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Quinta-feira, 13 de Dezembro de 1990

II Série-C — Número 9

DIÁRIO

da Assembleia da República

V LEGISLATURA

4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1990-1991)

6.° SUPLEMENTO

SUMÁRIO

COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO

Acta da Reunião de 4 de Dezembro de 1990

Prosseguiu o debate, na especialidade, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, das propostas de lei n.°* 163/V (Orçamento do Estudo para 1991) e 164/V (Grandes Opções do Plano para 1991).

Sobre o orçamento do Ministério das Finanças intervieram, além do Sr. Ministro das Finanças (Miguel Beleza) e dos Srs. Secretários de Estado do Orçamento (Manuela Leite), dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa), do Tesouro (Tavares da Silva) e das Finanças (Elias da Costa), os Srs. Deputados Ferro Rodri-

gues e Manuel dos Santos (PS), Octávio Teixeira (PCP), Rui Carp (PSD), Helena Torres Marques e Domingues Azevedo (PS), Ilda Figueiredo (PCP) e António Barreto (PS).

Sobre o orçamento do Ministério da Administração Interna intervieram, além do Sr. Ministro da Administração Interna (Manuel Pereiro) e do Sr. Secretário de Estado da Administração Interna (Luís Madureira), os Srs. Deputados Ilda Figueiredo (PCP), Rui Carp (PSD), Gameiro dos Santos e Luis Filipe Madeira (PS), Rui Silva (PRD), José Magalhães (Indep.) e Antunes da Silva (PSD).

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O Sr. Presidente (Rui Machete): — Srs. Deputados, vamos dar início à reunião.

Eram 10 horas e 40 minutos.

Estamos a chegar ao fim da discussão, na especialidade, em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano, da

proposta de lei n.° 163/V, relativa ao Orçamento do Estado. Contamos hoje com a presença do Sr. Ministro das Finanças e dos Srs. Secretários de Estado, a quem dou as boas-vindas.

Srs. Deputados, uma vez que já tivemos oportunidade de conhecer a posição do Ministério das Finanças sobre o Orçamento do Estado para 1991, não só através do relatório do articulado da proposta de lei, mas ao longo da discussão, na generalidade, e através dc algumas intervenções, na especialidade, penso que, neste momento, o Sr. Ministro das Finanças não pretenderá fazer uma intervenção inicial, pelo que passaríamos, desde logo, às questões que os Srs. Dcpuutdos quisessem colocar.

Entretanto, chamo a atenção dos Srs. Deputados para um aspecto importante, em lermos dc gestão do nosso tempo, que respeita ao facto dc o Sr. Ministro das Finanças — e suponho que isto não acontece com os Srs. Secretários dc Estado, ou, pelo menos, com todos — precisar dc abandonar a reunião perto da hora do almoço, uma vez que tem um compromisso cm termos da Cimeira Luso-Espanhola.

Em face disto, seria conveniente aproveitarmos da melhor maneira possível o tempo que o Sr. Ministro pode estar enue nós para lhe colocar as questões, cm nosso entender, mais importantes.

Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças (Miguel Beleza): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ames dc mais, gostaria dc agradecer ao Sr. Presidente e a todos os membros da Comissão dc Economia, Finanças e Plano a amabilidade que tiveram ao alterar a dam inicialmente prevista para a realização desta reunião, pois, pela razão que o Sr. Presidente acabou de referir, eu e o Sr. Secretário dc Estado do Tesouro vamos participar na Cimeira Luso-Espanhola, que terá lugar, como sabem, durante o dia de amanhã no Algarve.

Por esta razão, c uma vez que o Orçamento do Estado para 1991 já foi alvo de apresentação, por mais dc uma vez, desde já nos colocamos à disposição dc VV. Ex." para responder a todas as questões que entendam colocar c solicito, enuctanto, que sejam feitas primeiro as que se dirigem a mim c ao Sr. Secretário dc Estado do Tesouro.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Antes dc começarmos, propriamente, o debate, gostaria de, neste dia em que faz 10 anos que ocorreu o desastre dc Camarate, relembrar não só as duas figuras mais conhecidas, de Sá Carneiro e de Amaro da Costa, que a justo título hoje estão a ser lembradas, em todo o País, por todos os meios dc comunicação social e por um conjunto de figuras políticas, mas muito especialmente António Patrício Gouveia, um colega meu c do actual Ministro das Finanças, Miguel Beleza, que faleceu também nesse desastre e que recordo

com imensa saudade, admiração e toda a camaradagem e simpatia que ele nos mereceu.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, não posso deixar de

agradecer as palavras muiio oportunas que acabou de

proferir e aproveito para lembrar que, como V. Ex." sabe, hoje à noite vai realizar-se uma sessão de homenagem a

memória de Francisco Sá Carneiro, que também envolverá, como é natural, aqueles que com cie pereceram no infausto acidente. E embora a Assembleia da República tenha programado a realização de uma sessão especial na próxima semana, penso que nunca é de mais recordar com saudade as pessoas que nos abandonaram nessa data.

Portanto, todos nós nos associamos à sua homenagem, muilo em particular em relação a António Patrício Gouveia, que, embora não tenha sido meu colega, também tive oportunidade dc conhecer c dc com ele privar amplamente durante toda uma fase de actividade política em que participámos em conjunto, quando a intensidade dos acontecimentos políticos permitia uma grande comunhão entre as pessoas que neles participavam.

Vamos agora passar à fase das perguntas que VV. Ex." têm para colocar ao Sr. Ministro das Finanças e ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro c, posteriormente, aos outros Srs. Secretários dc Estado do Ministério das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, gostaria apenas de salientar que me associo à homenagem expressa nas palavras do Sr. Deputado Ferro Rodrigues, em particular no que respeita ao nosso colega c amigo

comum, António Patrício Gouveia. Aliás, uma das razões que me leva também a agradecer a possibilidade de se ter feito hoje esta discussão é que não nos impede, a nós c, certamente, a alguns dos senhores, de estar presentes no Porto, na sessão dc homenagem à memória dc Francisco Sá Carneiro e às outras vítimas do acidente. Assim, não posso deixar dc apreciar c de mc associar inteiramente à homenagem feita pelo Sr. Deputado Ferro Rodrigues c estou seguro também dc que os Srs. Secretários dc Estado gostariam dc fazer o mesmo.

O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, no sentido dc dar início ao debate, independentemente dc outras questões que mais tarde venha a colocar, gostaria dc levantar, dc imediato, «a questão» Tribunal dc Contas.

Com efeilo, cm reunião da Comissão dc Economia, Finanças e Plano realizada na semana passada, que contou com a presença do Sr. Presidente do Tribunal de Comas, foram contestadas, por não serem válidas, as justificações orais, feitas numa anterior reunião da Comissão pelo Sr. Ministro das Finanças, e escritas, que, entretanto, tinham sido enviadas pela Sr.* Secretária de Estado do Orçamento ao Tribunal de Contas para justificar os cortes orçamentais dc que o Tribunal dc Contas se considera vítima.

Neste sentido, gostaria de sugerir que V. Ex.', na qualidade de Presidente desta Comissão, informasse o

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Ministro das Finanças sobre as principais dúvidas que nos Ficaram após a reunião com o Sr. Presidente do Tribunal de Contas, possibilitando assim ao Sr. Ministro das Finanças esclarecê-las. .

Como não fui parte na referida reunião, não sei se foi ou não dada alguma informação sobre o conteúdo da mesma ao Sr. Ministro das Finanças, pelo que entendo que, se não foi, deverá ser o Sr. Presidente a fazê-lo c não qualquer um dos partidos.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Ferro Rodrigues, de facto seguimos um esquema um pouco informal da fase processual do contraditório. Isto é, as críticas feitas pelo Sr. Presidente do Tribunal de Contas ao Orçamento do Estado para 1991 foram objecto, a meu pedido, de uma informação por parte da Secretaria de Estado do Orçamento, a que poderíamos chamar, em linguagem processual, de contestação. Posteriormente tivemos oportunidade de ouvir aqui, numa reunião, em sede de Comissão de Economia, Finanças e Plano — que, suponho, contou com a sua participação—, o Sr. Presidente do Tribunal de Contas, que, mais tarde, resumiu o seu posicionamento num documento que já foi distribuído pelos partidos e que também já tive oportunidade de enviar para o Ministério das Finanças.

Em face disto, entendo que estamos perante uma espécie de contraditório imperfeito, na medida em que, em primeiro lugar, isto não é rigorosamente um processo e, em segundo lugar, porque o Tribunal de Contas teve três oportunidades de expressar o seu posicionamento, enquanto a Secretaria de Estado do Orçamento apenas o fez uma vez, através de um documento.

Em todo o caso, devo dizer que a impressão que me ficou de lodo este problema foi a de que o Sr. Presidente do Tribunal de Contas colocou dois tipos de questões: uma que diz respeito à arrumação e à sistemática do Tribunal de Comas no Orçamento, cm que exprimiu, por um lado, uma crítica à circunstancia de o Tribunal de Comas, após a respectiva reforma, se encontrar ainda integrado no sector do Ministério das Finanças, e, por consequência, entender que deveria ter um tratamento diferente —tendo dado alguns exemplos em termos de direito comparado— e, por outro lado, em úlüma análise, exprimiu o desejo de que fosse tratado de forma similar à do Tribunal Constitucional ou que fosse integrado no orçamento do Ministério da Justiça, uma vez que, como V. Ex.° sabe, os outros tribunais, com excepção do Tribunal Constitucional, que está no âmbito dos Encargos Gerais da Nação, incluem--se no Ministério da Justiça.

Aliás, penso que se trata de uma questão geral, que não é específica do Ministério das Finanças — pois, tanto quanto sei, este Ministério não é uma questão específica —, mas do Governo e da Assembleia da República.

Do outro problema, que tem a ver directamente com o Orçamento c que foi longamente explanado pelo Sr. Presidente do Tribunal de Contas, ressaltam dois aspectos que me parecem adquiridos: um é o entendimento de que o Tribunal de Contas tem, face às suas pretensões, em termos de adquirir verbas suficientes para a concretização da sua reforma, de que existem dois tipos de resposta por pane do Ministério das Finanças, que já foram explanadas no documento apresentado.

A primeira tem a ver com a circunstância de o Orçamento proposto pela Contabilidade Pública dizer respeito aos efectivos presentes e a resposta em relação aos efectivos

futuros, aos acréscimos de efectivos, na perspectiva da Contabilidade Pública e da Secretaria de Estado do Orçamento, só poder ocorrer através da dotação provisional.

A segunda tem a ver com os ganhos resultantes das economias realizadas pelo Tribunal de Contas e, portanto, com os prémios de economia a que o Tribunal de Contas tem direito e que somam uma importância avultada — se não estou em erro, da ordem dos 300 000 contos.

Nestas circunstâncias, encontramo-nos perante uma situação cm que há divergências quanto ao modus operandi e quanto aos quantitativos. É este —ao que suponho e numa síntese um pouco improvisada — o estado da questão.

Assim, e para concluir, podemos dizer que existe uma posição final no sentido de que ela resultou, já no lermo das sucessivas explanações e comunicações feitas, quer por forma escrita, quer oralmente, pelo Sr. Presidente do Tribunal de Contas, do documento úlümo apresentado aqui na Comissão de Economia, Finanças e Plano através de uma carta que me foi dirigida e que tive oportunidade de transmitir à Sr.* Secretária de Estado do Orçamento, e da posição claramente expressa, antes dessa carta, em que se explicava, num documento que também foi aqui distribuído, o comportamento adoptado pela Contabilidade Pública.

Neste momento ê este o ponto da situação, Sr. Deputado.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, apesar de V. Ex.* se ter referido a vários aspectos, fazendo uma excelente síntese da actual situação em relação ao Tribunal de Contas, gostaria, no entanto, dc saber o que é que o Sr. Ministro das Finanças tem a dizer sobre alguns aspectos. Como, certamente, se recordarão, da última vez que esta Comissão esteve reunida com o Ministério das Finanças, um argumento que foi fortemente utilizado para justificar alguma quebra orçamental do Tribunal dc Contas foi o das obras. Esse argumento foi, no entanto, completamente contestado pelo Sr. Presidente do Tribunal dc Contas, que chamou a atenção para a importância relativa, muito diminuta, que essas obras tiveram no Orçamento do Estado para 1990.

Por ouiro lado, um outro argumento apresentado, que também foi utilizado posteriormente, foi o de que era possível fazer projecções para as necessidades orçamentais dc 1991 com base nos primeiros nove meses, suponho cu, dc 1990. Ora, lambem ele foi seriamente posto em causa pelo Sr. Presidente do Tribunal de Contas, chamando a atenção para o facto de ser exactamente no último trimestre que a maior parle das despesas serão feitas. Assim sendo, não teria qualquer sentido fazer uma projecção de necessidades para o próximo ano com base nesses primeiros nove meses.

Estes dois argumentos foram os mais pesados, digamos assim, para além dos argumentos de organização das contas públicas, para as dotações para o Tribunal de Contas, como foi dito pelo seu presidente, poderem ter outro âmbito que não a sua afectação directa, numa primeira fase, mas poderem vir da dotação provisional e de prémios. Aí julgo que a questão não é meramente técnica, mas também política, porque, sc bem percebi no desenrolar da reunião, a independência do Tribunal de Contas poderá não ser considerada a mesma, pelo próprio presidente, nas suas

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possibilidades práticas, quer tenha ou não as dotações orçamentais claramente definidas à partida, isto e, desde o

primeiro momento.

Mas, para além deste argumento mais de fundo, havia estes dois aspectos concretos sobre os quais gostava de ouvir a opinião do Ministério das Finanças, visto que foram argumentos utilizados em reuniões anteriores.

Para além disso, evidentemente, todos gostaríamos de saber se, entretanto, se terá reatado o diálogo, porque foi surpreendente, julgo que para todos os deputados que estiveram presentes na reunião da semana passada, constatar a estranha situação de, depois de ter sido clarificado que havia um problema entre o Ministério das Finanças e o Tribunal dc Contas, nada sc ter passado em termos de desenvolvimento do diálogo entre essas duas instituições.

A resposta às várias perguntas que foram feitas ao Sr. Presidente do Tribunal dc Contas sobre este assunto foi no sentido de que se mantinha a ausência do diálogo, que seria mais importante, e que, portanto, a crítica que estava expressa na primeira carta enviada pelo Presidente do Tribunal de Contas à Assembleia da República se mantinha. Isso foi encarado por muitos deputados como algo de estranho e, portanto, queríamos saber se, entretanto, se pode dizer que essa situação mudou qualitativamente.

O Sr. Presidente: — Gostava só dc esclarecer dois pontos. No que se refere ao primeiro ponto, quero esclarecer que não fiz qualificações c não disse se o problema era técnico ou se era político, porque isso envolvia já algum tipo de juízo que não quis eximir.

Em relação ao segundo ponto, que diz respeito à questão do diálogo, queria apenas dar a seguinte explicação: pensei, e foi uma decisão minha, que era óbvio que lermos uma discussão na Comissão entre duas entidades, frente a frente, não era a fórmula mais curial dc procedermos; por isso não o fiz e penso que foi correcto.

Isto não significa que não tenha havido algum diálogo — porque, antes, ao que suponho, houve correspondência trocada— e que, depois, não tenha continuado a haver contactos. Mas, como digo, cm termos de Comissão, pareceu-me preferível agir deste modo, porque, simultaneamente, adquirimos o conhecimento das exactas divergências que existiam e evitámos —não era muito presumível que isso acontecesse — ou, de qualquer modo, prevenimos a hipótese de qualquer situação mais melindrosa, que seria sempre extremamente desagradável.

O Sr. Deputado Manuel dos Santos tinha pedido a palavra sobre esta matéria?

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr. Presidente, ainda na linha da intervenção do meu camarada Ferro Rodrigues, V. Ex.' recordará, e o Sr. Secretário de Estado também, porque esteve presente (o Sr. Ministro não), que eu próprio anunciei, em nome do PS, a disponibilidade para tomar uma iniciativa c que afirmei que não o faríamos, uma vez que considerávamos que se tratava dc uma relação entre dois órgãos de grande importância na vida financeira nacional e que, portanto, o ideal seria que fosse possível, através do diálogo que foi, dc algum modo, protagonizado na Comissão, embora indirectamente, que sc encontrasse uma solução que permitisse às duas partes continuar a defender o essencial dos seus pontos dc vista.

Nessa altura, como o Sr. Presidente se lecoTÒaú, fiz depender a nossa decisão de, eventualmente, apresentarmos uma proposta de reforço das verbas do Tribunal de Contas, na especialidade, da forma como decorresse o diálogo subsequente à reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano e, portanto, neste momento, é esta, concretamente, a pergunta que lhe faço, até porque as notícias que continuam a vir a lume e na comunicação social, por iniciativa do Sr. Presidente do Tribunal de Contas, já apontam para uma situação de impasse.

Basicamente, e até por uma questão processual, era importante para os deputados socialistas e para o Grupo Parlamentar do PS saber se está definitivamente fechada qualquer hipótese de diálogo com o Tribunal de Contas — circunstância em que assumiremos a responsabilidade política e apresentaremos uma proposta de reforço da verba do Tribunal de Contas— ou se, pelo contrário, como desejaríamos, ainda há hipótese de diálogo.

Não pretendemos, de forma alguma, fazer qualquer tipo de propaganda cm relação a isto, mas quero dizer-lhe que os argumentos do Sr. Presidente do Tribunal de Contas nos convenceram e achamos realmente deplorável a reafirmação, que não foi, aliás, contestada, da falta de diálogo. Isto é extremamente preocupante, como tive, aliás, oportunidade de assinalar. Assim, seria importante para nós conhecermos o ponto final sobre esta situação.

Já agora que estou no uso da palavra, e porque presumo que entrámos especificamente no assunto do debate, colocaria mais uma ou duas questões, sem prejuízo de voltar a intervir mais tarde. Uma delas tem a ver com o Secretário dc Estado dos Assuntos Fiscais.

É propaganda do Governo —propaganda no bom sentido, não estou a fazer qualquer juízo de valor em relação a isso — e, particularmente, do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que este Orçamento assentou muito na ideia do desagravamento fiscal, por virtude da aplicação de uma nova tabela do IRS. A oposição, e particularmente o PS, contestou este título de caracterização da política fiscal do Governo e fê-lo, obviamente, considerando que, para se poder falar de agravamento ou desagravamento, tinham, naturalmente, de se corrigir os rendimentos, face a uma evolução previsível ligada à inflação dos salários de 1990 para 1991.

Surpreendentemente, verificamos que, na sua última intervenção na televisão, o Sr. Primeiro-Ministro, dc algum modo, nos deu razão, uma vez que insistiu no desagravamento comparando os rendimentos sem actualização, mas reconheceu, embora de uma forma ligeira, que haveria um agravamento, que até saudou, no caso de haver uma actualização. Esta foi uma questão essencial do debate, entre outras, como é evidente.

Aproximamo-nos do fim deste debate e temos ou não propostas alternativas e dc especialidade para apresentar c, portanto, gostava dc ouvir, definitivamente, um comentário do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais sobre este assunto e, particularmente, a afirmação ou infirmação do nosso ponto de vista.

Mais concretamente, gostaríamos de saber se, corrigindo os rendimentos de 1990 para 1991, tendo em conta uma evolução previsível da taxa de inflação e, obviamente, do acréscimo salarial, é ou não verdade que não se verifica qualquer desagravamento, ou, pelo menos, não sc verifica um desagravamento significativo, daqueles que podem ser pesados significativamente, porque uma taxa de desagravamento de 0,1, 0,2 ou 0,3 % não é propriamente um desagravamento fiscal na óptica em que o estamos aqui

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a considerar. Poderá ser na óptica aritmética, mas não na óptica social.

A terceira questão, que presumo que seja para o Sr. Secretário de Estado das Finanças, tem a ver com o facto de, recentemente, um governador do Banco de Portugal, em várias oportunidades, ter anunciado e caracterizado a política monetária do Governo referindo, particularmente, que se tomava necessário, na economia, secar liquidez da ordem dos 1,06 milhões de contos.

Bem, aqueles que, como eu, já tiveram oportunidade e que vão continuar a ter, ao longo da vida, de estar num mundo real e produtivo e que tiveram responsabilidades de gestão em pequenas e médias empresas, sabem o que isso vai significar em termos de estabilidade dessas empresas, o que isso pode significar em termos de todas as outras coisas e, particularmente, da evolução desse mundo empresarial, tão rico e tão importante para o nosso país.

Perguntava-lhe, portanto, se as projecções macro-eco-nómicas que fez, particularmente em termos de crescimento, em termos de formação bruta do capital fixo e cm termos de evolução do emprego, tiveram em conta esta característica da politica monetária agora anunciada e, se não tiveram, se isso, de algum modo, leva o Governo a corrigir as previsões que, digamos, na altura própria, apresentou à Assembleia da República.

O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou colocar algumas questões, tendo em atenção o que o Sr. Presidente disse há pouco, ou seja, que o Sr. Ministro só cá estará da parte da manhã, tal como o Sr. Secretário de Estado do Tesouro; por isso deixarei outras questões para intervenções posteriores.

No entanto, como uma das questões que queria colocar ao Sr. Ministro já foi referida, gostaria de fazer algumas observações sobre o orçamento do Tribunal de Contas, isto sem prejuízo de depois a discutir, mais aprofundadamente, com a Sr.* Secretária de Estado do Orçamento.

Para além da questão da falta de diálogo, que é apontada pelo Tribunal dc Contas — e que, do nosso ponto dc vista, é uma situação insustentável, pois não concebemos que possa haver falta de diálogo entre o Ministério das Finanças e o Tribunal de Contas —, julgo que a questão do orçamento do Tribunal de Contas para 1991 coloca, desde logo, o problema de este Tribunal não poder ser tratado como um mero serviço da Administração Central e, por conseguinte, julgo que é uma questão que tem dc ser vista, claramente, nesta perspectiva por parte do Governo c, mais concretamente, por parte do Ministério da Finanças.

Por. outro lado, do nosso ponto de vista, julgo que o Governo, num momento em que se pretende que seja um momento de arranque do Tribunal de Contas — ainda não é um momento de consolidação—, não pode tratar o orçamento do Tribunal de Contas como o dc um serviço que existe há longos anos e que é preciso contrair em termos de despesas. Julgo que a perspectiva do alargamento da actividade, de funções e da profundidade da sua actividade, não se compatibiliza com uma situação destas!

Nesta perspectiva, a dotação proposta pelo Governo é, para nós, completamente incompreensível. Sc a memória não me uai, o orçamento proposto pelo Governo para o Tribunal de Contas é inferior ao seu orçamento de 1990. Há dotações em que há decrescimento entre aquilo que foi

gasto em 1990 ou, melhor, até Setembro de 1990 —e já não falo naquilo que foi orçamentado — e aquilo que é proposto para o ano de 1991, e ou há uma explicação lógica e clara sobre a razão desta situação ou, então, a redução de dotações é absolutamente insustentável, do meu ponto de vista.

Um caso concreto, embora não seja o mais flagrante em termos de diferença de números, é a dotação para pessoal. A proposta do Governo não chega para fazer face às despesas com o pessoal existente neste momento. Julgo que não passa pela ideia de ninguém que o Tribunal de Contas irá reduzir o pessoal que tem, antes pelo contrário!

Julgo ter, há pouco, ouvido uma explicação daquilo que se passou — e nao uma explicação própria —, por parte do Sr. Presidente, no sentido de que essas verbas seriam cobertas pela dotação provisional.

Lembro que a dotação provisional está apenas prevista para os descongelamentos — pelo menos é aquilo que aparece referenciado pelo Governo, mas se ele pôs uma coisa no relatório e tem na ideia outra, o problema não será certamente dos deputados nem da Assembleia da República, mas, sim, seu, pois está referido que os 25 milhões de contos são para descongelamentos e prémios de poupança.

Por conseguinte, julgo que, pelo menos, os encargos efectivos com o pessoal que existe, acrescidos, logicamente, dos 13,5 % que foram, julgo cu, acordados já entre o Governo e os sindicatos, ou alguns sindicatos, devem constar da proposta de orçamento do Tribunal de Contas.

Por último, ainda no âmbito das despesas com pessoal, há um problema que é preciso clarificar: o do pagamento dos retroactivos a diversos funcionários do Tribunal de Contas, relativos às carreiras de regime especial com estrutura semelhante às carreiras técnica e técnica superior. Por conseguinte, a aplicação do Decreto-Lei n.° 265/88 está, há bastante tempo, por fazer relativamente a vários funcionários. E julgo que essa interpretação também não aparece prevista em termos de orçamento do Tribunal de Contas.

Estas eram algumas questões que deixaria sobre o orçamento do Tribunal de Contas, sem prejuízo dc, mais tarde, voltar ao assunte, designadamente para, em alguns aspectos, analisarmos a questão com mais profundidade com a Sr.* Secretária de Estado do Orçamento.

No entanto, outras questões gostaria de colocar ao Sr. Minisuo, sendo a primeira ainda relacionada com o problema da taxa de inflação.

Não vou aqui voltar ao problema da discussão das previsões da taxa de inflação, não deixando, contudo, de registar que, até hoje, o Sr. Ministro não explicou ainda como é que pensa desacelerar o crescimento do índice de preços no consumidor. De qualquer modo, gostaria de lhe formular duas questões concretas sobre esta matéria.

Assim, gostaria de saber se o Sr. Ministro nos pode, neste momento, dizer qual a projecção mensal de evolução da inflação para 1991 ou, pelo menos, para o primeiro trimestre desse ano. Julgo que, se há elementos desses que são fomecíveis ao Conselho Permanente de Concertação Social, terão de, necessariamente, ser também fornecíveis à Assembleia da República

Por outro lado, Sr. Minisuo, gostaria de, franca e claramente, lhe colocar a seguinte questão: quando o Governo faz a previsão de 10,75 para o factor do consumo privado em 1991, está a fazer essa projecção com as bases actuais ou a prever alterações que decorrerão no novo índice de preços no consumidor?

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Note-sc que faço esta pergunta, na medida em que é natural que o novo índice de preços no consumidor venha apontar para valores inferiores aos que seriam obüdos com o actual índice de preços. É que, do meu ponto de vista, e independentemente do valor, para podermos analisar e discutir um problema do âmbito, da grandeza, da dimensão da desacelaração, é necessário que partamos da mesma base.

O segundo tipo de questões que gostaria de lhe colocar está relacionado com o problema das dotações para juros.

Gostaria de solicitar ao Ministério das Finanças que nos fornecesse agora —para, se for caso disso, podermos discuti-las — as taxas de juro implícitas na dotação para pagamento de juros. Refiro-me a todas as taxas dc juro, quer internas quer externas, mas com particular incidência nas taxas de juro implícitas para a dívida interna.

É evidente que será também de interesse saber quais são as taxas de câmbio implícitas. No entanto, muito particularmente, o problema que se mc coloca neste momento é o das taxas implícitas para a dívida interna.

No mesmo sentido, gostaria que algum titular do Ministério das Finanças — o Sr. Ministro ou os Srs. Secretários dc Estado — nos pudesse dar uma informação sobre a dotação para a bonificação de juros à habitação. Salvo erro, em termos nominais, há um aumento da ordem dos 17 % ou 18 %, mas gostaria de saber com base em que taxas de juro implícitas foram calculadas as dotações para 1991.

Para ser mais claro, quer relativamente ao problema do pagamento de juros, quer em relação ao problema da bonificação de juros à habitação, gostaria dc saber se foram tidos em consideração os aumentos das taxas de juro previstos pelo Banco de Portugal para o próximo ano.

Finalmente, a derradeira questão que lhe deixaria neste momento — penso que também se trata dc um problema relacionado com o Sr. Ministro c com o Sr. Secretário de Estado do Tesouro — é a do programa de recuperação financeira da Região Autónoma da Madeira. Já falámos nisto em sede dc Comissão e ficaram até dc nos ser fornecidos alguns elementos, mas, até hoje, pelo menos o Grupo Parlamentar do PCP nada recebeu.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Elementos?...

O Orador:—Sim, os elementos que o Governo prometeu que forneceria na Comissão de Economia, Finanças c Plano. Pelo menos um deles seria fornecido com carácter sigiloso, não passível dc divulgação pública, que era o problema da renegociação da dívida

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de, primeiramente, constatar que a oposição coloca como primeira prioridade para a discussão do Orçamento com o Ministério das Finanças o orçamento do Tribunal de Contas.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Não chegou no início, não sabe o que se passa!

O Orador: — Na verdade, em termos dc ocupação de tempo, o orçamento do Tribunal de Contas tem-no ocupado mais do que qualquer outra matéria, quando, no fundo, há

uma matéria sobre a qual ainda não ouvi a oposição pronunciar-se...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): —Ora essa?'.

O Orador: — Sr. Deputado, dá-me licença que continue a falar?...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Faça favor!

O Orador: — Muito obrigado!

Como ia dizendo, ninguém falou aqui das receitas próprias do Tribunal de Contas. Ninguém aqui referiu que o Tribunal de Contas se viu aliviado da utilização das receitas próprias do Cofre Geral dos Tribunais para a compra do seu edifício, dado que essa compra, que custou cerca de um milhão de contos, foi integralmente suportada pelo orçamento do Ministério das Finanças, através da Direcção-Gcral do Património do Estado. Também ninguém falou aqui do crescimento das verbas do Tribunal de Contas, o que, em termos percentuais, não oferece qualquer comparação relativamente aos outros departamentos, com ou sem autonomia financeira, abrangidos pelo orçamento do Ministério das Finanças.

Por outro lado, também ninguém focou o facto de o Governo ter colocado mais de 100 técnicos no Tribunal de Contas, assim como ninguém referiu a alteração estrutural fundamental da Lei Orgânica do Tribunal de Contas, que concedeu a esta enüdade a hipótese de ser ela própria, e não o Ministro das Finanças, a nomear os respectivos juízes.

Ninguém referiu aqui o equipamento informático que o Ministério das Finanças adquiriu para o Tribunal dc Contas, assim como o equipamento mobiliário, inclusivamente automóveis, suportado pelo Ministério.

Finalmente, ninguém referiu que, comparativamente, o orçamento do Tribunal de Contas é o que mais cresce em 1991, relativamente a todos os outros orçamentos das entidades, com ou sem autonomia, integradas na estrutura do Ministério das Finanças.

Para terminar, gostaria que o Sr. Ministro das Finanças se pudesse referir ao problema da política orçamental para 1991, designadamente se essa política adopta ou não uma orientação dc convergência relativamente às políticas que estão a ser adequadas ao nível da CEE. É que me parece ser importante debater aqui o problema de saber até que ponto a política orçamental para 1991, face a estes números e na especialidade, se aproxima ou se afasta do objectivo da convergência que, em termos dc CEE, está estabelecido para 1991.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou começar por esclarecer algumas das questões que os Srs. Deputados tiveram a amabilidade dc me colocar. Ulteriormente, se o Sr. Presidente me der licença, pediria aos Srs. Secretários de Estado que explicassem mais detalhadamente alguns desses aspectos.

Quanto à questão do Tribunal de Contas, gostaria de começar por referir que as preocupações substantivas e mais importantes do seu presidente e do Tribunal dc Contas em gera), no que diz respeito ao rigor, à transparência ou à prestação de comas por parte do Governo, dificilmente poderiam ser mais atendidas e partilhadas pelo Governo.

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Para além da própria reforma do Tribunal de Contas, mencionada pelo Sr. Deputado Rui Carp, refiro-me a outros diplomas importantes nesta matéria, que, aliás, a própria Assembleia da República aprovou, fazendo-o por forma a não deixar dúvidas de que os considerava adequados. Por exemplo, estou a lembrar-me da reforma da contabilidade pública, da alteração do regime da dívida pública, da alteração do regime das operações dc tesouraria ou da regularização das operações passadas.

Suponho que este conjunto de diplomas e a disposição, por parte do Governo, no que toca ao rigor e à transparência na prestação de contas quanto às finanças públicas são suficientemente eloquentes e elucidativos acerca da convergência de preocupações nesta matéria. Penso que, neste campo, o Governo terá agido pelo menos tão bem — se calhar melhor — como outros governos nesta área.

Quanto h questão referida pelo Sr. Presidente c muito expressivamente apelidada de «arrumação do Tribunal de Contas», o entendimento do Governo é o dc que a Constituição não equipara o Tribunal de Contas ao Tribunal Constitucional. Consequentemente, não é evidente que deveria estar incluído nos «Encargos Gerais da Nação».

Aliás, sobre este ponto de vista gostaria de referir que a inclusão do Tribunal de Contas no capítulo referente ao Ministério das Finanças ou em qualquer outro ministério nada tem que ver com a sua independência. Sc, hipoteticamente, estivesse incluído nos «Encargos Gerais da Nação» ou no Ministério da Justiça, a intervenção do Ministério das Finanças seria rigorosamente a mesma, isto é, apenas em matéria orçamental e financeira, nada tendo a ver com a sua independência. Por conseguinte, é um problema que não diz respeito a esse aspecto essencial.

Tal como sucede com o Tribunal Constitucional ou com os tribunais judiciais, acrescento que outros tribunais dc carácter especial estão afectos a ministérios diferentes. Dc facto, creio que os tribunais militares estão afectos ao Ministério da Defesa, os tribunais do trabalho no Ministério do Emprego e da Segurança Social, enquanto os tribunais que tratam assuntos fiscais se encontram afectos ao Ministério das Finanças em matéria orçamental.

Portanto, a arrumação do Tribunal de Contas no Orçamento não tem a ver com a sua independência, sendo um aspecto completamente diferente. Aliás, repito, a intervenção do Ministério das Finanças seria rigorosamente a mesma qualquer que fosse o capítulo em que o Tribunal de Contas estivesse arrumado, tal como referiu o Sr. Presidente.

Relativamente à questão específica do diálogo, cu não caracterizaria a situação como de falta de diálogo.

Tenho lido múltiplos contactos, por escrito c não só, com o Sr. Presidente do Tribunal de Contas. Não julgo adequado tornar públicos esses contactos, mas certamente que, pelo menos da minha parte, eles continuarão e penso continuar, quer por minha iniciativa, quer cm resposta a iniciativas do Sr. Presidente do Tribunal de Contas, a tratar dos assuntos que dizem respeito a ambos, tal como o tenho feito até aqui.

Como referi, não me parece indispensável que as cartas que troco com o Sr. Presidente do Tribunal de Contas sejam tomadas públicas. No entanto, do meu ponto dc vista, penso que não é correcto caracterizar a situação, neste como noutros pontos, como de falta de diálogo.

Quanto às questões específicas que me foram colocadas em relação à comparação entre os Orçamentos para 1990 e 1991, pediria à Sr.* Secretária de Estado do Orçamento que esclarecesse mais em detalhe esses aspectos. Talvez

por uma questão de arrumação, peço ao Sr. Presidente licença para passarmos já a esse ponto e depois responderei as restantes questões.

O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra a Sr.* Secretária de Estado do Orçamento.

A Sr.' Secretária de Estado do Orçamento (Manuela Leite): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não posso deixar de sorrir com uma frase que foi aqui proferida, isto é, que o Tribunal de Contas linha sido vítima de cortes... É que dá ideia dc que, recentemente, houve uma grande carnificina. Realmente, o Tribunal de Contas foi quem menos foi vítima de quaisquer reduções.

Os Srs. Deputados têm, com alguma frequência, rebatido as taxas de crescimento que apresentamos para diferentes sectores, fazendo-o com base na ideia de que não se deve comparar orçamento com orçamento, mas sim estimativas de execução com orçamento. No entanto, relativamente ao Tribunal de Contas, estão a fazer rigorosamente o contrário, pois estão a comparar orçamento com orçamento e não estimativas de execução com orçamento.

Se se comparar uma estimativa de execução do Tribunal de Contas com o orçamento desta entidade para 1991, ele cresce, no que respeita a pessoal, 25,6 %, o que significa que tomámos em consideração o facto de que, no terceiro trimestre, iria haver um aumento; se não o tivéssemos feito, é evidente que, então, se teria considerado um aumento de 13,5% — que seria o máximo. Portanto, quando se considera um aumento de 25,6 %, muito superior aos 13,5 % c mesmo aos 12,5 % orçamentados nos outros serviços, é evidente que se admite que no último trimestre existe um aumento que foi considerado.

Por outro lado, há aqui outra questão que será de referir, porque penso ser bastante cara ao Tribunal dc Contas, que a olha com enorme simpatia: é o facto de ter sido introduzido este ano o problema dos prémios dc produtividade, no sentido dc alterar a mentalidade dos serviços, dc modo a evitar a tendência de gastar para justificar a verba, incentivando-os, antes, a poupar, para obter alguns ganhos.

Penso que o Tribunal dc Contas, na sua óptica dc controlador da eficiência da despesa, viu esta medida com enorme simpatia. Nesse sentido, aquilo que está a acontecer com o Tribunal de Contas, em termos de uma baixa execução, deve-se ao facto de ele ter sido muito sobre-orçamentado em 1990, ou seja, teve uma orçamentação que não correspondia às suas necessidades e, neste momento e por esse motivo, vai ter o respectivo prémio de produtividade, que corresponderá a algumas centenas de milhar de contos.

O que é facto é que não se poderia fazer as duas coisas simultaneamente: já aumentámos 25,6 % a despesa cm pessoal; se se aumentasse muito mais —o que não corresponderia a despesa efectiva —, então a poupança no final do ano não teria a ver com uma eficiente gestão de recursos, mas com uma sobreorçamentação, motivo pelo qual, relativamente a todos os serviços — e o Tribunal dc Contas foi uma excepção positiva — tentámos não sobre--orçamentar a despesa com pessoal e reforçá-los apenas consoante as necessidades. Senão, à partida estávamos a permitir uma poupança que posteriormente teríamos de premiar e que, na verdade, não se trataria de uma poupança, mas, sim, de um erro dc orçamentação.

Penso que o Sr. Ministro das Finanças já respondeu ao essencial, no que diz respeito ao Tribunal dc Contas,

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porque, seja qual for a localização do Tribunal dc Contas, será sempre o Ministro das Finanças a autorizar todos os reforços pela dotação provisional — que é o assunto que está aqui em causa—, mas isso foi feito, efectivamente, em relação a todos os serviços. Os montantes necessários para cobrir eventuais aumentos de encargos com pessoal serão dados a posteriori pelo Ministério das Finanças, por uma questão de gestão criteriosa das verbas.

Há ainda um outro problema, colocado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, relacionado com o pagamento dos retroactivos de diversos titulares, ou seja, com a aplicação do diploma 275/88. Isso está por fazer e estará, porque, como o Sr. Deputado Octávio Teixeira sabe — e o Sr. Presidente do Tribunal de Contas melhor o saberá —, este diploma tinha a ver com uma revalorização de determinadas categorias técnicas enquadradas no sistema de classificação por letras, que já não existe desde a aplicação do NSR. Como é evidente (e ninguém o saberá melhor do que o Sr. Presidente do Tribunal de Contas, que esteve integrado na reforma do NSR), esse diploma não foi aplicado porque não foi feita a reforma nessa altura, mas a actual reforma lerá isso em conta. E isso certamente estará na base de determinadas propostas do Sr. Presidente do Tribunal dc Contas, que atenderá ao facto de que essa revalorização não foi feita — contudo, o diploma 275/88, rigorosamente, não pode ser aplicado porque já não existem letras de vencimento.

O Sr. Ministro das Finanças: — Srs. Deputados, em resposta a outras questões colocadas pelos Srs. deputados, começaria por aquela que se refere ao IRS para o próximo ano e ao desagravamento fiscal. A este respeito irei solicitar ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que dê alguns esclarecimentos detalhados sobre esta matéria; de momento gostaria apenas de repetir aquilo que eu próprio já afirmei na apresentação do Orçamento do Estado. Do que se trata é de uma correcção, pela inflação, dos escalões e, por consequência, de eliminar o efeito da inflação nos impostos. Para além disso, trata-se dc desagravar, dc forma especial, os rendimentos mais baixos e os rendimentos do trabalho. É esta a filosofia da proposta no que se refere aos impostos directos, nomeadamente ao IRS, no Orçamento do Estado de 1991, e 6 isso mesmo o que está na proposta do Governo.

Para mais pormenores, passo a palavra ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, com a permissão do Sr. Presidente.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa): — Sr. Deputado Manuel dos Santos, o desagravamento dos rendimentos de trabalho programado para 1991 é generalizado. Porém, não é necessariamente uniforme porque, quando se altera a estrutura dos escalões, haverá sempre zonas onde o desagravamento é mais expressivo do que" noutras. Mas, tal como o Sr. Ministro das Finanças já teve oportunidade de salientar, procurou-se, mesmo nesses pontos, que não houvesse agravamento em função do referencial da taxa de inflação prevista; procurou-se, inclusivamente, que esse desagravamento, tendo zonas tangenciais —aliás, extremamente limitadas—, abrangesse, de uma forma mais expressiva, os mais baixos rendimentos. Terei oportunidade de fornecer aos Srs. Deputados, um pouco mais adiante, elementos precisos sobre tudo o que aconteceu.

Aliás, todos os anos se debate este problema do desagravamento, aquando da apresentação do Orçamento

do Estado, e todos os anos os Srs. Deputados insistem em que não há desagravamento. Para que, de uma vez por todas, esse problema fique clarificado, estou a tentar preparar elementos, partindo de uma base de tributação e corrigindo com a inflação desde 1985 até 1991, através dos quais os Srs. Deputados poderão verificar que o desagravamento acumulado é, de facto, verdadeiramente notável.

Não se pretende, obviamente, num só ano, que o desagravamento tenha uma expressão muito grande, na medida em que isso não equivaleria a pôr em prática uma política correcta neste domínio. Procura-se, sim, desagravar gradualmente, adquirindo esse desagravamento uma forma muito expressiva pela acumulação ao longo de todos estes anos. Terão a oportunidade de verificar isto através dos elementos concretos e precisos que vos irei apresentar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.* Deputada Helena Torres Marques.

A Sr.* Helena Torres Marques (PS): — Creio que num debate em comissão se ganha muito se não esperarmos por n inscrições para podermos fazer uma pergunta sobre um caso concreto.

Sr. Secretário de Estado, no debate do Orçamento do Estado do ano passado, V. Ex." diziam que esperavam que o Estado devolvesse aos cidadãos 28 milhões de contos de cobranças a mais do IRS. Como o Sr. Secretário de Estado sabe, não só não devolveu os 28 milhões dc contos, como voltou a cobrar a mais uma quantia quase tão grande como esta. Sr. Secretário dc Estado, depois disto tudo, acha que pode dizer que há desagravamento fiscal e que as suas perspectivas são as que, no final, vèm a verificar-se como correctas?

Outra questão: no ano passado, quando da discussão do Orçamento do Estado, o Sr. Secretário de Estado disse que era uma irresponsabilidade fazer-se previsões superiores de receitas de impostos. No entanto, o Governo engana-se sistematicamente, nos últimos três anos, e os contribuintes têm pago, cm números do Governo (estou a tomar como base os relatórios que o Governo apresenta), 346 milhões de contos — este é o «engano» contra os contribuintes c a favor do Estado, que nós sabemos que será maior, porque, os dados constantes do relatório deste ano ainda estão incompletos. Sr. Secretário de Estado, depois de, sistematicamente, se enganarem em valores tão importantes como estes, acha que pode dizer que não há aumento de carga fiscal?!

O que o Governo faz, sistematicamente, é o seguinte: no início do ano subestima o valor dos impostos, calcula a carga fiscal c diz que esta é muito baixa; depois não fala da cobrança, que é muito mais alta e que implicaria uma carga fiscal muito superior, e calcula a nova carga fiscal com a diferença em relação ao cobrado e não em relação às previsões iniciais.

Penso que isto não é um sistema sério, Sr. Secretário de Estado. O que deveria ser feito era uma previsão o mais correcta possível. V. Ex.* não pode, com a mesma aütudc, dizer que está tudo certo, quando, sistematicamente, nos tem trazido valores de tal forma subestimados que resultam nestas diferenças que acabei de referir! Gostaria que nos esclarecesse aqui, em comissão, por forma que este assunto ficasse definido, sem grandes palavras. Os números que citei são do Governo e vamos tentar clarificar esta situação no sentido dc concluir se, de facto, o Governo

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está ou não está a subestimar o valor dos impostos para poder dizer que a carga fiscal é mais baixa.

O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr. Ministro, V. Ex.* sempre tem dito aquilo que acaba de dizer — isso é indiscutível — e sempre de forma coerente, no seu discurso. Não estou a tentar criar clivagens, mas o Governo nem sempre tem dito o mesmo— quer o Sr. Secretário de Estado, quer o Sr. Primeiro-Ministro assentaram no desagravamento fiscal boa parte da propaganda da apresentação deste Orçamento. Isto é evidente e basta consultar a comunicação social ou ver aqueles quadros que a RTP faz tão bem! Isto é um facto!

Mas o que se verifica, real e realisticamente, 6 aquilo que o Sr. Ministro aqui disse. Quando muito (e eu concedo isso sem qualquer favor, porque é evidente, é objecüvo e é científico), há uma atenuação dos efeitos da inflação sobre o IRS, com uma zona perversa—falta-me saber se se tratou de uma perversidade técnica ou de qualquer outro tipo.

É muito interessante verificar, em termos de receitas, a distribuição percentual dos vários rendimentos, porque a zona onde se verifica agravamento é muito significativa

— cerca de 9,9 % dos contribuintes —, não só pela percentagem em si mas também pela verba correspondente a cada um desses contribuintes. Portanto, em termos de receita fiscal, é muito importante essa zona, e a dúvida que tenho é se se tratou apenas dc uma perversidade técnica, por efeito da actualização dos escalões, ou se foi algo de pensado.

A questão que V. Ex.* refere, quanto ao desagravamento das classes de rendimento mais baixo, é apenas teórica, porque, na generalidade, essas classes já não eram, praticamente, tributadas em IRS — embora correspondam a cerca de 20 %, o que também é significativo —, não tendo peso cm termos de receita fiscal.

A meu ver, é um facto, que reconheço, que a proposta governamental poderá ter acomodado a evolução da inflação e, portanto, não ter agravado a situação dos contribuintes por efeito da inflação. Contudo, não pode — a meu ver, mas o Sr. Ministro das Finanças confirmou e, de algum modo, também o Sr. Secretário de Estado — falar--se, de forma alguma, em desagravamento fiscal, porque não há, de facto, desagravamento fiscal!

Quanto ao que se passou nos outros anos, confesso que não me recordo muito bem, apenas me lembro do ano passado, cm que segui o debate do Orçamento do Estado mais pormenorizadamente. Mas como Sr.* Deputada Helena Torres Marques já disse — e eu concordo inteiramente com isso —, creio que o exemplo do ano passado não lhe é muito favorável. Quero, embora, conceder que é, apesar de tudo, um ano de alguma experiência e, portanto, até percebo que essa previsão que fizeram das devoluções pudesse ter uma margem dc erro aceitável. Aliás, penso até que foi demasiado aceitável, sobretudo

— e volto sempre ao aspecto político (peço desculpa por politizar as questões, mas estamos numa câmara política) — quando o Governo assenta nisso a sua propaganda!

V. Ex.' disse que os Portugueses vão ter uma boa surpresa, porque vão receber 28 milhões de contos, mas, como é claro, o significado que V. Ex.' pretendia dar a esta afirmação era o de que os Portugueses teriam o seu rendimento disponível aumentado em 28 milhões dc contos,

o que podia resultar de pagarem a mais 28 e receberem 56 ou pagarem a mais 1 e receberem 29.

O que o Sr. Secretário de Estado certamente quis dizer quando fez a conferência de imprensa, na qual disse que os Portugueses iriam ter uma boa surpresa, porque iriam receber 28 milhões de contos a mais, foi que o rendimento disponível dos portugueses iria aumentar 28 milhões de contos. Mas o que é facto — a meu ver incontroverso — é que não aumentou!

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr.* Deputada Helena Torres Marques, julgo que a Sr.' Deputada incorreu numa confusão, que passo a esclarecer uma coisa é o desagravamento visto num quadro e numa referência objectiva e inelutável e outra a receita. Se atentar em todos os relatórios existentes, verificará que normalmente neles vem expresso esse facto, ou seja, o de que trabalhamos nas previsões com base numa determinada evolução da massa salarial. É óbvio que, quando a evolução dessa massa salarial é muito superior àquela que serviu de base ao cálculo, a receita virá acrescida.

Refiro, a propósito, que no ano passado — e friso que ainda não tenho os dados definitivos, uma vez que estamos a trabalhar a base de dados de que agora dispomos — trabalhámos com um determinado crescimento da massa salarial, sendo certo que o crescimento da massa salarial/ base fiscal atinge quase 20 %, o que significa que ou existe agora muito mais rigor naquilo que se declara ou houve fatias importantes de conuibuintes que tiveram aumentos significativos. Ora, se trabalho com 14 % ou 15 % mas depois me aparece 20 %, na realidade é óbvio que a receita terá de ser maior.

Quando se diz que, no ano passado, inscrevemos no Orçamento uma reserva de 28 milhões de contos para eventuais devoluções, teríamos de trabalhar com base nos dados que tínhamos disponíveis. Em função da experiência do imposto complementar, considerámos, nos cálculos para esse efeito, que haveria um comportamento idêntico. Todavia, esse comportamento não foi idêntico e houve muito mais despesas elegíveis para efeitos de dedução em IRS do que aquelas que havia no passado, em termos de imposto complementar. Daí ter havido devoluções acrescidas em função dessa situação concreta.

Mais uma vez se justifica esta realidade, que verificámos ao fazer a aplicação prática dos programas às declarações que foram feitas. No fundo, ficámos satisfeitos porque, afinal, aquilo quê se dizia, o ponto de vista dos críticos, acerca da reforma fiscal acabou por não se confirmar, confirmando-se o ponto de vista do Governo, o qual, no fundo, se traduziu também em os contribuintes pagarem menos, não obstante a receita ter sido maior, pelas razões que lhe apontei e não por quaisquer outras.

Estes são dados objectivos, Sr.* Deputada. Temos de comparar aquilo que é comparável e não extrapolar de uma base para a outra.

No que toca ao problema do desagravamento, tenho ideia de ter ouvido o Partido Socialista dizer, precisamente, que o desagravamento que se punha em prática no Orçamento para 1991 era irresponsável. Não o era, porque sabíamos aquilo que tínhamos feito e procurámos desenvolver uma nova estrutura dos escalões que privilegiasse predominantemente cerca de 50 % da população portu-

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guesa, ou seja, aqueles que têm mais baixos rendimentos. Devo dizer que atingimos claramente o objectivo.

Saliento, contudo, para que também os Srs. Deputados fiquem cientes do que acontece, que lemos de trabalhar com determinados dados e nüo podemos ver agora se no futuro a massa salarial vai crescer 14,4 % ou 15, 16, 17 ou 18 %. Trata-se, efectivamente, de coisas diferentes, que temos de ter presentes. O que importa é que, para uma determinada realidade, possamos quantificar, escalão a escalão, o número de contribuintes e o montante dc desagravamento que cada um desses escalões contém, escalões esses que estão trabalhados cm função da média ponderada da receita global de cada um.

Muitas vezes fica-nos aparentemente a ideia de que há uma margem de contribuintes mais ampla, mas, no fundo, não há, porque ela é de facto reduzida.

Procurei, aliás, apurar, dentro dessas áreas tangenciais, quantos contribuintes estão na base dc dados — fornecerei também esses elementos —, e não chegam a atingir o valor de 1 %.

A Sr." Helena Torres Marques (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr.1 Deputada?

A Sr." Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, para evitar estabelecer conversas em que parece não nos estarmos a ouvir uns aos outros, solicitaria ao Sr. Presidente que nos permitisse interromper o orador algumas vezes. Se assim não for, nós diremos uma coisa e o Sr. Secretário de Estado outra e nunca mais nos conseguiremos entender, quando, segundo penso, o objectivo é precisamente o de nos entendermos.

O Sr. Presidente: — Diria, pelo contrário, ser bastante natural que não se consigam entender.

Risos.

Em qualquer caso, faça favor de interromper o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

A Sr." Helena Torres Marques (PS): — Agradeço ao Sr. Presidente o favor de me ter permitido esta interrupção, que se destina a precisar uma questão.

Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, uma coisa é o Governo calcular mal a taxa de inflação, depois de termos dito sistematicamente que essa taxa estava mal calculada e que, portanto, a massa salarial estava errada. Dissemos isso inúmeras vezes, mas os senhores afirmavam que nós não sabíamos o que estávamos a dizer. Afinal, os senhores é que não sabiam o que estavam a calcular.

Outra coisa são as devoluções do IRS, que não têm a ver com a taxa de inflação, mas sim com as deduções que o Sr. Secretário de Estado previa haver e que não houve. Ou seja, os encargos foram muito maiores e era isso que gostaria que o Sr. Secretário de Estado dissesse.

O Sr. Secretário de Estado fala só dos 28,5 milhões de . contos, tendo anunciado e feito conferências de imprensa para dizer que os contribuintes iriam ter surpresas magníficas porque iam devolver 28 milhões de contos. Mas não fez uma conferência de imprensa para anunciar que, afinal, a surpresa não foi essa, jjorque não só não devolveram como cobraram a mais. E importantíssimo que as pessoas saibam isso, que gostaria de ver confirmado, ou não, pelo Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Presidente: — Sr.* Deputada, percebo que a vivacidade do debate seja favorecida por estas interrupções. Só que, como temos várias inscrições, tenho alguma dificuldade cm perceber se os Srs. Deputados se inscrevem para fazer uma interrupção que é uma intervenção, ou uma intervenção, que depois funciona como interrupção.

Estão inscritos, para usar da palavra, sem esquecer que ainda se encontra no uso dela o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, os Srs. Deputados Domingues Azevedo, Ferro Rodrigues e Octávio Teixeira.

Algum destes Srs. Deputados pretende fazer uma inicrvençâo/intciTupçâo do género daquela que acabou de ser feita pela Sr.' Deputada Helena Torres Marques?

Se assim for, daria imediatamente a palavra aos Srs. Deputados que eventualmente o desejassem fazer e ganharíamos em vivacidade do debate. Se não, lerão dc aguardar pela sua vez.

Pausa.

Como é esse o caso, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, se bem entendi a intervenção da Sr.* Deputada, a minha será no mesmo sentido.

Julgo que esta questão das projecções das cobranças e de haver ou não agravamento fiscal não se pode dirimir em termos dc verbo, mas sim em termos de situações e factos concretos. O facto concreto neste caso é o dc que, contrariamente ao que o Governo referiu, não ter havido desagravamanto fiscal em IRS. Refiro-me concretamente ao ano dc 1990, sobre o qual o Governo, no relatório que apresenta para este Orçamento, diz que a verba de cobranças do IRS, que está 58 milhões dc contos acima do que estava previsto — o que não representa, portanto, um pequeno desvio —, cresce a um ritmo idêntico ao do crescimento da massa salarial. Se cresce a um ritmo idênüco ao da massa salarial, é lógico, evidente e norma) que não pode haver desagravamento fiscal!

A segunda questão que quero colocar-lhe, ainda relacionada com este problema, é a seguinte: como é que o Governo pode justificar que faça em Novembro de 1989 uma projecção para a receita do IVA, colocando-a em 430 milhões dc contos, mas no fim de Dezembro desse ano a receita seja de 479 milhões dc contos? Isto não é uma projecção, mas um número que aqui se põe para prosseguir objectivos que nada têm a ver com as projecções orçamentais.

Voltarei à discussão do problema das receitas quando procedermos, no Plenário, a discussão, na especialidade, do Orçamento.

O Sr. Presidente: — Certo, Sr. Deputado, é evidente que os seus direitos não ficam precludidos.

Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr, Domingues Azevedo (PS): — Sr. Secretário dc Estado dos Assuntos Fiscais, não entrarei nos meandros da intervenção que há pouco produziu.

Tivemos o cuidado, até porque temos de ser conscientes naquilo que dizemos, dc analisar, caso por caso c escalão por escalão, o IRS sobre os rendimentos do trabalho dependente. Temos responsabilidade naquilo que dizemos c pensamos que tem dc ser dada dignidade a estas questões, mas lambem lemos perfeita consciência dc que a propaganda está feita. O Governo propagandeou efectivamente

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que iria haver desagravamento fiscal e, Sr. Secretário de Estado, não há —é ponto assente— desagravamento fiscal!

Se V. Ex.' quiser, com números e percentagens, fazer as contas partindo de um vencimento mensal de 40 contos até um vencimento mensal de 1000 contos, verificará que o que acabei de afirmar é verdadeiro. Temos essas contas feitas e não temos dúvidas sobre essa questão. Não batamos mais nessa tecla, Sr. Secretário de Estado.

O que o Governo faz é comparar um vencimento de 100 mil escudos em 1990 ao mesmo vencimento em 1991, o que, além de não ser correcto, se destina única e simplesmente a enganar os Portugueses. Se o Sr. Secretário de Estado actualizar a massa salarial de 1990 para o ano de 1991 com base naquilo que foi aceite pelo Conselho de Concertação Social, chegará por certo a valores totalmente diferentes daqueles que o Governo tem propagandeado. O honesto e correcto é actualizar a massa salarial de 1990 para 1991. Comparar valores absolutos é que não tem qualquer significado.

Posso até dizer-lhe, Sr. Secretário de Estado, que o Partido Socialista está em condições de afirmar c de provar que uma de duas coisas se passa: ou há má fé naquilo que VV. Ex.** dizem —o que é grave— ou, então, os computadores de VV. Ex." estão errados sobre o assunto. Como o código permanece o mesmo, a forma de cálculo também permanece a mesma, a não ser que VV. Ex." beneficiem de uma situação muito especial!

Há, todavia, uma tendência muito forte para sc tentar reduzir o sistema fiscal aos rendimentos do trabalho dependente. Não direi que eles não são importantes c que não têm um peso significativo na sociedade e no cômputo das receitas fiscais, mas o que é certo é que o sistema fiscal não se reduz a tais rendimentos. O sistema fiscal tem outras componentes importantíssimas, nomeadamente os rendimentos do trabalho independente, a que anteriormente se chamava profissões liberais, das empresas, dos empresários em nome individual c das sociedades. Tudo isso constitui rendimentos que se incorporam no sistema fiscal. O Sr. Secretário de Estado ainda não me explicou — e possivelmente nem me explicará— por que é que o Governo propõe à Assembleia neste Orçamento a não consideração como custos, por exemplo, das retiradas dos empresários em nome individual. Já entendi o que é que fundamenta e sustenta essa posição. O Sr. Secretário de Estado é que ainda não mo explicou*. Há, por isso, uma tendência para reduzir o sistema fiscal aos rendimentos da categoria A, o que não é correcto.

Quanto ao agravamento fiscal, está tudo dito. Lá fora, as pessoas já o sentiram de duas formas, uma das quais consiste nos erros que a administração fiscal praticou na liquidação dos novos impostos, erros advenientes da falta de cuidados e do facto de não se lerem testado suficientemente as soluções para a liquidação dos impostos, o que resultou no agravamento que este novo sistema implicou para as pessoas. Só quem não anda lá fora c não conversa com as pessoas é que não se aperceberá da situação real que acabei de descrever.

Deixo as restantes questões sobre a matéria fiscal para a parte da tarde, até porque o Sr. Ministro terá de se ausentar daqui a muito pouco tempo, ficando apenas o Sr. Secretário de Estado.

De qualquer forma, penso ser extremamente importante desmistificar, de uma vez por todas, as questões que referi: não haverá cm 1991 nem desagravamento nem agravamento fiscal, mas, única c simplesmente, actualização

de massa salarial. É isso que efectivamente acontece, Sr. Secretário de Estado, assumamo-lo de uma vez por todas! Se V. Ex.' quiser que o Partido Socialista prove aquilo que diz, dir-lhe-ei que está em condições dc o fazer.

O Sr. Presidente: — Faça favor de continuar a sua intervenção, Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr.' Deputada Helena Torres Marques, quando, no encontro que tive com os jornalistas, dei conhecimento dos resultados da reforma fiscal, indiquei, nesse mesmo momento, quanto se devolveu e quanto se teria a receber.

De todas as vezes que tem havido contactos com a imprensa sobre esta matéria indica-se clara e inequivocamente o montante a receber e o montante a pagar. Não se pode dizer, portanto, que se usou de duas medidas para comunicar isto com a opinião pública.

Pergunta o Sr. Deputado Octávio Teixeira como é que, havendo mais 58 milhões dc contos, se pode registar um desagravamento fiscal em matéria de IRS. Há desde logo que distinguir o trabalho dependente das outras categorias de rendimentos que estão a ser tributadas no âmbito do IRS.

A este propósito convirá talvez deixar uma palavra no que toca às actividades comerciais, industriais e agrícolas, que estão inseridas no IRS através da declaração modelo n.° 2. Como é do conhecimento geral, tais actividades eram tributadas por uma taxa média que, em termos de valores monetários, sc traduzia, em função de todo esse universo, numa média de 10 a 12 contos por sujeito passivo, o que — temos de convir — não corresponde à realidade. Com o IRS, e através de alguns passos que foram dados no sentido de encontrar mais verdade nas declarações, tal valor passou para cerca de 45 contos em média, o que implica uma taxa de tributação ainda muito baixa, mas que traduz um pouco mais de verdade e contribui, de uma forma muito expressiva, para esta evolução.

Além disso, como referi anteriormente, nas próprias declarações modelo 1, de trabalho dependente — e só dependente—, a evolução da massa salarial foi espantosamente superior à que se tinha calculado. Interessante é que foi nos mais altos rendimentos que essa evolução se fez sentir dc uma forma muito viva.

Defendemos sempre, a propósito dos limites que estabeleciam os recentes escalões e as taxas respectivas, tal como na altura sublinhámos — isso, aliás, foi votado pela Assembleia da República quando sc discutiu o problema da reforma fiscal, uma vez que o Governo tinha previsto 45 % de laxa marginal c foi aqui que os Srs. Deputados propuseram 40 % e o Governo aceitou. E aceiiou-o porque tinha a clara consciência de que as laxas marginais muito elevadas têm um efeito confiscatório de rendimentos c provocam, só por si, a evasão fiscal — que a evolução de 40 para 45 % dava, em termos da base que nós tínhamos, uma diferença de rendimentos de cerca de 17 000 contos. Na prática —aliás, tive oportunidade de afirmá-lo — não tenho dúvida nenhuma de que a receita não implicará um prejuízo e, pelo contrário, vai determinar um aumento significativo da receita, porque cria condições de mais verdade.

Assim aconteceu e não temos dúvidas nenhumas sobre isso. O grande crescimento da massa salarial era predominantemente devido a rendimentos acima de 2000 contos, os quais tiveram um crescimento muito vivo e muito forte. E aqui está a base do rendimento fiscal.

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Consequentemente, não tem de surpreender ninguém esta melhoria substancial das receitas por razões que mostram, afinal, eficácia do sistema e que não estão, de maneira nenhuma, a pôr em causa o que se disse quanto ao desagravamento.

O Sr. Deputado Domingues Azevedo insiste que não há desagravamento. Eu insisto que há desagravamento e provo-lhe que há.

O Sr. Deputado tem de pensar claramente que nós temos de ter um referencial. Esse referencial tem de ser a taxa de inflação e a taxa de inflação prevista âpontâ,

nitidamente, nesse sentido. Mas para que não haja dúvidas sobre esta situação e para que os Srs. Deputados não digam que calculamos com base numa taxa de inflação esperada e depois, na realidade, ela acontece de modo diferente, pegámos — e eu vou distribuir quadros — em valores do ano de 1985 e projectámo-los, ano a ano, até 1991, com a inflação efectivamente apurada. Por aí se poderá verificar que o desagravamento, afinal, atinge uma expressão extraordinariamente viva.

Posso dar-lhe, Sr. Deputado, um exemplo claro: 500 contos de 1985, para a situação de casados, um titular, pagava uma taxa de IRS de 8 %. Projectando os 500 contos para 1991, o que dá quase 1000 contos de rendimento, a taxa efectiva é de 2,8 %. Veja, pois, a expressão que o desagravamento tem em termos reais.

Agora se o Sr. Deputado vem aqui dizer que não há desagravamento e quer que se façam os cálculos com base naquilo que as pessoas vão ter dc rendimento, considerando a componente de inflação mais a componente dc aumento real, e queria que se pagasse menos, isso era um desagravamento brutal, que não é compaginável com a situação do País, que exige temperança em todas as medidas que se tomam.

Julgo que o assunto está esclarecido por si...

O Sr. Domingues Azevedo (PS): — Posso interrompê--lo, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): — Sr. Secretario dc Estado, desmistifiquemos dc uma vez por todas o que V. Ex.° acaba de dizer: um trabalhador que ganhe 40 000 escudos por mês não paga imposto, mas um trabalhador que ganhe 50 000 escudos por mês, Sr. Secretário de Estado, com a massa salarial actualizada, tem um desagravamento de 0,17 %. Mas dou-lhe mais números, Sr. Secretário de Estado: para quem ganhe 100 000 escudos o desagravamento é de 0,4 %. V. Ex." chama a isto desagravamento? Falemos verdade nestas coisas, Sr. Secretário de Estado!...

O Orador: — Sr. Deputado, suponho que alguns dos números que citou não estão correctamente apurados.

Em primeiro lugar, um rendimento de 50 contos, para uma situação de não casado, que é a situação menos favorável em termos dc análise para este efeito, pagará uns escudos muito escassos de imposto. Dc resto, o imposto arranca, para a situção de não casados, cm cerca dc 633 contos, arranca, para a situação de casados/um titular, pouco acima dos 700 contos e para a de casados/dois titulares, em 1123 contos. Consequentemente, isto revela que os números que mencionou não devem estar calculados com o rigor que se impõe nestas circunstâncias.

A verdade esmagadora, que põe em causa aquilo que, sistematicamente, pretendem fazer crer, é que, olhando este espaço de tempo que vai de 1985 a 1991, há um efectivo desagravamento para todas as classes de rendimento.

O Sr. Presidente: — Para prestar esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, vou retomar o esclarecimento de outras questões que me foram

colocadas, começando pela que me pôs o Sr. Deputado

Manuel dos Santos e que tem a ver com a operação dc secagem da liquidez e da política monetária, a que responderei, não obstante o Sr. Deputado Manuel dos Santos não se encontrar presente, de momento.

Vou permitir-me uma explicação técnica que leva algum tempo, mas penso que valerá a pena fazê-la para ficar absolutamente claro do que é que se trata.

Como os Srs. Deputados sabem, durante muitos anos, infelizmente, o financiamento do défice orçamental foi feito, sobretudo, por colocação da dívida pública no Banco de Portugal. A contrapartida foi, obviamente, a criação de base monetária e a acumulação da dívida pública no Banco de Portugal.

Essa acumulação de base monetária pelos mecanismos que cu me escuso de detalhar significariam, na ausência de outras medidas, a expansão da liquidez excessiva e pressões sobre os preços ou sobre a balança de pagamentos ainda maiores do que aquelas que existiram.

Por causa disso foi necessária a tomada de vários tipos dc medidas, nomeadamente a de limite de crédito a partir de 1978, que, no fundo, impediam que essa criação de base monetária se traduzisse em criação de crédito e, consequentemente, cm mais liquidez.

Isso teve várias consequências, das quais citarei uma, em especial. Como sabem, os bancos recebiam depósitos muito para além do crédito que podiam conceder c, para evitar consequências demasiadamente gravosas sobre o balanço dos bancos, foi estabelecido um sistema através do qual o Banco de Portugal adquiria essa liquidez excedentária, primeiro através do mercado interbancário de títulos e, mais recentemente, através da criação de depósitos relativamente longos junto do Banco de Portugal que, no fundo, absorviam uma liquidez que, de outra forma, seria oficiosa, e evitavam que ela se transferisse para a moeda propriamente dita ou para crédito propriamente dito.

Esto sistema, neste momento, conduziu, em primeiro lugar, a que existisse uma grande dívida pública no activo do Banco de Portugal e, em segundo lugar, a que os bancos tivessem em depósito mais de mil milhões de contos.

O que agora se pretende é alterar este sistema, para que possa entrar em vigor, plenamente, o controlo indirecto da liquidez —escuso-me de explicar porque é que isso é indispensável, por razões domésticas e por razões internacionais ligadas à nossa integração financeira à Comunidade Económica Europeia — e a operação que está prevista — pedirei, depois, ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro que vos dê mais pormenores— é uma grande emissão de dívida pública, que servirá para amortizar a dívida junto do Banco de Portugal c que, por sua vez, será adquirida pelos bancos, substituindo os tais depósitos longos que tem no Banco de Portugal. Portanto, por si só, não terá consequências quer nas condições de crédito quer nas taxas de juro.

O que significa é que, deixando os bancos de ter essa grande massa de liquidez, potencialmente transformável em

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base monetária, em liquidez e em pressões sobre a procura e sobre a balança de pagamentos, será possível pôr em prática o controlo indirecto do crédito e, portanto, também da liquidez. Desta operação não há, portanto, por si só, consequência sobre as condições de crédito.

A evolução dessas condições e das taxas de juro dependerá, naturalmente, da política monetária c de considerações dc vária natureza. Mas, sobre este aspecto específico, a situação é esta, e se o Sr. Presidente mc desse licença, pedia ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro que avançasse alguns pormenores.

No entanto, é este o quadro que está previsto para esta operação, à qual me referi dc forma sucinta quando apresentei, há alguns dias, o Orçamento do Estado nesta Câmara.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro (Tavares da Silva): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Penso que a primeira parte da explicação está já dada. Esta operação está, de facto, em vias de concretização.

A opção que tomámos foi a de colocar um volume de dívida pública distribuído por um conjunto variado de prazos e instrumentos, mas todos eles instrumentos já existentes. Portanto, não se recorre a nenhuma forma especial de dívida; é dívida transacionável e correspondente às formas já conhecidas, o que é vantajoso para o mercado, dado que não se introduzem novidades em termos de instrumentos financeiros, e sobretudo, para além do objectivo primeiro dela, que é o de substituir a liquidez excedentária colocada no Banco de Portugal, vai permitir uma outra coisa, ou seja, constituir um campo dc partida importante para o relançamento do mercado secundário da dívida pública. Há uma massa enorme dc títulos que vai ser colocada nas instituições dc uma só vez, que os bancos vão procurar — faseadamenle no tempo, obviamente — colocar no público, constituindo, assim, uma poderosa alavanca para a dinamização do mercado secundário da dívida pública.

Penso que os pormenores da operação e distribuição por \iVu\os nao são agora o mais importante, mas, se for necessário, temos esses elementos já negociados com os bancos, inclusivamente, mas, ainda quanto às preocupações manifestadas pelo Sr. Deputado Manuel dos Santos relativamente às pequenas e médias empresas, permito-mc dizer, para além do que o Sr. Ministro das Finanças já disse, que o facto de o controlo do crédito e da liquidez passar a ser feito de forma indirecta e deixar de o ser pelos tradicionais limites de crédito beneficiará as pequenas empresas, pois, como sabe, quando há limites de crédito, eles actuam de forma relativamente assimétrica contra as pequenas e médias empresas, que não têm, normalmente, acesso a fontes alternativas de financiamento, designadamente ao financiamento por obrigações e ao financiamento de origem externa.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Posso interrompê-lo, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: — Faça o favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octácio Teixeira (PCP): —Sr. Secretário dc Estado, o objectivo é a redução da dívida pública colocada no Banco de Portugal?

O Orador: — É esse e também o da amortização de uma parte da dívida externa.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP):—Então como é que isso se conjuga com o facto de, em termos orçamentais, na parte da Direcção-Geral do Tesouro, os juros a pagar ao Banco de Portugal, em 1991, aumentarem 77 % em relação aos juros que estavam orçamentados para 1990, visto que passam dos 113 milhões de contos para os 200 milhões de contos?

O Orador: — Onde é que o Sr. Deputado tem essa informação?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — No Orçamento do Estado.

O Orador: — Juros a pagar ao Banco de Portugal?!...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, pelo menos está lá BPL. Depreendo que BP seja Banco dc Portugal!

O Orador: — Sr. Deputado, ignoro qual é o elemento a que está a referir-se, até porque, nos quadros do Orçamento, como sabe, não aparece o Banco de Portugal...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, quando refiro o Orçamento do Estado, falo do Orçamento do Estado global e não apenas da proposta do Orçamento do Estado. Mas eu devo ter isto aqui à mão e apresento-lho já para dar uma vista de olhos.

O Orador: — Já agora, se me permite, ainda que assim fosse, na altura em que o Orçamento foi entregue esta operação não estava desenhada e muito menos concreüzada, ou seja, os juros pagos ao Banco de Portugal, nesse caso, serão pagos às instituições que substituirão a dívida que, neste momento, temos colocada no Banco de Portugal.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Posso interrompê-lo, Sr. Secretário dc Estado?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — O Sr. Secretário de Estado disse que na altura em que o Orçamento do Estado foi entregue não estavam ainda pensadas as consequências da operação que o Sr. Ministro das Finanças acabou de detalhar? Foi isso que quis dizer?

O Orador: — Quando o Orçamento foi apresentado na Assembleia da República ainda não estava concretizada. Não podíamos prever algo que não tínhamos negociado com os bancos.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Concretizando, isso quer dizer que há um impacte evidente, em vários aspectos do Orçamento, em consequência dessa operação que não estão na proposta que nos foi entregue!

O Orador: — Sr. Deputado, desculpe, mas só pode haver uma diferença entre as instituições que. v&o receber os juros, até porque a operação está desenhada por forma que o seu efeito orçamental em 1991 seja neutro.

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Em termos orçamentais, julgo que é indiferente pagarmos juros ao Banco de Portugal, ao Banco Nacional Ultramarino ou a outro qualquer. Julgo eu! Mas esta informação que o Sr. Deputado Octávio Teixeira traz do Banco de Portugal é para antes de a operação estar concretizada.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Não é informação do Banco de Portugal mas, sim, do Orçamento.

O Orador: — Sei que é do Orçamento, mas, na altura, não poderíamos apresentar no Orçamento algo de que os bancos não tinham sequer conhecimento. Aliás, esta operação é voluntária da parte dos bancos. Não há, com efeito, nenhum instrumento legal que nos permita chegar aos bancos e dizer: «Agora têm de substituir os depósitos por dívida pública.» E, neste momento, o protocolo ainda nem sequer está assinado, pelo que não poderíamos antecipar-nos a isso.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Só para melhor esclarecimento desta questão, perguntava ao Sr. Secretário de Estado se ao dizer que a operação é neutra, no senüdo de que tanto faz pagar ao Banco dc Portugal ou a outros bancos, quer dizer que a taxa de juro é a mesma em quaisquer circunstâncias.

O Orador: — Não, Sr. Deputado, estou a dizer que a operação, em termos orçamentais, é neutra. No primeiro ano, embora a laxa de juro seja naturalmente mais elevada, porque, como sabe, esta dívida está colocada no Banco de Portugal à taxa de desconto que, neste momento, não 6 uma taxa de mercado porque é inferior às que estamos a colocar, a operação está desenhada com o Banco de Portugal de forma que, no primeiro ano, em 1991, haverá uma compensação por parte do Banco de Portugal do excesso de encargos que temos.

Isto porque para o Banco dc Portugal, como sabe, é indifcrenic, do ponto de vista orçamental, fazer essa compensação porque, se não fosse assim, teria dc intervir nos mercados interbancários para absorver o excesso dc liquidez que assim é eliminado.

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Deputado Octávio Teixeira, cm relação à informação que teve a amabilidade dc me dar, e cujos elementos estou agora a verificar, trata--sc de um problema gráfico. De facto, destes elementos constam todas as instituições de crédito públicas e equiparadas ou participadas, incluindo o Banco de Portugal. Até porque não tem outro local onde estejam as outras, não é?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Estão na Junta de Crédito Público.

O Orador: — Não, porque isso faz parte da Direcção--Geral do Tesouro.

Sr. Presidente, houve outras perguntas que me foram feitas sobre as quais, se me desse licença, continuaria a esclarecer os Srs. Deputados.

Quanto à questão da taxa de inflação c da respectiva previsão, como o Sr. Deputado Octávio Teixeira referiu, no quadra do acordo conseguido no Conselho Permanente dc Concertação Social foi fornecida aos parceiros sociais uma projecção da taxa de inflação para o decurso do ano que vem. Aliás, como sabe, essa previsão é uma base para

o acompanhamento da execução do acordo e certamente que também poderemos fornecê-la, com muito gosto, ao Sr. Deputado, conforme solicitou.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Devia ser hoje, para podermos debater a questão.

O Orador: — Não sei se a temos connosco, mas podemos pedi-la a tempo de ainda hoje a debatermos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Se quiser fazer esse favor....

O Orador: — Quanto à previsão da inflação que está no Orçamento, e que baseia as projecções macroeconómicas, é baseada no modelo de que nós dispomos, não é uma projecção retirada do vazio e, como sabe, para este tipo de cálculos é necessária alguma série temporal histórica. Mas obviamente que é baseada no que está neste momento cm vigor, no índice de preços do consumidor.

Não é possível, porém, fazer conjecturas sobre como será o novo índice de preços do consumidor.

Sabemos que a alteração dos «pesos», devido à alteração do cabaz do consumidor típico, vai ter algumas implicações, mas, dc facto, não entrámos em linha de conta com isso até porque não é possível. Com efeito, não dispomos sequer, neste momento, de informação que permita chegar a alguma conclusão sobre isso.

Outra questão que me colocou foi a das dotações para juros.

Mais uma vez vou dar um esclarecimento de carácter geral e pedia ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro que, a seguir, esclareça mais em pormenor.

As taxas de juro implícitas na previsão de juros têm subjacente a hipótese de uma política monetária rigorosa, o que, aliás, 6 indispensável no contexto das necessidades de desinflação e de controlo da procura agregada e certamente que o Banco de Portugal, aliás no gozo da sua acrescida autonomia na sequência da alteração da lei orgânica, irá certamente pôr em prática uma política rigorosa.

Neste momento, de um modo geral, prevê-se que as taxas de juro reais subam ligeiramente, visto que, na generalidade, prevêem-se taxas de juro nominais aproximadamente constantes.

Mas, se o Sr. Presidente me dá licença, pedia ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro que elaborasse ura pouco mais sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Secretário de Estado do Tesouro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Antes dc começar, e porque já mc esclareceram, gostaria de dar a informação exacta ao Sr. Deputado Octávio Teixeira que há pouco não foi possível dar, pelo que peço desculpa da inexaclidão.

Há, de facto, um problema grave, Sr. Deputado Octávio Teixeira, é que aquilo são juros dc Bilhetes do Tesouro (BT).

Quanto à questão da dotação para juros, como o Sr. Deputado sabe, as previsões de taxas de juro e de taxas dc câmbio são das mais difíceis de fazer que conhecemos, de modo que, neste caso, como aliás tem acontecido, fazemos uma previsão que terá de ter em conta os elementos mais conhecidos e que estão disponíveis na altura em que

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o Orçamento é elaborado. E a hipótese com que trabalhámos foi em taxas de juro nominais não muito distantes das que vigoram nesta parte final do ano, o que significa, como sabe, um acréscimo da taxa de juro real que é consistente com as hipóteses que também temos vindo a assumir e que o Banco de Portugal tem vindo a tomar cm termos de orientação da política monetária.

Quanto ao assunto que aflorou, muito levemente, das taxas de câmbio, também, como sabe, são previsões muito difíceis de fazer. Todavia, e disto também já falámos no ano passado por esta mesma altura, neste momento a composição da dívida pública é de tal modo distribuída entre as várias moedas e de forma relativamente equilibrada — posso dizer-lhe que as moedas que integram o sistema monetário europeu, neste momento, representam aproximadamente 50 % da nossa dívida externa —, em termos de composição por moedas, que são muito pouco relevantes as taxas de câmbio cruzadas, digamos, entre as diversas moedas para efeitos de cálculo dc encargo de juros. É mais importante a hipótese que admitimos quanto à taxa de câmbio efectiva.

Aliás, curiosamente, neste momento também os pesos das diversas moedas na vida externa aproximam-se muito mais do que há alguns anos atrás dos pesos da taxa dc câmbio efectiva.

Portanto, o mais relevante, dc facto, é aquilo que nós pensamos que poderá acontecer em termos da desvalorização efectiva do escudo e menos aquilo que pode acontecer ao escudo face ao dólar, ao marco, etc.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Permite-me que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, quando coloquei a pergunta, pus logo a questão, fundamentalmente, cm termos de taxas de juro internas e, por isso, da dívida intema.

Sinceramente, suscita-me grandes dúvidas que sc possa fazer a projecção com base, mais ou menos como disse o Sr. Ministro, na constância das taxas actuais em termos dc dívida pública porque o aumento que vai haver, que é claro e evidente, embora possamos discutir se é de dois, três ou quatro pontos, mas isso é outra questão, das taxas de juro no mercado interno no próximo ano leva-me a perguntar se tal aumento tem ou não tem repercussão no preço a que a dívida pública vai ser colocada no mercado, dado que esse facto suscita-me bastantes dúvidas.

O Orador: — Sr. Deputado, com certeza que as taxas de juro que vamos pagar pela dívida pública vão depender da orientação da política monetária c, neste momento, eu desafia-!o-ia, se for capaz e melhor do que eu, a prever sc as laxas de juro vão subir em termos nominais, sc se vão manter, quando é que vão subir e quando é que podem vir a descer.

Neste momento, as taxas de juro reais da dívida pública são positivas, líquidas de impostos, e têm uma margem muito substancial em relação aos depósitos a prazo, como sabe. E é com taxas passivas que nós temos de comparar.

Deste modo, não é incompatível com uma política monetária mais rigorosa que as taxas de juro da dívida pública não sejam muito diferentes cm termos nominais das aciuais. E estamos a falar em taxas médias ao longo

do ano e não a falar em taxas no primeiro, no segundo ou no trimestre, etc.

Ora, se, como nós esperamos e projectamos, o índice de preços começar a desacelerar algures, ao longo do primeiro trimestre do ano que vem, é evidente que as taxas dc juro reais, mantendo-se as nominais, começarão a subir nessa altura. E é possível até que, algures, durante o ano, as taxas de juro nominais até possam descer em relação aos valores do início do ano.

Julgo que é prematuro estar a fazer qualquer especulação maior do que esta em relação ao valor médio das taxas de juro da dívida pública ao longo do ano que vem, e lembro, mais uma vez, que estamos a falar de taxas passivas e é com elas que temos de comparar e não com o que está a acontecer ou poderá vir a acontecer às taxas de juro do crédito. E, como sabe, nós temos vindo a colocar a dívida pública submetendo-nos totalmente às condições do mercado, que, neste momento, são relativamente duras cm termos de secura do mercado e não temos razões para admitir que serão muito mais duras do que o que estamos a verificar neste momento. O mercado, de facto, encontra--se numa situação de secura ou de falta dc liquidez nos bancos e nós estamos a pagar as taxas de juro que o mercado exige.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, é evidente que V. Ex.* pode desafiar-me, assim como eu desafiei o Governo, para explicar isto. Mas, como lhe disse há pouco, não vou discutir, não posso discutir, se haverá um agravamento das taxas cm dois, três ou quatro pontos. Julgo que não será sequer objecto de desafio a previsão do aumento das taxas de juro, mas, para além do mais, utilizaria, se aqui estivesse, como minha testemunha, pois teria muito mais elementos do que eu para fazer previsões numéricas, o Banco de Portugal.

Quando o governador do Banco de Portugal vem projectar para 1991 um aumento da ordem dos três pontos percentuais nas taxas de juros activas, eu não quero crer...

O Orador: — Não, Sr. Deputado!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sim, sim. O Sr. Governador do Banco de Portugal, há poucos dias, deu uma entrevista cm que o dizia.

Mas, como dizia, não quero crer que as taxas de juro passivas não aumentem. Não quero dizer que aumentem da mesma forma porque há outras razões e, além do mais, uma razão histórica, que é a de os depositantes irem sempre apanhando uma fatia dos custos.

De qualquer modo, sendo dura ou não a taxa de juro actual, ou melhor, estando o mercado a ser duro em termos de taxa dc juro para a dívida pública, julgo que com aquilo que é perspectivado pela autoridade monetária do País, para o próximo ano, em termos de evolução de taxa de juro, não me parece compatível que a projecção possa ficar numa mera constância das taxas actuais.

O Sr. Presidente: — A Sr.* Deputada Helena Torres Marques deseja interromper sobre esta matéria?

A Sr.* Helena Torres Marques (PS): — Sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.* Deputada.

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A Sr." Helena Torres Marques (PS): — Sr. Secretário de Estado, gostava de saber, muito concretamente, se as previsões dc pagamento de juros inscritos no Orçamento prevêm ou nâo o agravamento das taxas de juro.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — Começando por responder ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, se bem tenho presente a entrevista do Sr. Governador, ele não se referiu, em especial, à subida das taxas de juro activas em particular. Pelo contrário, suponho que ele até se referia mais a que os bancos, ao passar ao controlo indirecto, com a necessidade dc competir por recursos, provavelmente sentirão a necessidade dc remunerar melhor os depósitos. Penso que até era esta a tónica principal da entrevista, se bem tenho presente.

E, como lhe disse, em relação aos depósitos a taxa de juros da dívida pública tem uma margem muito substancial — as taxas dc juro nos Bilhetes do Tesouro andam, conforme o prazo, entre os 17 e pouco e os 18,5, para os Bilhetes a um ano e nos FIP/90 estará nos 18,625 — é a taxa base de indexação mais 1 ponto e 1/8 — acima do número que o Sr. Deputado referiu.

Verificamos assim que as taxas de juro da dívida pública são positivas em termos reais e tem uma margem considerável em relação às outras taxas passivas que com cias se podem comparar. Não creio que fosse razoável assumir o compromisso de antecipar uma subida das taxas passivas da dívida pública dado o nível em que estão — da ordem dos dois, três pontos.

Por outro lado, mesmo mantendo o valor nominal das taxas de juro do final do ano, se as nossas previsões para a inflação se concretizarem — como esperamos, e é com isso que temos de contar —, a partir de meados do próximo ano teremos taxas de juro reais da dívida pública substancialmente mais elevadas do que as que vigoram neste momento. Por isso, repilo, quando fazemos previsões de encargos com juros c taxas dc juros temos de assumir alguma hipótese e pareceu-nos que esta era válida e razoável. E, francamente, não contamos ter problemas com a dotação que considerámos para efeitos de juros. Aliás, já há um ano atrás tivemos uma conversa semelhante a esta.

Quanto à pergunta formulada pela Sr." Deputada Helena Torres Marques, penso que fui claro quanto à hipótese que assumimos em relação às taxas dc juro. Essa foi a subida das taxas de juro reais, mas não modificação substancial das taxas de juro nominais cm relação à parte final do ano de 1990. Isto significa, em lermos reais, um encarecimento do crédito ao sector público, mas aí será o mercado que ditará as leis e não tem interesse estarmos a inscrever muito mais ou muito menos porque será o mercado a dizer o que leremos de pagar. Penso que nenhum dos Srs. Deputados que nos interpelaram discordará desta filosofia.

O Sr. Ministro das Finanças (Miguel Beleza): — Aproveito o facto de o Sr. Secretario dc Estado do Tesouro estar no uso da palavra para lhe pedir que esclareça a questão colocada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira relativa às bonificações de juros.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro: — A dotação de juros para a habitação, como qualquer outra dotação para efeitos de bonificação, depende dc dois factores. Um é a variação do saldo do crédito bonificado e o outro é a taxa que serve de base à incidência da taxa de bonificação.

O primeiro dos dois aspectos — a variação do saldo do crédito — depende, por sua vez, por um lado, da expansão geral do crédito e, por outro, do acesso à bonificação ao crédito bonificado por parte dos potenciais candidatos. Portanto, depende daquelas alterações que fazemos anualmente, isto é, as correcções que se fazem aos parâmetros para efeitos de crédito bonificado para habitação — é uma portaria que sai anualmente.

Quanto à taxa de juro, como sabe existe uma taxa de juro chamada de referência para efeito do cálculo das bonificações; é também essa que determina os encargos com as bonificações c não propriamente as taxas que são praticadas no mercado. Portanto, a hipótese que lemos do crescimento das bonificações para efeitos de crédito a bonificações resulta das hipóteses que formulámos quanto a este conjunto de circunstancias. E aí assumimos um crescimento real positivo do crédito bonificado c por outro lado supusemos uma taxa de juro de referência, para efeitos de bonificação, também não muito distante da que se verifica c podendo mesmo contemplar uma ligeira subida.

No entanto, é algo em que temos de ter alguma prudência para que não venhamos a encontrar insuficiência da dotação ao longo do ano e em que devemos ler uma dotação suficieniemente prudente, embora não exagerada.

Relativamente aos elementos sobre o programa de equilíbrios financeiros da Madeira apresento ao Sr. Deputado Octávio Teixeira o meu pedido de desculpas por não ter enviado os elementos solicitados, mas suponho que neste momento o Sr. Presidente da Comissão de Economia, Finanças c Plano já os terá distribuído. Esses documentos são os protocolos dc consolidação da dívida com os bancos c em relação aos quais pedimos alguma reserva porque pensamos que não é do interesse público a sua ampla divulgação.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário dc Estado, se me permitem, colocarei duas questões relativas ao orçamento do Fundo de Regularização da Dívida Pública.

Uma delas tem a ver com o problema dos rendimentos dc propriedade, juros, o orçamento dos títulos de capitalização automática. A minha questão é esta: houve alteração de critério este ano? Se houve, qual é?

Em segundo lugar, em relação às transferências da Junta do Crédito Público para o Fundo de Regularização da Dívida Pública —os 259 milhões dc contos—, gostaria de saber se o Governo pode informar, quanto à previsão em termos de privatizações stricto sensu — 250 milhões de contos —, se tem em mente qual o quadro de privatizações cm que está a pensar.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Ferro Rodrigues queria fazer alguma pergunta a este respeito ou uma intervenção?

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, pretendia fazer uma intervenção, mas com todas estas interrupções, receio que quando a fizer já não se encontre presente o Sr. Ministro das Finanças e linha todo o interesse em que estivesse.

O Sr. Presidente*. — Suponho que teremos tempo porque o Sr. Secretário de Estado do Tesouro está quase a terminar.

O Sr. Secretário de Estado do Tesouro:—A ptt-gunta do Sr. Deputado Ociávio Teixeira tem efectivamente

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duas partes. A primeira é-me mais directamente dirigida e à outra responderá o Sr. Ministro ou o Sr. Scretário de Estado das Finanças. Quanto à primeira, constato que viu com atenção o orçamento do Fundo de Regularização da Dívida Pública ...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Vejo sempre com atenção o Orçamento do Estado.

O Orador: — Não ignoro isso.

e fez a mesma pergunta que eu me coloquei quando vi a proposta do Orçamento. Efectivamente, houve mudança do critério de contabilização dos juros das obrigações dc capitalização automática. Assim, enquanto no OE do ano que passou, que foi o primeiro, e em que, portanto, este problema não estava suficientemente estudado, eram inscritos na totalidade os próprios juros das obrigações de capitalização automática, neste caso o que é contabilizado são apenas os juros dos juros, ou seja, o Fundo de Regularização recebe apenas a acumulação dos juros e a parte restante são certificados de divida inscrita que são emitidos e que por sua vez rendem juros.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — E os juros estão orçamentados?

O Orador: — Estão sim. E na totalidade.

No entanto, há duas coisas diferentes: uma são os juros das obrigações de capitalização automática em cada ano, e esses são contemplados sob a forma de emissão de certificados dc d/vida inscrita, que servem de base ao pagamento de juros pela Junta do Crédito Público, que emite certificados da dívida inscrita nesse montante, os quais ficam, de facto, na posse do Fundo de Regularização e são esses que, por sua vez, rendem juros. Está a ver?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Eu não estou a ver é se esses juros estão orçamentados na totalidade.

O Orador: — Estão, na totalidade. Não tenha dúvida.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Então eles ficam na posse do Fundo de Regularização da Dívida Pública mas não constam cm termos, digamos, da transferência contabilística. É isto?

O Orador: — Não, Sr. Deputado. É assim: quando se vencem juros, a Junta do Crédito Público emite um certificado de divida inscrita, que é contabilizado como despesa.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Aparece como emissão de dívida?

O Orador: — E aparece como emissão de dívida.

Esses certificados são entregues ao Fundo de Regularização e por sua vez vencem juros, e é este vencimento de juros, esta acumulação, que o Fundo contabiliza no seu orçamento.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, isso significa, para efeitos dc cálculo do défice orçamental, que, em termos comparaüvos com o ano de 1990, este ano há uma subavaliação de défice na medida em que parte da amortização da dívida, a emissão da dívida, não aparecerá?

O Orador: — Não, Sr. Deputado. Em termos de Orçamento do Estado é exactamente a mesma coisa, simplesmente há alteração no registo contabilístico no Fundo de Regularização, porque em termos do OE há emissão da dívida pela totalidade dos juros das obrigações de capitalização automática vencidos, tal como havia o ano passado. A questão é que funciona em termos de ligação OE/Fundo dc Regularização de forma diferente, mas no OE —garanto-lhe— a totalidade inscrita dos juros das obrigações de capitalização automática vencidos.

O Sr. Secretário de Estado das Finanças (Elias da Costa): — Sr. Deputado Octávio Teixeira, relativamente à verba inscrita no orçamento do Fundo de Regularização da Dívida Pública no valor de 250 milhões de contos como receitas de privatização, respondo-lhe da seguinte maneira: até ao dia 30 de Dezembro teremos, basicamente, avaliadas todas as empresas do sector financeiro — o Banco Espirito Santo e Comercial de Lisboa, a União de Bancos Portugueses, o Banco Fonsecas e Burnay, o Banco Pinto e Souo Mayor, a Mundial/Confiança, a Império, a Bonança — e durante o primeiro quadrimestre dc 1991 conto ter reavaliado o sector cimenteiro nacional, com o reajustamento da Cimpor e da Secil decidido em Conselho dc Ministros.

Por outro lado, neste momento existe uma grande indefinição relativamente à situação no Golfo —não se sabe se vai haver guerra e, se houver, quais são as suas consequências no cenário internacional, quer em termos de investimento, quer em termos do mercado de capitais —, de maneira que a verba que está estimada, para 1991, teve em atenção uma situação de normalidade e com a necessária prudência.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, o que perguntei era se esta base dos 250 milhões dc contos foi feita com a previsão da privatização de algumas empresas, isto é, eu perguntei quais eram as empresas que tinham servido dc base a este calculo.

O Orador:—Repare, eu não posso iniciar processos de privatização sem ter as avaliações concluídas. As avaliações que estão concluídas são estas e o calendário dependerá da decisão do Governo e da evolução do cenário internacional. Esta previsão foi feita tendo cm conta a normalidade e a adequada prudência.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Ministro, antes de V. Ex.1 abandonar a reunião, gostaria de colocar algumas questões genéricas sobre esta matéria que hoje se tem debatido aqui. E, em primeiro lugar, focaria a questão da inflação prevista.

As reuniões que a Comissão de Economia realizou e, sobretudo, a muito interessante reunião havida com os representantes do Banco dc Portugal levaram-nos à seguinte conclusão: neste momento repousa fundamentalmente sobre a política monetária a grande responsabilidade de conduzir o País a uma meta de inflação mais compatível com uma adesão rápida ao mecanismo dc câmbio do Sistema Monetário Europeu. E não quero estar agora aqui a entrar em pormenores sobre se a taxa de inflação será de 10,75 (implícita no Orçamento), 12,75 (que considerámos nas propostas alternativas que apresentámos) ou, eventualmente, até mais. Julgo que é um assunto que terá de merecer um

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debate noutro momento que não neste. De qualquer forma, ficou claro — e, aliás, o governador do Banco dc Portugal tem voltado a insistir nesse ponto— que há, de certa maneira, uma neutralidade da política orçamental cm matéria de combate à inflação, que a política de rendimentos, mesmo no quadro do acordo dc concertação social, tem duvidosa eficácia nesse combale c que a política cambial dificilmente poderá ir além daquilo que já foi, ou seja, de uma valorização real do escudo, muito expressiva nos últimos tempos.

A primeira questão que gostaria de colocar é no sentido de saber como é possível compatibilizar esta, cu não diria dramática, mas importante tarefa que a política monetária vai ter de desempenhar, para a desinflação em Portugal, ou pelo menos para evitar que a inflação progrida, com as expectativas, apesar de tudo, claramente optimistas que o Governo aponta em matéria de crescimento económico e dc crescimento da procura interna.

O segundo ponto tem a ver com o problema tradicional da subavaliação das receitas. Julgo que — inclusivamente, nos últimos dias, alguns artigos têm-no demonstrado — começa a não ter qualquer credibilidade e é atingida dc algum ridículo a ideia de que subestimar receitas é sistematicamente um sinónimo de rigor e um aspecto positivo para a política orçamental e para a política económica em geral. Fazendo uma comparação com a situação nos últimos anos, as conclusões que podemos tirar sobre a inflação prevista e sobre aquilo que se passa neste Orçamento é que, desse ponto de vista, não se avançou substancialmente em relação a orçamentos anteriores e, portanto, nesta matéria, as receitas continuarão a estar fortemente subavaliadas c hoje já houve aqui momentos em que veio à superfície essa subavaliação.

Em terceiro lugar, quanto ao IRS, devo dizer que vejo com alguma satisfação que houve, dc certa maneira, um recuo por parte do Governo na imagem política que o Primeiro-Ministro deu na conferência dc imprensa que realizou antes da entrega do Orçamento do Estado à Assembleia da República. Essa conferência de imprensa — que motivou, correctamente, nessa fase, a posição do PS no sentido dc dizer que se estava a agir, cm matéria orçamental, com pleno eleitoraJismo— foi feita antes dc que tivéssemos tido acesso a dados concretos. E, realmente, com os dados concretos, aquilo que se verifica é que, em termos dc IRS, não há o tal desagravamento substancial que eslava implícito nessa conferência dc imprensa c que deu lugar a uma grande propaganda, como já aqui foi dito pelo meu camarada Manuel dos Santos. Nesse sentido, é positivo que tenha havido um recuo da imagem global do Governo nesta matéria, embora eu reconheça que o Sr. Ministro das Finanças não contribuiu cm nada para essa imagem, vislo que, nas poucas vezes cm que leve ocasião de falar em público sobre essa matéria, procurou acentuar, fundamentalmente, a qucsião do rigor.

Em quarto lugar, gostaria de me referir ao IRC. Quando aqui estiveram os representantes do Banco dc Portugal um dos aspectos mais interessantes da reunião então realizada foi o facto de ter sido dito — e devo dizer que não estou de acordo com tudo aquilo que foi dito pelos representantes do Banco de Portugal, nessa reunião, mas houve alguns aspectos que achei particularmente interessantes sobre a responsabilidade, se assim se pode dizer, da inflação — que a responsabilidade da inflação em Portugal, nos últimos anos, não pode ser colocada nem na evolução dos salários, nem na evolução da inflação importada, mas terá de siluar--se, fundamentalmente, num excedente e, portanto, nos

lucros. Ora, neste contexto, do meu ponto de vista, é completamente estranha c absurda a redução da taxa do IRC, se isto realmente é verdade. Se há uma responsabilização por parte desta componente do valor acrescentado no desenvolvimento da inflação, como é que é justificável este desagravamento fiscal em sede de IRC?

Em quinto lugar, julgo também que até agora, neste debate —e este é um aspecto que foi também bastante falado na altura em que o Orçamento foi lançado para a opinião pública —, se disse que as despesas sociais iriam aumentar muito. O que se verifica é que se se compararem as previsões de despesas sociais com a execução orçamental e não com o Orçamento do ano passado, não se verifica nem um aumento em termos reais, nem um aumento da sua percentagem no produto. Assim, julgo que esse é também um dos aspectos conclusivos, até esta fase do debate, que vai contra uma certa imagem pública que foi dada a este Orçamento na sua fase de lançamento e antes da sua entrega na Assembleia da República.

Ainda sobre a questão dos juros da dívida pública queria salientar alguns aspectos do debate que hoje aqui travámos e que me parecem importantes. Em primeiro lugar, noia--se uma hesitação importante por parte do Governo sobre se há ou não, na afectação das despesas para juros da dívida pública, a garantia de que essa afectação chegará para a evolução da política monetária e da política económica em geral do nosso país. E isso é relativamente preocupante, porque estamos a discutir em sede do Orçamento. Em segundo lugar, gostaria dc chamar a atenção para o facto dc o relatório que acompanha o Orçamento, em matéria de política monetária, ficar muito longe das conclusões que têm sido expressas pelo Sr. Governador do Banco de Portugal nos últimos dias. É que fica a quilómetros de distância, em matéria de reflexão sobre aquilo que se vai passar do ponto de vista das laxas de juro, tanto em termos dc taxas de juros activas, como de taxas de juro passivas!

Por outro lado, gostaria de salientar que a última intervenção do Sr. Secretário de Estado Carlos Tavares contradiz totalmente a argumentação ou o aspecto essencial da argumentação que o Sr. Ministro das Finanças utilizou aqui para rebater a proposta do PS quando dizia que iria haver um aumento da despesa c não uma redução, devido ao efeito mecânico que um aumento — reparem — de 1 % na taxa nominal dos depósitos a prazo iria ter sobre os juros da dívida pública. Por consequência, esta questão — que, aliás, nós temos vindo a defender— parecc-me extremamente exemplar.

Outro aspecto sobre o qual também gostaria de ouvir o Sr. Ministro das Finanças antes da reunião terminar é o da dotação provisional e da capacidade que essa datação irá ou não ter em relação às respostas imprevisíveis e a algumas previsíveis, visto que a negociação com os sindicatos da função pública decorreu já depois de ter sido apresentada a proposta do Orçamento. Aquilo que se verifica é que, para muitos ministérios, se compararmos as execuções dc despesas do ano cm curso e o Orçamento proposto, verificamos que não há aumentos das remunerações que estejam relacionados com essa negociação que foi fevta. A dotação provisional vai chegar para tudo isso? Vai chegar para tanta diferença nos vários ministérios? Esta é uma questão que gostaria de ver mais clarificada.

Quanto ao Tribunal dc Contas, tive pena que a discussão tivesse morrido há pouco por um motivo muito simples-, é que, efectivamente, aquilo que foi dito pelos Srs. Membros do Governo foi que as preocupações mais substantivas do presidente do Tribunal dc Contas dificilmente poderiam

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ter sido mais atendidas pelo Governo —como referiu o Sr. Ministro das Finanças — e que não caracteriza a situação como de falta de diálogo, só que o presidente do Tribunal de Contas esteve aqui tendo-nos dito exactamente o contrário! Hoje, o presidente do Tribunal de Contas, em entrevista publicada num jornal diário, vai até bastante mais longe, dizendo uma coisa desta gravidade: «o Ministério das Finanças tem recusado ao Tribunal de Contas acesso aos dados sobre execução orçamental, recusa esta que é ilegal, leva tempo a resolver e a sancionar, como sc impõe e se fará». Se tudo isto decorre nestas circunstâncias, alguma coisa está aqui muito mal em matéria de relação interinstitucional! Por consequência, nós voltamos a dizer que esta situação nos preocupa.

Devo dizer que há dois aspectos em todo este debate orçamental, que tem a ver com relações interinstitucionais, que nos preocupam francamente: a primeira questão é esta do Tribunal de Contas, que não se resolve, aparentemente, pelas afirmações feitas pelos membros do Governo — com todo o respeito por essas mesmas afirmações sobretudo quando coincidem no mesmo dia com afirmações, de sinal exactamente antagónico! —, e, por outro lado, o segundo sinal preocupante em matéria de relações interinstitucionais é o facto de, na proposta do Orçamento, terem aparecido as tais duas alternativas para as dotações do FEF e para as autarquias locais, com as consequências que isso teve cm matéria de dificuldade de se manter nesse contexto a coesão nacional indispensável para o esforço conjunto que se vai ter dc fazer em matéria de desenvolvimento do País e de integração europeia.

São estas as questões a que gostaria que, com toda a frontalidade, o Sr. Ministro das Finanças respondesse antes de sair. Evidentemente que isto não impede que a discussão seja retomada no Plenário, mas penso ser oportuno, nesta fase, que estas posições fiquem por nós explicitadas.

O Sr. Presidente: —Tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Presidente, aproveitarei também a oportunidade para responder a uma pergunta do Sr. Deputado Rui Carp em simultâneo com as respostas às questões colocadas pelo Sr. Deputado Ferro Rodrigues, pergunta essa que linha a ver com o facto dc saber se este Orçamento é um orçamento dc convergência ou não. Bem entendida — e penso que terá ficado clara—, a intenção do Governo é a de que ele seja um Orçamento de convergência. Aliás —e já iremos aos pontos concretos do Sr. Deputado Ferro Rodrigues —, a estratégia dc médio prazo que o Governo aprovou oportunamente, contando com a colaboração quer na parte técnica quer, depois, na apresentação pública, da Comissão das Comunidades, indica claramente que este Orçamento é um primeiro passo num processo de convergência, quer real, no sentido de permitir que continuemos a crescer mais depressa do que os nossos parceiros, quer nominal, no sentido em que é consistente com uma redução da taxa dc inflação, ainda não para os níveis desejáveis, mas para níveis mais baixos do que os que neste momento existem.

O Sr. Deputado Ferro Rodrigues perguntou como é que é consistente o objectivo da inflação com a conjugação dc políticas que estão neste momento ou cm execução ou previstas. Devo dizer que a taxa de inflação mencionada no Orçamento, como há pouco referi, não é uma taxa dc inflação avançada sem base, mas fundamentada no modelo de que dispomos no Ministério das Finanças, que conjuga

o efeito das políticas monetária, orçamental, cambial e de rendimentos. E, Sr. Deputado, há um ponto para o qual gostaria de lhe chamar a atenção: está prevista — e poderá consultar o relatório do Orçamento— uma importante desaceleração da procura interna para 1991. Prevê-se que, a seguir a um aumento que ultrapassará os 5 % ou 5,5 % para 1990, em 1991 esse crescimento da procura interna fique pelos 3,5 %, o que é uma desaceleração extremamente considerável.

O Sr. Deputado dir-me-á que a desaceleração da procura leva tempo a transmitir-se à desaceleração dos preços. Mas é nesse sentido que teremos de avançar e é isso que, de facto, está previsto graças à conjugação da política monetária que continuará a ser rigorosa e da política orçamental em que o efeito diferencial (se o Sr. Deputado comparar, verifica que isso também está feito no relatório e que o referi na altura em que apresentei o Orçamento) do Orçamento de 1991 relativamente a 1990 é dc contenção da procura. Este tinha uma componente expansionista que o Orçamento de 1991 não tem, havendo, por consequência, uma contribuição para a redução da procura.

O Sr. Deputado referiu também a questão de haver ou não rigor neste Orçamento do Estado, referindo-se à subesümação das receitas.

Devo dizer-lhe que gostaria que as receitas, em 1991, estivessem subavaliadas. Tanto quanto sei, de acordo com os números de que disponho c com os calculadores fiscais — se me é permitido um termo técnico —, a receita fiscal para 1991 está bem calculada. Se vier a revelar-se superior àquela que previmos, isso significa que, por acção dessa estimativa, o espaço para as despesas, dado o défice, é menor c que o Orçamento é mais rigoroso do que aquilo que está, à partida, proposto, o que não me parece que seja um defeito.

Sobre a questão da inflação e da componente dos lucros...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Uma forte componente do Ministério das Finanças.

O Orador: — ...suponho que há alguma incompreensão ou má interpretação do que terá dito o Sr. Governador do Banco de Portugal e que, aliás, é a minha posição.

A inflação em Portugal tem sido acima do desejável porque a procura interna tem sido acima do que estava previsto e do que seria, sob alguns pontos de vista, desejável. É evidente que tem tido aspectos positivos, nomeadamente o facto de os componentes principais da procura serem o investimento e as exportações e também tem contribuído, como o Sr. Deputado sabe, para uma taxa de desemprego muito baixa.

É essa a razão que, neste momento, nos parece mais adequada para explicar uma inflação acima do desejável. De facto, não tem que ver com a componente dc rendimentos, mas sim com a procura, que tem levado a uma inflação mais alta. Tecnicamente, é uma questão monetária; como a procura é mais alta do que o desejável, o ataque a essa inflação deverá passar por um crescimento mais lento da procura interna. É isto e nada mais.

No que loca à questão do IRC, em qualquer dos casos a tributação das empresas envolve, nalguma medida, uma outra tributação porque os lucros das empresas ou são distribuídos ou são reinvestidos, pelo que serão tributados mais tarde.

Mas o problema neste caso é que nos estamos a aproximar de um estádio dc integração financeira completo,

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nomeadamente de uma total liberação de movimentos de capitais, e a tendência clara nos nossos parceiros comunitários é para uma tributação menor em IRC. Para evitarmos a desnacionalização da poupança, entre outras medidas, é desejável algum alinhamento do IRC pelos nossos parceiros principais. Como essa tendência para uma taxa mais baixa se tem verificado em todos eles, deu-se um primeiro passo, mas uma parte importante desse valor mais baixo será recuperado nos lucros distribuídos, pelo que não há, nesse aspecto, uma influência excessiva.

Por outro lado, não vejo a ligação desta matéria com a taxa da inflação, que está relacionada com a procura. Então, o Sr. Deputado dir-me-á que, nesse caso, era necessário aumentar os impostos. É uma questão que poderemos considerar, mas é por isso mesmo que o desagravamento fiscal proposto para este ano, embora exista, é moderado. Essa foi sempre a minha posição, que, aliás, mantenho.

Quanto às despesas sociais, pedia à Sr.* Secretária dc Estado do Orçamento que se referisse um pouco mais em detalhe a essa matéria, que, aliás, já terá sido debatida noutras reuniões da Comissão de Economia, Finanças e Plano, mas parece-me que seria importante explicitá-la um pouco melhor.

Sobre as questões dos juros, gostaria de esclarecer os Srs. Deputados sobre a argumentação que eu próprio defendi, abordando também o referido efeito mecânico, já que se uata de duas questões diferentes.

A proposta continha a redução da margem de intermediação, que interpretei como sendo o aumento de um ponto, por hipótese, das taxas de juro passivas sem o aumento correspondente das taxas activas. Sobre esse ponto específico referi, e repito-o agora, que na medida em que traduz um aumento de rendimento do sector não financeiro e uma redução dos lucros do sector financeiro, o efeito líquido sobre os impostos é, na melhor das hipóteses, nulo. Porquê? Porque para o sector não financeiro incide uma taxa marginal de 20 % e para o sector financeiro, sujeito a IRC, incide uma taxa marginal de 36 %. Logo, o efeito marginal será naturalmente negativo ou, na melhor das hipóteses, nulo.

A outra questão, relacionada com os juros da dívida pública ou com os juros em geral, é separada desta e não tem que ver com o efeito mecânico, como o Sr. Deputado referiu.

Neste domínio, sustento que se à partida vamos admitir uma taxa de inflação maior e se, ao mesmo tempo, admitimos que a política monetária é não acomodatícia, e como são as taxas reais que interessam nesta matéria, temos de admitir também, pelo menos, que as taxas de juro nominais acompanham essa inflação mais alta.

São problemas separados, e embora haja ligação entre os dois aspectos, não é correcta a argumentação aduzida pelo Sr. Deputado. Por um lado, o impacte da redução da margem é, na melhor das hipóteses, nulo sobre as receitas fiscais, provavelmente até será negativo, devido ao facto de as taxas marginais serem muito diferentes. Logo, o efeito sobre a receita no IRC será mais importante do que no IRS, independentemente de outros factores. Por outro lado, se vamos admitir, à partida, uma taxa de inflação mais alta, a menos que admitamos que a política monetária vai ser menos rigorosa, naturalmente que as taxas dc juro, incluindo as da dívida pública, deverão ser, nessa medida, mais altas.

Estamos a prever taxas de juro que são taxas de mercado e naturalmente que a sua evolução não pode ser prevista, neste momento, com rigor absoluto. Por consequência, fez-

-se uma estimativa com base nos elementos disponíveis, mas é óbvio que,' sendo uma previsão sobre valores de mercado, estará sujeita a alguma margem de erro. Se vamos admitir uma taxa de inflação mais elevada,

temos simultaneamente de admitir que a componente de juros das despesas públicas terá de reflectir esse aumente. Porquê? Porque a dívida pública é colocada em condições de mercado; porque, em larga medida, devido a esta operação de secagem da liquidez, a parte da dívida pública que paga juros, não de mercado, como a que estava no Banco de Portugal, deixa de existir e ainda porque, como sabe, a dívida pública está praticamente toda indexada. A razão é esta e não tem nada que ver com nenhum efeito mecânico das taxas de juro dos depósitos.

Quanto às questões que referiu sobre a dotação provisional, posso dizer-lhe que o que está orçamentado permite pagar o acordo assinado recentemente e com certeza que a Sr.' Secretária de Estado do Orçamento terá muito gosto em detalhar um pouco mais as questões da dotação provisional.

Em relação à conferência do Tribunal de Contas, naturalmente que tenho uma interpretação diferente daquela que referiu. Suponho que não está em causa, quer o funcionamento, quer as preocupações substantivas —que partilho — do Tribunal de Contas. Em particular no que diz respeito à informação sobre execução orçamental, tanto quanto é do meu conhecimento, temos cumprido rigorosamente o que está na lei e o que é necessário nesta matéria. Mais uma vez a Sr.* Secretária de Estado do Orçamente poderá detalhar a forma como temos prestado essa informação ao Tribunal de Contas e mesmo a esta Assembleia.

Finalmente, quero dizer-lhe que supunha que a questão do FEF e das transferências para as autarquias locais tinha sido aqui debatida com o Sr. Ministro do Plano, que é a entidade mais adequada para essa discussão, mas poderemos voltar a debatê-la, se o Sr. Deputado assim o entender.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Ministro, gostaria apenas dc lhe dizer que não fiquei nada convencido com as explicações que V. Ex.* deu sobre a articulação entre a taxa de juro dos depósitos a prazo e os juros da dívida pública.

Continua a parecer-me que as intervenções do Sr. Ministro das Finanças e do Sr. Secretário de Estado são contraditórias.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro das Finanças, gostaria de pronunciar-me sobre duas afirmações proferidas por V. Ex.*

Em primeiro lugar, sobre o problema da inflação aqui levantado — inflação pela procura interna — o Sr. Ministro referiu que não vê qualquer ligação entre este aspecto e a questão das margens de lucro.

Julgo que não é difícil ver essa ligação: se houvesse uma oferta perfeitamente elástica, o aumente da procura interna não iria implicar o aumento da inflação. Poderia criar problemas na balança de transacções correntes, mas pelo facte dc a oferta não ser elástica, no caso concreto, na perspectiva das importações, é que se verifica um aumento das margens de lucro nas imporfâções. Daí decorre o problema da inflação, neste momento, em Portugal, e

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estou aqui completamente de acordo com o Sr. Vice-Go-vemador do Banco de Portugal quando diz que a inflação está a ser pressionada pelo aumento das margens de lucro através do aumento da procura interna.

Por outro lado, ainda em relação à inflação, julgo que há uma certa contradição no discurso do Governo, concretamente no do Sr. Ministro. V. Ex." diz que para combater a inflação é preciso reduzir a procura interna e, no essencial, quer referir-se ao problema do consumo. Mas, simultaneamente, o Governo diz que vai aumentar fortemente os salários.

Ao contrário do que tem sucedido nos últimos anos, segundo o discurso do Governo, o salário real vai sofrer um aumento proporcional à produtividade e, por outro lado, vai proceder-se a um desagravamento fiscal, isto é, vai pressionar-se mais a procura através do consumo.

Como é que sc conjugam estas medidas com a intenção de reduzir a inflação?

A segunda questão diz respeito à última afirmação proferida pelo Sr. Ministro, que mencionou que o problema do FEF não está relacionado com o Ministério das Finanças, mas sim com o Ministério do Planeamento.

Sr. Ministro, parece-me que nesta matéria há uma forte componente do Ministério das Finanças relacionada com um aspecto que já aqui foi discutido e que é a má projecção das receitas do IVA.

O Sr. Ministro pode constatar, através dos dados históricos, que essa má projecção lesa, em vários milhões de contos, as transferências do Fundo de Equilíbrio Financeiro, como é fácil provar e demonstrar.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro das Finanças.

O Sr. Ministro das Finanças: — Sr. Deputado Octávio Teixeira, não penso que a questão do FEF esteja relacionada com o Sr. Ministro do Planeamento, mas sim com todo o Governo. No que nos diz directamente respeito, tem que ver com a previsão da evolução do Imposto sobre o Valor Acrescentado, relativamente ao qual se prevê um aumento de 17 %.

Estou seguro de que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais lhe poderá dar esclarecimentos adicionais sobre a forma como é feita essa previsão.

Sobre a questão da inflação, confesso que vou repetir aquilo que disse há pouco. Trata-se de um problema dc procura em crescimento mais rápido que o desejável.

Em certo sentido, seria desejável que a redução da procura se verificasse neste ou naquele componente, mas não é muito fácil para a política monetária, c mesmo para a política orçamental, dizer com exactidão qual o componente da procura agregada que vai ser reduzido.

Claro que seria desejável que o consumo crescesse menos, que o investimento fosse maior e que as exportações continuassem a crescer a bom ritmo c, de algum modo, a informação de que disponho permite concluir nesse sentido.

Diz-me que o Governo promete um desagravamento, mas aquilo que lhe posso dizer é que o Governo retira o efeito da inflação em relação ao imposto sobre o rendimento e que, além disso, desagrava fortemente os rendimentos mais baixos.

Se o Sr. Deputado está a sugerir-me que, para efeitos de controlo da inflação, deveríamos ter impostos mais altos, estarei disposto a considerar essa hipótese.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, se me permite a interrupção, não fiz nenhuma sugestão, apenas demonstrei a contradição do discurso do Governo.

O Orador: — Não vejo qualquer contradição! Admito que, sem esse desagravamento de impostos proposto, o efeito fosse mais forte sobre a procura interna e, sobretudo, sobre o consumo. No entanto, outras razões ponderosas levaram a que o Governo propusesse este desagravamento moderado que, neste momento, está a ser analisado.

Se o Sr. Presidente me desse licença, pediria à Sr.' Secretária de Estado do Orçamento que explicasse um pouco mais em pormenor as questões relacionadas com as despesas sociais e com a dotação provisional e que se referisse à informação prestada ao Tribunal de Contas sobre a execução orçamental.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.* Secretária de Estado do Orçamento.

A Sr.* Secretária de Estado do Orçamento: — Parecc--mc ter ouvido o Sr. Deputado afirmar que as despesas sociais crescem pouco, quando nós dizemos que crescem muito. Não apresentou taxas, o que, dc qualquer forma, é uma boa referência, porque o «crescer pouco ou muito» é sempre relativo a determinado padrão que se estabeleceu. Quando nós dizemos que as despesas crescem muito, estamos a querer dizer que as despesas sociais crescem, em geral, o dobro ou pouco mais do dobro do total da despesa pública. Portanto, é essa a nossa referência: é que a despesa social cresce realmente mais do dobro do total da despesa pública.

A comparação entre Orçamento ou execução é a mesma coisa, na medida em que se eu fizer a comparação exe-cução-Orçamento, farei também essa mesma comparação para o total da despesa pública e não somente para as despesas sociais. Esse é o padrão de referência adoptado.

Quanto à dotação provisional e à assinatura do acordo com os sindicatos, devo dizer o seguinte: houve algumas frentes sindicais, designadamente duas delas, que não assinaram o acordo e acusaram a frente sindicai que o assinou de alguma precipitação, dizendo que se tivessem levado mais longe a negociação, provavelmente teriam obtido por parte do Governo mais alguns aspectos positivos para os funcionários públicos. Devo dizer que a frente sindical que assinou o acordo estava verdadeiramente consciente, desde o primeiro dia, de que eu interromperia as negociações no momento em que considerasse que com elas o Orçamento que estamos a apresentar, e que defendemos com rigor, era não para um ano inteiro mas apenas para alguns meses. Portanto, eles tinham a plena consciência dc que cu pararia nesse momento. Dc facto, parei c não avancei nem mais um ponto quando qualquer avanço poderia pôr cm causa que a durabilidade deste Orçamento fosse inferior a um ano. Gostaria, pois, de tranquilizar o Sr. Deputado Ferro Rodrigues, no sentido dc que os próprios sindicatos tiveram essa consciência.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Portanto, Sr.* Secretária de Estado, das suas palavras pode retirar-se a conclusão de que, contrariamente ao que sc verificou no ano passado, este ano a dotação provisional vai ser suficiente para tudo o que tem que ver com remunerações, com o novo sistema retributivo, com salários e remunerações em geral da função pública!? Não há qualquer problema sob esse ponto de

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vista? Esse é um compromisso que a Sr.' Secretária de Estado assume aqui hoje?

A Oradora: — Não assumo quaisquer compromissos relativamente à dotação provisional porque ela, tal como o próprio nome indica, é uma provisão para fazer face a despesas inadiáveis e imprevisíveis. Não estou a dizer-lhe que o Orçamento vai ser gerido apenas com a dotação provisional porque as folgas que existem no Orçamento ao longo dc todos os serviços não se verificam simplesmente com a dotação provisional. No entanto, estou segura de que ela é suficiente para o pagamento dos vencimentos. De qualquer modo, há certos serviços que não terão necessidade dessa dotação porque já a têm.

Quanto ao acesso pelo Tribunal de Contas aos dados relativos à execução orçamental, de facto nunca tal lhe foi negado — e o Tribunal de Contas, com certeza, nunca disse isso. Nunca foram fechadas as portas ao Tribunal dc Contas para o controlo da execução orçamental. Nesse sentido, o único aspecto que se poderá apontar neste caso ó alguma divergência de actuação ou de concepção relativamente à fórmula dc acesso do Tribunal de Contas aos dados da execução orçamental, e ela reside, única e simplesmente, no facto dc o Governo entender que o Tribunal de Contas tem total acesso aos dados de execução orçamental, mas que é necessário solicitá-los. É apenas isso! Feita a solicitação, todos os dados lhe são fornecidos e nunca qualquer dado lhe foi recusado! Evidentemente, o Tribunal de Contas nunca referiu que qualquer dado ou elemento específico tivesse sido solicitado ao Ministério das Finanças sem que os mesmos lhe tivessem sido fornecidos. Como tal, diria que essa é uma acusação que tem alguma exploração jornalística, mas que seguramente não tem qualquer tradução nas frases ou no pensamento do Sr. Presidente do Tribunal dc Contas. Ele nunca poderia ter dito isso!

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): — Sr. Presidente, cm primeiro lugar, gostaria de confirmar inteiramente aquilo que a Sr." Secretária de Estado acaba aqui dc referir sobre o que se entende como controlo de execução do Orçamento pelo Tribunal de Contas. Ao fazê-lo, estou a falar cm nome do partido maioritário que votou a Lei da Reforma do Tribunal de Contas, estou também a falar como um dos autores da proposta dc lei que foi aqui apresentada relativamente à reforma do Tribunal de Contas, tal como estou a falar como alguém que trabalhou em documentos anteriores referentes a essa reforma. E faço-o com a consciência que dito isto para a Acta, porque nos termos constitucionais compete ao legislador interpretar a lei, c se o Tribunal de Contas persisur numa interpretação divergente desta, é natural que alguém conclua qual é, afinal, a interpretação autentica da lei.

Portanto, se fosse necessário — penso que isso não se verificará —, o Partido Social-Democrata, mais uma vez, faria uma correcção à lei de forma que ficasse assente, de modo definitivo, qual a interpretação autêntica da lei, para defesa da democracia, para defesa da independência dos órgãos de soberania e para defesa do respeito do que é um verdadeiro controlo das contas do Estado.

O Sr. Presidente: — Meus senhores, são 13 horas c 20 minutos e chegámos ao final da sessão da manhã, mas,

antes de interromper os nossos trabalhos, eu gostaria de agradecer ao Sr. Ministro das Finanças e à Sr." Secretária de Estado do Orçamento não só a sua presença aqui como também as intervenções que produziram neste debate.

Vamos, então, recomeçar a sessão às 15 horas e 30 minutos, ainda com o Ministério das Finanças, para ultimarmos a discussão deste tema.

Está suspensa a reunião.

Eram 13 horas e 20 minutos.

Após o intervalo para o almoço assumiu a presidência a Sr." Vice-P residente da Comissão Helena Torres Marques.

A Sr.* Presidente: — Meus senhores, está reaberta a reunião.

Eram 15 horas e 45 minutos.

Vamos reiniciar os nossos trabalhos com a presença dos Srs. Secretários de Estado da pasta das Finanças, que já manifestaram intenção de não intervirem de imediato. Como tal, vou começar por dar a palavra aos Srs. Deputados para formularem perguntas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr." Presidente, Sr.* Secretária de Estado do Orçamento: Começaria por colocar várias questões relativas ao problema dos encargos com pessoal, na medida em que, em termos globais, suscilam-se-me diversas dúvidas acerca da insuficiência das dotações que aparecem no Orçamento. Reportar-mc-ia apenas às remunerações certas e permanentes, por razões que têm a ver com o problema da taxa dc crescimento a imputar e que, julgo, aqui será sempre dc 13,5 %, no mínimo, embora nas outras rubricas dc despesa com pessoal possa ser inferior.

A situação que se me apresenta é a seguinte: em 1990 foram orçamentados cerca de 468 milhões de contos. De acordo com afirmações que a Sr* Secretária de Estado fez na APEC —aliás, já tive oportunidade dc mostrar --lhe a respectiva notícia saída no dia 7 de Novembro último —, o Novo Sistema Relribuüvo (NSR) terá orçado não em 60 milhões de contos, que eram previstos inicialmente, mas em cerca de 150 milhões de contos. Isto conduz-me ao seguinte: 468 milhões de contos.orçamentados mais estes 150 milhões dc contos totalizará uma verba dc 618 milhões de contos. Se aplicássemos a taxa dos 13,5 %, totalizaria para 1991 uma verba de cerca de 700 milhões de contos. No entanto, para 1991 aparecem orçamentados apenas 642 milhões de contos para remunerações certas e permanentes. A minha grande dúvida é esta: o que é que falta nesta conta que acabei dc referir?

Por outro lado, e relacionado com esta questão, como é que o Governo prevê resolver a questão das remunerações a atribuir ao pessoal da função pública cm 1990 cm termos de dotações? Como é que ele prevê poder fazer face aos compromissos por si assumidos perante esta situação?

Inicialmente deixo apenas esta questão à Sr.* Secretária de Estado, para poder depois ver as respostas que vierem a ser dadas e se terei necessidade dc eventuais esclarecimentos adicionais no sentido de analisarmos mais clara c concretamente a situação. De qualquer modo, isto não significa que não tenha outras questões a apresentar e que colocarei seguidamente.

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A Sr.' Presidente: — Tem a palavra a Sr.' Secretária de Estado do Orçamento.

A Sr.* Secretária de Estado do Orçamento: —

O primeiro ponto, que abordarei e que provavelmente esclarecerá toda a resposta, reporta-se à afirmação dos 150 milhões de contos relativamente ao Novo Sistema Retributivo (NSR). Não vejo como é que o valor relacionado com o NSR será desta ordem de grandeza (mais para cima do que para baixo), mas uma coisa é certa: tem a ver com todo o NSR, parte do qual foi pago em 1989, outra parte em 1990 e outra parte ainda sê-lo-á em 1991. Portanto, este cálculo do NSR, que aí vem figurado com um montante de 150 milhões de contos (e admito que possa ultrapassar esta verba), não é o cálculo que atingiu 1990. Abrange também o problema do descongelamento de escalões, que, como sabe, tem uma parte significativa que irá incidir em 1992. É mediante a aplicação de lodo o NSR que faço este cálculo. Posso dizer-lhe que relativamente ao ano em curso essa verba deverá rondar os 110 milhões de contos (não tenho a certeza de um número). Portanto, creio que, se somar esta estimativa total aos referidos 468 milhões e lhe aplicar a taxa de 13,5 %, obterá um valor compatível com o que está orçamentado.

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): —Sr.* Secretária de Estado, as contas feitas dão-nos um total de 656 milhões de contos. Ora, V. Ex.' diz que quando referi que para este ano estão orçamentados 642 milhões de contos já estou a incluir os 25 milhões de contos da dotação provisional. Assim, mesmo com a dotação provisional, mesmo de acordo com estas contas e com a referida taxa... Chamo a atenção para este aspecto: a Sr.* Secretária de Estado referiu os 110 milhões de contos, que, somados aos 468 milhões de contos, perfazem 578 milhões de contos. Ora, aplicando apenas a taxa dc 13,5 %, totalizará 656 milhões de contos, montante que é superior à verba total inscrita no Orçamento do Estado para 1991, mesmo incluindo a dotação provisional de 25 milhões, e ainda falta o que houver — se houver...! — alguma coisa de descongelamentos!

A Sr.* Secretária de Estado do Orçamento: — Sr. Deputado, quando lhe referi os cerca dc 110 milhões de contos votados para este ano estava a referir-me a todo o NSR aplicado a toda a Administração Central, que se inclui em serviços e fundos autónomos. Aliás, esse valor não lhe está incluído nas remunerações certas e

permanentes, mas vem, com certeza, configurado na parte das transferências. Depois posso dar-lhe os valores exactos, em todo o caso, esse valor não pode somente ser calculado assim, porque ele é compatível com o número que está orçamentado excluindo a parte que está nas transferências e que ó rclaüva a todo o NSR.

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Se me permitem, Sr* Presidente e Srs. Deputados, apenas para podermos «resolver» este assunto, gostaria de dizer o seguinte: Sr.* Secretária dc Estado, eu acredito nisso c não só acredito, como tenho a certeza! O problema que se coloca aqui é o do Serviço Nacional de Saúde. Mas repare que

cu já estou a fazer arredondamentos muito grandes, porque estou a considerar que não vai haver nada para descongelamentos. E como a Sr.* Secretária de Estado assistiu a todo o debate do Orçamento na especialidade, sabe quais são os casos ou o caso mais flagrante que me leva a tentar esclarecer esta situação das despesas com o pessoal: 6 o problema do Ministério da Educação!

Não sei se a Sr.' Secretária de Estado está em condições de nos dizer neste momento se os descongelamentos que vão existir em 1990 subirão a x milhões dc contos, mas, caso esteja cm condições de fazê-lo, julgo que poderemos analisar a questão com mais pormenor e cuidado. O que me coloca grandes dúvidas, em relação à dotação para despesas com pessoal, é o problema da discrepância que surgiu entre o Orçamento do Estado apresentado pelo Governo e o orçamento do Ministério da Educação, na parte relativa ao Novo Sistema Retributivo. Trata-se de uma diferença muito grande e, de facto —pelo menos, numa primeira análise, ou seja, na análise possível com os elementos que temos ao nosso dispor —, sou levado a crer que a discrepância é real, mas que o mais certo está no orçamento apresentado pelo Ministério da Educação e não no Orçamento do Estado.

A Sr.* Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.* Secretária de Estado do Orçamento.

A Sr.' Secretária de Estado do Orçamento: — Penso que não se podem fazer as contas por via do que estava orçamentado ou através dc um trabalho que linha sido elaborado pelo Ministério da Educação. Isto pelo seguinte: os cálculos estão feitos de forma a sabermos que cada 1 % de aumento dos vencimentos corresponde, no total (incluindo serviços c fundos autónomos), a cerca de nove milhões dc contos. Sc o NSR para o Ministério da Educação fosse, só para o Ministério da Educação, 46 ou 48 milhões de contos (não tenho a certeza quanto ao número exacto), basta dividir por oito e pensar o que é que isto significaria, cm termos de aumento, para toda a Administração Pública — ou seja, o que é que isso seria, em termos de aumento, só para a educação — para verificar que não pode estar certo. Esse valor nunca poderá ser o cálculo do NSR.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Permita-me uma interrupção, Sr.* Secretária de Estado. Quando afirma que cada 1 % representa nove milhões dc contos, V. Ex.° está a incluir a evolução salarial normal, apenas, ou está a incluir também descongelamentos de carreiras? É apenas a evolução normal?

A Oradora: — O NSR do Ministério da Educação inclui tudo, como é evidente. Tenho aqui os valores mais correctos, e a estimativa de execução para 1990, quanto às remunerações certas e permanentes — e apenas estas — é de 540 milhões de contos. Estão orçamentados 617 milhões, o que significa 14,3 % de aumento, aproximadamente.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Houve uma poupança enorme!

A Oradora: — Porquê?

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sc estavam orçamentados 468 milhões de contos — refiro-me apenas àquilo que está orçamentado como remunerações certas e

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permanentes, nao estou a contar com o Serviço Nacional

de Saúde, entre outros...

A Oradora:—Então, tem 540 milhões!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Para 540, são 70 milhões de contos de diferença!...

A Oradora: — Para mais!

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Para mais, claro. Mas a Sr.* Secretária de Estado referiu 110 milhões de contos como a verba necessária ao NSR para 1990.

A Oradora: — Desculpe, nao percebi.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Há pouco, V. Ex.* referiu a verba de 110 milhões de contos para o NSR.

A Oradora: — Não apenas para o NSR mas também fundos e serviços autónomos. E disse isto: que era o encargo com o NSR para 1990, que não está orçamentado nas remunerações certas e permanentes mas está orçamentado nas transferências — nós estamos a falar só da rubrica das remunerações certas c permanentes. Há pouco, quando falei no valor do encargo para 1990, referia--me ao valor relativo a todo o sistema retributivo, dado que não estão orçamentadas apenas as remunerações certas e permanentes.

A Sr.* Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem agora a palavra a Sr.* Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.' Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, gostaria de colocar-lhe algumas questões, uma, em relação à derrama, tem a ver com uma proposta de alteração que foi enviada pelo Governo à Comissão, no senüdo de obter uma autorização para o Governo poder rever o regime de lançamento da derrama, prevista na Lei n.° 1/87, de 6 de Janeiro, de modo a assegurar que o produto da sua cobrança seja determinado com base na colecta do IRC relativo ao rendimento gerado na área geográfica de cada município. O meu pedido de esclarecimento é este: como é que vai ser calculada esta derrama? Como é que vão ser calculados os rendimentos gerados na área geográfica de cada município sobre os quais vai incidir o IRC, e consequentemente a derrama, e em que ano se prevê que comece a sua aplicação — já em 1991 ou apenas em 1992 mas relaüva aos rendimentos de 1991? O que é que o Ministério ou a Secretaria de Estado pensam em relação a esta questão?

Já agora, que estamos a abordar questões que têm a ver com o poder local, eu gostaria de saber, caso o Sr. Secretário dc Estado possa informar-nos, qual o montante das verbas que terão deixado de ser recebidas pelas autarquias devido às isenções da sisa e da contribuição autárquica. Há algum cálculo quanto a estes valores? E se houver — certamente haverá —, solicito que o mesmo seja fornecido a esta Comissão, porque é importante para preparar o debate na especialidade, na próxima semana.

A Sr.* Presidente: —Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (Oliveira e Costa): — Sr.' Deputada, peço-lhe o favor de repetir a primeira questão, porque não consegui entendê--la.

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Não conhece essa proposta, Sr. Secretário de Estado? Nesse caso, vou lê-la, mas julgo que os serviços poderão fornecer-lhe de imediato uma cópia da proposta que foi enviada a esta Comissão como tendo sido aprovada pelo Conselho de Ministros.

A Sr.* Presidente: — Foi enviado por quem? Pelo Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território?

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Diz assim: «na sequência do combinado em Conselho de Ministros e tendo-sc verificado o apoio da Associação Nacional de Municípios Portugueses à iniciativa, junto envio a V. Ex.* texto a apresentar pelo Governo na discussão especializada do Orçamento do Estado sobre a forma de cobrança das derramas».

A Sr.* Presidente: — Mas quem é que envia, Sr.* Deputada?

O Orador: — Isso é uma surpresa do Conselho de Ministros!

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Sr.* Presidente, quem mandou isto foi o Gabinete do Secretário de Estado Adjunto do Ministro dos Assuntos Parlamentares, mas a primeira proposta está subscrita pelo Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, Luís Valente de Oliveira.

O Orador: — Importa-se de me ler essa proposta, porque não tenho aqui nenhum documento sobre isso?

O Sr. João Amaral (PCP): — O melhor é interromper os trabalhos para o Sr. Secretário de Estado telefonar para o Conselho de Ministros...!

Risos.

A Sr.' Ilda Figueiredo (PCP): — Bom, eu vou ler, Sr. Secretário de Estado: «Fica o Governo autorizado a rever o regime de lançamento da derrama, prevista na Lei n.° 1/87 (trata-se da Lei das Finanças Locais), de modo a assegurar que o produto da sua cobrança seja determinado com base na colecta de imposto sobre as pessoas colectivas

(IRQ, relativa ao rendimento gerado na área geográfica,

de cada município.»

O Orador: — Entendi perfeitamente e agradeço-lhe, Sr.* Deputada. A aplicação só pode ocorrer em 1992 porque, como sabe, os rendimentos de 1990 já estão todos processados, pelo que, ao nível da empresa, isso significaria aplicar retroactivamente um esquema que implica informação complementar. Ou seja, só poderá desenvolver--se a partir da aprovação do Orçamento do Estado e a aplicação será, necessariamente, diferida de um ano, porque isto implica um levantamento complementar em função da informação que é prestada hoje — por consequência, só poderá ser aplicado no futuro.

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Qual será a base de incidência, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: — Obviamente que teremos de encontrar critérios.

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A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — E que critérios?

O Orador: — Vamos estudá-los.

A Sr.' Ilda Figueiredo (PCP): — Ainda não estão estudados?

O Orador: — Não, não estilo. Repare: isso é uma iniciativa que corresponde a um desejo antigo e que até à presente data não era possível assumir porque não havia meios para encontrar as soluções adequadas e tratá-las com a rapidez que se impõe. Agora que dispomos dos meios, estamos abertos a encontrar uma solução, que julgamos ser a mais justa, para fazer a imputação. Como V. Ex.* compreende, existem as empresas mais variadas e é preciso encontrar critérios, pelo menos de aproximação, de onde se gera o rendimento. Esperamos obter a colaboração das empresas e, mesmo sendo provável que não seja feito de forma muito rigorosa, o que imporia é que haja uma boa aproximação da realidade. Para isso, é necessária uma informação complementar que possa ser tratada c trabalhada.

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Se ainda não tem os critérios estudados, não posso perguntar-lhe mais nada, Sr. Secretário de Estado.

O Orador: — Sr.* Deputada, há critérios que conseguiremos encontrar, até porque há experiências nesse sentido feitas noutros países. Certamente, não será difícil encontrar dois ou três critérios que se complementem c será a resultante emergente de dois ou três critérios aplicados em simultâneo que nos dará os valores com grande aproximação.

Quanto à segunda questão, não posso responder-lhe porque esses cálculos nunca foram feitos. Aliás, seriam sempre falaciosos porque as isenções que existem —como já tive oportunidade de dizer na própria Comissão —, são aquelas que existiam já quando a Lei n.° 1/87 foi publicada, e esta, salvo erro no artigo 7.°, refere que haverá que proceder a ajustamentos se porventura houver isenções para além daquelas que estão previstas na própria lei. Acontece que não há, de facto, isenções para além dessas; há, sim, actualização dos valores tanto da contribuição autárquica como da sisa.

A Sr.' lida Figueiredo (PCP): — Mas há novas isenções! Então, no ano passado, não foram feitas novas isenções?

O Orador: — Não!

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Para a sisa foram! E estão previstas novas isenções no Orçamento deste ano.

O Orador: —Não, Sr.* Deputada! V. Ex.' lem dc ver o que é que estava em vigor em 31 dc Dezembro dc 1986 e, a partir daí, verificar sc há ou não há novas isenções.

A Sr.' Ilda Figueiredo (PCP): — Mas há novas isenções! Claro que há! Tem havido lodos os anos.

O Orador: — Não, não há!

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Há, sim.

O Orador: — Não, não! O que há é a actualização dos escalões.

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — E isenções também! Quer que lhe leia quais as isenções previstas no Orçamento do Estado deste ano, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: — Só há actualizações!

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Não há só actualizações! Há isenções! O Sr. Secretário de Estado está esquecido daquilo que escreveu na proposta de lei do Orçamento que enviou à Assembleia? Há, de facto, novas isenções e posso ler-lhas, se quiser...!

A Sr.' Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, recordo-lhe uma isenção muito recente, que foi aprovada ainda este ano aqui, na Assembleia da República, logicamente com os votos do PSD. Trata-se da isenção de sisa nas transmissões de imóveis entre empresas do mesmo grupo económico. Mas este é um mero exemplo! Então, não há novas isenções, quando na proposta de lei do Orçamento do Estado para 1991, que estamos agora a discutir, V. Ex.* propõe novas isenções? Como é que pode dizer que não há novas isenções? Sr. Secretário dc Estado, V. Ex.* deve estar distraído!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Talvez não seja isso mesmo, Sr. Deputado. Repare: essas inscrições que foram, efectivamente, consagradas destinam--se a criar condições para que, ao nível da empresa, se criem as melhores condições de exploração nesta ou naquela actividade.

O Orador: — Não, não! O problema que se estava a colocar é o de saber se são novas ou não.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — É apenas uma transferência dentro do mesmo grupo.

O Orador: — Mas são novas isenções ou não?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Não, não são porque elas não se realizariam, de modo algum...

O Orador: — Sr. Secretário de Estado, não quero discutir se são correctas ou não, se são boas ou más, as alterações que foram introduzidas; mas, neste caso concreto, antes da lei que foi aprovada há alguns meses (não me recordo bem), essas transacções de imóveis eram tributadas e deixaram de sê-lo! Por conseguinte, há uma isenção nova. E é esta a questão que está a ser discutida: sc há ou não novas isenções — e o facto é que há!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Mas o que eu estou a dizer é que esse instrumento foi criado para as empresas poderem explorar a sua actividade dc uma maneira eficaz. E também não tenho grandes dúvidas de que elas não se realizavam se não houvesse essa disciplina — essas situações e esses valores patrimoniais continuariam a estar na sede dessas mesmas empresas, pelo que não haveria transferência. No fundo,

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isto é uma mera transferência para efeitos de uma melhor gestão dentro do grupo. Repare: nós estamos a falar de uma isenção que só tem expressão concreta porque existe um instrumento. Se não existisse, ela não se realizaria. Portanto, nunca haveria receita.

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra a Sr.* Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretário de Estado, o artigo 25.° da proposta de lei do Orçamento do' Estado para 1991 diz: «Fica o Governo autorizado a estabelecer a isenção da contribuição autárquica para os prédios que hajam sido classificados como imóveis de valor municipal nos termos da legislação aplicável.» Até este ano pagavam contribuição predial e agora vão deixar de pagar contribuição autárquica. Então, Sr. Secretário de Estado, isto não é uma isenção que não existia quando a Lei n.° 1/87 foi publicada? É uma nova isenção! Assim, nos termos da Lei das Finanças Locais, as autarquias devem ser ressarcidas por um montante equivalente.

Por outro lado, o artigo 26.° sobre a sisa refere: «Fica o Governo autorizado a alterar a designação de imposto de sisa para imposto municipal de sisa»; depois diz-se: «Fica autorizado a isentar de sisa as transmissões resultantes dc operações dc parcelamento e emparcelamento de prédios rústicos», «isentar de sisa as transmissões resultantes da divisão de prédios rústicos em regime de compropriedade.» Então, isto não são novas isenções de sisa? Depois continua dizendo: «Condicionar a isenção e a redução de taxas de sisa (...)» As que li, são ou não novas isenções, Sr. Secretário de Estado? Não estavam previstas aquando da Lei n.° 1/87.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr.' Deputada, quem vai declarar se o prédio é dc utilidade municipal ou não é a respectiva autarquia, o que significa que a isenção será determinada em função daquilo que a autarquia quiser.

A Oradora: — E os que já estavam declarados, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — É uma figura nova, Sr.* Deputada.

A Oradora: — Mas não se diz, Sr. Secretário de Estado, «que hajam sido classificados como imóveis»? Portanto, não se diz para os que vão ser, mas sim para os que hajam sido.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — É, efectivamente, uma questão da responsabilidade da autarquia e não de outrem. Portanto, se as autarquias querem preservar esse património, têm de criar as condições para o não onerar. Estes instrumentos são funcionais c nada têm a ver com uma receita resultante de uma transacção normal. Isso não é uma transacção normal, Sr.* Deputada! É, de facto, algo de especial, que tem a ver com interesses autárquicos, que devem ser protegidos. Foram as próprias autarquias que o pediram! Então, agora vamos dar do Orçamento do Estado uma verba para compensar aquilo que as próprias autarquias pediram? Creio que temos de ver as coisas com o equilíbrio que é desejável e compreender estas situações. Pergunto, Sr.' Deputada: a ultraminipropriedade é ou não economicamente rentável?

Se há uma clara política do Governo de procurar concentrar a propriedade, dando-lhe as condições de exploração adequadas, pensa que devemos ter um mecanismo que perturbe essa própria política, que 6 requerida por tudo e por todos?

A Oradora: — Sr. Secretário dc Estado, mas o que não pode fazer é pôr as autarquias a pagar a política que o Governo quer seguir. É isso que o senhor está a fazer! Isso não pode ser e a Lei das Finanças Locais não o permite! Os senhores não querem cumprir a lei!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr.* Deputada, isso não é assim. É uma isenção instrumental, que permite que determinada política se concretize, potenciando a criação de riqueza. É isso que está em causa e não a isenção em si! Não se trata de uma liberalidade, mas sim de um instrumento que permite que determinados factos aconteçam e que potenciem a capacidade produtiva do terreno. Não compreendo a sua observação, porque são coisas distintas.

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr.* Presidente, gostaria de colocar uma ou duas questões ao Sr. Secretário dc Estado dos Assuntos Fiscais.

Começaria o meu pedido de esclarecimento por fazer o seguinte registo: considero que é inaceitável que se coloque uma questão ao Sr. Secretário dc Estado sobre o problema das novas isenções e que ele comece por negar a sua existência, quando é totalmente rebativel, demonstrável a falsidade da afirmação face aos Orçamentos de 1987 para cá, incluindo o que está agora cm discussão, e que, depois, perante isso, tente escudar-se respondendo àquilo que não foi perguntado e deixando dc responder àquilo que lhe foi perguntado.

Mas, já que estamos a falar de problemas relativos às implicações fiscais com as autarquias locais, gostaria de colocar, concretamente, ao Sr. Secretário de Estado a seguinte questão: quais são os elementos de base — portanto, não me refiro àquilo que está no relatório, à taxa de crescimento — que serviram à projecção da cobrança do IVA para 1990 e para 1991? Com que valores de cobrança foi feita a projecção que é colocada dc S20 milhões de contos para o ano de 1990? Como é que chega aos 520 milhões dc contos e, depois, aos 608 milhões dc contos?

Aquilo que, nos últimos anos, tem vindo a ser efectuado pelo Governo c que se traduz em defraudar as autarquias locais através de transferências do FEF por projecções manipuladas das receitas previsíveis dc cobrança do IVA é absolutamente inaceitável, inadmissível e insustentável. Só não o é porque o Governo dispõe dc uma maioria absoluta que lhe permite fazer tudo...! É inaceitável e inadmissível o caso que já hoje de manhã referi e que é este: em Novembro dc 1989 o Governo propôs uma alteração à previsão de cobrança do IVA c altera-a para 430 milhões de contos (isto quando a previsão inicial era de 419 milhões de contos), mas passado um mês as cobranças já se situavam cm 480 milhões de contos. Isto é inaceitável e inadmissível e só pode ser compreendido não como um erro de projecção, não como alterações da situação económica, mas sim como uma vontade concreta,

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clara e objectiva do Governo em defraudar as autarquias locais, escamoteando a receita previsível do IVA.

Nesse sentido, solicito as informações que já pedi há pouco: com que base é que o Governo fez, em termos dc receita do IVA, a projecção, para 1990, de 520 milhões de contos e a previsão de cobrança do IVA, para 1991, de 608 milhões dc contos? Pergunto isto porque elas continuam a estar subavaliadas em várias dezenas dc milhões de contos.

A Sr.* Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Deputado, esses elementos são os que constam do relatório. Está aí uma estimativa, uma previsão dc receita de 520 milhões de contos, a qual resulta da cobrança que foi feita nos primeiros oito meses deste ano. Para 1991, as contas são as que estão, inequivocamente, expressas no relatório.

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — O Sr. Secretário de Estado diz que a projecção de 520 milhões de contos foi feita com base nas cobranças até ao fim de Agosto, portanto durante os oito primeiros meses. Solicito que V. Ex.* informe a Assembleia da República, mais concretamente a Comissão de Economia, Finanças e Plano, que está a discutir, neste momento, o Orçamento na especialidade, de quais foram as cobranças do IVA feitas nos oito primeiros meses de 1990.

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Deputado Octávio Teixeira, nós já respondemos a essa questão através de um ofício que seguiu a sua tramitação normal —e se ainda não foi entregue, deve estar a sê--lo — e que tem essa e outras informações que na altura foram solicitadas.

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Solicito à Sr.* Presidente que diligencie no sentido de saber sc já chegou a informação que tem esses elementos e que foi pedida há mais de um mês.

A Sr.* Presidente: — Sr. Deputado, vou pedir aos Serviços de Apoio que nos dêem essa informação.

Gostaria de colocar aos Srs. Membros do Governo presentes, em especial ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, a seguinte questão: sobre estes elementos que foram agora distribuídos relativos à derrama, o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território disse que o Governo, na discussão na especialidade do Orçamento do Estado, iria apresentar um novo texto dc um artigo, o qual diz respeito a uma autorização legislativa. Como o Governo não pode apresentar alterações ao Orçamento, creio que esta alteração virá, eventualmente, a ser subscrita pelo PSD.

Para além deste aspecto, creio que a formulação da autorização legislativa está incompleta. Assim, gostaria de chamar a atenção do Sr. Secretário de Estado para o seguinte: conviria completar esta autorização legislativa com os tais critérios que V. Ex.* referiu há pouco e que, não estando ainda aqui mencionados, me parece que são essenciais para que este pedido de autorização legislativa seja constitucional.

Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr. Domingues Azevedo (PS): — Sr.' Presidente, antes de começar a minha intervenção, gostaria dc trazer à colação a contradição que se processou no debate de hoje dc manhã quanto às afirmações produzidas pelo Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e pelo Sr. Ministro das Finanças em relação à fiscalidade para 1991. Aliás, o Sr. Ministro das Finanças, que consideramos uma pessoa séria e responsável por aquilo que diz, veio exactamente confirmar aquilo que o PS considera que vai ser o ano fiscal de 1991, contradizendo aquilo que o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais tinha inicialmente dito, ou seja, que em 1991 não haveria desagravamento fiscal, que o que se verifica é apenas o aumento de escalões para atenuar os efeitos da inflação. Isto está gravado e foi dito pelo Sr. Ministro das Finanças hoje dc manhã. Como não tive oportunidade de evidenciar esta questão hoje de manhã, faço-o agora.

Sr. Secretário de Estado, creio que neste debate está a haver alguma confusão. Estamos ainda a discutir o Orçamento do Estado no âmbito da despesa, mas, cm alguns domínios, tem havido uma certa confusão entre despesa e receita. Gostaria de colocar algumas questões que se prendem com a execução da reforma fiscal, nomeadamente sobre os métodos de liquidação, que, em tempo oportuno, foram por nós contestados. Fizemos a antevisão do que iria suceder e do que está, dc facto, a acontecer. Em momento oportuno, chamámos a atenção para a dificuldade e para os problemas que adviriam de uma liquidação em bloco por um único serviço distanciado do contribuinte, sem um processo de defesa dos contribuintes conexo que respondesse às questões que se iriam levantar no âmbito do novo processo de liquidação. E o que se está a verificar, Sr. Secretário de Estado, é impressionante: neste momento há declarações de IRS, numa percentagem significativa, que é já superior a 50 %, erradamente calculadas. Segundo informações obtidas dos serviços que dependem de V. Ex.*, por erro de programação dos serviços de informática chega-se a resultados negativos nos rendimentos das categorias C, que são considerados como resultados positivos a multiplicar por dois. As pessoas chegam às repartições de finanças e perguntam: «O que é que eu vou fazer?» E os funcionários só dizem: «Nem nós sabemos o que é que vocês devem fazer!» É a bagunça total, é a desordem total, é a confusão total, Sr. Secretário de Estado! Esta situação já se verificava, embora em menor grau, nos serviços de administração do IVA. Nestes últimos dois meses a administração fiscal teve o bom senso de tentar fazer um saneamento das situações que estavam para trás e que são altamente penalizantes para os Portugueses. Nós, com a experiência colhida dos serviços de administração do IVA, aleitámos o Governo para este problema! Na discussão na generalidade do Orçamento do Estado, o Sr. Secretário de Estado disse, nesta Câmara, que a solução também passaria pela manutenção do sistema de liquidação central feito on Une pelas repartições de finanças, ficando aí os competentes

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processos, podendo, a todo o momento, ser consultados pelos contribuintes e tendo as repartições como meio mais próximo de os contribuintes apresentarem as suas dificuldades, factos, elementos, conhecimentos que lhes permitissem, in loco, ver no momento aquilo que tivessem feito mal. Diga-se de passagem que o erro não é dos contribuintes, mas sim do processo de liquidação dos serviços. Não há declarações mal preenchidas, mas sim liquidações mal feitas por parte dos serviços, com as quais os contribuintes nada têm a ver.

A razão de ser da minha pergunta é exactamente esta: nós fizemos a antevisão destas dificuldades, denunciámo--lo aqui e dissemos que era exactamente isto que ia acontecer, designadamente porque esta reforma não foi suficientemente testada, quer nos seus efeitos quer nos meios que linha à sua disposição.

O Sr. Secretário de Estado quis ser o «pai» da reforma fiscal, mas, neste momento, está a ser o seu «cangalheiro». É extremamente mau que isto aconteça...

O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Oh, Sr. Deputado...!

O Orador: — É verdade, Sr. Deputado, e nós não podemos ocultá-lo!

Não gostam de ter um cangalheiro? Então, correspondendo à solicitação do grupo parlamentar que apoia o Sr. Secretário de Estado, mudo os termos: é um assassino!

O Sr. Secretário de Estado disse aqui, na discussão na especialidade, que os serviços iam desenvolver o processo de liquidação on Une e que, por isso, iriam ter terminais ligados a um sistema central, que as repartições de finanças e os contribuintes teriam, a todo o momento, um contacto directo e imediato com as suas situações, que os serviços iriam ter na sua posse elementos que lhes permitissem ajuizar das alterações a que fosse necessário proceder.

Sr. Secretário de Estado, as repartições dc finanças ainda não têm esses elementos, que estão aqui todos concentrados. Ainda na sexta-feira estive a conversar com um funcionário das finanças, que me disse: «Olhe, Sr. Deputado, toda esta situação é triste. O contribuinte diz que nós é que somos os culpados; nós andamos todos aqui à batatada e ninguém sabe o que fazer. Não temos instruções, não sabemos o que havemos de fazer, não sabemos se o contribuinte deve ou não apresentar uma reclamação por escrito, não sabemos se temos de preencher impressos, enfim, não sabemos de nada.»

No âmbito da despesa, o que queria perguntar ao Sr. Secretário de Estado era o seguinte: depois de analisar o PIDDAC, do Ministério das Finanças, constato que, praticamente, não existem verbas para a aquisição de equipamentos informáticos para estes serviços. Isto, na prática, vai, possivelmente, significar que a experiência negativa verificada no primeiro ano da reforma fiscal quanto à liquidação dos impostos vai repetir-se durante vários anos, porque o Ministério das Finanças não tem previsto um plano de investimentos capaz de pôr cm funcionamento o novo processo de liquidação.

Gostaria que o Sr. Secretário de Estado me respondesse ao seguinte: não lendo verbas inscritas no PIDDAC do Ministério das Finanças para este efeito, como é que pensa executar essas novas liquidações?

Por agora, é só esta questão que lhe deixo.

A Sr." Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr.* Presidente, tenho de corrigir, praticamente, todas as informações que o Sr. Deputado deu a esta Comissão.

Em primeiro lugar, não é verdade que haja esse caos que aqui mencionou. Estão liquidadas e arrumadas 99,1 % das declarações modelo 1. Pergunto-lhe: 0,9 % significa o caos? Obviamente que não, Sr. Deputado!

No que toca à declaração modelo 2, houve alguma dificuldade, mas só nos casos em que existiam mais de três anexos. O programa global estava pronto há cerca de quatro semanas e esperava-se ter tudo pronto no fim-de--semana. No entanto, surgiram alguns erros e, por isso mesmo, o programa teve de ser revisto. Espero que, dentro de pouco tempo, se possa liquidar o resto, porque está tudo pronto. Só faltam os cálculos do computador central para se poder proceder à liquidação. Mas como há atrasos — e já os há —, os juros devidos serão contabilizados aos contribuintes.

No que toca aos meios informáücos, devo dizer-lhe, Sr. Deputado, que já este ano foi adquirido um incremento do computador central, que será montado até ao fim deste ano, passando esse computador da classe 30.90.180 para 30.90.220, o que significa que passaremos a dispor de uma capacidade complementar para atingir esse objectivo.

Na reunião que tivemos anteriormente na Comissão de Economia, Finanças e Plano disse-lhe também que já estávamos a pôr em prática as ligações em on Une para as repartições de finanças. Isso está, de facto, a acontecer, mas, como compreende, não é possível fazer-se tudo de uma só vez. Estão a ser atendidos, em primeiro lugar, os grandes centros urbanos de Lisboa e Porto, que representam mais de 60 % das necessidades.

Ao contrario daquilo que disse o Sr. Deputado, todo esse processo não é para se proceder à liquidação em on Une. Pelo contrário, a liquidação será processada centralmente e a busca será feita on Une. Há na área de Lisboa uma boa dúzia de repartições de finanças com esse acesso directo e que, portanto, já podem fazer as consultas e, eventualmente, as correcções que forem tidas como convenientes para cada caso concreto. Esse projecto está, pois, em marcha e esperamos que, até ao decurso do primeiro trimestre deste ano, 80 % das repartições de finanças tenham já ligações em on Une.

Tive também oportunidade de dizer que, depois da experiência colhida neste primeiro ano da reforma fiscal, sobretudo no que toca ao tratamento informático, iremos proceder a alterações sobre a metodologia de recolha da informação. E vamos fazê-lo porque a experiência feita este ano manifestou algumas fragilidades. Assim, no próximo ano a informação será feita, generalizadamente, em on Une, mas não na sua totalidade. Sê-lo-á nos quatro principais distritos do ponto de vista da componente fiscal. Portanto, iremos dar cobertura para recolha em on Une em 80 % das repartições de finanças, o que significa que, no próximo ano, já teremos condições para fazer um maior brilharete do que aquele que se fez este ano. Por terem havido alguns erros, inclusivamente dos próprios contribuintes — e é natural que isto aconteça numa primeira fase—, não se pode tirar a conclusão de que o que se passou foi um caos e que há 50 % ou qualquer coisa parecida de erros. Não é nada disso, Sr. Deputado! Esiamos a falar de situações marginais e, por consequência, devemos fazer a nossa apreciação crítica dentro deste facto e não noutro. Repito, 99,1 % das declarações modelo 1 estão arrumadas e há um núcleo de cerca de II mil e tal declarações que estão a ser objecto de apreciação. Suponho

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até que, neste momento, já só há 50 % ou menos, na medida em que, através dos meios complementares de apreciação e de análise, se procurou superar esta dificuldade (com a qual, aliás, não contávamos, mas que, dc facto, aconteceu). Só quem não faz ideia do que é trabalhar com milhões de documentos é que pode julgai que tudo tem de correr, à partida, de uma maneira extremamente eficaz.

Mas para que o Sr. Deputado, como português, fique um pouco mais tranquilo, vou dizer-lhe o seguinte: numa recente reunião do Conselho dos Governadores do Federal Fax, em que foi feita — não por portugueses — uma exposição sobre a tecnologia utilizada neste domínio em Portugal, foi referenciada como algo de extraordinário a utilização dos meios de hardware e de software. Quando, ao fim e ao cabo, são organizações internacionais de grande mérito a fazer e escrever tal afirmação, fico admirado que o Sr. Deputado, que não é especialista na matéria, ponha isso cm causa...! Devo dizer-lhe que quem falou sobre esta matéria foram os maiores especialistas dc informática que há no mundo. O Sr. Deputado diz que não, mas os números e os factos não confirmam, de maneira nenhuma, aquilo que V. Ex.* afirma. Tenho muita pena, mas a realidade é diversa daquela que procurou expressar.

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.

O Sr. Domingues Azevedo (JPS): — Sr.° Presidente, o Sr. Secretário de Estado falou aqui de uma coisa que me é muito cara. Falou muito, mas não se referiu a factos concretos. Quer factos, Sr. Secretário de Estado?

Primeiro, ao contribuinte das categorias C e D, com 1048 905S de matéria negativa, é-lhe liquidado 1 048 905$ de matéria positiva.

Segundo, ao contribuinte com um resultado de 132'558 contos é-lhe considerada a matéria colectável a dobrar.

Terceiro, ao contribuinte com rendimentos da classe D, mas que tem englobado na matéria colectável mais de 50 % de rendimentos provenientes da classe A, o Governo não atende ao previsto no artigo 73.° do Código, ou seja, à existência mínima.

Tenho mais factos concretos, Sr. Secretário dc Estado, escritos pelos serviços de V. Ex.° c que, portanto não são inventados!

Quando as pessoas chegam às repartições de finanças a perguntar: «O que vamos fazer?», só obtêm a resposta: «Não sabemos de nada!» Alguém chega a uma repartição de finanças e pergunta: «Mas como é? O imposto está liquidado, vai para execução, há juros. O que é que vai acontecer?» Os serviços vão anular isso, Sr. Secretário de Estado?

Não sou técnico de informática e não lhe estou a dizer se o programa está bem ou mal feito. Eu analiso factos, Sr. Secretário de Estado!

O que digo é o seguinte: a imagem que o público tem do sistema fiscal é a de que isto está nas mãos de uma pessoa que, por acaso, é V. Ex.*...! Não há orientação alguma de fundo para os contribuintes. Eles vêem as liquidações mal feitas, chegam às repartições de finanças e ninguém lhes sabe dizer o que é que deverão fazer. O contribuinte reclama para quem? A reclamação tem efeitos suspensivos? E se os serviços resolvem não alterar? O contribuinic vai ver-se a braços com uma execução fiscal que não deve e V. Ex." continua a apregoar a bondade do sistema...!

O Sr. Secretário de Estado é rico em palavras, mas desconhece as situações reais e isso é que é negativo, porque as pessoas conhecem menos as palavras e mais os problemas que vivem todos os dias. E são esses problemas, Sr. Secretário de Estado, que contradizem as suas palavras. Sou um homem de factos e são estes que quero alterar.

Diz V. Ex." que são situações marginais. Ó Sr. Secretário de Estado, não são! Há uma repartição de finanças importantíssima no distrito de Braga que tem 40 % das declarações modelo 2, com contabilidade organizada, reclamadas. Diz V. Ex.* que são situações marginais...? E isto é só o caso de uma repartição...!

O Sr. Secretário de Estado referiu aqui que o sistema tratou de milhões de documentos. Ora, já aqui disse que não me sinto capaz dc examinar o sistema informático, portanto não vou correr o risco de dizer asneiras. No entanto, gostaria de repetir aquilo que disse inicialmente: estas soluções deveriam ter sido suficientemente testadas e não o foram. Porquê esta pressa toda de fazer as coisas e agora termos, como consequência, todos estes problemas? Por que é que não se adiou a entrada em vigor da reforma fiscal para mais um ano para, assim, se poder testar os programas, o equipamento, as soluções? Porquê?

V. Ex." teve pressa em ser «pai» e é por essa razão que, neste momento, está a ser «cangalheiro»...! É que quem paga as coisas são os contribuintes!

Diz-me V. Ex.* que, como português, devo ficar tranquilo por termos conseguido implementar este sistema. Ao contrário daquilo que diz o Sr. Secretário de Estado, cu, como português, fico muito triste...! E porquê? Primeiro, porque os contribuintes não têm condições de alterar as situações, não têm meios de defesa legítimos que lhes permitam ter a certeza e a segurança de que não vão ver amanhã o seu carro, a sua camisa, a sua casa, o seu campo na praça, o seu ordenado hipotecado para pagar um imposto que não devem! Tudo depende de V. Ex.'...! Chegámos ao cúmulo de, em termos de defesa dos contribuintes, depender, única e exclusivamente, das orientações que V. Ex." dá quanto a estas situações e que nem sequer 1 % dos portugueses conhecem...! E isto que me deixa triste, Sr. Secretário dc Estado.

Quando nós alertámos para a existência destas situações, V. Ex.* limitou-se a dizer: «Esta é a melhor das soluções; nós somos os melhores do mundo, a oposição não sabe o que diz, não percebe nada disto.» Depois, quando confrontado com as situações é que V. Ex." tem de mudar o discurso —já o mudou da parte da manhã e com o tempo vai mudar, com certeza, algumas das suas palavras em relação a algumas questões que levantámos.

V. Ex." continua a não aceitar, mas são factos, Sr. Secretário de Estado, são situações concretas! Não tenho prazer algum em chegar aqui e dizer que está mal! Como português que sou, ficaria muito contente se pudesse chegar aqui e daMhe os parabéns, mas, infelizmente, não posso. • • .• '

Não posso fazê-lo devido à aplicação da reforma fiscal, quer no plano técnico, quer no plano ideológico, quer na filosofia fiscal. Não posso, pela pressa que V. Ex.* teve em fazer tudo isso, atabalhoadamente-e sem ter qualquer noção do que seriam os efeitos a-posteriori. Não posso de forrar alguma felicitar V. Ex.", pois como .português sinto-me muito triste por termos chçgado à situação a que chegámos!

O Sr. Secretário de Estado>já tinha essa experiência. Q Sr. Secretário dc Estado sabe qual é o mal dc muitas desta coisas? É haver «impostos de gabinete»! E quando não se vai às repartições de finanças, quando, não se fala com as

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pessoas, quando não se analisa, quando não se vê um empecilho que pode prejudicar a vida de um contribuinte, quando não sc conhecem estas situações, é claro: esbarra--se!... Foi exactamente isso que aconteceu!

Sr. Secretário de Estado, tenhamos a coragem e a ombridade necessárias, neste momento, para alterar as situações c para reconhecer os nossos erros.

Qualquer homem é capaz de errar. Sr. Secretário de Estado, sabe quem não eira? São aqueles que nada fazem. Esses não erram, mas tenha a humildade, no mínimo, de reconhecer! Há problemas, é verdade. Digam isto publicamente. Nunca vi o Sr. Secretario de Estado vir aos jornais e dizer aos contribuintes que não paguem as liquidações modelo 2 com rendimentos da categoria C porque estão mal calculadas. Nunca vi V. Ex.* fazer isto, mas devia fazê--lo! Isso é que é transparência!

Sr. Secretário de Estado, agora pergunto-lhe quantas declarações modelo 2, referentes ao IRS, não teriam sido pagas até este momento sem que as pessoas não tivessem a obrigação de pagá-las. Eu já detectei três situações em que as pessoas, infelizmente, por não terem os conhecimentos necessários, efectuaram os pagamentos, quando as liquidações estão mal feitas. O que o Sr. Secretário de Estado tem a fazer é ir à televisão e dizer: todas as liquidações de modelo 2 vão ser revistas pelos serviços e nenhum contribuinte que não tenha recebido a sua notificação efectuará o pagamento do imposto. Isto é que é transparência!

Agora V. Ex.* vem dizer que só existem uns empe-cilhozitos, ou seja, umas coisas aqui, outras acolá, mas vai e altera isso... Isto não é nada, Sr. Secretário de Estado! V. Ex." perdoar-me-á, mas como português, e pegando na sua frase, não tenho quaisquer motivos, neste momento, para me sentir feliz ou regozijar-me com a situação. Tenho é motivos para me sentir muito triste, porque uma reforma que poderia ser, de facto, uma reforma fiscal a sério está a ser uma coisa perfeitamente atabalhoada, sem qualquer sentido, com resultados extremamente nefastos, e quem está a pagar isso tudo são os contribuintes. Os mais avisados conhecem as soluções e lá vão analisando o seu caso e dizendo a outros: «Vocês vejam lá o que é que estão a fazer...!» Isto é, lá sc vão instruindo, lá se vão informando!... Quanto aos outros, que não têm o mínimo de sensibilidade para isto, pagam aquilo que não devem pagar. É isso que está a acontecer, e V. Ex.* deve reconhecer que houve falhas neste processo.

Sr. Secretário dc Estado, os actos estão feitos e não os consegue alterar de um momento para o outro, pois as situações existem. V. Ex.*, com humildade, deve reconhecer... Eu já disse que só não erra quem nada faz.

A Sr." Presidente — Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário dc Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário dos Assuntos Fiscais: — Bem!... Eu compreendo o discurso do Sr. Deputado. Compreendo!... Não pode ser outro!... Mas peço a atenção de todos para este facto singular estamos a falar dc milhões. Só na declaração modelo 2 são cerca de 880 000. Apontam-se três casos c daqui generaliza-se dizendo que é tudo uma desgraça, quando já disse, anteriormente, que tivemos de reformular as declarações com mais de três anexos e que continuamos a rever para saber onde, efectivamente, é que está a razão de ser do erro.

Sr. Deputado, quer queira quer não queira, não tem razão! E não mc venha dizer que é necessário testar, e

retestar, porque tudo isto foi testado e retestado no plano

teórico, aparecendo no plano prático situações não pevistas e que determinaram esses erros, que assumimos claramente. Sr. Deputado, fique tranquilo, pois não haverá ninguém prejudicado, porque seremos implacáveis na busca das soluções e na sua recuperação — melhor direi —, desde que alguma coisa de anómalo se tenha verificado. De resto, temos vastas provas dadas nesse sentido, e no contacto directo que temos com os contribuintes logo que se detecte uma situação ela será corrigida, até porque, para além do automatismo dos procedimentos, temos equipas que na retaguarda vão rever, de facto, tudo para que não haja situações que fiquem desadequadamente contempladas, quer a favor quer contra os contribuintes.

Além disso, o único teste válido e profundo é o teste real. Não venha pretender que, ao «arrancar» com uma reforma fiscal desta envergadura, com um aparelho informático poderosíssimo, em que pode haver múltiplas falhas, o facto de aparecerem uns tantos casos em que é necessária uma correcção complementar ponha «ao desbarato» um trabalho gigantesco, que é elogiado pelos especialistas internacionais sobre esta matéria.

Olhe, já agora digo-lhe que nunca fui à cátedra falar...! Gosto de estar cá em baixo! Aliás, é como nos serviços: faço reuniões semanais com os técnicos tanto da parte da administração fiscal, propriamente dita, como com os técnicos informáticos. E lá que os problemas são debatidos sistematicamente para, quando surgem as dificuldades, encontrarmos as soluções mais adequadas para o efeito. Aliás, posso apresentar ao Sr. Deputado — se tiver curiosidade para isso — despachos cm que estas preocupações profundas são, de facto, vistas e analisadas e sobre as quais tomamos as opções que em cada momento se afiguram mais adequadas para encontrar os caminhos que entendemos que devem ser seguidos.

A Sr.' Presidente: —Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Srs. Deputados, só pretendia fazer uma intervenção na sequência da intervenção do Sr. Deputado Domingues Azevedo e da resposta dada pelo Sr. Secretário de Estado.

Aqui há uns meses atrás tive a honra de defender, neste Plenário, um projecto dc lei apresentado pelo Partido Socialista sobre a defesa dos contribuintes. Na altura ele não foi rejeitado na sua essência e o Governo até o louvou — recordo a intervenção que aqui fez o então deputado Dr. Mário Raposo—, tendo sido utilizado como único argumento para justificar o voto negativo por parte da maioria em relação à nossa iniciativa legislativa a existência de uma autorização legislativa de 180 dias concedida ao Governo para legislar sobre essa matéria

Tanto quanto sei, os 180 dias esgotaram-se, e pergunto quando é que vamos ter, finalmente, uma lei de defesa dos contribuintes, uma vez que, independentemente da generalização que se possa fazer ou não dos casos que aqui trouxe o deputado Domingues Azevedo, um facto indiscutível é o de que é necessária uma lei de defesa dos contribuintes.

Para quando uma lei de defesa dos contribuintes?! Por que é que o Governo não legislou, como era sua obrigação, no prazo dc 180 dias concedido pela Assembleia da República?!

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A Sr.* Presidente: — Para responder, se assim o desejar, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Deputado, os 180 dias ainda não se esgotaram. Posso dizer-lhe que esse diploma está em circulação e que em breve será agendado em Conselho dc Ministros, muito antes do fim do prazo de 180 dias, que, aliás, só se esgotam no primeiro trimestre do ano que vem.'

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Isso é espantoso! Então já discutimos isso há mais de um ano!

O Sr. Secretário de Estado, tanto quanto sei, é licenciado em Economia e, normalmente, os licenciados em Direito é que encontram uma «fórmula» para fazer as contas aos prazos de outra maneira...!

O Orador: — Sr. Deputado Manuel dos Santos, sabe quanto o estimo, mas tenho muita pena que não tenha estado atento, pois havia uma autorização que vinha já do passado. Isto 6, a dado passo do percurso preparámos um projecto que era, talvez, demasiado ambicioso e, ao testarmos os limites da autorização legislativa para aquilo que tinha sido concedida, verificou-se que cm vários espaços do projecto, muito provavelmente, extravasava o próprio conteúdo da autorização legislativa.

Por isso veio a esta Câmara um novo pedido com os recortes muito mais definidos sobre esse projecto — salvo erro, foi publicado nos finais de Agosto... Penso que foi uma lei de autorização, não me lembro agora de qual é o número, mas terá sido em Agosto e, por consequência, o limite do prazo está muito para além do fim deste ano.

De qualquer maneira, o que posso reafirmar é que esse projecto de código tributário está cm circulação — aliás, foi apreciado por diversas organizações ligadas a toda esta problemática jurídica — e espero que cm breve venha a ser aprovado dentro dos prazos. O seu lapso é apenas esta intermediação numa lei para defender com maior rigor os contornos deste código.

A Sr.* Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Srs Deputados, estava a ouvir estas questões relacionadas com taxas c impostos c Icmbrci-me da discussão que teve aqui lugar de manhã sobre o agravamento ou não dos impostos. Portanto, quase que me permitia, se fosse autorizado pela Sr.* Presidente, a começar esta minha intervenção colocando uma adivinha aos presentes, quer aos Srs. Deputados quer aos Srs. Membros do Governo.

Tenho aqui um diagrama com uma pequena nota que convém ler e que é feito pela OCDE sobre as laxas médias de imposto sobre rendimentos pessoais com uma e que versa apenas sobre os rendimentos do trabalho — a fonte deste diagrama é o Ministério das Finanças português e não a OCDE.

Tenho aqui dois diagramas, sendo um inferior e outro superior. Portanto, a adivinha que coloco a todos é esta: são capazes de descobrir qual das linhas é antes ou depois da reforma fiscal? Isto, por acaso, é da OCDE.

Voltando agora a outras questões.

O St. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Deputado, gostava de saber onde foi buscar esse documento, porque esse documento não existe.

O Orador: — Não existe?!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — O Sr. Deputado espere pelo relatório da OCDE em Janeiro, pois será nessa altura que ele será tornado público. De qualquer modo, tomo o cuidado de quando o receber o enviar em primeiro lugar a V. Ex.*

O Orador: — Sr. Secretário de Estado, agradeço antecipadamente a simpatia da sua parte.

No entanto, digo-lhe que o documento existe. Não há aqui fantasmas!... Em Paris lambem se conseguem obter coisas.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — O Sr. Deputado quer telefonar para a OCDE e perguntar se esse documento existe?

O Orador: — Sr. Secretário de Estado, o documento existe, é real. O Sr. Secretário de Estado o que quer dizer é que «oficialmente» ainda não existe, porque ainda não foi publicado. Mas toda a gente sabe que o documento existe...

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Não existe!

O Orador: — Sr. Secretário de Estado, palavra de honra que não é um fantasma! Não é uma miragem!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — O Sr. Deputado escreve à OCDE e pergunta se este documento é real. Islo é, escreve oficialmente à OCDE... Se quiser, escrevo-lhe a carta!...

O Orador: — Sr. Secretário de Estado, eu se quiser escrever à OCDE, faço-o directamente, porque tenho a morada, tenho selos. Mas já lhe disse que isto foi obtido em Paris, na OCDE.

Sr. Secretário de Estado, todos sabemos que quando sai um relatório da OCDE sobre um determinado país a OCDE faz o seu próprio relatório. Depois esse relatório é negociado com os governos respectivos, havendo coisas que, às vezes, os Governo não querem que se saiba e a OCDE até acaba por facilitar... Possivelmente o Governo

— como o Sr. Secretário disse que em Janeiro sai o relatório — já conseguiu negociar o diagrama.

Sr. Secretário de Estado, passando agora a outras questões...

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Deputado, o Governo não negoceia, quando muito corrige com elementos objectivos e mais nada! Mas só se for caso disso. E quando vier o novo relatório não será, porventura, exactamente esse diagrama, mas terá o diagrama efectivo, real, que a OCDE está a «beber» dos elementos objectivos que lhe foram fornecidos.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Muito bem, Sr. Secretário de Estado. Felizmente, na chamada «cidade luz», ainda há mais luz do que cm Lisboa. Pelo menos nestas questões da informação sobre a parte fiscal portuguesa.

Agora gostaria de colocar outras questões, uma das quais

— que não sei se hei-de remeter ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais se à Sr.* Secretária de Estado do Orçamento — faz também parte do rol das que coloquei,

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há cerca de um mês, aquando da reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano com os Srs. Membros do Governo. Continuo à espera que me digam onde é que, no orçamento do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, está a transferência do imposto complementar, porque continuo a não ter elementos sobre essa transferência que, legalmente, deve ser feita para o orçamento do Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social.

Ainda na perspectiva do orçamento do Tribunal de Contas (e não vou discutir novamente os números), a segunda questão que gostaria de colocar directamente à Sr.» Secretária de Estado do Orçamento é a seguinte: está o Governo disponível para que o orçamento do Tribunal de Contas, a sair da Assembleia da República, inclua todos os encargos que, neste momento, são certos, para 1991, ficando a hipótese de transferência de verbas do Ministério das Finanças para o Tribunal de Contas, ao longo do ano de 1991, apenas ligada ao aumento dos quadros do Tribunal de Contas (e aumento, não em termos remuneratórios, mas o aumento do número de efectivos)? Julgo que seria uma situação muito mais clara, pois não teria implicações com o défice, nem qualquer outro tipo de implicações, a não ser a de fazer uma transferência da dotação provisional, ou de onde quer que seja, para o orçamento do Tribunal de Contas, neste momento. Julgo que esta é uma proposta razoável, na medida em que — repito-o mais uma vez — temos de considerar o Tribunal de Contas como aquilo que ele é e não como um mero serviço de um qualquer ministério. Por isso gostaria de saber se o Governo está disponível para isso.

A terceira questão «regressa» ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais. Gostaria que me respondesse a algumas questões relacionadas com o orçamento da Guarda Fiscal, pois ele é da tutela do Sr. Secretário dc Estado.

Em primeiro lugar, gostaria de saber se, no orçamento da Guarda Fiscal para 1991, estão inscritas quaisquer verbas —e se estiverem, pedir-lhe-ia que me indicasse quais são e em que rubrica é que estão — para aquisição de novos meios de fiscalização marítima, designadamente aqueles que estão destinados ao combate ao contrabando, e, muito claramente, ao problema do contrabando da droga.

Em segundo lugar, uma questão relacionada com o problema do material de informática. É que há uma verba de 23 contos que me parece bastante baixa c, por isso, pergunto que material de informática se prevê adquirir com esta verba para a Guarda Fiscal? Esse material de informática tem algo a ver com o equipamento necessário da Guarda Fiscal para a coordenação das suas actividades operacionais?

Em terceiro lugar, no orçamento da Guarda Fiscal aparece uma verba para a aquisição de material de guerra no valor de 10000 contos. Que tipo de material é que vai ser comprado com estes 10 000 contos?

Em quarto lugar, as obras das instalações do batalhão de apoio e serviços no Centro de Instrução de Queluz estão paradas há algum tempo por falta de verba. Gostaria de saber se, no orçamento para 1991 da Guarda Fiscal, aparece alguma verba para que estas obras possam ser acabadas e qual é a verba inscrita e em que rubrica.

A Sr.* Presidente: — Srs. Secretários de Estado, desejam responder já ou podemos passar ao pedido dc esclarecimento do Sr. Deputado António Barreto?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Quero responder já, Sr.* Presidente.

A Sr.' Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Deputado Octávio Teixeira, no Orçamento de Estado para 1989, quando se fixa a verba do imposto complementar, secção A, para a Segurança Social, diz-se: «O imposto complementar efectivamente cobrado em 1989.» Portanto, o que aí se refere é a verba efectivamente cobrada do imposto complementar em 1989.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Importa-se que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais; — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, não estou a perceber o que é que quer referir com isso. Recordo-lhe, apenas, que o imposto complementar era para ser cobrado, pelo menos àqueles que optaram por isso, em três prestações. Assim, é o imposto de 1989 mas, como é para ser cobrado em três prestações, todos os anos terá de haver...

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Desculpe, Sr. Deputado, mas é o efectivamente cobrado em 1989. É isso o que está escrito na lei: «efectivamente cobrado».

No que toca ao orçamento da Guarda Fiscal, gostaria de dar um esclarecimento muito claro sobre este assunto. Sabe-se que se procurou criar as condições para a Guarda Fiscal funcionar com grande eficácia. Portanto, a estrutura da Guarda Fiscal está em profunda mutação, que se vai operar através do fornecimento de equipamento altamente sofisticado que lhe permita a vigilância da costa portuguesa 24 horas sobre 24 horas. Este processo divide-se em várias fases, a primeira das quais está, neste momento, a ser testada sob a vigilância da costa num ponto e, depois, haverá mais cerca de 20 pontos que serão indispensáveis para cobrir toda a costa.

Nós entendemos que, sendo Portugal uma fronteira da Comunidade a ocidente da Europa, este esforço financeiro deveria ser comparticipado pela Comunidade Económica Europeia. Por isso mesmo fizeram-se diligências adequadas para atingir esse objectivo c sabemos, hoje, que a Comunidade se dispõe, não só em relação a Portugal mas também relativamente a outros países que têm fronteira marítima, a criar uma linha especial de apoio à modernização de toda a costa.

Assim sendo, tivemos de refrear um pouco a passagem à segunda fase, de modo a não prejudicar os apoios que esperamos para cofinanciar este esforço, para que a Guarda Fiscal atinja o grau de eficácia que, há três anos atrás, no dia da Guarda Fiscal, anunciei que iríamos pôr em prática.

Há, portanto, uma razão estratégica para esta paragem que defende altamente os interesses de Portugal e não traz problemas de maior, na medida em que, como estamos na fase de testar o equipamento de vigilância permanente, o outro equipamento — que é a aplicação prática deste, uma vez que é como que «os olhos avançados», constituindo uma presença permanente ao longo da costa portuguesa — virá com muito maior rapidez e então, depois sim, teremos os meios adequados. Portanto, esta é uma paragem estratégica para podermos usufruir das vantagens do apoio da Comunidade.

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A Sr.' Presidente: — Para responder às restantes perguntas, tem a palavra a Sr.* Secretaria de Estado do Orçamento.

A Sr.' Secretária de Estado do Orçamento: — À pergunta que me colocou, relativamente ao Tribunal de Contas, mais concretamente, se o Governo está disponível para que o orçamento do Tribunal dc Contas a sair desta Assembleia inclua todos os encargos certos para 1991, responderei que com certeza que sim, na medida em que é isso mesmo que já lá consta. Todos os encargos certos, para 1991, estão incluídos no orçamento do Tribunal de Contas. O que lá não está previsto é, por um lado, o número de admissões de cerca de 500 novos funcionários que o Tribunal de Contas se propõe admitir e, por outro, uma reestruturação dc carreiras, cujo diploma ainda nem está em circulação.

Portanto, ainda não se trata rigorosamente dos encargos certos, porque o facto de se prever a contratação de cerca de 500 funcionários — desde os concursos até à hipótese de se irem buscar esses cerca de 500 funcionários até à discussão do diploma— não constitui efectivamente um encargo certo, mas o resto está lá tudo, não falta nada.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Pcrmite-me que a interrompa, Sr.* Secretária de Estado?

A Sr.' Secretária de Estado do Orçamento: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): —Sr.* Secretária de Estado, nós temos aqui informações escritas —que já foram confirmadas, oralmente, pelo Sr. Presidente do Tribunal de Contas e, por escrito, por todo o Tribunal de Contas — em que se diz que, nomeadamente no caso dos encargos com o pessoal que existe, neste momento, no Tribunal de Contas, a dotação que está inscrita não chega para pagar os salários actuais. Aliás, julgo que na altura cm que foi feito o orçamento falou-se em 11,5 % e agora surgem 13,5 %.

Por conseguinte, julgo que há aqui um desfasamento, relativamente à altura em que o Governo elaborou o orçamento, em termos do pessoal existente no Tribunal de Contas. Julgo até que o Sr. Presidente do Tribunal de Contas teve oportunidade de referir que, no último trimestre, houve admissões e, portanto, no mínimo, há que ajustar isso.

E, já agora, se me permite, Sr.* Secretária de Estado, cm relação a outras despesas de aquisição dc bens c serviços, julgo que há ali alterações que são absolutamente incompreensíveis. Quando se passa de uma dotação proposta de 30 600 contos para uma proposta do Governo de 600 contos e sc verifica que, durante o ano de 1990, foram gastos, até Setembro, qualquer coisa como 14 ou 15 000 contos, penso que esta verba de 600 contos não pode ser minimamente realista. Estou a referir este exemplo dc memória, mas poderíamos encontrar outros.

A Sr.* Secretária de Estado do Orçamento: —

Sr. Deputado Octávio Teixeira, tenho todo o respeito pelas afirmações e pelos papéis do Sr. Presidente do Tribunal de Contas; só lhe peço que tenha o mesmo respeito pelos meus papéis c pelas minhas afirmações.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Muito bem!

A Oradora: —O Sr. Deputado tem um papel que lhe foi dado pela Secretaria de Estado do Orçamento, onde se demonstra que o aumento da despesa com pessoal para o Tribunal dc Contas é de 26,5 %, o que significa que não estamos simplesmente a considerar 13,5 %, ou seja, estamos a considerar que o último trimestre tem realmente uma execução diferente da que ocorre ao longo do ano e isso está lá contemplado.

Em segundo lugar, penso que o exemplo que o Sr. Deputado cita, acerca do montante das despesas com a aquisição de bens e serviços, também estava devidamente explicitado no papel que lhe foi fornecido pela Secretaria de Estado do Orçamento. O que acontece é que foi dada uma instrução a todos os serviços —e admito que o Tribunal de Contas não seja um serviço igual a uma dirccção-geral (com certeza que não é), o Tribunal Constitucional também não e a Presidência da República muito menos — e todos eles cumpriram essa determinação, só que a cumpriram, fazendo o respectivo ajustamento. Como sabe, não foi possível, por motivos certamente ponderosos, contar com essa colaboração por parte do Tribunal de Contas e, portanto, üveram de ser os serviços, dc uma forma mais ou menos automática, a fazer o ajustamento. Assim sendo, acontece que o montante de todas as despesas, para além do pessoal, cresce em todos os serviços — e não só no Tribunal de Contas — 0 %. Essa foi uma determinação que, em termos de constrangimentos dc natureza orçamental, se impôs ao funcionamento dos serviços.

Por um lado, estes 0 % incidem sobre uma despesa total que não inclui as remunerações certas e permanentes, é sobre uma despesa que é conjunturalmente mais elevada do que noutra qualquer situação. E todos sabemos quais são os problemas relacionados com a instalação do Tribunal de Contas, portanto 0 % relativamente ao Tribunal de Contas provavelmente representará algum crescimento em termos reais, o que não acontece com os outros serviços.

Por outro lado, é evidente que, se na rubrica de «Aquisição c serviços» há uma redução, é porque noutras rubricas há aumentos de 90 e tal por cento. Mas aqui, Sr. Deputado, deixamos à gestão flexível por parte dos directores dos diferentes serviços o ajustamento a que é necessário proceder — e isso nem cabe ao Sr. Presidente, que não se ocupa desses trabalhos menores, mas à Dirccção-Gcral do Tribunal dc Contas. Efectivamente, não é preciso ser o Governo a fazer esse ajustamento, porque qualquer director de serviços ajusta. É que a base dc manobra e a possibilidade de gerir flexivelmente as verbas é total, como sabe. Realmente, há umas que estão a menos c outras a mais, mas esse foi um problema derivado de uma certa cegueira c de um certo desconhecimento da nossa parte acerca do modo como o Tribunal de Contas quereria fazer o ajustamento. Provavelmente esse ajustamento corresponde, nalguns casos, a menos e, noutros, a muito mais, mas esse é um problema que não precisa dc ser acertado aqui por nós.

No entanto, se for essa a sua discórdia, estou na disposição de o acertar; desde que no conjunto continue a dar zero, nós reduzimos aqueles que aumentam 90 % e aumentamos os que decrescem.

A Sr.' Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): —Sr.* Secretária de Estado, não tenha dúvidas de que cu respeito igualmente

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as suas opiniões. Só que sou confrontado com números diferentes depois de receber as informações dos dois lados e, por isso, tenho de pensar — o facto de ter de pensar por mim próprio é algo que não posso evitar. Aliás, há pouco, dei-lhe aquele exemplo de memória, mas tenho aqui uma outra rubrica à minha frente, que é a das comunicações, sobre a qual gostaria de ser esclarecido. É que eu até posso admitir que o Tribunal de Contas telefone muito, escreva muito, que gaste exageradamente, posso admitir isto cm termos teóricos, em termos de comunicações. Agora, quando, no fim de Setembro de 1990, o Tribunal de Contas tem como despesas realizadas 14 mil contos e o Governo vem propor para a mesma rubrica, em 1991, mil contos, 6 Sr.* Secretária de Estado, isto não entendo!

A Sr.* Secretária de Estado do Orçamento: — Desculpe-me interrompê-lo, mas aí é que está, de facto, um certo desajustamento de interpretação. O Governo não propõe rigorosamente nada no que respeita às rubricas para além do pessoal, o ajustamento é feito dc qualquer outra forma, o serviço tem a possibilidade de gerir as verbas como entender. Portanto, se o Sr. Deputado fica um pouco incomodado com esse tipo de análise, vamos rearrumar essas rubricas de forma que não fique impressionado, porque o Governo está disposto a isso, desde que o crescimento, no resto, seja zero.

O Orador: — Mas quando a Sr.' Secretária dc Estado, para determinado conjunto de despesas, propõe uma verba de crescimento zero, como é o caso concreto, pergunto o que é que se faz se, por acaso, aparece uma despesa anormal em 1991? Suponhamos, por exemplo, a realização dc uma reunião internacional, em Portugal, para a qual se orçamenta 30 mil contos. Se o Tribunal tem de ir buscar os 30 mil contos a um orçamento de crescimento zero..., isso é um problema!

É, neste sentido, julgo, que haveria algumas questões que poderiam ser reanalisadas, com boa vontade, por parte do Governo e com compreensão de ambas as posições, no sentido de sair da Assembleia da República um Orçamento que pudesse, pelo menos, evitar o aparecimento de conflitos. Portanto, a proposta é feita num sentido muito claro, e foi apenas nessa perspectiva que fiz a pergunta.

Tenho agora a resposta da Sr.* Secretária de Estado e cada um de nós actuará de acordo com a sua consciência.

A Sr.* Presidente: —Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp, solicitando-lhe que seja breve.

O Sr. Rui Carp (PSD): — Só quero dizer que, efectivamente, tanto as reuniões internacionais como outras despesas desse tipo, do Tribunal de Contas, designadamente representação no estrangeiro, foram sempre suportadas pelos Cofres do Tribunal de Contas.

A Sr.' Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

O Sr. António Barreto (PS): —Sr. Secretário de Estado das Finanças, pode, à primeira vista, parecer que não há uma matéria imediatamente relevante cm questão de Orçamento, mas há. Vou falar do plano dc privatizações para 1991, nas perspectivas de receitas e avaliação das expectativas para 1991, e, se pensarmos bem, é evidente que as privatizações têm muito a ver com o Orçamento para 1991.

Gostaria de perguntar ao Sr. Secretário de Estado, e ao Governo em geral, se está satisfeito com o andamento da privatização do BPA, se entende que as coisas estão a correr bem, do ponto de vista financeiro, económico, técnico, social, político, etc., se tem já alguns elementos que nos permitam ver qual a medida do envolvimento do sector público na aquisição dc capital no BPA.

Como sabe, a imprensa tem sido bastante fértil em afirmações, pistas, nuvens, quanto ao envolvimento espontâneo de empresas do sector público ou o envolvimento comandado, aconselhado, convidado, do sector público na aquisição do capital do BPA.

Nestes termos, considera o Sr. Secretario de Estado normal e legítima toda a maneira como o processo tem vindo a ser desenrolado até hoje? Peço-lhe para notar e sublinhar as duas expressões que utilizei, isto é,-eu não disse legal, disse normal e legítimo, sendo que os termos da normalidade são os termos correntes no mundo ocidental e os termos da legitimidade envolvem evidentemente juízos de carácter nacional, moral, cultural, etc.

Estão o Sr. Secretário de Estado e o Governo satisfeitos com o envolvimento e o papel que vêm desempenhando, e vão desempenhar, o conjunto dos trabalhadores do BPA c dos seus directores e administradores?

Está o Sr. Secretário de Estado satisfeito e considera normal e legítimo o envolvimento público e notório de gestores públicos na própria privatização do BPA, seja o envolvimento de gestores públicos como factores essenciais nas decisões, como factores essenciais na escolha dos figurinos futuros para o BPA até, ao que consta, na participação do capital ulterior do BPA privatizado, ou, numa primeira fase, misto e depois privatizado?

Está o Governo satisfeito, considera normal e legítimo que o crédito aos trabalhadores, directores e gestores públicos seja concedido pelo próprio banco, com «pêlo do mesmo animal», como se costuma dizer — peço desculpa do coloquialismo.

Está o Sr. Secretário de Estado satisfeito, considera normal c legítimo que haja crédito bonificado concedido pelo próprio banco? Ao que consta o juro pago pelos trabalhadores, directores c administradores será de 5 %, o que quer dizer que há uma forte bonificação. E cu que sou relativamente incapaz em questões de economia rigorosa, recorri-me dc pessoas que sabem muito mais do que eu, que me disseram que, numa avaliação sumária e superficial, mas cujos limites são seguros, o subsídio concedido pelos accionistas do banco aos futuros compradores do capital do banco oscilaria entre 4 a 6 milhões de contos. Supondo que o accionista actual do banco é o Estado e que os accionistas futuros são as pessoas que comprarem os capitais, quer dizer que o Estado e os futuros accionistas vão pagar, durante alguns anos, um montante que se situa algures entre os 4 c os 6 milhões dc contos dc subsídios grátis, pagos aos trabalhadores, directores e gestores públicos do banco para comprarem o próprio banco.

Está o Sr. Secretário dc Estado satisfeito, está o Governo contente, estão todos felizes, consideram normal c legítimo, consideram que este é um modelo de privatização para o futuro, para Portugal e para outros países da Comunidade Económica Europeia?

Gostava que o Sr. Secretário de Estado me dissesse que este processo, tal qual ele decorre até hoje, cumpre as regras dc transparência do Estado democrático e da política moderna. Gostava que o Sr. Secretário dc Estado me dissesse se pensa ou não que existe aqui uma promiscuidade condenável a lodos os títulos, a título moral,

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económico, cultural, político, financeiro, empresarial, administrativo, etc, ou se considera que não há qualquer promiscuidade e que as fronteiras e as linhas directas entre o público e o privado já atingiram este grau dc total liquefacção em que tudo é possível.

Gostava de dizer-lhe, Sr. Secretario de Estado — infelizmente, as pessoas na sociedade portuguesa muito centralizada também têm níveis de intimidação psicológica e outras—, que falei com alguns gestores públicos da banca, nomeados pelo actual Governo, a quem perguntei o que é que eles pensavam disto... e não lhe repito, Sr. Secretário de Estado, o que eles pensam; aliás, não sei se terão a coragem de lho dizer no seu gabinete. Perguntei igualmente a dois importantes administradores da banca privada, que estão ainda mais escandalizados. Telefonei a professores universitários dc economia e falei com deputados —e sublinho, Sr. Secretário dc Estado— de todas as bancadas ou, pelo menos, das quatro maiores bancadas deste Parlamento, e devo dizer-lhe que nenhuma das pessoas a quem perguntei me disse que estava contente e satisfeito c que considerava este processo normal e legítimo.

Gostava que o Sr. Secretário de Estado me desmentisse e me dissesse: «Não, não tem nenhuma razão para estar preocupado, vou convencê-lo do contrário! Não há promiscuidade, a transparência é total, isto é absolutamente legítimo, é o que se faz no mundo moderno e é o que se fará no futuro em Portugal!» Gostava que o Sr. Secretário de Estado me dissesse isto.

E já agora, que estou com a mão na «massa», isto é, com o microfone aberto, gostava de acrescentar uma pergunta suplementar: relativamente à privatização do JN estão a ser pontualmente cumpridos todos os compromissos?

A Sr.* Presidente: — Está também inscrito o Sr. Deputado Manuel dos Santos, a quem pergunto se deseja intervir sobre a mesma matéria.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr.* Presidente, sinto-me representado nas questões que o Sr. Deputado António Barreto colocou. Por isso, só pretendo depois pôr uma questão ao Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

A Sr." Presidente: — Apesar dc estar na mesa, não posso deixar de fazer uma pergunta que tem a ver com a que fez o Sr. Deputado António Barreto.

Sr. Secretário de Estado, o Sr. Presidente do Tribunal de Contas disse, hoje, numa entrevista a um jornal diário, que não podia fazer fiscalização sobre a forma como as privatizações se estão a passar. É dito também nessa entrevista que o Sr. Secretário de Estado das Finanças teria respondido que era um facto, que não havia outro tipo de controlo a não ser através da comissão dc acompanhamento das privatizações, mas que esse facto derivava da lei. Isto foi exactamente o que vinha no jornal c o que o Sr. Secretário dc Estado terá dito.

Gostaria que, para já, ficasse, pelo menos, aqui registado, já que não sc pode Tegistar noutro sítio, que esta lei foi aprovada com os votos favoráveis do PSD e com os votos contrários do PS e do PCP, exactamente por esta razão, isto é, porque não havia qualquer hipótese dc fiscalização.

Já agora, Sr. Secretário dc Estado, quer também responder a este aspecto?

Tem, pois, a palavra o Sr. Secretário de Estado das Finanças.

0 Sr. Secretário de Estado das Finanças (Elias da Costa): — Sr. Deputado António Barreto, vou tentar responder tendo em conta as informações de que disponho neste momento relativamente ao processo.

Como sabe, a inscrição para a oferta pública da venda do BPA ocorreu durante a semana passada, mas a oferta pública dc venda só se realizará no próximo dia 11, pelo que, necessariamente, os resultados económicos, políticos e sociais da privatização do BPA só poderão ser aferidos na próxima terça-feira.

No entanto, a informação de que disponho quanto à receptividade do público, dos pequenos investidores e dos investidores em geral, quer aos balcões do próprio BPA quer aos balcões de diversas redes públicas, foi bastante boa, foi significativa, o que nos cria expectativas favoráveis quanto a esse mesmo resultado. Porém, a partir de lerça--feira, estarei certamente na disposição para lhe referir qual o grau de satisfação relativamente a esta operação.

Quanto às demais questões que colocou, gostaria dc dizer-lhe que, relativamente à participação das empresas públicas no processo de privatizações — disse isso nesta operação do BPA, como na operação da Centralcer —, o Governo ou eu próprio nos teríamos desmultiplicado para contactos, junto das empresas públicas, para subscreverem acções do BPA. Penso que é a hora de esclarecer basicamente o nosso posicionamento quanto a esta matéria. Em primeiro lugar, existe um despacho que define que quando as empresas públicas pretendam acorrer às privatizações, deverão solicitar autorização. Ora, essa autorização é sempre dada, desde que estejam satisfeitos determinados requisitos, nomeadamente que a proposta das empresas públicas assente basicamente na mobilização, que lhe é permitida por lei, dos ülulos de nacionalização e expropriações para, ao valor nominal, acorrerem às operações de privatização.

Pensamos que as empresas públicas não deverão deixar passar esta oportunidade que lhes permite substituir activos dc muito baixo rendimento por activos de bom rendimento, melhorando a sua situação.

Por outro lado, existem também empresas públicas e investidores institucionais que entendem dever ter, na composição das suas carteiras, uma participação nesta ou naquela privatização e, nesse sentido — não no de mobilização dc títulos de nacionalização e expropriação—, solicitam a autorização para acorrerem a esta ou àquela privatização, consoante o conceito que façam do «pape/» que é colocado à sua disposição no mercado.

Nestas circunstâncias, quer se trate de títulos de nacionalizações e expropriações quer de recomposição de carteiras de empresas públicas, que são investidores institucionais, a nossa preocupação é a de que a participação destas empresas públicas não ultrapasse, em caso algum, o limite máximo de 5 % do total da empresa pública a privatizar.

Assim, resumindo e concluindo, queremos apenas significar que na privatização do BPA, por exemplo, entendemos que este conjunto de acções por parte das empresas públicas não deverá ultrapassar 4 % ou 5 % do capital do banco, exactamente para não desvirtuar a situação.

Entendemos que as empresas públicas também devem ter oportunidade dc fazer os seus negócios, realizar as

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operações que entendam dever realizar para assegurar a

adequada rentabilidade dos seus activos.

Quanto à questão que colocou, na longa intervenção que produziu, no sentido de saber se considero normal e legítimo o processo que ocorreu na privatização do BPA, dir-lhe-ei que considero absolutamente normal, legítimo e transparente todo o processo relativo ao BPA.

Em relação à participação dos trabalhadores, dos quadros e dos gestores públicos envolvidos na privatização do BPA, gostaria de dizer-lhe que, particularmente destes últimos, tive a melhor colaboração, quer a nível do conselho dc administração, quer da estrutura do próprio banco, pela forma como respondeu à montagem da operação, que se traduziu numa oferta pública de venda semelhante à que foi feita relativamente à primeira fase do processo dc privatização do Banco Totta & Açores, apenas com a diferença dc no Tona & Açores terem sido privatizados 49 % e no BPA apenas 33 %.

Com efeito, uma oferta pública de venda é um mecanismo, talvez, dos mais transparentes. Aliás, é o primeiro mecanismo de privatização que 6 referido na Lei n.° 11/90 e, como tal, julgo que esta Assembleia poderá solicitar todas as informações que entender sobre o processo de privatização do BPA ou de qualquer outra instituição.

Quanto à participação dos trabalhadores, posso acrescentar que estamos satisfeitos com ela e entendemos que é uma componente essencial do processo dc privatizações. Desde há muito que vimos dizendo que, em face de um processo de privatizações, o nosso propósito não é obter apenas a maximização da receita, pois, embora a defesa do valor patrimonial do Estado seja um dos nossos objectivos, existem outros objectivos fundamentais a atingir, como a identidade nacional da prossecução do programa dc reprivatizações, a defesa dos legítimos interesses dos grupos nacionais, que em cada uma delas se desenvolve, e o controlo da participação dos estrangeiros, que, para além da maximização da receita, fazem parte de um conjunto de objectivos a atingir com a privatização.

Na verdade, as condições de crédito suplementares definidas pelo conselho dc administração do Banco Português do Atlântico para os seus trabalhadores foram motivo de grande difusão ao nível da comunicação social, pelo que me causa algum espanto que se possa pôr em causa uma medida que. no fundo, vem exactamente no sentido, no espírito e na letra da Lei n.° 11/90, ou seja, pretende proporcionar ainda mais a participação dos trabalhadores na privatização do Banco Português do Atlântico, e, neste caso, ainda com um adicional relevante de essa participação — ao contrário do que aconteceu na Tranquilidade, onde se poderia admitir que a participação dos trabalhadores tivesse presente alguma perspectiva especulativa a curto prazo— ser feita numa perspectiva perfeitamente estável de participação no futuro do banco a médio prazo, pelo que a linha de crédito que foi estabelecida no BPA mais não visa do que vir a propiciar ainda mais a adesão dos trabalhadores ao processo de privatização.

Dc facto, quando, ainda há pouco, disse que me causava algum espanto a difusão que foi dada a esta matéria no caso do BPA, isto é, à existência de uma linha de crédito a três anos com juros a 5 % —aliás, como V. Ex.' referiu—, foi porque no Banco Totta & Açores foi estabelecida uma linha de crédito a três anos e sem juros para os trabalhadores. Estas medidas que apoiem e que levem, de facto, a uma participação maior dos trabalhadores na privatização das empresas públicas não devem, em meu

entender, ser motivo de contestação, mas de aplauso. Assim, surpreende-me, de alguma forma, a posição do Partido Socialista nesta matéria, na medida em que ela foi uma das pedras de toque das intervenções que fez, e em que, inclusivamente, manifestou concordância com as posições do PSD e do Governo aquando da discussão da Lei n.° 11/90.

Portanto, Sr. Deputado António Barreto, entendo que a privatização do BPA está a correr normalmente, num esquema de oferta pública de venda, que é normal, que aos trabalhadores do BPA foram propiciadas todas as condições por parte do conselho de administração/aliás, como já aconteceu com outros processos de uma participação maior, e, como tal, não vejo nisto qualquer promiscuidade, palavra que, se bem me recordo, utilizou para condenar esta situação.

De qualquer modo, terei de aguardar os resultados de terça-feira para poder fazer uma maior reflexão sobre a privatização do BPA.

Quanto à questão levantada pelo Sr. Presidente do Tribunal dc Contas, devo salientar que o que referi, quando fui instado sobre esta matéria, foi que o Governo estava exactamente a aplicar a Lei n.° 11/90, que define a Comissão de Acompanhamento das Privatizações como órgão de acompanhamento, verificação e fiscalização de todo o processo das privatizações. Assim, foi nesse sentido que dirigi a minha resposta.

Nunca pretendi, de forma alguma, impedir o Sr. Presidente do Tribunal de Contas de conhecer os processos de qualquer privatização que seja desenvolvida, desde o início até ao seu final, e, aliás, devo salientar que, de acordo com a lei, basta que solicite ao Ministério das Finanças que pretende ter esse conhecimento e teremos todo o gosto cm prestar toda a informação ao Tribunal de Contas, aliás, como é nosso timbre.

A Sr.' Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

O Sr. António Barreto (PS): — Sr. Secretário de Estado, agradeço as suas informações e ficamos (ou, pelo menos, eu fico) ansiosamente à espera do dia 11 — não é?...

O Sr. Secretário de Estado das Finanças: —Dia 111

O Orador: —... — para saber um pouco mais sobre esta matéria

Apesar de tudo, gostaria agora de fazer uma brevíssima observação.

Em primeiro lugar, devo salientar que V. Ex.* não me respondeu à pergunta sobre a venda da participação do Jornal de Notícias...

O Sr. Secretário de Estado das Finanças: — Sr. Deputado, não lhe respondi porque, como sabe, esse processo é conduzido pelo meu colega, Dr. Albino Soares, Secretário de Estado Adjunto do Ministro Adjunto e da Juventude e, portanto, não estou na posse dos elementos necessários c não tenho perfeito conhecimento do dossier para lhe poder responder objectivamente, como seria meu desejo.

O Orador: — Mas posso concluir que, em breve, V. Ex.* poderá, eventualmente, ter a amabilidade de nos dar informações mais detalhadas!

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O Sr. Secretário de Estado das Finanças: — Certamente, Sr. Deputado!

O Orador: — Entretanto, gostaria de observar que fiquei esclarecido quanto aos seus sentimentos actuais e aos do Governo em relação ao processo de privatização do BPA e ficámos todos convencidos de que o Governo está satisfeito e contente com o que se está a passar c que considera que tudo é absolutamente normal e legítimo. Mas devo dizer que não mudei de opinião, pelo que as minhas preocupações não diminuíram, antes se mantêm.

Quanto aos direitos dos trabalhadores, gostaria de sublinhar — aliás já estava implícito no que eu disse — que receio muito seriamente que além de se utilizar o dinheiro do banco, isto é, o crédito do banco e os subsídios grátis dos accionistas, também se utilizem os direitos dos trabalhadores para criar uma estrutura política dc decisão no futuro do banco e que essa sim seja fundamental.

Como sabe, pode dirigir-se um banco com percentagens muito baixas, e isto é o que há de mais moderno. Aliás, tudo leva a crer que esteja a ser feita de forma gradual, segura e premeditada a construção de uma estrutura de decisão política. E quando digo política, não falo de política partidária, poderia ser, mas é mais vasto, pois o termo partidário vai lá dentro, como é, de facto, a decisão na organização. Receio, pois, que essa estrutura, esse núcleo duro, no fundo, a decisão fundamental do futuro esteja a ser construída laboriosa e metodicamente a partir do dinheiro do banco, dos subsídios dos accionistas e dos direitos dos trabalhadores. E é com estas três componentes: tijolo, argamassa e betão que se constrói a estrutura futura.

A Sr.' Presidente: —Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Finanças.

O Sr. Secretário de Estado das Finanças: — Não poderia agora deixar de fazer um esclarecimento adicional, que, aliás, era já minha intenção dar, mas que me falhou na exposição de há pouco.

Como já referi, a óptica do Governo no programa de privatizações não é a maximização da receita. Se eu estivesse preocupado com essa matéria, tinha proposto a privatização do BPA, da Centralcer ou do Totta & Açores em esquemas substancialmente diferentes daqueles que foram propostos. Portanto, não estamos preocupados em que as condições da linha de crédito venham, eventualmente, a diminuir o cash flow do banco em quatro ou mesmo em seis milhões de contos, se foram tomadas como boas as informações prestadas ao Sr. Deputado, até porque, de facto, os nossos propósitos são uma simbiose de objectivos a atingir, mas um deles, de facto, é a participação dos trabalhadores, que consideramos essencial num programa de privatizações.

Por outro lado, ao longo deste processo c após a aprovação da Lei n.° 11/90, diversos trabalhadores de diversas empresas públicas já privatizadas e a privatizar — posso referir-lhe especificamente os trabalhadores do Banco Fonsecas & Burnay, da Cimpor, do Banco Totta & Açores, do Banco Português do Adântico e da Cecil — fizeram, formalmente, ao Governo propostas no sentido dc que lhes era fundamental ter uma voz e um voto concertado na assembleia geral para poderem participar efectivamente nos destinos futuros do banco e propunham ao Governo, das duas uma: ou a constituição de sociedades de gestão de participações sociais ou a dc um fundo dc investimento imobiliário que permitisse vir a concentrar

essas acções, de modo a dar-lhes a possibilidade de ter uma voz activa concertada na assembleia geral.

Entendemos esta posição ou, melhor, este instrumento como, de facto, um instrumento válido de acordo com o espírito da Lei n.° 11/90, em termos de participação dos trabalhadores neste processo e, sobretudo, com as orientações do próprio Governo nesta matéria. Daí que esteja em tramitação no Governo um projecto de decreto--lei que irá permitir adaptar as condições a que deve obedecer o fundo de investimento imobiliário, onde os trabalhadores que o entenderem e o desejem coloquem as suas acções, de forma a terem uma voz e um voto concertado na respectiva assembleia geral.

Aliás, Sr. Deputado, recordo que na discussão da Lei n.° 11/90, nesta Assembleia, o Partido Socialista fez uma proposta nesse sentido, isto é, de expressamente se considerar no texto da lei a possibilidade de os trabalhadores se agregarem num fundo de investimento imobiliário e como tal acorrerem às privatizações. Assim, nessa altura, referimos que isso não necessitaria de estar na lei, porque se esse fosse o desejo dos trabalhadores, certamente se criariam os instrumentos adequados para esse efeito. E aqui está!

Deste modo, não vejo, de forma alguma, como é que o Sr. Deputado —pelo que se pode depreender das suas palavras— pode recear uma participação concertada dos trabalhadores na assembleia geral e na vida futura de uma empresa.

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

O Sr. António Barreto (PS): — Sr. Secretário de Estado, devo lembrar a V. Ex.* que, no diálogo que travámos, frisei sempre que me referia ao Secretário de Estado, mas devo salientar que não sei, sequer, se o Sr. Secretário de Estado é membro do PSD e que nunca falei no PSD. Agora, o Sr. Secretário de Estado fala-me do PS; é evidente que estou aqui ao serviço do meu partido mas também ao serviço do Parlamento, de mim próprio e do País, portanto, também aqui há uma simbiose.

Concluo das suas palavras que o Sr. Secretário de Estado tem uma preferência pelo corporativismo com cara nacional ou com identidade nacional, em detrimento do mercado, mesmo do mercado com cara nacional e, ainda mais, do mercado com cara exterior, por isso optou por essa simbiose, em que deu relevo, direitos e subsídios a esse corporativismo. Foi bom que o Sr. Secretário de Estado tenha explicitado esta preferência.

A Sr.* Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, esta é uma questão interessante, que mereceria ser discutida aprofundadamente, mas não é esta a altura própria de o fazer, do meu ponto dc vista, dado o tempo disponível.

Recordo-me que, antes de 1974 — não sei se o Sr. Secretário de Estado estará recordado ou se conhecerá o facto—, também sc verificou, em Portugal, a aquisição dc um banco por uma determinada pessoa, que não tinha qualquer dinheiro para o fazer, mas conseguiu comprá-lo com o dinheiro desse mesmo banco.

Esta situação que se está a criar, agora, com o BPA é uma situação idêntica c estava quase inclinado a dizer que

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isto seria um management by out muito enviesado, muito distorcido e pouco claro, mas é mais do que isso...

O Sr. Secretário de Estado das Finanças: — Nao tenho culpa que o Sr. Deputado...

0 Orador: — Ainda não acabei. Certamente que o Sr. Secretário de Estado não tem qualquer culpa daquilo que cu possa fazer ou dizer.

Esta questão não é assim tão simples nem tão linear como o Sr. Secretário de Estado pretendeu fazer crer, porque a empresa que foi criada tem outros interesses, para além dos trabalhadores, que estão a influir no processo e são eles, de facto, que vão gerir o banco no futuro, se isto se concretizar, e não os trabalhadores.

Já agora, gostava de lhe pôr a questão concreta, que é a seguinte: essa linha de crédito foi aberta com conhecimento e com o consentimento da tutela? Qual é o valor global dessa linha de crédito aberta? Há ou não limites diferentes, nessa linha dc crédito, para os diversos níveis de pessoal do BPA, para serem utilizados na aquisição das acções que podem subscrever?

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Finanças.

O Sr. Secretário de Estado das Finanças: — Sr. Deputado, quer nas suas palavras, quer na exposição do Sr. Deputado António Barreto, houve, dc alguma forma, algumas críticas à participação dos trabalhadores e às formas de apoio a essa participação na privatização dos bancos? É considerada negativa, digamos, a possibilidade de esses trabalhadores virem a poder ter um instrumento no sentido de concentrarem as suas acções, por forma a terem um voto e uma voz na assembleia geral? É isto que está em causa? Ou o Sr. Deputado quer equiparar o caso que referiu, anterior a 1974, ao caso do fundo de investimento mobiliário criado pelos trabalhadores?

Das duas uma, ou o Sr. Deputado esclarece objectivamente aquilo que quer, porque não percebo a pergunta...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Posso interrompe-lo?

O Orador: — Faça favor.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, eu fiz um comentário e, depois, fiz-lhe três perguntas concretas. Primeira: a linha de crédito que, para o efeito, foi aberta no BPA foi-o com o conhecimento c com o consentimento da tutela? Segunda: qual é o montante dessa linha de crédito? Terceira: os limites individuais para recurso a essa linha de crédito são iguais para todos os empregados do banco ou são diferenciados de acordo com os vencimentos, com as funções ou com qualquer outra coisa?

O Orador: — Em primeiro lugar, a competência do estabelecimento das linhas de crédito é dos respectivos conselhos de administração; portanto, não são feitos com o consentimento, nem tão-pouco com o conhecimento da tutela, porque tal não é necessário. São da competência expressa dos respectivos conselhos de administração. Haverá empresas que o podem fazer e haverá outras que não; portanto, dependerá apenas de uma decisão do conselho de administração de cada empresa.

Em segundo lugar, no que se refere ao montante da linha de crédito, direi que, no limite do universo, admitindo

que lodos os trabalhadores do BPA recorriam, na totalidade,

a linha de crédito, ela não ultrapassaria 6,75 milhões de contos.

Em terceiro lugar, o número de acções do BPA que cada trabalhador pode subscrever tem em conta o tempo

de serviço prestado no banco, aliás de acordo com o que

vem estabelecido no n.° 2 do artigo 12.° da Lei n.° 11/90.

Portanto, as condições da linha de crédito são da absoluta competência do conselho de administração do banco. Aliás, o conselho de administração do BTA também não me pediu qualquer autorização, porque a fixação dessas condições estava no âmbito das suas competências para o estabelecimento.

O Sr. António Barreto (PS): — Dá-me licença, Sr.* Presidente?

A Sr.' Presidente: — Sr. Deputado, é sobre esta mesma matéria?

O Sr. António Barreto (PS): — É sim.

A Sr.* Presidente: — Tem, então, a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Barreto (PS): — Sr.* Presidente, o Sr. Secretário de Estado fez-me uma pergunta e, portanto, queria responder-lhe. O Sr. Secretário de Estado perguntou se estavam implícitas nas minhas palavras —e nas do Sr. Deputado Octávio Teixeira, mas só posso responder por mim, como é óbvio— algumas críticas.

Sr. Secretário de Estado, há alguma crítica. Em primeiro lugar, o facto de não haver uma lei geral para a organização desses fundos, para a participação dos trabalhadores, etc., c, por conseguinte, parece que a participação dos trabalhadores, com esse paradigma filosófico e social que. o Sr. Secretário de Estado está a indicar, está a ser feita à medida.

É o paradigma do alfaiate, pois numas empresas cria-se o paradigma e noutras não, mas não temos qualquer lei geral sobre esse assunto que enquadre, englobe e dê força legal a isso.

Sc bem recordo, e o meu camarada e amigo Manuel dos Santos teve o cuidado de me informar, o PS — já que o Sr. Secretário de Estado fala tanto no meu partido — já propôs que houvesse uma lei geral sobre esse assunto, o que até hoje não aconteceu. Por conseguinte, há implícita uma crítica à participação dos trabalhadores nestes exactos termos que acabo de sublinhar.

Em segundo lugar, gostava dc reafirmar o que disse há pouco, isto é, não considero que, tal como as coisas estão a ser feitas, se esteja, apenas, a tratar da participação dc trabalhadores no capital de um banco a privatizar e da sua associação, mas, sim, que se estão a utilizar os direitos dos trabalhadores para a construção de uma estrutura do poder político na banca que, seguramente, não vai ser exactamente aquilo que o Sr. Secretário de Estado diz.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): —É evidente!

O Orador: —Finalmente, creio que neste conceito de trabalhadores dos bancos c das empresas públicas se estão sempre a incluir os gestores públicos. Devo dizer-lhe que não considero o gestor público como um trabalhador de

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uma empresa. Um gestor público é uma pessoa de nomeação política, não é um trabalhador normal como os outros, e, portanto, é uma falácia ajudar e promover a participação dos gestores públicos na decisão política das empresas a privatizar e chamar-lhes trabalhadores, ou beneficiar os gestores públicos à custa do crédito da banca que eles decidem e à custa dos direitos dos trabalhadores. Um gestor público é uma pessoa que está em serviço político e não um trabalhador.

Vozes do PS: — Muito bem!

A Sr.* Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado das Finanças.

O Sr. Secretário de Estado das Finanças: — Era apenas para esclarecer que não há qualquer fundo dc investimento mobiliário criado, nem pode haver, pois não há lei que o permita.

Como sabe, os fundos de investimento mobiliário têm determinadas regras específicas a que têm de obedecer; por exemplo, qualquer participação não pode exceder 10 % da estrutura dos capitais do fundo.

Os fundos de investimento mobiliário que estão, neste momento, institucionalizados têm características específicas que não se adaptam a este fundo. Neste momento, já o referimos publicamente, estamos a elaborar um projecto de decreto-lei que venha a contemplar a possibilidade da constituição desses fundos por parte dos trabalhadores que o entenderem fazer. Portanto, neste momento, não existe qualquer fundo de investimento mobiliário criado para este efeito.

Entendo que é, de alguma forma, paternalista considerar que estes fundos de investimento mobiliário possam, dc alguma forma, ser utilizados como forma de manipulação dos direitos dos trabalhadores. São eles próprios que os constituem, que elaborarão os seus estatutos e serão eles próprios que votarão a constituição dessas sociedades.

Por último, quanto à questão da participação dos membros do conselho de administração nas privatizações, posso dizer-lhe que podem comprar até ao limite máximo que é possível a cada trabalhador. Estamos a falar dc 150 acções, Sr. Deputado!

No caso do BTA falámos cm 150 acções c no caso do BPA falámos num limite máximo, com um tempo de serviço máximo, de 250 acções. É nisto que estamos a falar. Esta é a realidade objectiva e aquela na qual o Sr. Deputado, entendo eu, deve também ponderar na sua análise. Portanto, acho que não é excessivo a um conselho de administração de um banco permitir aos seus elementos que subscrevam 150 ou 250 acções, se o entenderem.

O Sr. António Barreto (PS): — Nem uma, Sr. Secretário de Estado!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Pelo amor de Deus!

A Sr.* Presidente: — Sr. Secretário de Estado, gostava de intervir também sobre esta matéria. Vamos chamar as coisas pelos seus nomes.

O que se passa é o seguinte: dois bancos públicos foram privatizados, mas os seus presidentes continuam a ser os mesmos. O Sr. Secretário de Estado pode dizer que tudo isto é completamente transparente e claro, ou o que quiser, mas, para todos os efeitos, não pode ser. Então, quem

tomava melhor conta da defesa do sector público é quem defende melhor o sector privado? O Sr. Secretário de Estado dirá o que quiser, mas só o senhor é que acredita nisto... e, talvez, também o presidente do sector público.

O Sr. Rui Carp (PSD): — Sr.* Presidente, os dois bancos públicos que foram privatizados são o Banco Totta & Açores e é, nesta fase inicial, o Banco Português do Atlântico.

Os corpos sociais do BTA serão eleitos, ao que julgo, no dia 9 de Janeiro de 1991 e a lista que é proposta à assembleia geral desse banco é proposta pelo seu maior accionista. O seu presidente é o presidente da Valores Ibéricos — Sociedade de Gestão de Participações Sociais, SA, Dr. José Roquete, que entendeu propor —e nós achamos muito bem — o Dr. Alípio Dias como presidente da comissão executiva. Portanto, sejamos objectivos.

A Sr.* Presidente: — Objectivíssimos!

O Sr. António Barreto (PS): — Uma coisa lhe digo, Sr. Secretário de Estado, lá claríssimo é!

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — O melhor que o Sr. Deputado terá a fazer é perguntar aos accionistas privados, que propuseram os corpos sociais à assembleia geral, a razão de ser das suas propostas, porque não fui eu que as fiz.

Enquanto o BPA for maioritariamente público, certamente que me caberá a mim propor a lista dos corpos sociais, mas, no momento cm que o capital deixe de ser maioritariamente público, entendo que devem ser os accionistas privados a propor esses corpos sociais; portanto, esse esclarecimento só lhe pode ser dado pelos accionistas privados.

Neste momento reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Rui Machete.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): — Ainda sobre esta matéria, queria pronunciar-me sobre dois pontos. O primeiro, de que prescindo, tinha a ver com a futura participação dos trabalhadores no capital social a privatizar ou privatizado dos bancos, porque o PSD não tem dúvidas de que o Governo acompanhará com atenção essa participação de modo a evitar que ela, ao abrigo dc um regime especial e muito louvável — não diria que seria um capitalismo popular, mas é, efectivamente, uma participação da força do trabalho no capital social desses bancos —, não sirva, posteriormente, através dc acordos mais ou menos claros, para outros grupos de accionistas deterem a maioria na decisão do capital social desses bancos.

Nós louvamos nessa boa fé e, portanto, não temos dúvidas de que essa bondade do sistema não será alterada por esses mecanismos.

Mas, quanto ao outro aspecto, penso que é mais grave o que a Sr.* Deputada Helena Torres Marques aqui referiu, relativamente ao futuro presidente do conselho executivo desse banco. É mais grave porque está a suscitar um problema dc incompatibilidade entre as conotações porventura partidárias ou mesmo gestionárias desses gestores e a sua possibilidade dc deterem competências gestionárias nesses mesmos bancos.

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Falou no caso do Dr. Alípio Dias —enfim, podemos citar as pessoas —, que foi deputado do PSD. Porém, estou, por exemplo, a lembrar-me do caso da Tranquilidade, cujo presidente nunca foi conotado com o PSD. E estou a olhar para a bancada do PS porque penso não estar a mentir se disser que o Dr. Redondo Lopes, um dos expoentes de gestão em matéria de seguros, sempre esteve próximo do PS. Não sei se é filiado, nem me interessa. O que interessa é que o Dr. Redondo Lopes é um dos melhores gestores no sector da actividade seguradora e sempre esteve conotado com o PS; não obstante o grupo privado que assegurou a maioria no capitai da Tranquilidade o ter convidado — suponho que ele aceitou — para continuar à frente do conselho de administração da Companhia de Seguros Tranquilidade.

Portanto, penso que é muito grave criar aqui uma espécie de estrela de David, como Hitler criava para os judeus, dizendo que quem fizer isto não pode ser gestor de empresas públicas.

Infelizmente que o PS tem um pouco essa tendência, a qual penso ser grave, uma vez que, como partido de alternância do poder, deve olhar os gestores pela sua capacidade, isenção e seriedade e não pelas conotações partidárias que possam trazer atrás de si.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Barreto.

O Sr. António Barreto (PS): — Sr. Deputado Rui Carp, gostaria que ficasse registada em acta a parte final da sua intervenção, pois subscrevo-a integralmente. Com efeito, devemos todos zelar pela capacidade técnica, pela capacidade de decisão e pela isenção dos gestores públicos. Aliás, devo dizer-lhe que me é completamente indiferente que haja um socialista gestor público ou um socialista que, de gestor público, tenha passado a administrador privado. Contudo, considero que a nenhum gestor público nomeado pelo Estado para gerir empresas públicas deveria ser permitido adquirir, directa ou indirectamente, e independentemente do partido a que pertença, qualquer espécie de capital accionista na própria empresa que está a gerir.

E digo-lhe mais: penso mesmo que nem deveria poder ser administrador de empresas privadas do mesmo sector, tal como acontece com os ministros, os secretários de Estado, os directores-gerais, etc., e que a ninguém, directa ou indirectamente, envolvido num processo de privatização deveria ser permitido, durante um período de uês, cinco ou 10 anos —poderemos discutir o prazo—, participar no capital privatizado de uma empresa pública.

O Sr. Deputado Rui Carp já me conhece um bocadinho, eu já o conheço um bocadinho, e, portanto, devo dizer-lhe que isto é completamente sincero.

Por conseguinte, é-me indiferente que o gestor seja socialista, social-democrata ou democrata-cristão. A nenhum deveria ser permitido efectuar esse tipo de operações! Quando o Sr. Secretário dc Estado dizia que só tinha 250, eu disse-lhe: nem uma! Gestor público, nem uma! É que só assim é que ele será verdadeiramente isento!

O Sr. Rui Carp (PSD): —Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Rui Carp pediu a palavra e eu vou dar-lha. Em todo o caso, Srs. Deputados, este debate é muito interessante, mas começamos a afaslar--nos um pouco da matéria especificamente orçamental.

O Sr. António Barreto (PS): — Começamos a afastarmos só um bocadinho...

O Sr. Presidente: — Só um bocadinho grande... Tem então a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): — Sr. Presidente, eu não queria entrar cm diálogo, pois penso que estamos também a extravasar um pouco da matéria que aqui nos reúne.

De qualquer modo, o que foi dito pelo Sr. Deputado António Barreto pode entrar no domínio da capacidade de análise que o Estado, numa fase a posteriori e enquanto accionista das empresas, pode fazer desses gestores, sejam eles quais forem.

O sector privado deve ter a capacidade de escolher o seu melhor gestor. Portanto, esse gestor pode ser um ex--gestor público, um gestor privado ou um ex-gestor público de outra empresa que não aquela a privatizar.

Compreendo perfeitamente o que o Sr. Deputado António Barreto aqui acabou de referir. Tem a ver com problemas de suspeição, de isenção, durante todo o processo de privatização. Porém, isso deve ser encarado como um factor de análise ou mérito do gestor em causa e não como um impedimento a que ele possa permanecer na mesma empresa.

Não estou a ver tanto o caso da banca, mas o dos seguros, cm que se exige um grau de especialização muito elevado. É que pode até verificar-se uma situação em que, entre o gestor que já lá estava como presidente e outro gestor, o primeiro era o melhor. Então, se ele for, de facto, o melhor, por que razão é que não poderá ser convidado a permanecer?

Está no íntimo do próprio gestor aceitar ou não e, portanto, o que pode acontecer é ele entender que não deve continuar — essa é outra ordem de valores. Portanto, não obstante ser de um partido da oposição ou do partido da situação, se ele aceitar continuar, esse é um problema pessoal, pois, a partir daí, a empresa já não é do Estado, mas dos accionistas maioritários.

Por conseguinte, o que nós, enquanto políticos, devemos fazer é fiscalizar e verificar se em todo o processo de privatização c até ao momento da privatização propriamente dita houve alguma falta de transparência e de isenção.

Volto a dizer que compreendo as preocupações do Sr. Deputado António Barreto, embora não comungue das suas conclusões.

O Sr. António Barreto (PS): — Há países muito mais liberais e que são muito mais exigentes nesta material

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel dos Santos.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: No final deste ano a gasolina subiu três vezes. Não tenho nada contra os aumentos do preço da gasolina, mas estes foram sempre apontados pelo Governo como consequência da crise do Golfo, particularmente da subida média do preço do crude nos mercados internacionais.

Com algum espanto, verificámos que países que assumiram uma postura semelhante e que encontraram justificações análogas, uma vez que o crude se estabilizou a partir de determinado momento, têm feito correcções para baixo.

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Portanto, gostaria de saber se, à semelhança daquilo que se passou, por exemplo, em Espanha (já por duas vezes), está prevista alguma baixa do preço da gasolina ou se o Governo assume —como, aliás, tem sido a minha opinião desde o início— que os aumentos do preço da gasolina tiveram muito pouco a ver com os aumentos do crude, mas com o ritmo de cobranças do Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e que, portanto, os aumentos verificados — obviamente introduzidos também por via de alterações no preço das ramas— tiveram um objectivo fiscal, isto é, o de cumprir a receita fiscal que estava programada.

De resto, um recente documento que chegou agora à nossa mão permite verificar que, curiosamente, a estimativa da receita deste imposto para o fim do ano se situa, praticamente, no ponto que inicialmente tinha sido previsto.

Em suma: assume o Governo que a alteração do preço dos combustíveis é, fundamentalmente, uma alteração de natureza e justificação eminentemente fiscais ou continua a insistir na propaganda televisiva de que esse aumento se deve apenas às peculiares condições que se verificam na região do Golfo?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais: — Sr. Deputado Manuel dos Santos, estou a falar de memória e, portanto, não vou referir números exactos. Porém, posso dizer-lhe que todos os países das Comunidades Europeias, já com baixas recentes, registaram uma trajectória evolutiva dos preços do petróleo. Contudo, se considerarmos o dia 20 de Novembro, verificamos que, dos oito países das Comunidades Europeias que fizeram oscilar os preços, seis encontram-se com uma elevação dos preços superior à que Portugal regista, incluindo o aumento dos preços verificado anteriormente à crise do Golfo.

Por conseguinte, isto significa que, devido às respectivas estruturas de mercado, a evolução dos preços nos diferentes países oscilou muito mais do que em Portugal. Numa primeira fase subiram bastante, depois desceram um pouco, mas, repito, em 20 de Novembro — data dos últimos dados que tenho disponíveis sobre a estrutura de preços praticados na Europa—, seis países das Comunidades Europeias registavam ainda percentagens dc crescimento, após a crise do Golfo, superiores à portuguesa.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não há mais inscrições e, portanto, terminámos a análise, em termos de Orçamento, do Ministério das Finanças.

Segue-se o Ministério da Administração Interna. De qualquer modo, gostaria de dar-vos uma indicação de como é que me proporia orientar os trabalhos cm termos de votações, para ver se há algumas discrepâncias ou se há concordância nessa matéria.

De qualquer modo, gostaria de agradecer aos Srs. Secretários de Estado dos Assuntos Fiscais, das Finanças e do Orçamento a sua participação, que foi muito útil.

Pausa.

Srs. Deputados, como VV. Ex." se recordarão —já o ano passado tivemos oportunidade dc discutir esta matéria—, entendo que, do ponto dc vista jurídico, com a revisão constitucional e a revisão do Regimento, as coisas passam-se hoje dc modo diverso, em termos de distribuição

entre o Plenário e as comissões, do que existia anteriormente, muito embora a Lei do Enquadramento Orçamental não tenha ainda sido alterada.

Como se recordarão, chegámos o ano passado a uma solução compromissória, no sentido de que manteríamos, essencialmente, o esquema de divisão que tínhamos seguido anteriormente e que consta da lei do enquadramento, isto é, que as receitas seriam votadas no Plenário, seguidas das votações finais globais das propostas de lei do Orçamento do Estado e das Grandes Opções do Plano, sendo que apenas a parte relativa às despesas seria votada na Comissão.

Como há pouco tive ocasião de vos referir, julgo que estamos vinculados a seguir este procedimento. No entanto, é o último ano da legislatura e fizemo-lo no ano passado.

Por outro lado, é natural que, pela sua relevância política, algumas matérias levem os grupos parlamentares a preferir transferir a sua votação para o Plenário.

Por conseguinte, em vez de estarmos a vê-las uma a uma, suponho que vou ao encontro do interesse dos diversos grupos parlamentares —repito que não somos, contudo, obrigados a adoptar este procedimento e, em rigor, carecendo de uma votação para a avocação— se mantiver a orientação do ano passado.

Assim, faríamos uma divisão do articulado a ser votado aqui na Comissão e no Plenário nos moldes tradicionais, sem prejuízo de algum aspecto que, mesmo de acordo com essa divisão, possa ser aqui avocado pelo Plenário.

Suponho que esta proposta merece consenso...

Pausa.

Nestes termos, interpretaria o vosso silêncio como manifestação desse mesmo assentimento.

Assim sendo, e se VV. Ex." quiserem ter a amabilidade de pegar no texto do articulado da proposta de lei n.° 163/V, iríamos verificar rapidamente, para ver se não há divergências, os artigos que votaríamos amanhã na Comissão.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr. Presidente, iríamos verificar se eu tivesse aqui o Orçamento à minha frente...

O Sr. Presidente: — Bem, eu presumia que o Orçamento fosse algo que os Srs. Deputados tivessem à mesa-de-cabeceira, ao pequeno-almoço, ao almoço... Não sendo esse o caso, vamos aguardar uns minutos.

Pausa.

Já temos entre nós o Sr. Ministro da Administração Interna e o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna. Porém, se os Srs. Membros do Governo nos dessem licença, iríamos só ultimar uma questão que facilitará os nossos trabalhos de amanhã e que, prometo, será rápida.

Srs. Deputados, em relação ao artigo 1.°, relativo à aprovação dos mapas, é evidente que se seguirmos esta orientação, o mapa I «Receitas do Estado» será votado em Plenário, visto que se traia de receitas; o mapa n «Despesas por departamentos do Estado e capítulos» será votado em comissão; o mapa in «Despesas por agrupamentos económicos» será votado em comissão; o mapa IV «Classificação funcional das despesas públicas» será votado em comissão; quanto ao mapa v «Receita global dos fundos e serviços autónomos por classificação orgânica»

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penso que será preferível votá-lo em Plenário; o mapa vi «Despesas dos serviços, institutos e fundos autónomos por classificação orgânica» seria votado em comissão; o mapa vn «Despesas dos serviços, institutos e fundos autónomos por agrupamentos económicos» seria votado em Plenário; o mapa vm «Despesas dos serviços, institutos e fundos autónomos por classificação funcional» seria votado em comissão.

Quanto ao mapa rx «Orçamento da Segurança Social para 1991» há aqui uma questão sobre a qual gostaria de vos ouvir, pois este mapa inclui um orçamento de receitas e de despesas. Se VV. Ex." preferirem, votamos as receitas em Plenário e as despesas em comissão ou tudo globalmente...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, sugeria que, quanto aos mapas que estão nessa situação — sinceramente que não sei sc é só esse —, votássemos a parte das despesas em comissão e a parte das receitas em Plenário.

O Sr. Presidente: — São dois mapas nessa situação: o mapa rx, que já referi, e o mapa X «Finanças Locais»...

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Aliás, Sr. Presidente, há aí um problema que poderemos ver depois, que c a questão da numeração dos mapas.

O Sr. Presidente: — Portanto, quanto ao mapa x, também votaríamos as receitas em Plenário e as despesas em comissão.

Relativamente ao mapa XI «PIDDAC», ele seria votado em comissão, uma vez que se refere a despesas.

Quanto ao artigo 2.°, seria votado em comissão; os artigos 3.°, 4.° e 5.°, em Plenário; artigos 6.° e 7.°, em comissão; artigo 8.°, em Plenário; artigos 9.° a 15.°, em comissão...

O Sr. Rui Carp (PSD): — Sr. Presidente, só tenho uma dúvida sobre o artigo 12.°, mas é em comissão...

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Rui Carp, o artigo 12.° «Concessão de empréstimos e outras operações activas» referc-se a empréstimos a conceder pelo Governo, que, neste caso, não é o mutuário mas o mutuante.

Como ia dizendo, os artigos 16.° a 21.° serão votados em comissão; os artigos 22.° a 42.°, em Plenário.

Quanto ao artigo 43.° «Fundo de Equilíbrio Financeiro», simultaneamente por razões de distribuição e de ordem política, seria votado em Plenário; o artigo 44.°, em comissão...

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — O artigo 44.°, em comissão?...

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, é que o artigo 44.° aborda uma questão menor — a regularização de dívidas à EDP— e penso não haver razões para que seja avocada pelo Plenário.

Continuando, penso que depois, a partir do artigo 45.° até ao fim, seria tudo votado em comissão.

O Sr. Manuel dos Santos (PS): — Sr. Presidente, é tudo votado em comissão até ao artigo 59.°?...

O Sr. Presidente:—Exacto, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Carp (PSD): —Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Rui Carp (PSD): — Sr. Presidente, nós temos algumas propostas de alteração a apresentar e gostaríamos de saber como é que irá desenvolver-se o processo de entrada e votação dessas propostas.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o trabalho da Mesa será bastante facilitado se essas propostas puderem ser entregues até ao início das votações de amanhã. É evidente que, se, por qualquer motivo, algum grupo parlamentar tiver um atraso e entregar mesmo durante a votação, a proposta será considerada.

Por outro lado, o que estamos a pedir, aliás à semelhança de outros anos, é a boa vontade em termos organizatórios, pois só com a votação no Plenário é que preclude o direito de apresentar propostas, embora isso pressuponha a avocação ou o cumprimento deste esquema que acabei de vos apresentar.

Por conseguinte, o que é desejável, para evitarmos qualquer situação desagradável e até, eventualmente, de algum melindre, é que as propostas sejam apresentadas até ao início das votações de amanhã ou mesmo, se houver algum atraso, antes da votação do artigo que está a ser considerado.

Srs. Deputados, para terminar esta nossa ronda pelos diversos ministérios cm termos de análise, na especialidade, do Orçamento do Estado para 1991, vamos fechar com o Ministério da Administração Interna

Pergunto ao Sr. Ministro se quer começar por fazer uma sucinta exposição introdutória sobre o orçamento do seu Ministério, o que, eventualmente, permitirá ganhar tempo.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Manuel Pereira): — Obrigado, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Aquilo que gostaria de transmitir relativamente ao orçamento do Ministério da Administração Interna não é muito mais do que aquilo que já tive o prazer de informar junto da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República

Por outro lado, gostaria de transmitir a VV. Ex." que, dentro do esquema que seguimos no Ministério da Administração Interna para a gestão e acompanhamento do orçamento, existe uma responsabilidade a nível do Governo —que, neste caso, cabe ao Sr. Secretário de Estado da Administração Interna— para a preparação e execução do orçamento.

Comprccndcr-se-á esta nossa preocupação na existência de uma entidade governamental coordenadora do orçamento, uma vez que, como sabem, se registam variadíssimos orçamentos autónomos ao nível do Ministério.

Portanto, quer isto dizer que, relativamente aos pormenores, o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna estará muito mais vocacionado do que eu para lhes prestar alguma informação neste campo.

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Antes de mais, gostaria dc lhes dizer que o peso das despesas do Ministério da Administração Interna cm relação as despesas do Estado aumenta de 7,6 %, em 1990, para 7,8 % em 1991, passando, portanto, de 63 milhões para 80 milhões de contos, o que significa um aumento de 17 milhões de contos, representativos de um aumento de 26 %.

É evidente que o novo sistema retributivo da função pública é o principal responsável por este crescimento orçamental. Porém, mesmo isolando os seus efeitos, e através de um exercício que fizemos relativamente ao primeiro semestre do ano em curso, verifica-se que teremos um crescimento real do orçamento do Ministério situado em 12,5 %, ou seja, 8,8 milhões de contos.

Nestes números não se entra em linha dc conta com as pensões de reserva, uma vez que estas constam do orçamento do Ministério das Finanças, sendo transferidas com uma periodicidade regular para o orçamento das forças de segurança.

Para além do montante dos 80 milhões de contos incluídos no Orçamento do Estado, há outros montantes de que beneficiam alguns serviços dependentes do Ministério da Administração Interna, como é o caso das verbas do PIDDAC, das contas dc ordem e dos fundos e serviços autónomos.

Se considerarmos todas estas verbas cm termos líquidos, não incluindo, portanto, as transferências —para evitar uma dupla contagem —, e se se considerar ainda a inclusão do Serviço Nacional de Protecção Civil, teremos um orçamento global de, aproximadamente, 95 milhões de contos, distribuídos da seguinte maneira: Orçamento do Estado, 80 milhões de contos; as contas de ordem do Serviço Nacional dc Bombeiros e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, 3 932 900 contos; o PIDDAC, que, como sabem, também sc distribui por três PIDDAC (do Ministério da Administração Interna, do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações e do Ministério do Planeamento e Administração do Território), cerca de 4 256 000 contos; os fundos e serviços autónomos, aproximadamente, 6 030 000 contos; e o Serviço Nacional de Protecção Civil, 794 000 contos.

Se se comparar este valor com o montante de 1990, integrante das mesmas componentes, teremos um crescimento de 18,84 milhões de contos, ou seja, mais 1,84 milhões de contos além do crescimento para o Orçamento do Estado.

O peso relativo das forças de segurança no orçamento global do Ministério é de 92,1 %: a PSP com 49,5 % e a GNR com 42,6 %.

Com o Orçamento de 1991 será possível continuar o programa de reforço dos efectivos da PSP, como primeira prioridade do Ministério. A partir dc 1 dc Janeiro de 1991 a PSP terá 1200 novas unidades e a Guarda Nacional Republicana mais 350.

Gostaria de lhes transmitir que o orçamento traduz, neste aspecto, uma prioridade do próprio Ministério da Administração Interna no que diz respeito as forças de segurança. A razão da existência de um maior peso no aumento das unidades da Polícia de Segurança Pública tem a ver, exactamente, com a estratégia seguida no sentido do reforço do policiamento e da prevenção nas áreas urbanas. Segundo os nossos indicadores de segurança interna, as áreas urbanas são responsáveis por cerca de 75 % da criminalidade e é nessas áreas que ela mais aumenta. Daí que, numa primeira abordagem, se tivesse considerado muito mais importante o aumento das unidades da Polícia dc Segurança Pública responsáveis pela vigilância dessas zonas.

Por outro lado, através da política seguida pelo Ministério da Administração Intema, na clara definição das funções que cabem a cada uma das forças de segurança, estipulou-se que à Polícia de Segurança Pública caberá, essencialmente, o policiamento das áreas urbanas, considerando-se como tal os locais com mais de 10 000 habitantes. À Guarda Nacional Republicana, conforme a sua vocação tradicional, competirá, essencialmente, o policiamento das áreas rurais. Daí, portanto, a diversidade das prioridades dadas à PSP e à GNR.

Devo dizer-lhes que as 1200 unidades que entrarão em efectividade de funções na Polícia de Segurança Pública a partir de 1991 foram já treinadas este ano na Escola Prática dc Polícia.

Relativamente às 350 unidades que ingressarão na Guarda Nacional Republicana, a nossa prioridade foi para o reforço da Brigada de Trânsito, que, por si só, receberá 230 unidades.

Para além do reforço de pessoal, será também possível concretizar um outro tipo de realidades, entre as quais modernizar o equipamento do Ministério; continuar com o plano de construção e reparação das instalações; melhorar substancialmente o contingente das viaturas das forças de segurança e continuar com o projecto de remodelação da rede de transmissões da Polícia de Segurança Pública — e convém fazê-lo agora, pois está a ser transformada toda a rede de transmissões do Comando Distrital de Lisboa —; equipar a Guarda Nacional Republicana com três novos helicópteros; e reforçar a rede de informática da Secretaria--Geral e dos governos civis, tendo em vista melhorar o sistema de emissão dc passaportes c de apuramento dos resultados eleitorais.

Em relação ao orçamento anterior, o Serviço Nacional de Bombeiros regista um valor orçamental de mais 479 000 contos, sendo 200 000 relativos ao PIDDAC. Por sua vez, o Serviço Nacional de Protecção Civil conhece um decréscimo da ordem dos 270 000 contos, o que se deve ao facto dc se ter entendido não ser este o ano mais adequado para se enfrentar o problema da construção da sede do Serviço Nacional de Protecção Civil, pois, antes disso, há que saber, concretamente, o que vai ser a protecção civil, o que só ocorrerá com a aprovação da nova lei dc bases da protecção civil. Devemos, pois, começar pela estrutura, para só depois passarmos às necessidades de equipamento.

O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras apresenta um aumento de 400 000 contos, essencialmente destinado ao reforço de pessoal, com vista a 1993. Apenas para informação dos Srs. Deputados, esclareço que vai iniciar--se no próximo dia 11 um curso para 149 novos agentes do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, seguindo-se-lhe um concurso para selecção de mais 149 agentes. No entanto, a verba que referi destina-se também à informatização do processo.

Os governos civis aparecem, pela primeira vez, autonomizados no Orçamento do Estado para 1991 e o crescimento da verba que lhes é atribuída é relativamente reduzido cm relação às outras despesas, na medida cm que sc situa apenas cm 10 %.

Por seu lado, o Serviço de Informação e Segurança conhece um aumento de 42 % c os Serviços Técnicos para o Processo Eleitoral vêem a sua verba aumentada cm 200 %. Tais aumentos têm a sua justificação na abertura de delegações dos Serviços de Informação e Segurança no porto do Funchal e em Ponta Delgada e com a realização dc dois actos eleitorais no próximo ano.

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O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro. Tem a palavra a Sr." Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.° lida Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, começarei a minha apreciação pelo Serviço Nacional de Bombeiros e pelo Serviço Nacional de Protecção Civil.

As verbas que o Sr. Ministro acabou de referir —e que, aliás, já tínhamos detectado no Orçamento do Estado— revelam não haver crescimento, em termos reais, nos montantes que foram atribuídos a qualquer destes serviços. Posso até afirmar que, pelo contrário, em termos reais há mesmo um decréscimo dessas verbas.

No orçamento global do Serviço Nacional de Protecção Civil dá-se apenas um crescimento de 2,8 %, o que significa um decréscimo, em termos reais, da ordem dos 10 %. O orçamento do Serviço Nacional de Bombeiros tem um crescimento global da ordem dos 5,6 %, o que significa, em termos reais, um decréscimo que rondará os 8/9 pontos, em função da taxa dc inflação em 1991.

A questão que se põe, Sr. Ministro, é a seguinte: como todos sabemos —nós e todas as entidades, incluindo o Governo—, durante a época dos incêndios fizeram-se promessas, falou-se da importância dos bombeiros, da importância da protecção civil, o mesmo acontecendo, aliás, na época das cheias. Só que depois, quando chega ao momento crucial de dotar essas entidades com as verbas necessárias para o seu funcionamento normal, para a compra do equipamento que se impõe, a fim dc darem resposta aos problemas do País, não há verbas.

As razões para que isso aconteça podem ser muitas, mas a realidade nua e crua é que vemos terem ficado perdidos pelos caminhos do Orçamento os 2 milhões de contos que o Sr. Ministro considerou ser a verba necessária para o Serviço Nacional de Bombeiros.

Na comissão eventual que tratou do problema dos fogos florestais tivemos ocasião de falar com vários responsáveis por esses organismos, entre eles o presidente do Serviço Nacional de Bombeiros. A nível descentralizado, ouvimos também responsáveis das comissões especializadas de fogos florestais (CEFF), e todos eles foram unânimes ao queixarem-se da falta de verbas e a dizerem que as verbas de que dispõem não lhes permitem comprar máquinas para responder, eficazmente, ao combate aos incêndios. Todos se referiram à falta dc meios, nomeadamente dc meios aéreos, e eu recordo que o próprio Governo fez publicar, no Diário da República de 11 de Setembro de 1990, um despacho conjunto, que o Sr. Ministro também assinou, e que dizia: «Havendo necessidade dc acordar com o Estado--Maior do Exército a colaboração a prestar pela engenharia militar, no âmbito das infra-estruturas florestais, para o ano de 1991, deverá a Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais, com a colaboração do Serviço Nacional de Bombeiros, elaborar um plano de infra-estruturas para aeronaves de combate aos fogos florestais no prazo dc 60 dias a contar da data deste despacho, cobrindo todo o território de Portugal continental e com especial incidência nas áreas criticas.»

Concluo, portanto, que, neste momento, o Sr. Ministro já tenha na sua mão esse levantamento e que, certamente, já estarão tomadas algumas medidas sobre o plano de infra--estruturas para aeronaves de combate aos fogos florestais. Admito que isso já esteja feito! Só que, como não sei se estão as respectivas verbas, gostava que o Sr. Minisuo me informasse.

Vou passar por cima da questão, importante, que tem a ver com o estatuto de bombeiros, cujo debate deve ser

feito na devida sede, nomeadamente a alteração do Decreto--Lei n.° 418/80. Nao quero falar sobre isso, nem das implicações que toda essa reestruturação terá, se for feita a muito curto prazo — provavelmente já no próximo ano —, no plano orçamental. Espero que o problema seja aqui debatido e resolvido com a devida brevidade, a fim de ficarmos a par de todas as questões ligadas à criação da Escola Nacional de Bombeiros, à informatização, à necessidade de técnicos para as inspecções em edifícios, por exemplo, cujo regulamento já foi publicado, mas para as quais, segundo creio, não há técnicos em número suficiente para garantir uma intervenção eficaz dos bombeiros. Julgo que no orçamento não há também resposta para isso, mas o Sr. Ministro di-lo-á.

De qualquer forma, o problema que se põe é o da necessidade de dotar não só o Serviço Nacional de Bombeiros mas também as CEFF com as verbas necessárias para responder a um problema tão sério como este, a fim de não voltarmos, em 1991, a ter pela frente a falta de meios a combater os fogos florestais e, até mesmo, para cometer aos bombeiros toda a responsabilidade que lhe tem sido atribuída, mas a que não se dá depois, por falta dc verba, os meios necessários para actuarem.

Relativamente ao Serviço Nacional dc Protecção Civil, o Sr. Minisuo começou por dizer que não sabe bem o que vai ser esse serviço, uma vez que só no próximo ano deverá ser discutida a sua lei de bases.

Sr. Minisuo, há neste momento um problema sério. O Serviço Nacional de Protecção Civil existe, está a funcionar a Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais, que, bem ou mal, está «pendurada» no Serviço Nacional de Protecção Civil, a quem estão a ser cometidas as responsabilidades pelo pagamento das indemnizações devidas, na sequência dos fogos florestais e das cheias.

Tivemos ocasião de visitar algumas zonas atingidas pelos fogos, nomeadamente Góis e Pampilhosa da Serra, onde foi prometido — e justamente! — as pessoas cujas casas arderam que receberiam as devidas indemnizações, que seriam construídas habitações, etc.. Até há muito pouca tempo nada tinha sido concretizado. O Serviço Nacional de Protecção Civil não tinha recebido qualquer verba extra para fazer face a esse problema. Segundo soubemos, dispunham apenas de 110 000 contos, que só poderiam ser pagos em Março ou Abril do próximo ano. Entretanto, como é que as pessoas vão passar o Inverno, como é que continuam nessa situação sem qualquer tipo de apoio?

Foi-nos aqui dito que, até 16 de Outubro, tinham entrado no Serviço Nacional de Protecção Civil 2297 processos pedindo indemnizações em virtude dos fogos florestais, num total de 191 000 contos. No entanto, o valor de que o Serviço Nacional de Protecção Civil dispunha era apenas de 109 000 contos.

Depois desta data, outros processos terão entrada naqueles serviços. Como 6 que todo este problema vai ser encarado, tendo em conta que as verbas não chegam? Isto, Sr. Ministro, é a repetição do que aconteceu no ano passado, sem ter sequer em conta a taxa de inflação, para fazer face a um problema tão sério como este.

Passando à questão da Polícia de Segurança Púbbca, o Sr. Minisuo deu alguma informação a propósito do reforço dos efectivos e da intenção do Governo no plano da construção, do material e do equipamento, quer para a P5P quer para a GNR. Porém, as verbas inscritas no Orçamento não são suficientes para estas medidas; parecem-nos, pelo contrário, muito reduzidas.

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Gostava, pois, que o Sr. Ministro me informasse relativamente às verbas constantes do orçamento da PSP para aquisição de instalações e para a realização de obras de melhoramento. Que tipo de instalações, que obras e que melhoramentos vão ser feitos, tendo em conta que a verba constante do orçamento é tão diminuta? Para edifício, vemos 20 000 contos; para material de transporte, 150 000 contos; para material informático, 20 000 contos; para maquinaría e equipamento, 158 000 contos. Quais são, por exemplo, as verbas destinadas à aquisição de novos carros--patrulha pela PSP, sabendo-se que esta necessita bastante de novos carros-patrulha, e a que comandos irão ser adstritos esses novos carros?

O mesmo perguntaria em relação ao equipamento em geral. Seria importante que o Sr. Ministro nos dissesse exactamente o que é que vai ser feito, na medida em que as verbas são tão diminutas que nos interrogamos sobre aquilo que será feito, tendo em conta, por outro lado, as carências reais que a PSP aponta e que o próprio Sr. Ministro já reconheceu, nomeadamente ao dizer que é necessário fazer um reforço de efectivos. Não se trata, porém, apenas de fazer um reforço de efectivos mas, também, de equipamento, de material de transporte, etc.

Quanto à GNR, gostaria de perceber por que razão desapareceu do PIDDAC o aquartelamento do Fogueteiro ou se, pelo contrário, há apenas algum erro de impressão, o que pode perfeitamente acontecer. Como já hoje aqui detectámos erros de outro tipo, bastante sérios (onde, por exemplo, se lia «Banco de Portugal» deveria ler-se, afinal, «Bilhetes do Tesouro»), também aqui pode haver algum erro. Gostaria de saber o que aconteceu no PIDDAC ao aquartelamento do Fogueteiro para o ano de 1991. Já não consta do PIDDAC, ao contrário do que acontecia, esse aquartelamento, que, como sabe, a GNR considera como um dos mais importantes aquartelamentos em construção. Pergunto-lhe o que é que se passa exactamente com isso, até para desfazer a minha dúvida sobre se terá ou não havido um erro de impressão.

Gostaria de saber também que concursos para a construção de novos aquartelamentos irão ser efectivamente lançados no ano de 1991, tendo cm conta que no PIDDAC só para dois ou ttès existe uma verba superior a 5000 contos destinada a lançamento de obra. Não acredito, como é óbvio, que esses 5000 contos sejam para os lançar.

Quanto à PSP, creio que não há qualquer verba — pelo menos também não consta do PIDDAC nenhuma verba para o efeito — para novas instalações no próximo ano, sabendo nós, no entanto, que muitas autarquias estão a insistir, com razão, junto do Ministério na construção de novos aquartelamentos quer para a GNR, dada a carência em zonas do interior do País, quer para a PSP.

Para a GNR está inscrita uma verba — da ordem dos 147 000 contos — destinada à aquisição de material militar. Gostaria de saber exactamente que material militar é esse.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): — É confidencial!...

A Oradora: —Julgo que não o será, Sr. Deputado, até porque 147 000 contos não dão para grande coisa. Não poderá, pois, ser grande segredo. Se calhar, a verba nem chega para comprar um míssil!...

Gostaria de saber sc essa verba é destinada apenas a material da GNR ou se também poderá ser usada pela PSP.

Finalmente, conhecemos os grandes problemas de trânsito e de acidentes que existem e a necessidade insistente de fiscalização por parte das brigadas de trânsito. Sabemos

também que os meios de que estas dispõem não são muitos, antes pelo contrário. Ainda não há muito tempo, o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações sc queixava dizendo que os problemas do IP-5 que existem na região até poderiam ser resolvidos com mais brigadas de trânsito destacadas para o local. Pergunto, em concreto, se há qualquer verba destinada à aquisição dc meios aéreos e helicópteros para a brigada de trânsito, que outros meios irão ser adquiridos e para quando a substituição dos actuais meios aéreos, que não conheço mas que, segundo me foi

dito, estão já muito próximos do fim de vida, ou seja, a necessitar de substituição urgente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Carp.

O Sr. Rui Carp (PSD): — Sr. Ministro da Administração Interna, nos últimos anos o Governo realizou um esforço excepcional no domínio do reforço de efectivos das forças de segurança, quer da PSP, quer da GNR, e também em termos de equipamentos. Para 1991, o Ministério da Administração Interna prevê um reforço de efectivos da PSP de 1000 mais 1200 unidades. Ou seja, num dos problemas que a sociedade civil mais debate — o da segurança e prevenção da criminalidade—, o Governo tem feito o maior esforço possível, dentro dos recursos orçamentais, que são sempre limitados, para lhe dar resposta. Estou até convencido dc que mesmo politicamente não tem explorado essa faceta do reforço de meios e efectivos. Também quanto ao novo sistema retributivo, o Governo praticou uma revisão do esquema remuneratório das forças de segurança, que é, em média, superior à dos restantes funcionários, neste caso civis.

Ora, o Governo está a suportar o ónus orçamental desse esforço, no sentido de mais efectivos e meios, mas muitas vezes esse ónus do esforço orçamental é depois diluído pela prática. Ou seja, muitas vezes mais efectivos não dão em mais policiamento e mais protecção dos cidadãos na rua, porque outros mecanismos, dentro da própria estrutura de segurança pública, levam a que esses agentes de segurança se concentrem mais nas esquadras ou em actividades que têm a ver com a actividade privada da Polícia de Segurança Pública, isto é, nos chamados serviços gratificados.

A questão que aqui coloco ao Sr. Ministro da Administração Interna é a seguinte: prevê o Governo tomar algumas medidas no sentido de a PSP e a GNR serem mais utilizadas ou afectadas àquilo que mais preocupa os cidadãos comuns, que é o serviço gera) de policiamento, e manterem uma actividade relativamente menos importante nos chamados serviços gratificados?

Esta questão tem a ver também com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, estrutura nova que visou substituir a Guarda Fiscal naquilo que tem a ver com as entradas e saídas de cidadãos no País. A isso deveria corresponder uma compensação num reforço da operacionalidade nesses sectores, dado que a Guarda Fiscal ou recuou, nos termos até do próprio mercado interno europeu, para o interior do território, ou reforçou os seus meios nas zonas que não são de entradas e saídas de cidadãos no País.

Gostaria de saber, por um lado, se o Sr. Ministro da Administração Interna pode dizer-nos alguma coisa sobre a melhoria da operacionalidade e da desburocratização nas fronteiras que decorre deste reforço, de facto muito grande, da verba destinada ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, e, por outro, se este aumento dc efectivos da Polícia de

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Segurança Pública vai ser colocado ao serviço dos cidadãos ou se, pelo contrário, continuará a ler um peso relativamente grande no domínio dos serviços gratificados.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.

O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Sr. Ministro da

Administração Interna, gostaria de lhe colocar algumas questões, pedindo-lhe, desde já, desculpa por vir eventualmente a repetir algumas das que já foram suscitadas.

As questões que pretendo colocar-lhe estão relacionadas com o Serviço Nacional de Bombeiros.

Quero dizer-lhe, em primeiro lugar, que a ideia que tenho —e julgo que a experiência prática também o evidencia— é a de que, apesar dos aumentos que o orçamento destinado a tal serviço tem sofrido nos últimos anos e apesar de os meios terem crescido nos últimos anos, o que sobra para apoio ao investimento —não só ao investimento directamente a cargo do próprio Serviço Nacional dc Bombeiros como também ao investimento a cargo das associações de bombeiros, que por norma beneficiam de comparticipações para esse fim — é reduzidíssimo. Que eu saiba, não se fez nos últimos anos nenhum programa aprofundado destinado ao apoio a investimentos de equipamento nas associações de bombeiros. As verbas têm sido sistematicamente reduzidas, o que aconteceu de 1987 para 1988, de 1988 para 1989 e de 1989 para 1990. Com este orçamento auguro, infelizmente, que em 1991 a situação se manterá.

Para além desses, também os próprios investimentos a cargo do Serviço Nacional de Bombeiros estão comprometidos. Olhamos para as verbas inscritas no orçamento e verificamos que para despesas de capital temos pouco mais de 20 % do orçamento global do Serviço Nacional de Bombeiros. Aparece na rubrica «Instituições particulares» a verba de 1 066 000 contos, que presumo ser desuñada a apoios às associações, mas já não volto a ver inscrita aqui, por exemplo, uma verba para continuar com um investimento fundamental, que é o da rede de transmissões. Essa rede iniciou-se com uma experiencia-piloto no norte do distrito de Santarém, mas quedámo-nos por ela. Trata-se, como sabe, de uma aspiração legítima dos bombeiros, porque, sob o ponto dc vista operacional, essa rede é fundamental. Mas já passaram praticamente três anos desde a entrada em funcionamento dessa experiência-piloto e as verbas, infelizmente, não aparecem.

Reporto-me agora ao antigo imposto para o Serviço dc Incêndios, que, se até 1988 constituía receita municipal, passou no Orçamento do Estado para 1988 a ser receita do Serviço Nacional de Bombeiros. Mas passou a sê-lo dentro do princípio — foi esse o entendimento geral desta Câmara, na altura em que a matéria foi discutida — dc que essa verba seria distribuída pelas associações de bombeiros, embora, em vez de a distribuição se fazer, como ocorria no passado, por via dos municípios, passasse a ser feita via Serviço Nacional dc Bombeiros. O que verificámos foi que essa verba, que hoje não deverá andar muito longe dc um milhão ou de 1,2 milhões de contos, não tem sido distribuída pelos bombeiros: em 1989, apenas uma parcela reduzidíssima o foi; para 1990, a informação de que disponho, prestada pelo Serviço Nacional de Bombeiros, é a de que tal distribuição vai ser de zero.

É claro que há razões para este facto, que estão substancialmente associadas aos enormes encargos com os fogos florestais que o Serviço Nacional de Bombeiros teve

de saüsfazer. Só que as associações de bombeiros nada têm a ver com as insuficiências orçamentais do Serviço Nacional de Bombeiros. Convenhamos que o fado de associações humanitárias com fracos recursos, à espera, naturalmente, desta verba, que até costuma aparecer a partir do início do quarto trimestre, se verem agora confrontadas com uma verba de zero constitui uma situação que não faz sentido.

É por isso mesmo que nós, Partido Socialista, por nos sentirmos de certo modo defraudados com o que aconteceu na discussão desse Orçamento do Estado — desculpar-me--á a minha frontalidade—, iremos agora apresentar uma proposta no sentido de que o imposto para o Serviço de Incêndios volte a ser receita municipal. Dessa forma, as associações dc bombeiros não perderão o que, infelizmente, estão a perder nestes últimos anos, porque as câmaras municipais procederiam depois à transferência dessas verbas para as associações.

Seja como for, fica a questão: por que é que isso sucede, Sr. Ministro? Por que razão não se reforçou o orçamento do Serviço Nacional de Bombeiros para que estas verbas tivessem sido transferidas?

Outra questão que quero colocar-lhe refere-se a uma verba que, embora em termos de investimento apareça inscrita no âmbito do Ministério do Planeamento e da Administração do Território, está relacionada com o programa da construção dc quartéis de bombeiros.

Assistimos aqui a situações curiosíssimas, que passo a mencionar: no Orçamento do Estado para 1989 dizia-se estarem previstos 1,3 milhões de contos para apoio à construção c a algumas recuperações de quartéis de bombeiros; no Orçamento do Estado para 1990 previa-se, como execução para o ano de 1989, 833 000 contos — vejam bem a diferença de 833 000 contos para 1,3 milhões de contos! quando analisamos o Orçamento do Estado para 1991, constatamos que a execução de 1989 já não foi de 833 000 contos mas, sim, de 711 861 contos. Isto é uma diferença abismal, ocasionada por razões que irei já apontar c que têm dc ser invertidas, sob pena dc o problema nunca mais se resolver.

Curiosamente, no Orçamento do Estado para 1990 a verba prevista era de 1,1 milhões dc contos, verba que na altura criticámos por representar uma redução em relação à previsão de 1989.

Mas o que é que verificamos? Verificamos que no Orçamento do Estado para 1991 a previsão de execução para 1990 é de 685 000 contos. Isto é uma situação insustentável!

A razão que está por trás de tudo isto não é, certamente, a falta dc dinamismo das associações de bombeiros, pois não lhes falta dinamismo. O que acontece é que o sistema dc financiamento para a construção dc quartéis dc bombeiros está completamente desajustado da realidade.

Ora, esia é uma situação injusta para as próprias associações c, como o Sr. Ministro sabe, desde que o PSD é Governo — tenho de falar com esta frontalidade —, o nível de financiamento passou de 80 % para 70 %, em 1987, e para 60 %, em 1988, e, ainda assim, os níveis de financiamento são calculados pelo Ministério em função da data dc apresentação do projecto e não em função da data do início da construção. Isto quer dizer que, na prática, a comparticipação das associações na construção de quartéis não é de 40 % mas de menos de 50 %.

Esta situação é insustentável'.... De facto, nao há meios!... As associações não têm capitais próprios e as autarquias não dispõem de meios financeiros para apoia-

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-las na construção dos quartéis de bombeiros. Isto, naturalmente, tem de ser invertido. Temos de voltar ao regime do funcionamento a 80 %. É preferível, eventualmente, aprovarem-se menos projectos do que manter este nível de execução!... Um nível de execução orçamental deste tipo significa que não se tem avançado com projectos de construção de quartéis de bombeiros!...

Quero colocar-lhe uma outra questão, Sr. Ministro, que me parece importante e que está também relacionada com este problema dos quartéis de bombeiros. Trata-se de uma questão fiscal, relacionada com o IVA que incide sobre a construção dos quartéis de bombeiros, mais exactamente sobre os serviços de construção civil.

Abordo este problema porque não foi só o Partido Socialista e outros partidos da oposição que o reivindicaram, mas o próprio Govemo, através do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (ele sabe disto), quando se debateu, nesta Câmara, o estatuto dos benefícios fiscais e se lhe pediu uma autorização legislativa no sentido de atribuir determinadas isenções às instituições privadas de solidariedade social — cujo decreto apareceu depois — e aos próprios bombeiros.

Na altura do debate perguntei ao Sr. Secretário de Estado se, com esta isenção, os quartéis de bombeiros passariam a ficar isentos de IVA, tendo-me ele confirmado essa isenção. Isso está gravado e consta das actas. Não sei se houve algum lapso, mas a verdade é que o decreto apareceu posteriormente c nele nem sequer sc fala nas empreitadas de obras públicas. Isto representa muito!... São mais 8 %!

Gostava de saber, Sr. Ministro, se está em estudo a alteração desta situação, pois os bombeiros, financeiramente estão a «rebentar pelas costuras». Para além de todos os estrangulamentos do Serviço Nacional de Bombeiros, que tive a oportunidade de lhe apontar — isto não é, naturalmente, do âmbito do Sr. Ministro —, outros mais existem. Os pagamentos dos serviços que prestam aos hospitais estão atrasadíssimos, o mesmo acontecendo com os que prestam às próprias administrações regionais dc saúde. Tudo isso somado, dá uma situação terrível, que tem de ser invertida, porque o papel que as associações prestam ao País é de grande relevância, como o Sr. Ministro sabe.

O Sr. Presidente: —Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, sc outra razão não houvesse para intervir, havia, com certeza, uma razão de solidariedade e o Sr. Ministro, com este orçamento, precisa da solidariedade da Assembleia da República.

Se olharmos para o mapa de números comparativos do Orçamento do Estado, por ministérios, entre 1990 c 1991, verificamos facilmente que, no Ministério da Administração Interna, o aumento não chega para a correcção monetária.

Sr. Ministro, se, como nós todos, em geral — e eu, em particular—, considerarmos que a segurança pública dos cidadãos é um bem em si mesmo, lemos dc concluir que, na escala de prioridades, o Governo, cm véspera de eleições, não considerou a segurança pública uma matéria eleitoral. Preferiu, de facto, outro tipo dc prioridades, como, por exemplo, as estradas. Vamos consumir estradas ao metro quadrado, não ao metro quadrado dc eficácia ao serviço dc uma estratégia de desenvolvimento nacional, mas sim ao metro quadrado «fontista» da Junta Autónoma de Estradas.

Ainda há pouco se falou aqui da «fonte» de acidentes da famosa IP-5, que é, realmente, uma «fonte» de acidentes, de desastres, de despesas públicas e de custos nacionais.

O Sr. Rui Carp (PSD): — Quem é que a traçou?

O Orador: — A Junta Autónoma de Estradas.

O Sr. Deputado falará na sua ocasião e, então, terei muito gosto em responder-lhe.

Nessa estrada encontram-se, de facto, troços mais perigosos que os dos Pirinéus, o que é uma coisa espantosa. Atribui o facto ao relevo do terreno onde a estrada foi implantada. Não é! O que a Junta Autónoma de Estradas quer é fazer metros quadrados de estrada e apresentar ao patrão uma factura barata. É isso que estamos a fazer por este País fora. O Algarve vai pagar a mesma factura com uma via do Infante, uma estrada contrária à estratégia correcta de desenvolvimento para aquela zona e para o País, mas que é a que mais convém à Junta Autónoma de Estradas.

Parece-me, portanto, que nesta área a Administração Interna foi vítima da proximidade do período pré-eleitoral. Normalmente, o Governo, que, apesar das suas anormalidades, não é um governo anormal, é sensível a esta questão da segurança.

O Sr. Ministro disse-nos que a PSP vai ser reforçada com mais 1200 agentes e a GNR com mais 350. São números bonitos, mas não falou — e também deveria falar--nos, pois só assim se compreende que sem este aumento de verbas possa ter tanta gente a mais — do número de agentes que deverão dar baixa por reforma, por invalidez, por morte ou por demissão.

Depois, com um optimismo que lhe fica bem como membro do Governo —embora puxando a manta para cima destape os pés e puxando-a para baixo destape os ombros, pois a manta, de facto, é curta — falou em viaturas, em transmissões, em helicópteros c em informática. Como? Com estas verbas? Irá o Sr. Ministro ficar na história moderna portuguesa como o tal profeta que conseguiu a multiplicação dos pães e dos peixes?!...

Isto são coisas muito sérias, Sr. Ministro, e estou a falar nelas neste tom para ver se lhe demonstro — a si, que é responsável por este «bico de obra» que lhe puseram na mão — a minha solidariedade.

Embora sendo deputado nacional, sou muito sensível às coisas da minha região. Depois do Verão, altura em que há sempre um reforço de efectivos —com dificuldade, mas há! —, voltaram a ocorrer no Algarve crimes graves, entre os quais assinalo o assalto a um banco e o assassinato de uma criança inglesa.

Relativamente a este crime, descobriram-se objectos que pertenciam à criança assassinada, mas, quando se precisou de cães para seguir o rasto, a GNR de Albufeira, que tem umas dezenas de agentes, que policia um aglomerado urbano com dezenas de milhar de pessoas, teve dc ir buscá--los, dc Land Rover, a Tavira, o que levou um dia. Enquanto isso, as pistas desapareceram e, sem pistas, o faro dos cães deixou de ser necessário.

Acontece também ali, frequentemente, solicitar-se a presença da GNR e ela não poder ir, porque não terem gasóleo. Esgotou a verba! No dia 10 ou 15 de cada mês a GNR já não tem verba para o gasóleo. Claro que as empresas mais poderosas dizem: «Venham, que nós damos um dinheiro por fora para porem gasóleo no jeep.» Sr. Ministro, isto é brincar com a segurança!

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Não vale a pena falarmos de viaturas, helicópteros e informática, quando este ano nem sequer há dinheiro para gasóleo nos postos da GNR. Não vale a pena falarmos disto!... Para o ano haverá dinheiro para o gasóleo nos postos da GNR? Será que o Governo entende que as despesas com a segurança são um gasto, um custo? Ou

serão antes um investimento? Será a segurança um factor

importante de investimento ou será um custo que se suporta difícil e contrariadamente?

Sr. Minisuo, quero manifestar-lhe aqui a minha solidariedade e dizer-lhe que estarei contra este orçamento, dado que ele não garante, minimamente, a melhoria da segurança colectiva dos Portugueses.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Silva.

O Sr. Rui Silva (PRD): — Sr. Presidente, vou tentar ser o menos repetitivo possível, no entanto gostaria dc colocar algumas questões ao Sr. Minisuo e ao Sr. Secretário de Estado que tem a ver com os orçamentos para o Serviço Nacional de Bombeiros e para o Serviço Nacional de Protecção Civil.

Começarei por este último, para o qual o Sr. Ministro disse, há pouco, haver uma verba prevista de 794 000 contos, salvo erro, o que representa um aumento relativo, dado que não se prevâ exactamente qual será a função do Serviço Nacional de Protecção Civil, uma vez que a lei dc bases está, neste momento, em elaboração, pelo que terá de ser discutida e aprovada nesta Câmara.

No entanto, Sr. Ministro, independentemente dessa lei de bases vir ou não a ser aprovada durante o ano que vem, o que se verifica neste momento é que o Serviço Nacional dc Protecção Civil não tem instalações. Já não falo do problema a nível de Lisboa, onde, como o Sr. Ministro sabe, essas instalações estão distribuídas por dois ou três andares, concretamente na Av. da República e na Lapa, mas a nível distrital, onde os delegados distritais de protecção civil dependem totalmente dos governos civis.

Como o Sr. Minisuo sabe, um delegado distrital do Serviço Nacional de Protecção Civil é hoje obrigado a ter de socorrer-se, muitas vezes, do próprio carro do Sr. Governador Civil, dos meios de transmissão do Sr. Governador Civil e, até, dos próprios meios financeiros do Sr. Governador Civil.

Os 17 000 contos de aumento previsto para o corrente — de 766 235 para 794 000 contos — não irão, certamente, cobrir essa lacuna, Sr. Minisuo. Vão, com certeza, continuar as queixas que os delegados distritais fazem aos governadores civis e que nós, os que andamos nestas andanças, temos üdo oportunidade dc verificar. A lei de bases não virá, com certeza, alterar esta situação c os delegados distritais, pelo menos esses, vão continuar a mendigar viaturas e verbas para poderem desempenhar a sua função.

Recordo ao Sr. Ministro que, ainda hoje, acontece um delegado distrital ter de pedir autorização ao Sr. Governador Civil para se deslocar a qualquer sítio c quantas são as vezes que, quando lá chega, já o acontecimento teve lugar e já não pode fazer uma análise tão aplicada quanto possível da situação.

Gostava que o Sr. Minisuo me dissesse se esta verba de 794 000 contos prevê ou inclui qualquer alteração à função dos delegados disuitais dc protecção civil, já que, como o Sr. Minisuo e o Sr. Secretário de Estado sabem, ela tem uma execução relativa mínima, pois a nível

nacional só quatro deles, se não estou em erro, têm instalações próprias e alguma autonomia no seu serviço.

Já no que diz respeito ao Serviço Nacional de Bombeiros, a verba prevista é de cerca de 500 000 contos. Lembro-lhe que o aumento para estes serviços tem rondado os 500000 contos todos os anos, mas todos os anos se verificam as mesmas dificuldades na aquisição de meios pelas associações de bombeiros e todos os anos se tem vindo a verificar uma redução dos investimentos nas próprias associações.

Prevê-se, Sr. Minisuo, um aumento nos seguros de incêndio que irão, com certeza, cobrir uma parte dessa lacuna.

Não sei se está estimado ou não o valor que vai ser coberto pelos cerca de 1 % ou 1,5 %, mas perguntar-lhe--ia: estes 479 000 contos não são esses 1,5 %, pois não?

Ora, isso quererá dizer que, durante o próximo ano, a verba poderá eventualmente vir a descer cerca de um milhão de contos. Se assim for, estará, naturalmente, salvaguardada a verba que os bombeiros reclamam, que é um aumento de cerca de um milhão de contos, a qual se manterá porque, de facto, o Sr. Ministro, assim o afirma.

Pela parte que me toca, como responsável que também sou de uma associação, penso que poderemos, de algum modo, acalmar em relação às verbas que iremos solicitar ao Serviço Nacional de Bombeiros.

No que diz respeito ao IVA, suponho, Sr. Minisuo, que foi uma lacuna da regulamentação da Lei dos Benefícios Fiscais, porque, na realidade, foi dito, aqui, pelo Sr. Secretário dc Estado, que as associações de bombeiros iriam ser contempladas com a isenção do rVA, na parte relativa à construção.

Nós, na própria comissão parlamentar, temos vindo a receber alguns lamentos de associações de bombeiros que não têm capacidade de resposta para a comparticipação da construção do seu quartel, que é, neste momento, de 40 %. Por sua vez, as autarquias locais também não têm, naturalmente, essa capacidade de resposta.

Assim, perguntaria ao Sr. Minisuo se, de facto, tem conhecimento desta situação e se pensa ou não vir a alterar a atribuição do IVA à construção dos quartéis de bombeiros.

Dc resto, Sr. Minisuo, isto vem colocar, também, uma questão injusta, pois o que se está a verificar —e o Sr. Deputado Gameiro dos Santos já teve oportunidade de aqui o referir— é a construção de quartéis cm lugares onde, muitas vezes, são, digamos, menos necessários, só porque as câmaras municipais têm mais possibilidades de conuibuir e, por sua vez, as populações são mais ricas c conuibuem, também, através de cortejos de oferendas e outras formas de apoio.

Com efeito, vamos por esse país fora, para o interior, e cm câmaras com menos capacidade financeira e para um orçamento de um quartel, que hoje nunca é inferior a 100 000 contos, a câmara terá de conuibuir com 40 000 contos, porque as associações de bombeiros não têm meios próprios. Neste caso, pensa também o Sr. Minisuo alterar a situação?

Pela parte que nos toca, Sr. Minisuo, iremos apoiar, naturalmente, qualquer iniciativa ou até mesmo tê-la, no sentido dc repor a situação do financiamento em 80 %, ainda que isso implique a construção de menos quartéis de bombeiros.

Deve-se primar pela qualidade e menos pela quantidade, porque a execução, no final do ano, como se viu, tendo vindo a reduzir-se ao ano em cerca de 200 000 contos de

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1988 para cá, isto é, de 800 000 para 600 000 contos, pelos menos, deste ano para o ano que vem.

O Sr. Ministro não considera, de facto, injusta esta situação, em que os quartéis dos bombeiros levam, muitas vezes, dez anos a construir, como alguns cujas obras estão, neste momento, em curso e em que as verbas que lhe são atribuídas são iguais às que eram previstas para 1980, embora aplicadas em 1990, com uma comparticipação de 60 %, manifestamente insuficiente para poder vir a fazer a sua conclusão?

Finalmente, perguntaria ao Sr. Ministro se, de facto, pensa ou não avançar com o projecto que foi iniciado em Tomar, em 1988, para a unificação de uma rede de transmissões a nível do Serviço Nacional de Bombeiros.

Como sabe, aquele projecto-piloto teve uma função espectacular e todas as associações que a ele aderiram verificam, hoje, os benefícios do mesmo, no âmbito do Serviço Nacional de Bombeiros. Na altura foi dito, suponho que pelo então ministro Silveira Godinho, salvo erro, que seria um projecto para vir a abranger todo o País.

Contudo, não se vêem no Orçamento verbas que contemplem esse projecto para o ano de 1991.

Nesta conformidade, faço a seguinte pergunta: foi abandonado ou não vai tomar-se extensivo a todo o território nacional o projecto-piloto para uma unificação da rede de transmissões iniciado em Tomar? É que, se assim não for, vai ser mau, Sr. Ministro. Como sabe, hoje, muitas verbas são escusadamente despendidas, porque os bombeiros não têm uma rede de ligação com uma frequência única que lhes permita, também, rentabilizar o seu próprio serviço.

É sobre isto que gostaria, também, de ouvir a sua opinião.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (Indep.): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Creio que há uma questão que surpreenderá os observadores que leiam este debate, sobretudo os observadores situados nos outros pontos das Comunidades. E que, sendo a questão do Mercado Único e a sua projecção, nesta área da segurança interna, uma problemática instante, dir-se-ia que isso não tem projecção alguma no Orçamento que estamos a debater e menos, ainda, naturalmente, no debate.

Obviamente, as questões colocadas são pertinentíssimas, em particular as respeitantes à matéria relacionada com os bombeiros, que representam cerca de 8 % do Orçamento.

Em todo o caso, seria interessante que o Sr. Ministro se pronunciasse sobre as perspectivas gerais e sua projecção orçamental decorrentes dos compromissos assumidos por Portugal, designadamente a questão central que isso coloca em relação ao financiamento. Se Portugal é fronteira externa da Comunidade, então esta deve financiar, em parte, as questões da segurança interna.

Ora, gostaria de saber que tratamento é que isto tem. É uma questão absolutamente central e também é uma questão em que sabemos que não tem havido êxito na negociação, o que não quer dizer que não venha a haver no futuro, porque a questão tenderá a tornar-se mais e mais grave.

Portanto, é impossível fazer esse debate sem projectar esta matéria.

A segunda observação diz respeito aos números. Humildade total precisa-se. Creio que o Sr. Ministro usou

alguma, mas, em minha opinião, embora seja uma questão de critério, podia usar mais, porque todas as projecções das taxas de crescimento são viciadas pela base de partida.

Como V. Ex.* sabe, perfeitamente, o orçamento não chega, sequer, para despesas de funcionamento, nem tem projectadas as implicações do novo sistema retributivo. É sabido que o orçamento deste ano precisou de mais dois milhões de contos de reforço em orçamento suplementar.

Por outro lado, há verbas que não estão inscritas no orçamento, designadamente mais de 1,5 milhões de contos resultantes de multas, como tivemos ocasião de discutir na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

Além disso, são receitas extravagantes, o que contraria um princípio constitucional, como V. Ex.8 bem sabe.

Por outro lado ainda, as receitas dos governos civis só em parte estão espelhadas no orçamento.

Deu-se um passo, mas é preciso dar, provavelmente, dois ou três para conseguirmos a plena integração. São razões para não termos excessivo optimismo em relação ao volume das dotações. As dotações, de facto, não chegarão para cobrir o orçamento de funcionamento e em relação aos investimentos a situação é de manifesta estagnação.

Ora, isso é obviamente preocupante por todas as razões que já ficaram averbadas e só convida a ter cuidado quando se anunciam percentagens que, face ao orçamento rectificado, sobretudo tal qual vai ser no fim da execução, neste ano, e que não têm a mínima chance de ser sustentadas, sobretudo se utilizarmos taxas de inflação correctas, aproximadas de um cálculo exacto.

Portanto, temos razões, Sr. Ministro, para ter alguma preocupação séria em relação à possibilidade do exercício em boas condições das missões das forças de segurança.

A opção tomada quanto a uma maior ênfase no crescimento de efectivos da PSP é largamente consensual. Não é isso que nos preocupa. Já não é assim com alguns dos financiamentos que seria útil que fossem mais e melhor esclarecidos, como os respeitantes ao Serviço de Informações de Segurança.

V. Ex.* referiu as delegações, mas gostaria de saber mais alguma coisa sobre o que está previsto quanto ao material informático e o processo de informatização do SIS, pois as verbas que encontro são tão ínfimas que não acredito que sejam as únicas que o Serviço vai ter.

Por outro lado, em relação ao processo de informatização do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, foi agora inaugurado, com pompa e circunstância, por um membro do Governo, um departamento, uns equipamentos, etc. Sobre isto também desejaria saber qual é o follow up disso em termos orçamentais.

Quanto às questões relacionadas com o STAPE não há problema algum. O crescimento é natural, mas o conspecto global, repito, é de grande preocupação nesta matéria por insuficiência manifesta de recursos.

Entretanto assumiu a presidência o Sr. Secretário da Comissão Gameiro dos Santos.

O Sr. Presidente: — A Sr.1 Deputada Ilda Figueiredo pediu a palavra para um pedido de esclarecimento?

A Sr.» Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, precisava de clarificar uma questão que há pouco tinha levantado ao Sr. Ministro, antes de ele responder.

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0 Sr. Presidente: — Sr.5 Deputada, porque também está inscrito o Sr. Deputado Antunes da Silva, se não se importa, daria a palavra a este Sr. Deputado e, no Hm, daria a palavra a V. Ex.*

A Sr.» Ilda Figueiredo (PCP): — Está certo, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Antunes da Silva.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Sr. Ministro, ia retomar o problema da análise das dotações para as forças de segurança.

Com efeito, procedendo à análise das referidas dotações, não pinto a situação tão de negro como o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, mas, de qualquer forma, confirmo — isto é particularmente sentido ao nível da província — a escassez das dotações para funcionamento das forças de segurança, designadamente a GNR.

Ora, como dizia, comparando as verbas do orçamento do corrente ano e da proposta para o ano de 1991, verifico que há uma diferença de cerca de 16 000 contos, o que corresponde a um aumento superior a 26%. Mas, confirmando as insuficiências de verbas relativamente ao ano de 1990, o que gostaria de ouvir da parte do Sr. Ministro era, de alguma forma, a palavra «tranquilidade» relativamente ao orçamento para 1991. Ou seja, se com este aumento, de cerca de 16 000 contos para esta rubrica, o que corresponde a um aumento superior a 26 %, as insuficiências para o ano de 1991 vão ser anuladas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.* Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.' Ilda Figueiredo (PCP): — Apenas desejava clarificar uma questão que há pouco levantei em relação ao aquartelamento do Fogueteiro, porque tive oportunidade, entretanto, de verificar que está no Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações. Simplesmente, tem uma verba diminuta, ou seja, tem 200 000 contos, quando prevê, para o ano seguinte, um milhão de contos.

Ora, sendo assim, no próximo ano a construção vai praticamente estagnar em relação ao conjunto global da obra, cujo investimento está orçado em mais de quatro milhões de contos. Convenhamos, portanto, que ao ritmo de 200 000 contos ano só ao fim de 20 anos é que teríamos pronto o quartel.

Sr. Ministro, gostaria que clarificasse, de facto, esta questão.

Mas, já agora, se me permite, Sr. Presidente, só mais duas perguntas, muito rapidamente.

A primeira é sobre a questão do IVA nas construções dos quartéis de bombeiros. Sobre ela gostava de lembrar ao Sr. Ministro, embora estando de acordo com as intervenções que outros Srs. Deputados já fizeram sobre esta questão, que foi publicado, ainda neste ano, em 5 de Abril, o Decreto-Lei n.° 113/90, que isenta as instituições particulares de solidariedade social, mas que não teve em conta, de facto, os bombeiros.

Quanto a esta questão, gostaria que o Sr. Ministro dissesse o porquê e se a mesma foi ou não alvo dc negociações entre o seu Ministério e. o Ministério das Finanças.

A última questão, Sr. Ministro, tem a ver com as verbas que são tão diminutas para o investimento do Ministério da Administração Interna, ou mesmo para obras que.

estando noutros Ministérios, como o das Obras Publicas, têm a ver com acções do Ministério da Administração Interna e que ainda estão sujeitas a um congelamento de 10 %, que, como todos sabemos, está num dos artigos do

Orçamento do Estado para 1991.

Ora, isto sugere-me a seguinte pergunta: Sr. Ministro, o que é que vai ser feito, em concreto, no próximo ano?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Srs. Deputados, muito obrigado pelas questões que puseram, todas elas bastante pertinentes, às quais vou dar uma resposta geral, para, depois, o Sr. Secretario de Estado da Administração Interna, em alguns pormenores, precisar melhor.

Começaria pela Sr.1 Deputada Ilda Figueiredo, que colocou diversas questões relacionadas com o Serviço Nacional de Protecção Civil e com o Serviço Nacional de Bombeiros.

Algumas das questões colocadas pareceram-me resultar de alguma confusão relativamente ao Serviço Nacional de Protecção Civil, especialmente no que toca ao pagamento de indemnizações e às verbas de emergência que referiu, porque, como sabe, estas verbas especiais de emergência, tal como aconteceu, por exemplo, quando se tratou de situações graves como a das cheias do Algarve do final de 1989 —o Sr. Deputado está a acenar e eu confio muito bem na sua memória— são, de uma maneira geral, decididas caso a caso, porque são situações de emergência e, como tal, têm uma dotação especial concedida através de resolução do Conselho de Ministros ou de diploma específico.

As situações que a Sr.9 Deputada Ilda Figueiredo coloca relativamente aos problemas dos incêndios, sobretudo na região Centro, prefiguram situações de emergência que, por se repetirem muitas vezes, poderemos considerar como praticamente previsíveis. Neste momento, muito embora estejamos a falar de 1990, de cujo orçamento sairá o montante para satisfazer essas verbas, e não do de 1991, quero dizer-lhe, desde já, duas coisas: primeira, as verbas não irão ser satisfeitas em Abril ou Maio, como referiu, mas ainda este ano por conta do Orçamento de 1990; segunda, a verba de 110 000 contos que referiu foi aumentada para 200 000, o que satisfaz justamente os pedidos feitos pelos lesados.

A Sr.' Ilda Figueiredo (PCP)' — E quando é que vai ser paga?

O Orador: — Ainda há pouco referi a data, mas vou repetir. Não será em Abril ou Maio, como V. Ex.1 disse, mas, porque será paga por conta do OE de 1990, no ano em curso.

A Sr.1 Ilda Figueiredo (PCP): — Ao Serviço Nacional de Protecção Civil?

O Orador: — Exactamente.

Quanto à prevenção dos fogos florestais —assunto colocado com muita insistência por V. Ex.' — e ao facto de a verba para essa prevenção não estar prevista no orçamento do MAI, devo dizer que essa verba não tem de estar prevista nesse orçamento. Efectivamente, a prevenção dos fogos florestais, como o próprio nome indica, é objecto

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de outras medidas, por exemplo o Ministério da Agricultura preocupa-se com a limpeza da floresta, com a abertura de caminhos nas matas, etc, e o Ministério da Defesa colaborou e continuará a fazê-lo este ano.

Também outras verbas destinadas a essa prevenção e que não constam do orçamento do MAI são as atribuídas à CNEF (Comissão Especializada para a Prevenção dos Fogos Florestais).

Relativamente às outras medidas que V. Ex.*, os Srs. Deputados Rui Silva e Gameiro dos Santos acentuaram, julgo haver aqui alguma pequena confusão, porque se trata de dois tipos de impostos que, como VV. Ex." sabem, o Serviço Nacional de Incêndios recebe.

Um desses impostos advém de uma percentagem sobre o valor dos seguros que é pago pelo Instituto de Seguros e de Crédito e o outro —julgo que seria a esse que se referiam— é o imposto para o Serviço de Incêndios, cuja autorização está prevista na Lei do Orçamento do Estado para 1990, que incidirá sobre os prédios que não estão seguros ou aqueles em que se verifica uma diferença substancial entre o seu valor e o dos seguros; aliás, o diploma que o criará já está preparado e seguiu para Conselho de Ministros.

Essa verba que o Sr. Deputado Rui Silva citou e para a qual, como compreenderão, não temos números precisos poderá andar entre os 600 e 800000 contos e com ela, porque se destina especialmente às corporações de bombeiros, procuraremos responder às dificuldades das corporações de bombeiros locais. Temos plena consciência dessas dificuldades, pois sabemos, não apenas o Governo mas a sociedade em geral, o mérito dos bombeiros voluntários e, como temos a preocupação dc os dignificar cada vez mais, será através destas verbas especiais —porque destinadas especificamente às corporações de bombeiros — que procuraremos resolver alguns dos problemas importantes que se lhes colocam neste momento.

No que se refere aos quartéis de bombeiros e relativamente às percentagens que acentuou, se me permitem uma opinião pessoal, visto que este assunto é exterior ao MAI, direi que o que se fez nos últimos anos, em termos de dotar as corporações de bombeiros de novos edifícios é veitladeiramente notável — todos teremos de o reconhecer.

Seja-me permitido um pequeno parênteses. As corporações de bombeiros, até com algum ciúme por parte das outras instituições que funcionam no âmbito do MAI, têm tido uma atenção e um carinho muito especiais, que, no fundo, correspondem a um problema específico que tem a ver com o facto de o Govemo dever estar atento e apoiar as iniciativas particulares, das populações e dos municípios, ligadas a essa matéria.

Quanto à percentagem entre os 60 e os 80 %, ela traduz--se numa questão de prioridades para as quais quaisquer sugestões são bem-vindas. As prioridades devem ser definidas tendo em atenção dois critérios, isto é, temos de ter em atenção duas opções: ou vamos construir menos quartéis, atribuindo mais dotações a cada uma das corporações para os fazerem; ou vamos abrir mais o leque — com isso damos sentido a esta solidariedade que existe entre Govemo e populações— e satisfazer melhor esse esforço, que é notável, das populações e dos municípios.

É evidente que qualquer das posições é defensável, mas pessoalmente defendo a solução actual, na medida em que se alarga o leque da solidariedade, das ligações entre o Governo e os municípios.

Penso que respondi, embora colectivamente, a todas as questões, relativas a bombeiros, que me foram colocadas.

Seguidamente procurarei responder às questões relativas à PSP.

Se nos colocassem o problema de saber se o orçamento satisfaz todas as necessidades das forças de segurança e do próprio Ministério da Administração Interna, obviamente que a minha resposta seria negativa, até porque nunca vi um ministério satisfeito com as verbas com que foi dotado.

No entanto, Srs. Deputados, isto não significa, ao contrário do que foi afirmado, que o Governo não dá prioridade à segurança interna. Deixando de lado, por agora, os casos particulares, como o focado pelo Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, sempre muito preocupado — e ainda bem — com o Algarve, onde temos algumas dificuldades, nomeadamente em Albufeira e em outros sítios, a verdade é que iremos actuar dentro do quadro daquelas três prioridades que foram estabelecidas: aumento de efectivos, que VV. Ex." aceitaram como medida justa e equilibrada, aumento de um sistema moderno de telecomunicações e aumento dos meios mais sofisticados, especialmente dos aéreos.

Permitam-me um pequeno parênteses para responder à pergunta da Sr.* Deputada Ilda Figueiredo acerca dos helicópteros da Guarda Nacional Republicana. Sr.* Deputada, esses helicópteros já não estilo operacionais e já foi aberto um concurso público para os abater e vender. No entanto, e porque reconhecemos ser altamente indispensável que as forças de segurança, sobretudo a GNR, sejam dotadas de helicópteros —o meio mais indicado para o ordenamento do trânsito, visto os carros-patrulha também ficarem imobilizados nos engarrafamentos— está prevista a aquisição de três novos helicópteros para a GNR, para substituir os que se encontram inoperacionais.

A Sr.» Ilda Figueiredo (PCP): — Para a Brigada de Trânsito?

O Orador: — Não só. Os helicópteros serão para a GNR, porque não podemos ficar com eles parados à espera de um engarrafamento, e servirão para outras missões, como, por exemplo, as que decorrerão da abertura de fronteiras em 1993, perseguição de delinquentes, etc.

Em suma, servirão para qualquer missão de segurança interna Ainda relativamente ao material militar que iremos comprar não se assuste a Sr.1 Deputada, porque não iremos comprar mísseis.

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Até porque não dava!

O Orador: — É verdade que 194 000 contos dá para muito pouco material militar, mas são precisas carabinas, pistolas, munições, que, como é óbvio, se destinam a missões pacíficas e não vamos aplicá-lo em coisas muito graves.

Quanto ao reforço de pessoal, tive a oportunidade de dizer no início da minha intervenção — a Sr.1 Deputada, possivelmente, não me estava a prestar a atenção devida, pois certamente não merecia tanta — que, dos 350 novos efectivos entrados para a GNR, 230 são destinados à Brigada de Trânsito.

A Sr.» Ilda Figueiredo (PCP): — Relativamente ao trânsito falei sobre o equipamento.

O Orador: — Julgo que se quer referir a equipamento para detectar excesso de velocidade e outro para melhoria da segurança do tráfego.

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A Sra Ilda Figueiredo (PCP): — Exactamente.

O Orador: — Já está a ser utilizado e com algum desgosto para os condutores apanhados em excesso de

velocidade. Estes argumentavam que não circulavam à velocidade indicada nos radares, mas agora já não o poderão fazer porque o «computadorzinho» regista a velocidade exacta.

Retomando um pouco «o fio à meada», responderei, com toda a sinceridade e o à-vontade que me caracteriza, à questão colocada pelos Srs. Deputados Gameiro dos Santos e Rui Silva. VV. Ex." colocaram o problema das telecomunicações em Tomar, mas como não estou dentro dessa matéria, talvez o Sr. Secretário de Estado possa dar alguma informação sobre ele.

No entanto, se o assunto não ficar suficientemente esclarecido, prometo enviar-lhes uma resposta por escrito.

Outro problema que também foi colocado diz respeito ao IVA. Esse assunto é da competência do Ministério das Finanças e, particularmente, do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e a única coisa que posso dizer é que entrarei em contacto com ele e enviarei uma resposta o mais rapidamente possível.

Sr. Deputado Luís Filipe Madeira, o Sr. Secretário de Estado dará a resposta à sua pergunta relativa a uma possível falta de gasóleo.

Relativamente à D?5, onde passo com alguma frequência, reconheço haver alguns traçados que não estão em condições, mas não me parece que seja só a fiscalização que vá obviar a essas dificuldades. Julgo que foi a primeira vez que nos «metemos» pelo meio de uma serra em lugar de a contornar e possivelmente ainda não temos experiência suficiente para fazer um serviço como deve ser.

O Sr. Deputado Rui Silva colocou um problema muito importante, que diz respeito à protecção civil, ao qual não quero deixar de responder. V. Ex.» focou o problema do relacionamento entre os delegados da protecção civil, ao nível dos distritos, e o Serviço Nacional de Protecção Civil, que é de âmbito nacional. Esse problema é importantíssimo, porque não é tanto o serviço distrital de protecção civil que está em questão, mas a dinamização dos serviços municipais de protecção civil, que tem sido uma das carências de base no nosso sistema de protecção civil. Faço muita questão que o sistema seja vertical e que o Serviço de Protecção Civil actue de acordo com o grau de gravidade de cada momento e o grau mais adequado para actuar numa primeira frente é quase sempre o grau municipal. Só quando este não for possível é que deverá intervir o grau distrital.

Isto prende-se, também, com o sistema de redes de comunicação adequadas entre serviços municipais e serviços distritais, e aí é que surgirá aquela necessidade — que o Sr. Deputado colocou e que eu anotei com muito interesse — da dotação dos sistemas de protecção civil ou dos bombeiros.

É uma opção que ainda hoje se colocou no Conselho Superior de Protecção Civil," no sentido de saber se se deve dotar o Serviço de Protecção Civil de uma rede autónoma, fazendo de novo uma duplicação, ou se se deve, antes, reforçar o sistema de bombeiros, servindo ele próprio também para o sistema de protecção civil e utilizando outros sistemas de telecomunicações, como os da Guarda Nacional Republicana, os sistemas policiais, etc, que estão, todos eles, envolvidos e que sao, todos eles também, componentes importantes da própria protecção civil. Este é um problema que o Sr. Deputado me referiu e que

recolho com muito agrado, pois considero-o muito importante.

No entanto, antes de dar uma opinião, gostaria de poder pensar um pouco melhor no assunto, uma vez que esse

aspecto de ligação de telecomunicações de bombeiros, de protecção civil e da GNR é algo que deve ser entrosado, sob pena de estarmos a fazer algumas duplicações e a não racionalizar devidamente os encargos públicos.

Ao Sr. Deputado José Magalhães gostaria de dizer que, obviamente, lhe faço desde já a promessa de enviar as informações por escrito que pretende.

Relativamente à questão do Sr. Deputado Antunes da Silva, quanto à insuficiência das verbas de financiamento, o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna dar--lhe-á algumas informações.

Quanto à questão da segunda intervenção da Sr.1 Deputada Ilda Figueiredo, devo dizer que os 200 000 contos que estão previstos para o Fogueteiro, obviamente, que dizem respeito à elaboração do projecto e a todas as acções que agora se irão realizar. É que não valia a pena estarmos a introduzir aí os quatro milhões de contos, quando sabemos que é materialmente impossível gastá-los num ano. Como é óbvio, esta verba é relativa a cada ano e por essa razão é que existem as GOP. As opções distribuem-se por vários anos e esta distribuição parece-nos a mais racional.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Interna.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna

(Luís Madureira): — Penso que a Sr.1 Deputada Ilda Figueiredo ainda tem algumas questões em aberto e, nomeadamente, perguntou que verbas existem nas forças de segurança para os problemas da construção. É evidente que os pequenos montantes, de cerca de 150 000 contos, inscritos na rubrica «Edifícios» se destinam, fundamentalmente, a obras de conservação dos edifícios, uma vez que a construção está prevista em verbas do PIDDAC. Como verificou, temos PIDDAC para o Ministério da Administração Interna propriamente dito e PIDDAC inscrito no Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.

Por outro lado, em relação à redução inicial, devo dizer que é evidente que esta não deixará de ter alguns efeitos perversos no programa de construção, mas, apesar de tudo, penso que não inviabilizará o programa na sua globalidade, na medida em que, quando muito, o que se arrasará será o lançamento de obras. Isto significa, de facto, alguma redução e implicará algum atraso de obra, mas dc maneira nenhuma a anulação de um programa que penso estar concebido de forma a ir dando resposta às carências que se nos vão colocando com maior gravidade.

Relativamente à aquisição de viaturas, que é outro dos meios indispensáveis para o bom exercício da função «Segurança», posso também tranquilizar a Sr.4 Deputada, dizendo que o próximo ano de 1991, penso —passe a expressão— será um pouco o ano das «vacas gordas» para as forças de segurança.

A Sr.s Ilda Figueiredo (PCP): — Não as vejo!

O Orador: — Falou-se numa receita que não está de facto prevista neste orçamento, mas devo dizer que é uma receita toda ela consagrada a material de equipamento. É a receita proveniente das multas das infracções ao Código da Estrada que serão todas elas destinadas a investimentos

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em meios de transporte e em equipamentos. Posso dizer--lhe que a nossa previsão é um pouco superior a um milhão de contos para a GNR e de cerca de 600 000 contos para a Polícia de Segurança Pública, verbas essas que, naturalmente, serão inscritas ou tratadas em créditos especiais a abrir.

Serão, portanto, verbas geridas com toda a transparência, não obstante não ter sido possível inscrevê-las no Orçamento deste ano, uma vez que se trata de um processo

que teve alguma morosidade na preparação normativa e que está a ser ultimado.

O Sr. Deputado Rui Carp tinha também colocado uma questão — aliás a questão que colocou relativa ao Fogueteiro já foi respondida pelo Sr. Ministro — que no fundo é a seguinte: que racionalização vai fazer o Ministério da Administração Interna das suas forças de segurança? Devo dizer que vamos ter, de facto, um efectivo dos meios humanos, mas que vamos ter também uma natural racionalização na gestão desses efectivos, colocando-os justamente nos locais onde eles são mais necessários. Temos centros urbanos que se desenvolvem, estando ainda parte desses centros urbanos sob o controlo da GNR, que irá naturalmente deixar essas zonas para a PSP, indo ela própria reforçar os meios onde há maior carência de efectivos.

Consequentemente, não se coloca aqui, como me pareceu resultar da intervenção do Sr. Deputado Rui Carp, o problema dos gratificados, porque estes não têm nada a ver com a situação de prestação efectiva dos serviços, uma vez que dizem respeito a prestações de trabalho feitas para além do horário normal de cada agente.

O Sr. Deputado Rui Carp falou também no problema do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. É evidente que esse serviço conhecerá em 1991 um particular impulso, não só em meios humanos, como também no sistema de informatização. Quero dizer-lhes que o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras tem, como consta do Orçamento, uma receita própria de 260 000 contos e uma parte dessa receita terá como destino a informatização dos mesmos.

O Sr. Deputado Gameiro dos Santos colocou também algumas questões, mas penso que já estarão todas respondidas pelo Sr. Ministro. No entanto, se, por acaso, alguma questão não ficou esclarecida, agradecia-lhe que me dissesse.

O Sr. Deputado Luís Filipe Madeira colocou uma questão, no sentido de saber quais os saldos entrados e saídos nas forças de segurança. Devo dizer que o saldo é mesmo aquele que foi referido, ou seja, que há um aumento efectivo previsto de 1200 elementos na PSP e de 350 na GNR, tendo sido calculados esses valores para além das previsões das saídas.

Houve ainda uma intervenção que não cheguei a apanhar, mas suponho que, quando o Sr. Deputado Antunes da Silva referiu que o aumento não chegava para a correcção monetária, tinha em mente uma outra indicação. Não obstante, a previsão da inflação em que assenta o Orçamento e depois de retirados os efeitos do Novo Sistema Retributivo, temos um crescimento efectivo, de 1990 para 1991, no orçamento, de 12,5 %.

Enfim, penso que, se era essa a correcção a que se referia, também está perfeitamente salvaguardada a situação. O Sr. Deputado colocou ainda uma outra questão — peço imensa desculpa —, mas não cheguei a apanhá-la. Perguntava-me também se uma diferença de 16 000 contos, que penso tratar-se de uma diferença de 17 milhões de contos...

O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Dá-me licença, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Sr. Secretário de Estado, a questão que coloquei era a seguinte: não faço uma análise tão escura desta situação, como quando se diz que as verbas não sobem ou que sobem pouco, porque

verifico que, particularmente em relação às forças de segurança, há aqui um aumento superior a 26 %.

No entanto, também não deixo de reconhecer algo que foi dito pelo deputado Luís Filipe Madeira, no sentido de existirem deficiências de funcionamento por insuficiência de verbas, designadamente na província e no que toca à GNR. E, utilizando a expressão de há pouco, o que gostaria de ouvir da parte do Governo era, de alguma forma, uma palavra de tranquilidade no sentido de nos dizer se este aumento de cerca de 16 000 contos nesta rubrica «Forças de segurança» é ou não suficiente para não se verificarem, em 1991, as mesmas insuficiências que se estão a verificar em 1990. Não sei se me fiz entender?

O Orador: — Sr. Deputado, não vejo onde é que foi buscar o valor de 16 000 contos.

O Sr. Antunes da Silva (PSD): — No orçamento de 1990 nós temos para «Serviços e forças de segurança — 59,335 milhões de contos» e para 1991 eu tenho, para a mesma rubrica, o valor de 75,203 milhões de contos.

Pausa.

É evidente, não são 16 000 contos, mas 16 milhões de contos! Peço desculpa! Assim a tranquilidade é capaz de ser maior!

O Orador: — Sr. Deputado, penso que quase respondeu à questão que colocou. É evidente que — e o Sr. Ministro já o referiu — nenhum Ministério fica satisfeito com o Ministério das Finanças, quando este não dá a cada um de nós tudo o que pretendemos.

No entanto, julgo que o orçamento previsto para o Ministério da Administração Interna é um orçamento que permite um crescimento muito ajustado aos novos desafios que nos vão ser colocados, nomeadamente em 1993.

Voltaria atrás para responder a uma questão do Sr. Deputado José Magalhães que penso não ter sido respondida. O que pede será enviado por escrito.

Aparte inaudível.

A Sr.» Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, dá-me licença?

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.* Deputada.

A Sr.» Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Secretario de Estado, estou sinceramente interessada em conhecer a resposta à questão do Sr. Deputado José Magalhães e pedia também ao Sr. Ministro que respondesse. É que só não fiz as mesmas perguntas porque já estavam feitas e, exactamente, para evitar repetição de perguntas.

O Sr. Secretário de Estado da Administração Interna: — Quanto à elaboração do orçamento, o que nos tocava de maior responsabilidade era, no fundo, distribuir

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II SÉRIE-C — NÚMERO 9

o bolo pelos diferentes serviços. Tivemos, exactamente, uma preocupação de justiça relativa e, neste caso, distributiva pelos diferentes serviços. Contámos, naturalmente, com as receitas próprias previsíveis à data da elaboração do orçamento e aquelas que nós próprios estimávamos, embora não fossem ainda previsíveis em termos de orçamento. Foi o caso já referido do Serviço Nacional de Bombeiros com o imposto de incêndio urbano, sendo também para este serviço o aumento de prémios, o que, por arrastamento, vai contribuir para um maior aumento das receitas próprias do Serviço Nacional de Bombeiros. Foi assim que fizemos também em relação à GNR e à PSP, ou seja, contabilizando receitas que este ano não puderam ser incluídas no orçamento, mas que serão contabilizadas e que, no próximo ano, serão inevitavelmente inscritas no orçamento.

Relativamente à questão das contrapartidas referida pelo Sr. Deputado José Magalhães, tenho a dizer-lhe que o problema já foi colocado, em sede própria, pelo Ministério da Administração Interna, mas o Sr. Ministro poderá dar depois, quanto a essa matéria, um esclarecimento adicional. Aliás, já foram avançados alguns números, mas ainda não está nada definido, porque não é só o Ministério da Administração Interna o único interveniente, mas também a Guarda Fiscal.

De qualquer forma, a matéria relativa as fronteiras exteriores da Comunidade não interessa a todos os países membros, pelo que a respectiva negociação não será fácil, embora pense que terminará a nosso favor.

Por outro lado, o reforço, ainda que moderado, do orçamento do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras coloca--o em belíssimas condições para preparar a substituição da Guarda Fiscal no controlo das fronteiras.

Não sei sc o Sr. Deputado José Magalhães se terá referido a mais alguma questão a que possa responder.

A Sr.» Ilda Figueiredo (PCP): — Sim, referiu uma questão respeitante aos Serviços de Informação e Segurança.

O Orador: —Já falei, quer na informatização do SIS, quer na do SEF. A informatização do SEF vai ser continuada no próximo ano com uma contrapartida fundamentalmente encontrada nas receitas próprias, uma vez que estão previstos no orçamento 260 000 contos. A informatização do SIS está praticamente concluída, pelo que não se vão verificar alterações substanciais.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.' Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.1 Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Ministro, gostaria de fazer um comentário relativo a uma informação prestada por V. Ex.', sobre o não pagamento, até à data, das indemnizações às vítimas dos incêndios ocorridos em Junho, Julho e Agosto deste ano.

Como tivemos ocasião de observar, os deputados dos vários partidos, membros da Comissão Eventual dos Fogos Florestais, ficaram colocados numa posição delicada, pois é inadmissível que, em Dezembro, passados cinco meses, essa situação não esteja ainda resolvida, pelo que queria deixar aqui o meu protesto em relação a esse facto.

Por outro lado, parece-me que no próximo ano se deveria dotar o Serviço Nacional de Protecção Civil para o apoio às vítimas dos fogos florestais com uma verba mínima que, de facto, criasse condições para obstar a

situações semelhantes que se possam repetir, tornando-se desnecessário esperar por uma dotação e, consequentemente, atrasar três, quatro ou cinco meses o pagamento das respectivas indemnizações.

É por força desta situação que vamos apresentar uma proposta de alteração, no sentido do reforço das verbas, da ordem dos 250 000 contos, definidas para o Serviço Nacional de Protecção Civil, sucedendo o mesmo para o Serviço Nacional de Bombeiros, pois cremos que a situação é idêntica, pelo que propomos o reforço da verba que lhe está adstrita também em 250 000 contos.

Por último, penso que a defesa da floresta (e talvez estejamos ambos de acordo nesse ponto) deve ser prosseguida, essencialmente, através da prevenção, cabendo aí um importante papel aos Ministérios da Agricultura e do Ambiente. Infelizmente, as verbas inscritas para esse fim não são suficientes, e como já tivemos ocasião de discutir esse assunto, não o vamos fazer agora.

Assim sendo, e porque nos parece que as medidas preventivas para o próximo Verão não estão a ser tomadas em devida conta, é necessário tomar algumas cautelas adicionais no combate aos incêndios florestais, para que as comissões especializadas de fogos florestais tenham o equipamento mínimo, já que o existente se revelou, este ano, não ser suficiente para impedir o alastramento dos fogos c o seu agravamento em situações várias. Desta forma, propomos que se atribua uma verba de 1,5 milhões a essas comissões especializadas.

Aliás, a necessidade de uma verba para a compra de equipamento foi referida pela maior parte das entidades que contactámos, bem como pelo Serviço Nacional de Bombeiros e certamente que o Sr. Ministro concordará connosco.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr.! Deputada, tenho muito gosto em responder-lhe, embora a questão que me colocou esteja fora do âmbito da discussão do Orçamento para 1991. Mas como não gosto de me furtar às questões, pela consideração que a Sr.' Deputada me merece, vou tentar esclarecê-la.

Esse lapso de tempo que referiu não é propriamente de quatro meses, porque é necessário compreender que só se começa a tratar da matéria referente às indemnizações depois dc passado o período de incêndios, como a Sr.* Deputada entenderá porquê.

Não me parece que, decorridos três meses desde Outubro, se possa falar num lapso de tempo excessivo, porque para fazermos uma atribuição correcta desses subsídios, temos de saber quem subsidiamos e não os podemos conceder apenas porque alguém nos pede uma indemnização de umas centenas ou de uns milhares de contos. É necessário estudar cada caso para que o dinheiro de que dispomos seja gasto correctamente.

A Sr.* Ilda Figueiredo (PCP): — Mas todos tivemos oportunidade de constatar a existência de casos graves!

O Orador: — Mas com certeza que a Sr.1 Deputada tem dificuldade em calcular, assim como eu próprio, os prejuízos directos dos fogos florestais e quem gere os dinheiros do Estado tem de fazê-lo com cuidado.

Continuo a sentir as mesmas dificuldades que de início, já que as CNEF não estão vocacionadas para a área do Ministério da Administração Interna. Como sabe, pertencem

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a outro ministério porque se destinam essencialmente à fase preventiva.

Assim, a pergunta colocada pela Sr.! Deputada está um pouco deslocada e deveria ser discutida noutra sede, embora

estejamos preocupados em dotar os bombeiros com os meios de ataque de que necessitam. Aliás, é isso que compete ao Serviço Nacional de Bombeiros e, directamente, ao Ministério da Administração Interna.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de encerrar a reunião, gostaria de comunicar-lhes que, dada a

necessidade de as propostas que, entretanto foram dando entrada na Mesa, serem organizadas, vamos reunir amanhã na sala do Senado, às 16 horas, para se proceder às votações.

Está encerrada a reunião.

Eram 20 horas e 05 minutos.

Os Redactores: Maria Amélia Martins — Ana Marques da Cruz — Maria Leonor Ferreira — Cacilda Nordeste—Isabel Barral—José Diogo.

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DIÁRIO

da Assembleia da República

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