirmação não representa qualquer espécie de menor respeito pelo papel que deveria ter um texto deste tipo mas, sim, uma constatação do papel que, infelizmente, tem, provavelmente por falta de força política e de influência sobre o conjunto da acção do próprio Governo.
Finalmente, quero referir que, no debate na generalidade, o Partido Socialista não se referiu às GOP, tendo isso sido
interpretado como uma atitude de grande gravidade. Peio
contrário, o Sr. Engenheiro Angelo Correia, cuja ausência
hoje aqui muito lamento, ficou tão «fascinado» com o texto das GOP que seria normal que aqui estivesse para apoiarmos nesta discussão.
Repito que considerar muito grave aquela atitude do PS é um fraco argumento, sobretudo quando, em sede do debate na generalidade, se assistiu ao fenómeno, que julgo único na discussão de um orçamento e de um plano cm qualquer país da Europa democrática, que é o de que não houve uma única intervenção de qualquer ministro responsável pelas áreas sectorias económicas. Não sei sc os senhores terão tido consciência disto... Não falou o Sr. Ministro da Agricultura, Pescas e Alimentação, nem o Sr. Ministro da Indústria e Energia, nem o responsável pelo comércio.
Como é que pode dar-se credibilidade a um debate sobre as GOP quando, no debate na generalidade, nem sequer esüvcram presentes os próprios responsáveis principais pelas políticas estruturais?
Nenhum dos Ministros que citei fez qualquer intervenção! Porquê? Porque o Govemo mais não quis do que, numa primeira parte, que foi mal sucedida, transformar o debate numa tentativa professoral do Sr. Minisuo das Finanças e, depois, num conjunto de afirmações, em termos de obras públicas e de abertura de hospitais, para serem transmitidas pelo Telejornal.
Assim, ficámos com um grande défice de debate sobre os grandes problemas e as transformações mais importantes para o País, mas esse défice deve-se, única e exclusivamente, ao Governo.
Para acabar, quero, desde já pedir desculpa por, provavelmente, não estar presente nesta reunião aquando da resposta do Sr. Minisuo, o que sc deve a compromissos inadiáveis do PS, que me obrigam ausentar de Lisboa daqui a pouco. No entanto, ficam os meus camaradas, o que é o mesmo.
O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado, tenho três questões muito concretas a colocar.
A primeira diz respeito ao PIDDAC global —não ao deste Ministério —, partindo do princípio de que a Secretaria de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional fará um certo acompanhamento daquele.
Gostaria de ver explicitadas as principais causas daquilo a que chamamos o arrastamento do PIDDAC. O termo
«arrastamento do PIDDAC» significa o seguinte: previa--se no PIDDAC de 1990 determinada verba para o ano de 1991 è, neste último, essa mesma verba aparece muito reduzida. Neste caso concreto, são 70 milhões de contos. Não me interessa discutir o montante mas, sim, conhecer as razões fundamentais dadas pelo Ministério para este arrastamento, que, aliás, não é novo c já tem vindo a verificar-se.
A segunda questão tem a ver com o problema do aproveitamento dos recursos comunitários. Tenho comigo uma fotocópia de um jornal que refere um relatório
elaborado no mês de Agosto pelo do Ministério do Planeamento e da Administração do Território segundo o qual a realização de acções financiadas por recursos comunitários é de apenas 16 %, isto é, segundo o relatório citado há problemas no aproveitamento global dos fundos comunitários para 1990. Gostaria de obter alguma informação sobre o que de facto sc passa, até porque tentei obter este relatório através dos serviços da biblioteca da Assembleia, o que não foi possível.
A terceira questão concreta prende-se com o FEF, mas é diferente de todas as que já aqui foram levantadas.
Gostaria que o Ministério me explicasse como é que exactamente chegou à verba de 157,5 milhões de contos atribuída àquele Fundo para 1991.
Alguns dos Srs. Deputados, alguns de vós, já se inscreveram para usarem da palavra pela segunda vez. No entanto, só poderão fazê-lo após o Sr. Ministro responder aos pedidos de esclarecimento já feitos.
Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Srs. Deputados, agradeço-vos as questões que colocaram e às quais tentarei responder cabalmente.
Começarei pela matéria relativa à ciência e tecnologia, abordando também alguns dos pontos mais gerais dos outros dois sectores e, depois, pedirei aos Srs. Secretários dc Estado aqui presentes para darem a sua colaboração ao esclarecimento de todas as questões suscitadas.
Em relação às duas perguntas respeitantes à área da ciência e tecnologia envolvê-las-ei na mesma resposta, porque a.primeira é mais directa e a segunda mais geral. Começarei pela segunda, no entendimento de que ela deve ter interesse para todos os Srs. Deputados.
O que sc passa relativamente ao Programa Ciência e à sua «contestação» tem, naturalmente, uma causa que — devo dizer, entendo como positiva e que estou a, digamos, administrar como tal. Nunca houve cm Portugal tanto dinheiro para a investigação científica como com este programa, que, aliás, foi negociado para isso mesmo, ou
seja, para mudar radicalmente as condições infra-cstruturais, para aumentar radicalmente o número de bolseiros e, através destes, também o número de investigadores e — e este é um terceiro vector que não tem sido muito sublinhado nas intervenções aqui produzidas— para o aproveitamento dos resultados da investigação.
A grande parte daquilo a que o Sr. Deputado Carlos Luís designou por contestação eu chamo «vontade de participação da comunidade cientifica». Esta comunidade científica já viu que, neste momento, dispõe dos meios necessários e que esta é a oportunidade que se lhe oferece dc vir a robustecer a sua capacidade de intervenção, fazendo aquilo que o Sr. Deputado Carlos Luís disse — e que é verdadeiro!, ou seja, reclamar pelos meios e não por vantagens pessoais. Faço-lhe essa justiça, Sr. Deputado! Chegou a grande oportunidade de a comunidade intervir e esta ter algum receio dc que possa não ser o seu sector, o seu laboratório, a sua escola ou o seu domínio aquele que vai ser mais beneficiado. Chamo, por isso, a atenção para o facto e diz, de uma forma ou dc outra, mais ou menos, o seguinte: «E nós, sector A? E nós, sector B? E nós, que estamos na universidade X? E nós, que estamos afastados?» Chamo, pois, a atenção, dizendo que também tem alguma coisa a oferecer, o que é extremamente gratificante para nós, pois significa que o primeiro dos objectivos do Programa Ciência foi amplamente atingido: as pessoas
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participam, dizem da sua vontade dc participação, estão alerta e manifestam uma vontade muito grande em ser envolvidas, justificando e concorrendo às acções que podem ser financiadas.
É neste sentido que interpreto grande parte daquilo de que se tem feito eco. Devo, aliás, dizer-lhe que tenho tomado muito a serio aquilo que sc tem feito e que ató tenho falado, pessoalmente, com os «contestatarios da contestação» (que 6 o termo que utilizou) sobre essa «chamada de atenção» (que é o termo que gosto mais de utilizar). Devo dizer que tem havido muito cuidado, por exemplo, em que cm determinado domínio se dê maior valor à investigação básica do que à aplicada; em outros domínios acontece o contrário, ou seja, há uma maior orientação para a tecnologia, sem nada nas ciências básicas. Há, pois, os dois tipos de críticas: no domínio, por exemplo, das ciências da saúde a inquietação é a de que só haja investigação básica; noutros domínios, pelo contrario, a inquietação é a de que tudo «aquilo» é «muito tecnológico».
A verdade é que, havendo referências dc ambos os teores, o conjunto é capaz dc não estar desequilibrado. Tomo muito a sério quer a manifestação dc inquietação que me aparece directamente, quer aquela que surge nos jornais. Quando é feita de uma forma justificada, serve, por exemplo, para rcalinhar uma acção ou para reformular um programa ou uma forma de atender a qualquer coisa. Tomo, naturalmente, a sério o que os destinatários dizem.
Perguntou o Sr. Deputado se não haverá uma falta de articulação e também desperdícios. Respondo-lhe que nüo, Sr. Deputado! Há comissões que funcionam com o PEDAP, outras com o PEDIP, mas são feitas articulações nesse domínio, registando-se, efectivamente, a procura dc uma possível convergência nesta área.
Quanto à correcção de assimetrias, o Sr. Deputado fez-me uma pergunta muito interessante, que é a seguinte: estando 65 % da comunidade cientifica concentrada à volta de Lisboa, que instrumentos é que o Ministério está a desenhar para corrigir esta situação? Tal como há pouco referi — em tom de brincadeira —, não é, efectivamente, por enviar investigadores, com «guia dc marcha», para Vila Real ou para a Covilhã que se resolve o problema. Rcsolvc--se, sim, se se tentar associar, em programas comuns, universidades menos robustas e mais robustas c fazendo com que haja programas que estabeleçam a interligação de investigadores c projectos de investigação. Devo dizer--Ihe que eu próprio já tive reuniões com os quatro reitores das diferentes universidades do norte —a Católica, do Minho, do Porto e dc Vila Real — e com a Universidade dc Coimbra, embora ainda não com as restantes duas localizadas na Região Centro.
Tem-se continuamente forçado o «arrastamento» das unidades menos robustas que sc situam nos centros mais periféricos, o que não quer dizer que, nalguns casos, uiis unidades sejam mesmo periféricas. Se há universidades com alguma robustez em certos sectores, há outras que a não têm. O que estamos a fazer é aproveitar esta circunstância para uma construção institucional de unidades dc avaliação e a lentar concretizar, na prática, a noção dc rede, que é a única que funciona com capacidade de «arrastamento» das unidades menos robustas, associadas a quem lhes pode fornecer alguma energia e alguma capacidade dc envolvimento. Desta forma, robustecem-sc, pois, universidades c departamentos periféricos.
Devo dizer que esta perspectiva interna está Uimbém a ser adoptada no Ministério relativamente ao exterior. É isso que bilateralmente — com a França, com a Suécia e com
a Alemanha—, tenho procurado fazer. Eu próprio tenho sido protagonista dessas viagens bilaterais e do estabelecimento de acordos e protocolos bilaterais. É também dessa forma que se forçam as coisas no quadro dos programas comunitários, nos quais se têm envolvido, de forma muito intensiva, maciçamente e com bons resultados, os investigadores portugueses.
No que sc refere à questão dos «parques dc ciência e tecnologia» cm Lisboa c no Porto, tive ocasião de fazer, há cerca dc três semanas, uma intervenção sobre o que se deve entender por «parque de ciência e tecnologia». Remeter-lhe-ei, pois, o texto dessa minha intervenção, onde CStá tudo resumido. No entanto, quero dizer-lhe que a primeira das coisas que a experiência internacional nos mostra acerca desses parques é que eles têm de ficar localizados junto de comunidades cientificas robustas. Vir, portanto, dizer que, neste momento, é possível fazer um parque de ciência e tecnologia na Guarda, em Bragança, em Beja ou, mesmo, numa cidade universitária do interior é fugir a tudo o que o bom senso determina nessa matéria.
Não vou fazer agora uma exposição sobre essa problemática — daí que vá enviar-lhe o texto da referida intervenção—, mas posso desde já dizer-lhe que as recomendações que nos têm feito vão no sentido de que tais parques devem ser construídos junto, por exemplo, de um aeroporto internacional, de uma comunidade cientifica grande ou dc uma grande cidade, que ofereça garantias de escolha e de serviços muito variados. Serve isto para demonstrar que nenhuma destas coisas está a ser feita desligada das outras.
Passo a responder ao Sr. Deputado Ferro Rodrigues — que agora está ausente da sala, mas que, seguramente, lerá a acta desta reunião —, dizendo-lhe que esses parques constituem um instrumento daquilo que eu pretendo, e que é a diversificação do perfil das nossas actividades. É através deles que vai ser feita, dc forma pausada e sustentada, a modificação — que está a tardar! — do perfil da actividade económica. Somos, de facto, críticos cm relação à velocidade com que se está a mudar o perfil da nossa actividade económica. Começámos por temer que o desemprego fosse o nosso maior cuidado; mas verificámos depois que nüo era, porque, entretanto, foram criados muitos empregos. Assim, o desemprego já não é, em lermos gerais do País, um motivo dc preocupação sob o ângulo quantitativo, embora, tal como disse o Sr. Deputado — com o qual estou de acordo—, o seja em lermos qualitativos.
Referia há pouco o Sr. Deputado que não estamos a entrar cm consideração com o feed-back. Sucede que nós não fazemos outra coisa! Sc reparar, por exemplo, nos incentivos, nas regras dc apreciação da valia e do historial dos projectos candidatos e no peso insignificante que ela linha no primeiro ano — porque queríamos criar emprego na periferia, mas verificámos que, afinal, não actuando sobre essa relevância industrial dos projectos, prolongaríamos um perfil inconveniente—, verificará que já no segundo e no terceiro anos o peso do interesse industrial passou a ser muito maior, embora tenha havido —devo dizê-lo— queixas e manifestações de lástima de muitos que queriam fazer aquilo que constitui a nossa vontade e que é fazer com que as vantagens comparativas portuguesas não sejam apenas aquelas que repousam nos custos, ainda favoráveis, da mão-de-obra. Isto está,,efectivamente, interligado c respeita a coisas que estamos a querer fazer cm conjunto.
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O Sr. Deputado fala na questão do diálogo permanente e constante com essas pessoas. Nós não fazemos — isso não — comícios com os cientistas, mas ouvimos, constante e continuamente, os cientistas e os investigadores. Há grupos que chamam a atenção, por uma razão ou por outra, para certos factos. Ora, eu acredito que eles tenham necessidade de chamar a atenção dessa forma, mas é evidente que, tal COmo comecei por dizer, tomo boa nota
das críticas feitas de forma construtiva e de boa fé.
Quanto à questão do parecer do Conselho Superior de Ciência e Tecnologia, o Sr. Deputado recebeu, em devido tempo, o parecer da comissão permanente. Repare que, por estatuto, o Conselho reúne muito poucas vezes, mas existe uma comissão permanente que reúne mais facilmente. Faz, aliás, parte dos livros e da sabedoria comum que quando há um grande conselho acaba sempre por existir uma delegação de poderes em poucos membros, que, habitualmente, são os da comissão permanente. A comissão permanente tem, efectivamente, uma larga delegação de poderes relativamente àquilo que vem a ser o Conselho na sua totalidade, e daí o parecer que surgiu.
Respondendo agora directamente ao Sr. Deputado Vítor Costa, direi que grande parte das medidas NNOIP já está homologada. Eu próprio já homologuei, anteontem, um grupo delas, estando um outro grupo submetido para análise ao meu colega da educação. Uma grande fatia dos montantes dos programas de NNOIP está em condições de poder ser mobilizada nos próximos dias. Portanto, as suas inquietações quanto a uma falta de aproveitamento não têm razão de ser, porque, seguramente, isso não vai ficar sem aproveitamento.
Quanto à questão das verbas, devo dizer-lhe que, do ano passado para este ano, o Orçamento para os sectores da ciência e tecnologia subiu enormemente em relação — e tenho-o dito muitas vezes — às nossas possiblidades.
Sr. Deputado, muito mais importante do que as verbas subirem num ano para caírem dramaticamente no ano seguinte é fazê-las subir — como aliás temos feito! — com gradiente constante, de forma que seja possível absorver, com justeza, com boa aplicação, com capacidade dc coordenação e com capacidade dc avaliação, ex ante e ex post, o que está a ser feito, porque um investigador não se faz em pouco tempo.
Devo dizer-lhes que 2,5 % do PIB é uma percentagem dc países ricos, de países muito desenvolvidos. Onde estamos mal — c apresso-me a dizer onde é que estamos muito mal para saberem que não estamos contentes e que, por isso, estamos a fazer tudo para modificar essa situação — é na percentagem de investigação que é feita pelas empresas.
Quando começámos a olhar para esses valores e a aplicar-lhes o Manual de Frascatli de uma forma mais rigorosa, verificámos que havia uma incorrecta classificação das despesas e que não estávamos, efectivamente, nos 30 %
da investigação. Devo dizer-lhe que esta percentagem é, na Alemanha, de 70 %, no Japão, dc mais de 70 % e na Suécia, também de mais de 70 %. Mas esses são países que têm uma altíssima percentagem de investigação feita pelas empresas e o resultado dessa acção vê-se na sua prosperidade económica.
Quando começámos, a nossa percentagem de investigação feita c subsidiada directamente pelas empresas era, ficticiamente, de 30 %, mas por má classificação das despesas. Esta percentagem tem vindo a descer e, neste momento, se formos rigorosos, situa-se nos 24 %. Ora 24 % da investigação feita c subsidiada directamente pelas
empresas é algo que nos deve dar um grande cuidado! E nós temos um grande cuidado nisso!... E temos um tão grande cuidado que eu próprio reúno, frequentemente, com as associações industriais e de empresários para ver este estado de coisas. Dizemos-íhes sempre a mesma coisa, ou seja, que, no longo prazo, pagar royalties é sempre muito mais negativo do que suportar despesas de investigação que dêem alguma valorização e algum peso acrescido à
componente endógena da inovação. É esS6 0 flOSSO objectivo.
Recusamos o financiamento em «acordeão», pois queremos um crescimento de gradiente constante. Temos conseguido manter esse crescimento gradiente constante, pois achamos que as verbas não são para gastar de qualquer maneira mas, sim, para aplicar nos protagonistas dessa investigação, que demoram muito tempo a fazer. Um investigador não se faz em menos de cinco anos. Faz-se um «Ph.D» cm três anos, com certeza, mas até que ele comece a produzir e se encaixe decorrem, seguramente, cinco anos. Portanto, há aqui uma expansão do sistema da comunidade cientifica em consonância com o que podemos vir a gastar.
Quanto aos números concretos que o Sr. Deputado referiu, podemos analisá-los em pormenor, como posso também mandar-lhe elementos muito desagregados de tudo isso. Agora na resposta, necessariamente global, que tenho de dar vou socorrer-me de elementos que, entretanto, foi possível coligir, permanecendo eu à sua disposição para análises miúdas do que quer que seja. Naturalmente tomei nota de tudo para evitar uma aplicação exagerada dos défices orçamentais que o Sr. Deputado referiu.
Quanto ao PIDDAC de 1990, nele tínhamos atribuições do Estado no montante dc 4,6 milhões de contos, às quais acrescia uma contribuição da CEE de 2,5 milhões, o que dava 7 milhões de contos, no total, para o sector. No PIDDAC de 1991, ambas as contribuições subiram, mas o que cresceu realmente muito foi a contribuição da CEE. Temos, agora, 6,3 milhões de contos internos e 6 milhões de contos da CEE, o que dá 12,5 milhões de contos. Houve, portanto, uma alteração no total de 7 milhões para 12,5 milhões de contos.
Suponho que grande parte da falta de esclarecimento que o Sr. Deputado referiu tem a ver com o facto de alguns dos programas comunitários serem programas abertos e de, por esse facto, os fundos comunitários acrescem. Portanto, pode ser que, quanto a isso, haja alguma falta de esclarecimento, mas espero não ser necessário um grande esforço para demonstrar-lhe que tudo joga certo. Tem de jogar! Foi feito tanto esforço para que jogasse certo que sc tal não acontecesse as coisas estavam muito mal.
Antes de pedir ao Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território para completar a minha resposta, vou referir-me à questão do FEF, dado que ela interessou a grande parte dos Srs. Deputados presentes.
Sr. Deputado Gameiro dos Santos, vir dizer aqui que os municípios poderiam optar pela melhor das soluções, o que representa termos um «orçamento elástico», ao sabor dos apetites de uns e de outros, que podia variar dentro de um intervalo, de acordo com a escolha municipal, parece--me totalmente irrealista!... Desculpar-me-á que lhe diga isto desta maneira. Não pode ser!... Não houve qualquer progressidade daquelas que anunciou.
Depois o Sr. Deputado Júlio Henriques também veio admitir que havia um maquiavelismo c uma preversão por trás dc tudo isto, em que seriam os municípios do Partido
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Socialista os que mais sofreriam. Nüo é verdade!... Não houve qualquer maquiavelismo! Isso é uma análise ex posi em que foram utilizados indicadores especiais e não referiram os outros.
A explicação que nunca ocorreu a qualquer dos Srs. Deputados, relativamente ao distrito da Guarda, por exemplo, é a de que, afinal, esse distrito, durante estes quatro anos, se calhar, teve uma absorção dc verbas maior do que aquela que devia ter tido relativamente aos outros!... Nunca lhes ocorreu que o facto de as verbas atribuídas a esses municípios subirem menos significa que cies tem mais, que beneficiaram de mais durante este tempo e que, por isso, passam agora a beneficiar de menos, numa perspectiva mais justa e mais adequada?
Os critérios não tiveram qualquer espécie de manobra nesse sentido!...
O fundo da questão foi, aliás, também abordado pelos Srs. Deputados Mendes Costa e Antunes da Silva. Já expliquei —os Srs. Deputados sabem-no muito bem c eu vou falar agora para a acta, dado que já o disse duas vezes cm comissão e já o referi também no Plenário — que não há qualquer atropelo ou oportunismo nesta introdução dc novos critérios.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Eu não disse isso!...
O Orador: — Eu sei que não disse isso!...
Já disse há bocado —e volto a insistir—, fizemo-lo quando verificámos as previsões do IVA, tal como estabelece a Lei das Finanças Locais. Essas projecções davam um FEF muito favorável e, portanto, esta era uma boa ocasião para fazer um acerto e acomodar todos os crescimentos, fazendo com que ninguém descesse, com que todos subissem, naturalmente subindo uns mais do que outros, fazendo algumas correcções. Esta pareceu-nos ser uma ocasião muito propícia para fazer tudo isto! ... Os Srs. Deputados interpretam agora esta atitude dc uma forma que me parece errada, mas não vou estar a laborar sobre o erro de interpretação ou sobre o vício dc lógica da vossa interpretação.
Rcferindo-me, agora sim, directamente ao Sr. Deputado Antunes da Silva, quero dizer que, se não houver um apoio mais largo que o do partido que apoia o Governo c sc isso não for muito claramente expresso, a proposta original é da aplicação da Lei das Finanças Locais!... Mas, naturalmente, a oposição fica com o ónus dc não ter querido...
O Sr. Júlio Henriques (PS): — Fica o ónus da boa vontade!...
O Orador: —... numa ocasião cm que era oportuno, em que era praticável, cm que era factível fazer uma correcção no caminho dc uma coisa qualquer que poderia vir, a seguir, na Lei das Finanças Locais. A oposição fica com esse ónus!...
Parece-nos, Srs. Deputados, que a nossa proposta conduziria a um equilíbrio maior. E vêem-sc os municípios que ficariam a ganhar!... Os partidos da oposição não a querem e o País fica a saber que vamos diferir as correcções para uma análise, tal como dizia o Sr. Deputado Gameiro dos Santos, feita num quadro lento, muito pausado, com a consideração de muitas alternativas, com cenários diversos, com tudo isso! O País fica também a saber que nós não o fizemos de improviso mas, sim, quando assistimos a uma possibilidade. Quando vimos «uma aberta» quisemos promover a justiça ou contribuir
para uma melhor justiça, mas os Srs. Deputados dizem: «De maneira nenhuma! [...] Isso é um maquiavelismo terrível, o que querem fazer é dar cabo de uma série de câmaras socialistas [...]»
O Sr. Carlos Luís (PS): — É verdade!...
O Orador: — «[...] quer na Madeira quer nos Açores, quer no distrito dc Santarém, quer no distrito da Guarda. Estão aí de arma assestada para elas.»
Para evitar essas coisas todas e para reafirmar a grande isenção do Govemo a este respeito, como os Srs. Deputados não querem, como acham que os municípios que têm receitas próprias mais elevadas...
A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): —Cerca de 180 milhões!...
O Orador: — Ó Sr.' Deputada, 180 milhões!... Nós já sabemos disso!... Queremos 180 milhões?!... São propostas muito realistas!
Srs. Deputados, digo-lhes, muito honestamente, que, quando sc discutiram as verbas do FEF, conversei com muitos presidentes dc câmaras — sei muito bem o que é que eles dizem e o que é que eles pensam!... — e a todos fiz esta pergunta: «Qual a quantia que o senhor pensa que seria equilibrada e justa? Nós não sabemos ainda qual será a verba a atribuir, mas qual é a que considera uma coisa equilibrada e justa?»
Devo dizer-lhes que, com alguma relevância estatística, poderei inferir que 150 milhões dc contos era uma verba que os satisfaria muito, porque era muito acima do valor estimado da inflação, porque era muito acima de um crescimento real muito importante. E a verdade é que o crescimento foi de 22,7 %, coisa que nenhum deles imaginava que pudesse acontecer!...
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): —Imaginava!...
O Orador: — Como sabem, a verba atribuída foi de 157,5 milhões de contos, portanto 7,5 milhões de contos acima daquilo que eles achavam que seria excelente. E, vai daí, agora sim, com sentido oportunista, levanta-se a oposição c diz: «Queremos 180 milhões.» Isto é oportunista c irrealista!
Srs. Deputados, a vossa vontade será feita.
A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — É feita a vossa vontade!...
O Orador: —Não, não, Sr.' Deputada! 180 milhões estão absolutamente fora dc causa e a Sr.» Deputada sabe muito bem que isso é assim! Está feita a vossa vontade em não avançar com uma maior compensação dos municípios que dependem mais do FEF.
Até à votação final, VV. Ex.M ainda lêm tempo para se arrependerem. Espero que pensem melhor nesta proposta e não queiram ficar com esta carga de trabalhos cm cima e que é a dc impedirem que os municípios com menos receitas próprias fiquem melhor através do fundo de percquação financeira. Cada um assume a responsabilidade que é sua!... VV. Ex.**, certamente, prestaram contas...
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Nós, as nossas!
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0 Orador: — As vossas... E nós também!... Estamos todos a prestar contas, como deve acontecer num regime democrático.
Quanto às sedes das juntas de freguesia, nunca se construíram tantas sedes como durante os dois últimos Governos, o X e o XI. Construímos 1041 sedes, conforme me <2tSSe agora O Sr. Secretário dc Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território!... Nunca houve um aproveitamento de fundos tão claro, tão exaustivo e tão bem gerido. Estou à vontade para dizê-lo, porque foi ele que o geriu e não eu. Só beneficiei da sua boa gestão. Viu o que estava a acontecer com os atrasos deste e daquele, o que é que estava a acontecer com as coisas que não andavam bem e reafectava imediatamente os meios. Devo dizer que se tem feito um esforço excelente, que nunca se fez tanto como agora
Portanto, aqueles gritos de indignação, aquelas chamadas de atenção «então, as autarquias mais pequenas [...]», não têm razão de ser, Srs. Deputados! Até temos feito uma coisa que ninguém fez antes e que é a de tentar juntar parcelas de várias origens — como é o caso do Ministério do Emprego e da Segurança Social ou do Ministério da Saúde—, de tentar ver se se podem tirar vantagens da escala de acumulação dos centros de saúde com outras funções. Há muitos edifícios de sedes de juntas que já têm todas estas valências. Subimos, naturalmente, o valor respeitante a esta rubrica, que tem sido, exaustivamente, gasta e muito bem.
Aparte inaudível da deputada do PCP Ilda Figueiredo.
É preciso sempre mais, Sr.* Deputada. Só vejo a essência das suas propostas: são mais 30 milhões para as autarquias, mais não sei quantos milhões para... A Sr.* Deputada quer mais verbas para a habitação, para as juntas de freguesia ...
Sr.' Deputada, vamos ver outras coisas...
Aparte inaudível da deputada do PCP Ilda Figueiredo.
Uma melhor distribuição? V. Ex.' não propõe uma melhor distribuição, porque não diz onde é que vamos cortar, se na saúde, se na educação ou na investigação científica.
A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Não, Sr. Ministro. Já apresentámos uma proposta, que mostra como é que isso se faz.
O Orador: — Quanto à questão da regularização das dividas à EDP, diria que a situação da EDP tem de ser clarificada. Neste aspecto, temos também de ter cm conta que a crise do Golfo vai, com certeza, redifmir uma valia eléctrica diferente e que, portanto, vamos ter de voltar às formas renováveis de energia. Um dia destes temos, com certeza, de aumentar a nossa construção de empreendimentos hidroeléctricos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — É isso mesmo, Sr. Ministro!
O Orador: — Sr. Deputado Gameiro dos Santos, o Governo é muito inteligente. Embora V. Ex.* diga o contrario, o Governo é sensato e inteligente.
O que sucede é que, para fazer isso, precisamos que a grande empresa portuguesa de produção de energia, a EDP, tenha uma situação financeira robusta. Enquanto não a tiver,
a EDP não poderá ir ao mercado endividar-se. Para fazer grandes barragens é preciso que possa ir ao mercado arranjar financiamentos.
Assim, para podermos beneficiar disto temos dc levar as pessoas a fazer contas certas.
Quanto à questão da construção de escolas, gostaria de perguntar-vos o seguinte: a convergência de prioridades
da administração central e local não é, em si mesma, uma
situação interessante e muito equilibrada? lSao t uma situação ideal que, através de uma associação, de uma parceria, de uma coisa que está agora muito na moda, e que é a associação partenariate, possamos levar as autarquias a forçar o rol imenso das suas preferências? A Administração Central diz «a nossa prioridade nessa zona é esta»; a autarquia local diz «e nós lemos muitas». Mas, Srs. Deputados, essa prioridade da Administração Central para essa zona também está incluída nesse rol; ora, se está lá e se essa é uma das muitas que tem a Administração Central, então a convergência dessas duas dá, naturalmente, uma associação. Isto parece-me ser o exemplo acabado de uma convergência na definição de objectivos que, naturalmente, é a mais estimada. É esse, pois, o espírito que deve presidir.
Quanto aos contratos-programa, as verbas têm crescido e tem sido excelente a colaboração entre as autarquias. Digo isto porque esses contratos-programa são sempre muito apetecíveis e os Srs. Deputados não podem imaginar a lista imensa de contratos já celebrados...
O Sr. Gameiro dos Santos fPS):—E as satisfações, Sr. Minisuo?
O Orador: — As satisfações são públicas e muitas, Sr. Deputado. Repito, as satisfações têm sido, em todos os domínios, muitas. Nunca houve uma reabilitação tão grande do parque das sedes dos paços do concelho como aquela que tem ocorrido nos últimos três anos; até agora nunca houve tanta estrada municipal feita ao abrigo de contratos--programa...
O Sr. Deputado Gameiro dos Santos fica surpreendido, mas vou mandar-lhe a lista desses contratos-programa. Quando V. Ex.* verificar quão numerosos são esses contratos-programa ficará surpreendido!... E, Sr. Deputado, são as autarquias que querem celebrá-los!
O Sr. Deputado Ferro Rodrigues, que já não se encontra aqui presente, falou da questão das GOP. Ora, não consigo reconhecer aí os défices que o Sr. Deputado referiu. Dix Se lerem com atenção as GOP, encontrarão lá, pelo menos em dois parágrafos, essa referência. Aí diz-se-. «A situação internacional está muito volátil, ninguém é capaz de prever seja o que for.» Todos previam a guerra para finais dc Setembro, o que não veio a acontecer; toda a gente desmarcou as férias que tinha marcado para aquela zona do Golfo, porque pensaram que, em Setembro, já havia guerra. Estamos em Novembro, mas a guerra airoSa não rebentou; tem data marcada e a televisão está pronta a filmá-la! Ninguém sabe é o que vai acontecer, nem quando é que ela irá ter lugar.
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Daí a referencia que se faz — aliás, com realismo e muito honestamente, ao contrário daquilo que disse o Sr. Deputado Ferro Rodrigues— à situação que resulta dos actuais preços do petróleo.
O Sr. Ministro das Finanças esteve sempre atento à definição desses preços c, nessa altura, já sabia quanto é que se ia pagar por esse produto daí a uma semana. Foi com o conhecimento de toda essa informação que, na ocasião, foi possível definir tudo aquilo que aí se encontra. Porém, à cautela — isto porque não queremos enganar
ninguém —, dissemos: «cuidado, porque, se calhar, vamos ter de alterar algumas destas variáveis».
Fá-lo-emos, Srs. Deputados, sem peso na consciência, porque dissemos que o iríamos fazer e porque, nessa ocasião, eram esses os melhores números que poderíamos apresentar.
O Sr. Deputado falou também do défice dc profundidade do documento, dizendo que se dá uma ideia dc facilidade, o que é errado. Penso que é exactamente o oposto.
Há aqui um problema de princípio, Sr. Deputado. Devemos é dar uma ideia de optimismo. Há século e meio que padecemos daquilo a que chamo «síndroma dos vencidos da vida», o que tem feito muito mal ao País! Esses «vencidos da vida» escreveram coisas óptimas, mas numa perspectiva aniquiladora do entusiasmo, olhando sempre para o copo meio vazio, em vez de se olhar para o copo meio cheio!... Com esses mesmos indicadores, Sr. Deputado, temos a tendência de olhar para o copo meio cheio, uma vez que é que mobiliza. O outro, de facto, é desmo-bilizador!
Já falei aqui da questão da estrutura produtiva. Todos os instrumentos que referi há pouco orientam-sc para essa modificação.
Srs. Deputados do PS que se encontram aqui cm representação do Sr. Deputado Ferro Rodrigues, défice dc humildade e de capacidade de autocrítica? Nem pensar, Srs. Deputados! Pelo contrário, sabemos reconhecer onde é que precisamos dc fazer correções.
Hoje, durante esta agradável reunião, já tive ocasião dc referir a forma como encaramos, atentamente, estas evoluções. A última coisa que seremos é deterministas c uma coisa que não fazemos é sacralizar, tecnocraiicamcntc, seja que modelo for ou projecções. Os modelos sao mentirosos! Usamo-los com pinças, pois sabemos quais as limitações existentes e até onde é que eles podem ir.
Quanto ao défice dc compreensão, devo dizer que toda a gente compreendeu. A expressão que temos ouvido é a de que nunca houve GOP redigidas de forma tão comunicativa, tão imediata c acessível. Elas lêem-sc não como um romance mas, sim, como um ensaio. Assim, suponho que essa afirmação se deve a alguma má disposição passageira do Sr. Deputado Ferro Rodrigues, porque a compreensão tem sido, unanimamente, reconhecida ao documento.
Pedia ao Sr. Secretário dc Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território o favor dc, muito rapidamente, responder às questões que foram aqui colocadas.
Peço antecipadamente desculpa, mas vou ter dc sair daqui a 10 minutos porque lenho uma outra reunião.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário dc Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território (Nunes Liberato): — Sr. Presidente, completando aquilo que o Sr. Ministro referiu, gostaria dc abordar várias temas, em particular aquele que diz respeito às finanças locais.
Tenho analisado, com cuidado, a proposta que a Associação Nacional de Municípios fez e a decisão que tomou sobre esta matéria respeitante aos critérios, mas não consigo vislumbrar qual é, no fundo, a sua opção. Será a de 180 milhões, e cada um a escolher a melhor lei? Essa solução, que nao corresponde a opçüo nenhuma entre antígos e novos critérios, é perfeitamente inaceitável! Devo dizer, francamente, que nem sequer percebo como é que alguns dos Srs. Deputados estão na disposição de patrocinar essa solução que, além de ser inconcebível no campo dos princípios, seria clarissimamcnte inconstitucional, pois até já existem pareceres do Tribunal Constitucional sobre matérias afins.
Então, cada município escolhia a lei que mais lhe convinha?!...
A Sr." Ilda Figueiredo (PCP): —Eu disse «em último caso»!
O Orador: — Que disparate, desculpem que lhes diga! Isso seria clarissimamcnte inconstitucional. Por exemplo, o Tribunal Constitucional inviabilizou a possibilidade de a Assembleia Regional dos Açores escolher critérios próprios.
Portanto, como é que seria possível dizer a cada município para escolher a lei que mais lhe conviesse?
A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Volte a ler o que diz a Associação Nacional de Municípios Portugueses!
O Orador: — Isso seria um precedente inconcebível! Quer dizer, na Chamusca haveria uma lei e em Benavente haveria outra. Tal ideia será completamente impossível de aceitar.
Quanto à questão dos casos concretos que citaram, sobretudo os Srs. Deputados do Partido Socialista, o Sr. Ministro já referiu que tem de ser referente à legislação c à situação anterior. Com efeito, sc há casos onde o crescimento é menor é porque, porventura, esses municípios eram favorecidos com as disposições legais no anterior critério dc distribuição.
O Sr. Deputado Gameiro dos Santos pegou numa questão que mc parece muito interessante, mas que tinha subjacente uma acusação que me parece bastante grave e que gostava de abordar. Trata-se da questão de haver, eventualmente, subjacente à distribuição do FEF e aos seus resultados, alguma ligação com os partidos políticos que têm a presidência das câmaras municipais, particularmente no distrito de Santarém, que referiu.
O Sr. Deputado também referiu que dos municípios prejudicados apenas um era do Partido Social-Dcmocraia, mas esqueceu-se de dizer que o Partido Social-Democrata, se calhar, infelizmente, tem apenas cinco municípios no distrito de Santarém.
Mas por que não pegou, por exemplo, no distrito de Castelo Branco, onde o Partido Socialista tem cinco câmaras municipais? Aqui, do Partido Socialista, só uma é prejudicada. Neste caso, não vai, certamente, dizer-nos que a lei foi concebida para favorecer o PS, porque isso lambem é uma acusação que não pode ser feita ao Governo.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — E em Faro!
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O Orador: — Estou a citar um exemplo, usando-o da mesma forma como o Sr. Deputado 0 USOU. É rigorosamente igual c serve para lhe demonstar que a sua acusação ou, pelo menos, aquilo que estava subjacente ao caso particular de Santarém que referiu não tem fundamento.
Quanto à questão dos trâmites e da rapidez com que 0
Governo apresentou esta iniciativa, o Sr. Ministro já teve ocasião de dizer que está tudo em ligação com o aumento de recursos que, este ano, de uma forma tão nítida, existe.
Quanto a subavaliações do IVA, conforme já tivemos ocasião de discutir em várias circunstancias, o que está em causa, estritamente e nos termos da lei, são as previsões que o Orçamento do Estado contém em cada ano. Isto foi discutidíssimo e alguns dos Srs. Deputados, pelo menos, a Sr. Deputada Ilda Figueiredo, talvez sc recordem que isto foi discutido na preparação da anterior Lei das Finanças Locais.
Ora os Srs. Deputados, que são tão zelosos na discussão pormenorizada de todas as questões c do diálogo aprofundado no contexto da Assembleia da República, hão-dc recordar-se que esta questão foi disculidíssima no contexto da preparação da Lei das Finanças Locais c foi apontado, claramente, como solução preferível a das previsões do imposto do valor acrescentado.
Seria possível outra solução, como seja a de, em cada ano, haver encontro de contas com as autarquias, mas se a previsão do IVA viesse realmente a revelar-sc superior ao valor efectivamente cobrado? Então, iríamos negociar com os municípios, e «sacar» aos municípios!
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Sim, senhor, com certeza!
O Orador: — Sr. Deputado, gostava de ver a sua posição quando isso acontecesse!
Do ponto de vista do Governo, isso seria altamente inconveniente para os municípios e conduziria à sua instabilidade financeira e à banca rota, porque sc efectivamente havia uma diferença entre a previsão c a cobrança real de impostos é porque algo de muito grave se verificava na economia portuguesa; seria mesmo, com certeza, um momento de crise e, nesse caso, iríamos «sacar» aos municípios essas quantias tão avultadas.
Portanto, a proposta que os Srs. Deputados da oposição fazem parece-me ser extremamente grave para os municípios portugueses e atentatória da capacidade financeira dos mesmos c da sua gestão equilibrada. O Governo nunca adoptaria nem patrocinaria tal solução.
Quanto às compensações por isenção, Sr.* Deputada lida Figueiredo, não sei se me poupa que lhe explique a situação, mas posso voltar a repetir aquilo que lhe tenho dito cm várias circunstâncias, na medida cm que a Sr.° Deputada põe sempre a mesma questão c eu, naturalmente, dou-lhe a mesma resposta. Mas sc a Sr." Deputada insiste que eu faça referencia, devo dizer que se trata naturalmente das novas isenções.
A Lei das Finanças Locais é claríssima a esse respeito c não vou, sequer, invocar os crescimentos enormes que têm havido nas receitas fiscais das autarquias portuguesas, pois, como o Sr. Deputado Gameiro dos Santos insinua na sua referência, não temos ainda dados finais sobre o ano de 1990, nem eles são possíveis porque ainda não chegamos ao final do ano.
Assim, alguns dados parciais que cu já tenha recebido de certas câmaras municipais,..como o Sr. Deputado, pelos
vistos, também tem recebido, não são ainda significativos para tomar uma posição sobre a matéria. Mas, mesmo que eventualmente houvesse uma estabilização dos valores dc 1989-1990, a taxa média dc crescimento é da ordem dos 100 %. Ora, não há país nenhum do mundo onde isso ocorra. É uma situação cm que realmente as receitas fiscais dOS miiniCÍpiOS passaram de 19 milhões, em 1985, para quase 80 milhões, cm 1989. Trata-se de um crescimento enorme que ultrapassa todas as considerações que possamos fazer.
Naturalmente que os Srs. Deputados da oposição desejariam que a taxa dc crescimento das receitas fiscais fosse, talvez, de 120 % ou 150 %. Mas a situação real é, na verdade, extremamente positiva para os municípios portugueses. Mesmo admitindo que havia novas isenções e que era possível calculá-las, as contas têm de ser feitas sempre em relação ao nível de operações que seriam realizadas se, efectivamente, essas isenções não existissem, c se elas não existissem o número de operações seria significativamente menor. Por isso, as contas que têm sido avançadas são completamente destituídas de qualquer razoabilidade.
Quanto às freguesias, o Sr. Ministro já teve ocasião de dizer que estamos com 1041, pelas minhas contas, desde 1985.
Portanto, já somam mais de um quarto, quase 30%, as freguesias portuguesas que foram financiadas desde 1985, para as obras nas suas sedes.
O Sr. Deputado acha pouco e diz-me que há, ainda, casos dc sedes de juntas que funcionam mal c algumas nem existem. É verdade, sim senhor, e eu adiro a essa posição que existe, que é uma verdade objectiva e, por isso, vamos continuar a procurar resolver o problema. Resolver mil e tal casos em cinco anos parece-mc um score perfeitamente razoável, pelo que vamos continuar a resolver o problema da forma como temos vindo a fazer.
Além disso, existe outro problema. É que este trabalho de construção dc sedes é feito em conjugação com os municípios que também precisam, eles próprios, que a construção seja feita de forma programada para que não tenham encargos súbitos com a construção demasiado rápida das novas sedes.
Quanto às novas competências, o Sr. Ministro também já sc referiu a essa questão. Temos ajudado os municípios a financiar competências que são deles próprios, como, por exemplo, a questão dos edifícios das câmaras municipais que é uma competência claramente municipal. Fomos até motivados por um caso que nos sensibilizou imenso e que cito por ser uma câmara do Partido Socialista c do distrito dc Santarém, que o Sr. Deputado muito dignamente representa, que foi a Câmara de Rio Maior e que consideramos que realmente estava a funcionar — aliás, a obra, tanto quanto sei, está parada, sem ser por culpa do Governo ou da própria Câmara. A verdade é que o que está em questão é um mecanismo que foi criado a pensar numa câmara do distrito de Santarém e presidida pelo Partido Socialista.
Efectivamente, foi esse caso que muito nos motivou, embora, naturalmente, depois tenhamos verificado que havia uma certa generalização dc situações a que temos procurado corresponder.
Aliás, referindo o exemplo do distrito de Santarém — o Sr. Deputado vai perdoar-me porque o citou c eu gostava, também, de o fazer—, em relação a paços do concelho e às grandes operações de apoio da parte do Governo, devo dizer que estamos a financiar a coravruc.ão.
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dos paços de concelho no Município de Almeirim, que é do Partido Socialista, no Município dc Alpiarça, que é do Partido Comunista, estamos a financiar uma obra municipal com um grande montante, já Financiamos, também, os aços do oncelho do Município de Constância, que é do Partido Comunista, estamos a financiar os Paços do Concelho de Rio Maior, que é do Partido Socialista, financiámos uma grande obra municipal do Município do Sardoal, que é do Partido Socialista, e estamos a financiar os Paços do Concelho de Vila Nova da Barquinha, que é, também, do Partido Socialista — o Sr. Deputado dirá que esta câmara era do Partido Social-Democrata, mas, até agora, a essa câmara nenhum dinheiro foi concedido para a obra que está prestes a arrancar.
Em relação aos municípios do Partido Social-Democrata, infelizmente, não foi atribuído sequer um tostão, o que constituirá, certamente, motivo para que os Srs. Deputados do Partido Social-Democrata protestassem.
Peço desculpa por me estar a alongar um pouco mais do que desejava, mas as perguntas foram muitas e pormenorizadas.
Gostava, ainda, de esclarecer a questão levantada pelo Sr. Deputado Júlio Henriques sobre os 22,66 % que precisa realmente de uma explicação, pois admito que a sua dúvida seja legítima, atendendo que os elementos disponíveis não facultam a explicação necessária.
Mas, afinal, o que é que aconteceu? É que cm relação ao ensaio que fizemos dos elementos de distribuição da proposta alternativa colhemos determinados resultados e das conversas que tivemos com a Associação Nacional de Municípios Portugueses, a este mesmo propósito, parcecu--nos que esta fazia questão — aliás até o escreveu — em que nenhum município crescesse abaixo da taxa de inflação.
Apesar das várias observações que têm sido feitas em relação a muitas versões desta distribuição alternativa, a verdade é que, dos elementos que entregámos à Assembleia da República só constam duas: uma, que foi entregue com o relatório do Orçamento do Estado; outra, que respeita a alguns pequenos lapsos relativos ao distrito dc Santarém.
O Sr. Júlio Henriques (PS): — Grandes divergências!
O Orador: — Pequenos lapsos!
O Sr. Júlio Henriques (PS): — Dezenas dc milhares de contos.'
O Orador: — Logo por azar fui calhar no distrito do Sr. Deputado Gameiro dos Santos, mas garanto que não foi de propósito!
Traia-se, portanto, de diferenças relativas a três ou quatro municípios e, também, dc pequeníssimas diferenças dc mais ou menos 1 % cm relação a outros.
Isso surgiu porque, entretanto, chegou-nos informação mais actualizada sobre a rede viária que de imediato foi possível utilizar e, também, porque efectivamente houve um lapso no distrito dc Santarém, como já está dito e redito e não vale a pena continuar a citar esta questão.
Em relação aos 22,66 %, o que é que acontece? Como é que nós financiamos o estabelecimento do limite mínimo de 10 %? Ora, isso também já foi dito, através dos Municípios que estavam acima da média, ou seja, aqueles que estavam acima de 22,66 %.
Mas o que é que acontece? É que ao reduzirmos esses municípios dos 22,66 %, havia muitos que tinham 23 % 24 % 23,5 % 22,8 % 23,1 % e 24,5 % e que, portanto, foram
rebaixados, mas como queríamos que não baixasem da média geral, terminaram por ficar ao nível dessa mesma média. Em rigor, se aplicássemos cegamente o critério que utilizámos, viriam para 21 e qualquer coisa por cento. Mas como havia municípios que estavam, previamente a esta alteração, com 22,1 % e 22,3 %, ou seja, ligeiramente próximo da média, se fôssemos baixar aqueles que estavam acima da média para o nível daqueles que não tinham sido alterados, cometia-se uma grande injustiça.
Por isso, rebaixámos para os 22,66 % aqueles que estavam acima da média.
Quero que esta questão fique muito bem esclarecida, porque não há qualquer manipulação, assim como nas outras. Mas esta, repito, desejaria que ficasse bem esclarecida, porque a operação parece-me evidente.
Em relação aos auxílios financeiros, eles não são para calamidades, como temos dito e ainda, outro dia, o repelimos na discussão.
Como sabe, o Governo tomou a decisão de fazer um decreto-lei sobre esta questão dos auxílios financeiros, o que nunca aconteceu antes dele, em que isto era tratado de uma forma desregulameniada.
Nesta lei está previsto que as calamidades são financiadas com recurso à dotação provisional do Ministério das Finanças e, portanto, não está em causa situar a questão das calamidades no contexto desta verba, que se destina essencialmente ao financiamento dos planos directores municipais e aos programas que VV. Ex." já têm conhecimento.
Quanto às assembleias distritais, como sabem, esse diploma fez-se na sequência da autorização legislativa da Assembleia da República e só serão financiadas pelas câmaras municipais, na medida em que o governador civil foi retirado desse processo, e bem, através da revisão constitucional, aquelas actividades que elas quiserem efectivamente exercer com recurso às suas disponibilidades. E uma política que começou a ser seguida antes de 1985, com grande dinamismo por parte de membros do Governo e de membros do PS que hoje fazem parte dessa bancada, e que estabeleceram essa orientação com a qual concordamos totalmente e cu próprio tenho tido a preocupação dc desenvolver uma evolução na continuidade.
Termino abordando a questão, que não será agradável aos membros do PS, mas em relação à qual não me consigo calar, da discussão da Lei das Finanças Locais.
Em relação aos apelos dc diálogo que os Srs. Deputados da oposição fazem, nomeadamente quanto à discussão profunda deste assunto na Assembleia da República, embora reconhecendo a coerência do PCP nesta matéria, não posso deixar de dizer que o PS quando esteve no Governo trouxe à Assembleia da República um pedido de autorização legislativa c nem sequer mostrou algum documento com a distribuição de verbas fosse a quem fosse, regulando-a apenas por decreto-lei sem qualquer audição desta Câmara.
O comportamento do PSD foi bem diferente quando em 1986 trouxemos a esta Assembleia uma proposta de lei substantiva sobre esta matéria. Assim, estamos a discutir, no contexto do Orçamento, a possibilidade dc haver uma alteração da Lei das Finanças Locais, dc forma muito transparente, mostrando aos Srs. Deputados qual é a nossa intenção. Não pretendemos pedir nenhuma autorização legislativa sobre esta matéria, mas estamos clara c transparentemente a apresentar uma alternativa possível que, caso mereça consenso nesta Assembleia, estaríamos
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dispostos a patrocinar. Esta é uma questão que assumimos com toda a transparência e com toda a objectividade.
É por isso que peço aos Srs. Deputados do PS que, nesta matéria, não venham exigir uma discussão profunda desia lei, porque não estão em condições de o fazer.
No entanto, da parte do Governo sempre estivemos
disponíveis para apresentar toda a informação âCCTCâ desla proposta alternativa. Pensamos que ela é melhor do que os actuais critérios em vigor e, por isso, a Assembleia da República faria bem em patrocinar esta proposta.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional.
A Sr.' Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional (Isabel Mota): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Colocaram-mc três questões e a elas procurarei responder.
A primeira tem a ver com os fundos estruturais, a segunda com o PIDDAC global e a terceira, eu não resisto, será mais um pequeno comentário sobre as observações, que considero subjectivas, feitas pelo Sr. Deputado Ferro Rodrigues.
Relativamente aos fundos estruturais há duas questões que se prendem uma com a outra. A primeira, colocada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, tem a ver com a execução global, tendo aludido a um relatório que foi presente à Comissão de Acompanhamento do Quadro Comunitário de Apoio; a segunda, tem a ver com a questão colocada pelo Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
Srs. Deputados, antes de responder à questão do Quadro Comunitário de Apoio, farei uma breve exposição relativamente à forma como se processam estas fases para poder responder cabalmente e para que não fiquem dúvidas sobre atrasos ou não atrasos desse Quadro.
Como VV. Ex." sabem, Portugal apresentou 50 programas novos à Comissão Europeia, lendo, em finais de Julho, sido aprovados 18 programas regionais, dois em Agosto, dois em Outubro e os restantes 14 aguardam ainda a aprovação por parte da CEE. Aproveito para dizer que,
na próxima terça-feira, três programas, porventura quatro, serão aprovados em Bruxelas. Estou a fazer grande insistência junto dos serviços da Comissão Europeia para exigir que os programas portugueses, que foram dos primeiros a dar entrada, tenham resposta por parte dos serviços. Neste momento, tenho indicações, aliás vou ter uma reunião com o comissário Millan na terça-feira, que até final do ano estarão aprovados todos os nossos programas.
Só que, quando se negociou o Quadro Comunitário o pressuposto de base era que os programas estariam em vigor no início de Janeiro de 1990 e daí que o Governo tivesse pedido que se instituísse uma Comissão dc Acompanhamento do Quadro Comunitário de Apoio, a fim de pôr «preto no branco» a situação. Esta Comissão é conjunta e nela estão representadas todas as entidades — autarquias, etc. — e a Comissão Europeia c nela ficaram claras três coisas.
Primeiro, Portugal vai conseguir, não obstante estes atrasos que são totalmente imputáveis aos serviços da Comissão e por ela assumidos, a aprovação dos programas.
Segundo, face ao atraso na aprovação dos calendários, apenas \5 %, t óbvio que, por exemplo, no caso das autarquias, um programa que é aprovado no dia 31 dc Julho e uma vez que o processamento das transferências finan-
ceiras demora cerca dc três meses — é esta a média da Comissão Europeia— não pode apresentar taxas de execução muito elevadas. Assim, elaborámos um relatório para que fosse reconhecido que o atraso era da responsabilidade da Comissão Europeia — e esta reconheceu-o —
c, por isso, conseguimos — e com isto respondo ao
Sr. Depuiado, embora já o tivesse feito anteriormente numa
destas discussões — que as verbas passem automaticamente para o ano que vem e, mais do que isso, conseguimos também que a execução do Quadro Comunitário dc Apoio seja alargada até 1994.
Considero que não podemos, relativamente a esta situação, deixar de ter presente duas coisas.
Primeiro, as metas do Quadro Comunitário de Apoio têm de ser tomadas com rigor, como objectivos estratégicos, mas o espírito que preside a esse quadro é que haja, através de um diálogo permanente entre as diversas partes envolvidas, a possibilidade de ir fazendo alterações e correcções de trajectória.
Este exercício que envolve todo o nosso país, todas as nossas autarquias, que é o sistema de todos os países membros e que é gerido da forma mais descentralizada, no sentido da co-responsabilidade entre a administração central e local — de que muito me orgulho e que tem sido muitas vezes realçado pelo próprio comissário Millan, como exemplo para os outros países — significa aquilo que eu, utilizando uma expressão do Presidente Delors, apelidaria de revolução silenciosa em termos da responsabilidade na gestão dos fundos comunitários.
Por tudo isto é evidente que este sistema vai ter alguns problemas dc percurso, porque ele não é gerido nem do Terreiro do Paço, nem da D. Carlos I c nem por computador.
Portanto, tem de haver muito diálogo, muita co-responsabilidade para irmos ajustando as trajectórias e os problemas que vão surgindo.
Ora bem, qual é a situação actual face a esses problemas? O resultado global, pois já tenho o apuramento todo feito, é que vamos atingir as metas, quer de compromissos, quer de transferências da Comunidade para Portugal, e até vamos uluapassar ligeiramente aquilo que estava no orçamento de transferências da CEE, embora nem lodos os programas sigam a igual ritmo — aproveito para lhe referir a questão do vale do Tejo.
Por ouiro lado, todas as unidades de gestão estão a funcionar, não querendo deixar de sublinhar que já houve comissões de acompanhamento, sendo Portugal o único país da CEE em que isso aconteceu para todos os programas. Isto porque exigi que a CEE o viesse fazer, estando as coisas neste momento de molde a que essa tal taxa, que era de 15 %, já esteja em 30 % ou 40 %, apesar de, como disse, não a considerar representativa. Já tenho o compromisso da CEE de que no relatório anual a coluna em que dizia «Despesa pública do ano de 1990» vai ser alterada dc acordo com a realidade.
Existe, pois ioda uma programação estratégica que vamos ter que ajustar. Não obstante, como disse e repito, com muito esforço de todos — Governo, autarquias e CEE — as metas vão ser atingidas.
No entanto, um dos aspectos que deu origem a que o Governo Português tivesse tantos êxitos nas negociações dos fundos estruturais tem a ver com a credibilidade da nossa postura e com a forma como apresentamos os nossos dossiers. Muitos desses dossiers —e isso é uma prática nova — são executados nas unidades de gestão, em que se incluem as autarquias e os serviços, pelo que, há o pro-
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blcma de alguma aprendizagem. E alguns atrasos, que se possam registar, têm a ver com o facto de eu não abdicar do rigor na apresentação dos dossiers, porque é esse o nosso grande trunfo negocial.
Portanto, há casos, há regiões, há unidades de gestão, em que as coisas vão mais depressa c estão já em fase dc pedir segundos adiantamentos, mas haverá outras em que se verificam dificuldades que têm a ver, muitas vezes, com razões exteriores à própria vontade das vontades, por causa dos concursos ou das expropriações, ou porque o dossier estava errado — há dossiers que voltam para trás porque as contas estavam mal feitas.
Não posso deixar de repelir que não abdico de colocar lodo o rigor na apresentação dos dossiers porque acho que isso é o grande trunfo negocial que temos. E esta experiência de grande descentralização e co-responsa-bilidade 6 um trunfo colectivo que não podemos, dc maneira nenhuma, nem menosprezar, nem apressar, dado que as eventuais pressas não compensam.
Penso ter respondido ao Sr. Deputado Octávio Teixeira. Acrescentarei apenas que o relatório é reservado, não confidencial e o representante das autarquias portuguesas, que é membro dessa Comissão, tem o relatório. Simplesmente, foi o relatório que serviu de base para demonstrar à CEE que não fazia sentido não alterar toda a programação, porque 6 imputável à Comissão Europeia o atraso, c, por isso, está garantido o financiamento e as verbas passaram automaticamente para o ano que vem.
Relativamente à questão dos dinheiros e dos adiantamentos direi que o sistema de adiantamentos, que foi negociado mereceu total acordo da Associação Nacional de Municípios. Só que, enquanto não houver comprovativos e enquanto eu não tiver a certeza que o Tribunal de Contas ou as missões de controlo da CEE não levantam problemas, não haverá pagamentos. Portanto, os pagamentos serão feitos em adiantamento, desde que os comprovativos dc despesa sejam devidamente preparados e não há nenhuma razão neste momento para não se pagar. Aliás, Sr. Deputado, estive anteontem na Região Centro e todas as autarquias estão a receber em adiantamento.
Mas não quero deixar de dizer que essa responsabilidade de aprovar projectos, muito mais do que ser minha, 6 dos participantes das unidades de gestão, dos próprios autarcas que, muitas vezes, pedem mais tempo, havendo uma co-responsabilidade em todo este processo. Acontece que isto é tanto mais exigente e eu sinto-me tanio mais responsável, quanto alguns pequenos problemas que houve no passado nos programas do FEDER existiram ou porque havia ignorância das regras ou porque o formulário não eslava bem preenchido. As coisas foram facilmente regularizadas e hoje em dia, como qualquer coisa que tenhamos que devolver à CEE é feito com juros, a responsabilidade 6 muito maior.
Quero que fique com a certeza que, do meu lado, cumprir metas, cumprir prazos ó um objectivo, mas aplicar bem os fundos estruturais é o meu grande objectivo, meu e dc todos.
Relativamente à questão dos fundos estruturais, penso que terá ficado explicada.
Quanto ao vale do Tejo, esse programa está a funcionar como os outros, está a funcionar a unidade dc gestão, bem como todas as outras unidades dc gestão. Já agora deixem--me dizer que tenho notado que as pessoas se estão a sentir muito responsáveis, muito satisfeitas por poderem ser elas próprias a decidir da aprovação dos projectos, e estão a fazê-lo com grande espírito de solidariedade.
A questão do PIDDAC global. É um facto que se assiste a um deslizamento relativamente à despesa prevista num ano e aquilo que é a despesa efectiva, que decorre do exercício anual do Orçamento, porque uma coisa é uma programação plurianual e indicativa e outra é o orçamento que cm cada ano somos abrigados a fazer.
O que acontece, Sr. Deputado, é que os ajustamentos que se fazem de um ano para outro têm a ver, primeiro, com a selectividade acrescida que temos vindo a introduzir no PIDDAC.
Por exemplo, rigor em prazos. Como sabe, não é fácil de conciliar o enorme esforço de investimento que estamos a fazer com o problema da redução do défice de Estado.
Por outro lado, uma outra explicação que poderá ser dada está relacionada com o facto de podermos, de 1990 para 1991, felizmente, ir buscar à CEE muitos dos recursos adicionais, pois na altura não era possível prever, já que não tínhamos os quadros todos feitos. Por exemplo, o Programa Ciência não tem expressão orçamental, já que tem uma parte de contrapartida interna e a outra parte acresce.
Portanto, tudo isso significa a conciliação dos dois objectivos, ou seja, o objectivo do desenvolvimento com o objectivo da contenção rigorosa do défice de Estado.
Não obstante, o PIDDAC cresceu 20 % em termos globais. Todas as contrapartidas internas para os projectos estão asseguradas e mesmo em sectores onde não foi possível obter fundos estruturais, como, por exemplo, para a saúde, cm que se dizia que não era possível obter fundos estruturais, mas, no entanto, temos vindo, devagarinho, a consegui-lo c já os temos para os Hospitais de Guimarães, Elvas, Leiria e Matosinhos.
Portanto, tudo isso vai obrigando a que cada ano se faça um ajustamento com a maior racionalidade, rigor e selectividade, mas sem prejudicar as metas de desenvolvimento a que nos propusemos.
A propósito, Sr. Deputado — e porque sei que é uma pessoa sempre atenta a estas questões —, gostaria de dizer--Ihe que, não obstante, por vezes, na programação plurianual, não se vai tão longe quanto se podia prever naquela coluna que refere do mapa xi. Mas se fizer a comparação do PIDDAC efectivo com as metas de médio prazo das GOP verifica que, em muitos sectores, vamos atingi-las, e até ultrapassá-las, e que constituem as prioridades aprovadas pela Assembleia da República para o investimento e para a estratégia dc desenvolvimento do País.
Finalmente, queria só fazer um comentário às GOP, apesar de o Sr. Ministro já ter respondido na essência.
Tenho imensa pena, durante os três dias em que estive aqui para discutir as GOP dc médio prazo, que o Partido Socialista não tivesse querido fazer essa discussão. Considero que muitas das observações que o Sr. Deputado Ferro Rodrigues fez são altamente subjectivas e dariam lugar a um debate que lamento que não tenha sido feito na sede c na altura apropriadas.
Dc qualquer maneira, existe um aspecto que gostava de referir. Não percebo como é que o Partido Socialista refere que o Plano que o Governo apresentou para discussão na Assembleia da República, no ano de 1991, não tenha característica de um Plano anual, porque tem como quadro estratégico as grandes opções que foram aprovadas a médio prazo!
Portanto, as opções não mudam todos os anos. Como é óbvio, trata-se de um projecto de sociedade, trata-sc de um projecto dc desenvolvimento que não tem natureza
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conjuntural. Simplesmente, o que aconteceu cm 1991 —e 6 esse, do meu ponto dc vista, o grande aspecto que importa sublinhar— é que as alterações que se registaram no contexto internacional obrigaram a que se fizesse uma
reflexão mais profunda sobre correções dc trajectória ou alertas que se toma indispensável fazer. s
Primeiro, não obstante as GOP serem anuais inscrem--se nas GOP de médio prazo. Portanto, é óbvio que os objectivos são os mesmos. O Governo não anda a mudar de objectivos todos os dias. Tem um objectivo estratégico a prosseguir e uma política de desenvolvimento clara para levar a cabo.
Segundo, as alterações que se operaram no contexto internacional implicam, no entanto, algumas alterações dc trajectória e abrem novos alertas. É isso que se faz num capítulo específico das GOP que foram apresentadas para discussão na Assembleia da República. Esta matéria suscitou debate, discussão, por vezes até controvérsia, porque é óbvio que se trata de questões dc grande profundidade, de grande alcance c que merecem, cm sede própria, a sua discussão.
Quanto ao elenco, as GOP de 1991 tem uma descrição exaustiva e tão detalhada quanto possível sobre as acções de investimento, pois é óbvio que numa política dc desenvolvimento o investimento tem um papel motor, quer quanto à situação macroeconómica do ano dc 1991, quer quanto ao programa dc investimento do ano dc 1991, com a indicação clara dc quais são as indicações que se vão fazer e cm que medida é que correspondem às prioridades governamentais e dc desenvolvimento aprovadas nesta Assembleia. Por fim, tem o elenco dc todas as acções que cada ministério e cada sector se propõe fazer no ano dc 1991.
Portanto, creio que existe uma conciliação entre uma política dc desenvolvimento que, obviamente, tem sempre um carácter estrutural c dc médio prazo com as acções concretas que o ano dc 1991 vai levar a cabo.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.* Secretária dc Estado do Orçamento.
A Sr.* Secretária Estado do Orçamento (Manuela Leite): — Srs. Deputados, vou responder rapidamente; no entanto, não quero deixar dc sublinhar que lenho lodo o respeito pelos Srs. Deputados do Partido Socialista que se encontram aqui na Sala, mas não posso deixar dc lamentar que, tendo estado o Ministro das Finanças cm Plenário c eu própria estive aqui praticamente todo o dia, o Sr. Deputado Ferro Rodrigues lenha escolhido csic momento cm que estava para sair da sala para fazer uma intervenção que, obviamente, tem de ter resposta.
Fiquei no mínimo a saber que o Sr. Deputado, dc acordo com a comunicação social, foi o eleito para vir debater o Orçamento, mas resolveu fazê-lo com o microfone.
Terei, com certeza, oportunidade para responder, pois os problemas agora levantados serão objecto dc discussão com o Ministério das Finanças. Nessa altura, agradecerei ao Sr. Deputado Ferro Rodrigues o enorme elogio que fez ao Governo, quando disse que tínhamos uma inflação subjacente que não é realista. Com certeza, nessa altura, o Sr. Ministro das Finanças terá oportunidade dc responder ao facto dc, efectivamente, ele ter cometido um erro grosseiro quando, em Plenário, avaliou a proposta dc orçamento proposto pelo Partido Socialista.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, neste momento, inscrcvcram-sc os Srs. Deputados Gameiro dos Santos, Antunes da Silva, Mendes Costa e Júlio Henriques.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Iria começar por comentar umas palavras proferidas pelo meu querido colega deputado Antunes da Silva, pois quando se referiu ao Sr. Ministro disse que não importavam muito as respostas dos municípios, bastaria o apoio do PSD. Isto é, desde que o apoio do PSD fosse expressivo era suficiente.
O Sr. Minisro não está aqui, mas peço que façam chegar-lhe esta minha sugestão, ou seja, para a próxima, no relatório técnico cm vez de dizerem «os novos critérios serão formalmente propostos sc se verificar que existe um apoio significativo à solução apresentada por parte do Grupo Parlamentar do PSD». Ponham isso no relatório técnico, porque isso retira-nos, proventura, algum trabalho. Escusamos, talvez, dc estar aqui a perder tanto tempo!... Escusávamos de estar a consultar os municípios!... De ter acesso às respostas que são mais do que elucidativas!... Para a próxima, sc fizerem isso no relatório técnico — creio cu—, evitamos aqui uma grande perda dc tempo e até dc gasios!
Quanto às restantes questões, tenho que fazer um comentário — o Sr. Presidente vai perdoar-me.
Em relação à posição da Associação Nacional de Municípios diz que, por um lado, considera necessária a fixação dos 180 milhões dc contos, mas depois diz que face à metodologia utilizada pelo Governo, pelo menos, os municípios possam optar pela maior das propostas.
Portanto, ao fim c ao cabo, existe aqui uma posição clara. E para que não restem dúvidas a posição do Partido Socialista é a seguinte: consideramos que, de facto, a metodologia seguida não foi a mais correcta, já que isto assumiu foros dc novela, como já tive oportunidade de dizer.
O Sr. Secretário de Estado disse que havia duas propostas, mas na prática não houve. Os municípios viveram conhecimento, para além da proposta formal, dc quatro propostas que saíram do Ministério, não foi da Assembleia da República, como o senhor sabe: uma com crescimentos negativos; outra com crescimento zero; outra com 10 %, mas cheia dc erros; por fim, ouiras com os tais 10 % dc crescimento mínimo já corrigida.
Portanto, não há dúvida alguma que houve aqui uma grande confusão, uma grande anarquia, na apresentação desta proposta c só por isso justifica, plenamente, a posição da Associação Nacional dc Municípios Portugueses.
Aliás, posso dizer-lhe que defendemos —perante esta autêntica confusão que sc gerou não existe outra solução para 1991 — uma solução razoável que não venha a ferir as expectativas criadas junto dos próprios municípios, porque, dc facto, Sr. Secretário dc Estado, tem que entender que, quando na proposta dc Orçamento do Estado, no mapa x, aparecem determinados valores, quando os governadores civis enviam circulares com valores também errados, quando a própria Assembleia da República envia, também, um pedido de consulta com valores que também não estão correctos — tiveram de ser esclarecidos à última hora pelos Srs. Deputados — isto não é um processo muito razoável.
Por isso, a posição que vamos defender é a de que transitoriamente, em 1991, enquanto sc não faz a grande
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discussão das finanças locais, possam optar pelo maior Fundo de Equilíbrio Financeiro.
O encargo não c grande, são 5,7 milhões dc contos — fizemos as contas e estão correctas —, c não me parece que ató do ponió dc vista técnico seja difícil lá chegar, porque a previsão do IVA, no nosso entendimento, não está bem feita. A situação do passado, infelizmente, de
certo modo, leva-nos a tirar esta conclusão. Como sabe,
no passado, as previsões foram sempre feitas por defeito — e que defeito! Foram quase 14 milhões dc contos a menos para as autarquias, nos últimos anos, como o Sr. Secretário de Estado sabe.
Portanto, não me parece que isto venha trazer grande agravamento na despesa pública. Se até houver correcção da receita do IVA, com certeza que nem isso sucederá.
Mas já que estou a falar na questão do FEF, gostaria de lhe dizer que não nos repugna nada — e julgo que à própria Associação Nacional de Municípios também não— que sc fizessem correcções ao FEF por via das correcções ao próprio Orçamento do Estado. É que, como sabe, este ano, os aumentos de receitas não constaram do Orçamento rectificaüvo, mas, em anos anteriores, isso verificou-se.
Portanto, leria sido perfeitamente correcto que, por via disso, se tivessem feito as correcções ao FEF. Se houvesse necessidade de fazer correcções para menos aos municípios, fazia-se a correcção no ano seguinte e não havia problema algum. Nós já defendemos isso publicamente em Plenário e os municípios também. Não há, pois, razão para que assim sc não tivesse feito.
O PS não vai ficar com o ónus, se eventualmente vier a ser aplicada a Lei n.° 1/87, porque a nossa posição sobre isto é clara c já a enunciei aqui. Esperamos é que a grande questão das finanças locais, de atribuições c competências, venha a merecer uma discussão aberta, não sei sc ainda este ano, ou só no próximo.
Mas o Sr. Ministro, quando falou nas escolas secundárias, disse outra coisa curiosa. Disse que o partenariate eslava na moda. De facto, é capaz dc estar na moda, mas só num senüdo: 6 que, para o Governo, só há quando os municípios são chamados a responder a investimentos que são da única responsabilidade da administração central. Mas quando estamos na situação inversa, o partenariate já não está na moda. E já não está na moda, porque o Sr. Secretário de Estado na sua resposta lambem teve o cuidado de dizer: «bem, há imensos contratos-programa!».
Gostaria, pois, de lhe perguntar o seguinte: para o universo dos municípios portugueses e para o universo de projectos que eles apresentam, o que significa uma verba de 1,1 milhão de contos, há dois anos, c uma verba dc 1,3 milhões de contos, agora, para contratos-programa? Julgo que concordará comigo se lhe disser que sc trata dc uma verba insignificante e que não permitirá que o partenariate possa ser exercido com alguma eficácia.
Quanto à questão das GOP, vamos ler oportunidade dc discutir isto. Não se preocupe, nem a Sr.* Secretária de Esiado do Orçamento nem a do Planeamento c do Desenvolvimento Regional. Aliás, ela já foi alvo dc intervenção na sessão de encerramento, como deve estar recordada c gostaria dc lhe lembrar que o Sr. Ministro das Finanças vai cá estar na próxima semana c decerto voltaremos a discutir com elc estas questões.
Agora, o que também lem dc entender é que quem cá esteve hoje foi o Sr. Ministro do Planeamento c da Administração do Território, que é o responsável pelo planeamento e, naturalmente, os deputados do PS, a quem
cabia falar sobre estas questões. O Sr. Deputado Ferro Rodrigues não se eximiu ao debate — de faclo, já tinha compromissos assumidos, como teve a delicadeza de referir antes de partir —, mas cá estaremos na próxima terça-feira para debater estas importantes questões.
Ainda cm relação aos critérios do FEF, quero dizer que, de facto, a confusão é enorme ...
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Gameiro dos Santos, a propósito dc confusão, agradecia-lhe que sintetizasse as questões finais, por causa dos outros deputados.
O Orador: — Não pretendo confundir V. Ex.*, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — A mim não me confunde.
O Orador: — Quero só dizer que os exemplos que foram apontados, como a Madeira, os Açores, a Guarda, Faro, etc., são exemplos que devem até ser bem aferidos pelo Governo, devido a esta coincidência dos números.
O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado Antunes da Silva.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Tenho de voltar a esta questão do FEF, até na sequência das intervenções do Sr. Deputado Júlio Henriques; depois, farei uma observação relativamente à intervenção do Sr. Deputado Ferro Rodrigues e terminarei com algumas observações, relativamente à intervenção do Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
Sr. Deputado Júlio Henriques, meu caríssimo conterrâneo, deixe-mc insistir, c reafirmo-o, que não podemos tomar as posições da Associação Nacional dc Municípios, aqui nesta matéria, como boas — depois, darei a explicação ao Sr. Deputado Gameiro dos Santos — porque elas partem de um pressuposto falso, no sentido de que não existe — são os lais 180 milhões dc contos.
Portanto, qualquer proposta ou análise dos Srs. Deputados ou dc outrem que parla deste pressuposto falso, no sentido que apontei, não nos leva a coisa alguma cm lermos correctos. Qualquer proposta que os senhores façam, partindo desse mesmo pressuposto, peca pelo mesmo defeito, porque parte de uma base falsa. Aliás, ainda relativamente a esta matéria, não sabemos o que é que vai acontecer cm lermos finais, mas qualquer eventual alteração a estas verbas nunca poderia partir dessa base, c muito menos das vossas propostas, porque elas pecam por este defeito dc base.
Mas mesmo assim, e embora o Sr. Deputado Gameiro dos Santos tenha agora dado quase a resposta a esta questão, deixo este repto: os deputados do PS —c, já agora, dirijo-me também ao Sr. Presidente, como representante do PCP —, negam-se a aprovar esta proposta alternativa do Governo, com vista a estabelecer novos critérios dc distribuição das verbas do FEF? Não quero falar cm termos de responsabilidades, senão, depois, os senhores terão dc assumir este repto de uma forma muito clara, em termos dc sim ou não.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — É a nossa proposta!
O Orador: — Mas essa não existe, porque parte de um pressuposto errado: os senhores partem de um pressuposto
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dc 180 milhões dc contos, que não existe! É nesse sentido, no de que não existe, que reafirmo que ela é falsa. Mas já
voltaremos a esta questão,
O Sr. Deputado Ferro Rodrigues — cuja ausência
lamento, porque não gosto de falar de pessoas que estão ausentes— fez aqui um esforço muito grande para se redimir dc uma falha que teve aquando da discussão na generalidade. Enfim, esse esforço tem de ser compreendido; fô-lo hoje, está perdoado, assim o PS lhe perdoe, por nao ter feito a intervenção na discussão na generalidade.
Ainda em relação à intervenção do Sr. Deputado Ferro Rodrigues, quando ele se referiu às verbas comunitárias, penso que, a determinada altura, ouvi a verba dos 250 milhões, mais concretamente 250,8 milhões dc contos, relativamente à estimativa para 1990. O Sr. Deputado referiu este valor absoluto, mas como há aqui entradas e saídas de dinheiro devia ter falado no fluxo final que, dc facto, este ano é favorável a Portugal, em termos da estimativa de 180 milhões de contos, como o será para 1991, como fluxo financeiro dc 187,4 milhões de contos. E bom que não se digam meias verdades, mas as verdades todas, porque isto é, dc facto, um fluxo financeiro e não podemos avaliar esses valores, se os tomarmos apenas como valores absolutos.
Finalmente, quanto ao que afirmou o meu querido amigo deputado Gameiro dos Santos, quero dizer-lhe que o Sr. Deputado entendeu, mas fez dc conta que não entendeu, a minha posição, relativamente à questão que coloquei. Quando me diz que eu teria dito que não interessa o apoio da Associação Nacional de Municípios Portugueses, bastando o apoio do PSD, é evidente que o PSD, tendo a maioria, se quiser fazer passar qualquer proposta, fá-lo. Mas o Sr. Deputado percebeu, não tenho dúvidas nenhumas acerca disso, que o que eu quis foi interpelar o Sr. Ministro,
no sentido de ele me explicar qual era o alcance das expressões que estavam em jogo. É que no relatório geral do Orçamento do Estado — como já tive oportunidade dc dizer, com toda a franqueza e espírito de abertura —, fala--se em «apoio significativo» e o Sr. Ministro hoje aqui falou numa outra expressão que, salvo erro, era «expressiva manifestação de apoio». Tentei «provocar» o Sr. Ministro, no sentido de ele me explicar qual era o alcance destas expressões. Ora, o Sr. Deputado, que tinha percebido isto perfeitamente, fez de conta que não percebeu.
Quero, agora, retomar o problema das verbas, repelindo pela milésima vez, relativas aos 180 milhões de contos. Os senhores agora apontam para uma proposta da maior das verbas, o que corresponderia a um agravamento dc cerca de 6 milhões de contos. E, depois — já não lhes faço a pergunta, porque os senhores já responderam —, como é que vão buscar esses cerca dc 6 milhões de contos? Vão alterar as previsões do IVA? Sr. Deputado, de facto, o PS revela pouca imaginação. E digo isto porque, quando apresentou um orçamento dito alternativo ao Orçamento do Estado para 1991, apresentado pelo Governo —cm relação ao qual, como a Sr.* Secretária de Estado disse há pouco, o Sr. Ministro cometeu um erro de análise, quando chegou à conclusão de que se tratava dc um agravamento de 85,5 milhões de contos, porque, na realidade, será um agravamento do défice muito maior (dc facto, foi um erro muito grande do Sr. Ministro) —, já aí os Srs. Deputados limitavam-se a fazer a reavaliação de receitas. E neste sentido que digo —com o devido respeito— que o PS nestas matérias orçamentais revela muito pouca imaginação.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Mendes Costa.
O Sr. Mendes Costa (PSD): — Quero colocar duas questões muito rápidas.
A primeira dirige-se ao Sr. Secretário dc Estado e é a seguinte: o meu colega deputado Carrilho Pereira colocou uma questão sobre o imposto municipal sobre veículos que não obteve resposta. Gostava que o Sr. Secretário dc Estado respondesse a essa questão, para que eu pudesse transmitir a resposta ao meu colega.
A segunda questão dirige-se à Sr.* Secretária de Estado. Estou muito preocupado com a OID dc Setúbal, que tinha a duração de cinco anos. No PIDDAC estáo elencados uma série de projectos que ultrapassam o prazo de cinco anos. A questão que lhe coloco é se, no seu entendimento, é possível ou não uma perda dc verbas, ou se o prazo foi alargado, ou quando é que começou a contar o prazo da OID dc Setúbal (não sei sc foi em 1989, ou cm 1990, que o projecto foi assinado pela Comunidade) c sc haverá algum prejuízo para a aplicação das verbas consignadas — os 97 milhões de contos relativos à OID de Setúbal que estáo no PIDDAC de 1991.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Júlio Henriques.
O Sr. Júlio Henriques (PS): — Sr. Secretário de Estado, V. Ex.*, de forma muito enfática, referiu que seria inconstitucional a proposta da Associação Nacional de Municípios Portugueses. Como relativamente a essa proposta não tenho dc me pronunciar nem lenho de a defender, volto à proposta do PS, para sublinhar — o que está, aliás, sublinhado em cada intervenção — o sentido útil dc que os municípios possam optar pela maior das verbas inscritas numa ou noutra proposta. Mas, obviamente, que não sc trata de pôr isto em leilão; tratava-se dc sugerir, dc solicitar, de reivindicar, dc V. Ex." e do Governo a que pertence, que fosse construído um novo mapa em que os números fossem esses, com o tal agravamento que é inferior a 4 % da verba inscrita. E depois, não tendo o direito — c não me arrogo o direito que não tenho — de duvidar das afirmações que V. Ex." produziu, sempre desejo sublinhar que fiz um esforço para compreender a explicação que deu dos 22,66 %. Em todo o caso — e por mera circunstância —, tinha aqui um apontamento — porque alguém me aguardava e fui despedir-mc peio telefone — relativamente a um município, em que a situação é esta: em 1990, o FEF é de 221 369 milhões dc contos; cm 1991, segundo os novos critérios, é dc 253 403 milhões dc contos, o que corresponde a um crescimento dc 14,7 %. Todavia, o anexo 10, aquele que decorre do cumprimento da Lei n.° 1/87, aponta para 22,7 % dc crescimento. Ou entendi mal — e penitencio-me —, ou a coisa não ficou tão clara. Portanto, agradecia que, depois, me esclarecesse sobre isto, pedindo-lhe desculpa pela insistência.
Em relação às coincidências, claro que o Sr. Secretário de Estado e os serviços da sua Secretaria de Estado e do seu Ministério aferiram os dados que curiosamente são estes: havia, como eu disse há pouco, 122 municípios a ganhar com a aplicação da lei cm vigor e 183 a perder. E o mesmo é dizer que a inversa é verdadeira: 183 municípios ganhariam com a aplicação dos novos critérios.
Em termos de filosofia, concordamos com a necessidade dc reformular a Lei das Finanças Locais, por forma a acrescer novos meios financeiros, novos afluxos, para os municípios mais pobres, mais carenciados, aqueles onde
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13 DE DEZEMBRO DE 1990
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de facio o FEF constitui a sua principal receita. Mas, Sr. Secretário de Estado, tôm chegado ao nosso conhecimento, à Comissão e àAssemblcia da República reclamações de muitos desses municípios, que consideram que os novos critérios agora assumidos não respondem às suas necessidades, nem pouco mais ou menos.
De facto, a proposta foi elaborada apressadamente, é bom que sobre o assunto nos debrucemos. O PS fez entrar na Assembleia da República um projecto dc lei dc finanças locais que, julgo, responde a esses problemas, mas — e sublinho — dos 122 municípios é bom referir que, por acaso, apenas 38 são do PSD e que para os distritos de Faro, Lisboa e Setúbal, comportando 44 municípios, os seus «prejuízos» ascenderiam a cerca de 2,7 milhões de contos. Isto é muito e a verdade é que estes municípios que avançaram para a organização dos seus planos de actividades para 1991 e do seu orçamento a pensar que existe uma lei cm vigor que é a Lei n.° 1/87, e que, se aplicada, lhes garantiria esses montantes. São, de facto, os distritos dc Faro, Lisboa e Setúbal onde também por acaso, em 44 municípios, o PSD só tem seis.
O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra ao Sr. Secretário dc Estado, quero agradecer à Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional as respostas que deu e, ao mesmo tempo, fazer uma breve nota.
A questão que levantei sobre o PIDDAC —e como o problema não era números —, foi no sentido de tentar que a programação fosse, de ano para ano e tanto quanto possível, mais rigorosa. É só para chamar a atenção para isto que quero fazer um pequeno comentário, não é para discutirmos a questão.
Por exemplo, no PIDDAC para 1992 aparece um valor que lodos nós, à partida, sabemos que será absolutamente impossível, porque aparecem 221 milhões de contos e, logicamente, ninguém pensa que vai haver de 1991 para 1992 um aumento do PIDDAC de 61 %.
A minha questão relaciona-se com a programação que, sinceramente, não faço a mínima ideia. Neste momento, não é uma questão que se me coloque se a responsabilidade é dos ministérios sectorialmente ou se é do Minisiério do Planeamento e da Administração do Território. Não é isso. O que está em questão é o problema da programação.
Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território: — Procurarei ser breve e, sobretudo, tentar não repetir as afirmações que já proferi.
Insisto, realmente, que a solução que o PS procura construir é destituída de toda a razoabilidade, independentemente da questão oportunamente posta pelo Sr. Deputado Antunes da Silva. Porque a questão é a dc saber onde vão buscar os recursos para fazer isso: sistematicamente, o PS altera as previsões de cobrança dos impostos, ou seja, não alteram a receita, alteram uma previsão e depois vão aumentar a despesa. Efectivamente, estão a aumentar as despesas, não estão a criar nova receita.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): —Estamos, estamos!
O Orador:—Estão a alterar uma previsão, como já foi visto, aliás, no debate, na generalidade, do Orçamento do Estado. Mas, enfim, isso é uma questão que ultrapassa talvez um pouco o debate neste momento.
Voz inaudível do deputado do PS Gameiro dos Santos.
Mas os senhores não podem extrapolar essa experiência mesmo que ela exista.
De qualquer forma, considero que a ideia que está subjacente à vossa proposta é perigosíssima, porque essa ideia é de que vamos construir um mapa X à medida de
um objectivo, que é lateral, que se fosse assumido era totalmente inconstitucional, na minha perspectiva, e irmos manipular a informação de forma a dar um determinado resultado que desejamos ver. Isso seria perigoso para a estrutura do poder local em Portugal, para a maneira como ele, constitucionalmente, está definido e para aquilo que nós todos, o próprio PS —dou-lhes naturalmente esse benefício— comungamos do fundamental das grandes ideias em relação ao poder local democrático em Portugal e, por isso, não quero estar a excluí-los dessa perspecüva. No entanto, o que defendem contraria substancialmente muitas daquelas ideias de fundo que temos de um FEF, construído com indicadores objectivos, estatísticos, claramente definidos, com transparência e objectividade.
Por isso, volto a dizer, além de ser claramente inconstitucional, na medida em que teríamos o Pa/s dividido — e leiam o parecer do Tribunal Constitucional sobre esta matéria, quando se pôs a questão das regiões autónomas —, é uma solução sem fundamento que continuo a considerar perigosíssima para a estrutura do poder local democrático em Portugal, tal como todos, julgo eu, consoemos à volta desta mesa.
Mas cm relação a isso parece-me também muito perigoso, como eu disse, toda essa ideia do acerto de contas. Repito, isso foi examinado clara e pormenorizadamente nesta Assembleia, com todos os partidos políticos, e considerou-se que esta era a solução mais estável para os municípios e, sobretudo, é uma solução que tem provado, tem tido excelentes resultados para os municípios portugueses, que têm crescido dc uma forma que não tem comparação com o que era antes da aplicação da lei. Antes da aplicação da lei os municípios sofreram, aí sim, golpes profundíssimos na sua capacidade financeira, nomeadamente quando os orçamentos cresciam pouco e as taxas dc inflação eram enormes. Esses sim, foram decréscimos sucessivos ao longo de vários anos que, realmente, provaram que as soluções anteriores eram extremamente inconvenientes.
Em relação à pequenez da verba destinada a contratos--programa, devo dizer que na filosofia daquilo que julgo que também lodos temos defendido, em matéria de poder local, na filosofia da Carta Europeia de Autonomia Local, aprovada nesta Assembleia, com o voto do PCP, cm relação a tudo isso, toda a ideia destas verbas adicionais ao FEF lêm dc ser encaradas como verbas residuais — está dito na própria Carta Europeia da Autonomia Local. Ou seja, é sempre residual a consideração desta verba para casos urgentes de incapacidade dc a aularquia realizar investimentos muito significativos de interesse nacional. E aqui aproveito para dizer que a construção de um edifício, sede dc um município, é claramente uma responsabilidade das autarquias locais, não é uma responsabilidade do Governo e o Governo associa-se ao espírito do partenariate, utilizando a expressão do Sr. Deputado, indo exactamente ajudar as câmaras municipais a financiar objectivos, que são claramente das autarquias.
Porque o facto de a câmara estar dignamente instalada é também uma questão dc interesse nacional, mas com
responsabilidade da autarquia se fôssemos ver em termos rigorosos.
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Por isso, as verbas têm sido razoavelmente fixadas, julgo
que tem sido geridas com todo o critério c nâo há qualquer
possibilidade de atacar o Governo nesta matéria, devido à transparência, objectividade e publicação no Diário da República de lodos os contratos-programa assinados. Nem sequer tem precedentes em relação a outras situações do tempo em que havia ciclones, que percorriam o País aos ziguezagues, que atingiam um município e depois saltavam para outro e andavam como salta-pocinhas, de município para município. Não tem comparação com esses tempos.
Quanto aos municípios que sofrem —os Srs. Deputados apontam os distritos de Faro, Lisboa e Setúbal —, isso é a lógica da reforma que o Governo aqui traz, isto é, a lógica é penalizar os municípios que têm mais receitas próprias. O Sr. Deputado sabe que um município do Algrave recebe 200 000 ou 300 000 contos numa operação dc sisa numa venda de um hotel? Mas isto é o FEF de muitas câmaras para o ano inteiro! E dc uma câmara, por acaso, do PS.
A situação actual é realmente dc injustiça, Srs. Deputados, têm de reconhecer isso.
Por isso, julgo que a nossa solução é uma solução alternativa, que foi pensada ao longo de muito tempo e foi criteriosamente estudada. Aí os Srs. Deputados poderão dizer: mas por que é que não dialogaram previamente, por exemplo, como a Associação Nacional de Municípios? É que nós não tínhamos a intenção dc aprcscntá-la agora com o Orçamento do Estado. Isso tem sido dito sucessivamente.
Perante o aumento enorme do FEF dissemos: «bem, este é o momento! Porque aqui podemos dizer, como em todas as alterações de distribuição, que há quem ganhe e quem perca. Esta é a altura, este é o momento em que realmente a reforma pode ser aplicada com menos perda para os municípios, que inevitavelmente terão de sofrer.»
Há municípios que estão a receber acima das suas possibilidades. Isso é claríssimo. Naturalmente, o PSD lerá muita pena de só ter cinco municípios nos distritos que citou, mas os Srs. Deputados poderiam fazer a análise no distrito do Porto, que tem crescimentos elevados e cm que a maioria dos municípios são de presidência PS.
Quanto a imposto de veículos, não sei como é que está a questão neste momento. Sei que o meu ministro já se dirigiu ao Ministro dos Assuntos Parlamentares para dar assentimento à proposta que recebemos da Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Gostava de tentar corrigir ainda uma coisa que disse o Sr. Deputado Júlio Henriques, porque os meus dados não coincidem com os seus. Não lenho a certeza que os meus é que estejam certos e os seus errados, mas devo dizer, honestamente, que as minhas contas são 193 que ganham e 112 que perdem, ou seja, há 10 em que estamos em desfasamento. Todavia, isso também não altera o raciocínio global que ambos fazemos da situação.
Gostava, porém, de dizer-lhe que, quanto àquele raciocínio que fiz em relação aos 22,66 %, estou a aplicado estritamente à proposta alternativa, porque na outra é a aplicação pura e simples da lei, nem sequer fizemos os limites mínimos de crescimento. Tenho receio de errar, mas julgo que só há um caso, talvez nem isso, porque não fizemos qualquer correcção. São os critérios puros da Lei n.° 1/87.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr." Secretaría de Estado do Planeamento c do Desenvolvimento Regional.
A Sr." Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional: — Muito brevemente para responder às duas questões que me foram colocadas.
A primeira, t um comentário r&laúvameniè ao que o
Sr. Presidente referiu do aspecto da anormalidade e plu-
rianualidarte do PIDDAC. V. Ex." tem cm mim a principal defensora dc uma necessidade e de um rigor acrescido na programação plurianual.
Isso é, dc facto, uma responsabilidade conjunta e sectorial da Secretaria dc Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional.
É, portanto, um exercício conjunto, que tem vindo a ser feito com preocupação, embora seja no orçamento de cada ano que o compromisso entre a política de desenvolvimento e as restrições macroeconómicas, designadamente o objectivo do défice, tenha de ser encontrado. Portanto, isso é claro!
Aparte inaudível.
Acho que relativamente a essa questão, tem a ver fundamentalmente com aspectos que só em cada ano vamos limando, tem a ver com os fundos comunitários, com as necessidades dc financiamento e com o equilíbrio que se encontra entre défice dc Estado e peso das despesas de investimento.
De qualquer maneira, as despesas de investimento têm continuado a crescer, quer em termos de PIB, quer em termos da despesa total do Estado. Isso significa que vamos no caminho de uma política dc desenvolvimento clara.
Relativamente à questão que o Sr. Deputado colocou da OID de Setúbal, não esteja preocupado, porque já foi — e penso que isso já é do conhecimento de todos os participantes—, aprovada formalmente a reprogramação financeira da OID, que mantém todo o montante de investimento, incluindo o montante dos fundos estruturais, que tinha sido previamente acordado.
Quanto ao facto de aparecerem no mapa XI do PIDDAC empreendimentos de grande envergadura, que vão para além dc 1993 e 1994 —agora já falamos em 1994 —, como seja o nó ferroviário, a travessia da ponte, etc, que são empreendimentos que vão para lá dessa data, o apoio comunitário surgirá no novo exercício de fundos estruturais, que entrará em vigor a partir de 1993. Portanto, não lem de estar preocupado.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Oxalá que sim!
A Oradora: — Não tenho dúvidas!
O Sr. Presidente: — Resta-me agradecer, em nome da Comissão de Economia, Finanças e Plano e também em nome da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, aos Srs. Secretários dc Estado o facto de terem estado connosco até esta hora.
Gostaria de lembrar os Srs. Deputados desta Comissão dc que há uma pequena alteração no programa para segunda-feira, isto é, há mais um ministério incluído.
Portanto, às 10 horas teremos o Ministério da Defesa Nacional, às 13 horas o Ministério dos Negócios Estrangeiros, às 15 horas o Ministério do Ambiente e Recursos Naturais e às 18 horas o Ministério do Emprego e da Segurança Social.
As reuniões, na próxima segunda-feira e terça-feira, terão lugar na Sala do Plenário.
Está encerrada a reunião.
Eram 19 noras e 7 minutos.
Os Redactores: Maria Amélia Martins — Cacilda Nordeste — Isabel Barral—José Diogo.
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