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Sexta-feira, 21 de Fevereiro de 1992
II Série-C — Número 15
DIÁRIO
da Assembleia da República
VI LEGISLATURA
1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1991-1992)
SUPLEMENTO
SUMÁRIO
COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO
Acta da reunião de 17 de Fevereiro de 1992
Pelas 10 horas, o Sr. Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano (Manuel dos Santos) reiniciou o debate, na especialidade, das propostas de lei n.m 13/VI (Grandes Opções do Plano para 1992) e 14/VI (Orçamento do Estado para 1992).
Sobre o orçamento do Ministério da Defesa Nacional intervieram, além do Sr. Ministro (Fernando Nogueira), os Srs. Deputados João Amaral (PCP), Eduardo Pereira (PS), Pedro Cam-pilho (PSD) e Marques Júnior (PS).
Sobre o orçamento do Ministério do Planeamento e da Administração do Território intervieram, além do Sr. Ministro (Valente de Oliveira) e dos Srs. Secretários de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território (Nunes Literato), do Planeamento e do Desenvolvimento Regional (Isabel Mota), da Ciência e Tecnologia (Manuel Fernandes Thomaz). os Srs. Deputados Guilherme de Oliveira Martins e Jorge Lacão (PS), Luis Sá (PCP), Fernando Sousa. Fialho Anastácio e Eurico Figueiredo (PS), Manuel Castro Almeida (PSD), Helena Torres Marques (PS), José Manuel Maia e Octávio Teixeira
(PCP), Alberto Avelino (PS), Duarte Pacheco (PSD), Marques da Costa, Gameiro dos Santos, Fernando Pereira Marques e António Costa (PS).
Sobre o orçamento do Ministério da Educação intervieram, além do Sr. Ministro (Diamantino Durão), os Srs. Deputados Julieta Sampaio (PS), Carlos Lélis, Guido Rodrigues e Lemos Damião (PSD), António Filipe (PCP), Ana Maria Bettencourt, Fernando de Sousa e Edite Estrela (PS), Lourdes Hespanhol (PCP), Carlos Coelho (PSD), Guilherme Oliveira Martins, António José Seguro, José Apolinário, António Martinho e Fernando Pereira Marques (PS).
Sobre o orçamento do Ministério da Indústria e Energia intervieram, além do Sr. Ministro (Mira Amaral) e dos Srs. Secretários de Estado da Indústria (Alves Monteiro) e da Energia (Luís Conceição Pereira), os Srs. Deputados Ferro Rodrigues (PS), Nogueira de Brito (CDS) e Apolónia Teixeira (PCP).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 20 horas e 40 minutos.
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O Sr. Presidente (Manuel dos Santos): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 10 horas.
Como sabem, temos hoje uma audição com o Ministério da Defesa Nacional, encontrando-se presentes o Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Deputado Ferro Rodrigues pede a palavra para que efeito?
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — É para fazer uma in-terpelação à mesa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Presidente, peço desculpa pelo facto de esta interpelação não ter a ver directamente com a questão do orçamento do Ministério da Defesa Nacional, que é o que está hoje na ordem de trabalhos, mas aproveitando o facto de estarem aqui alguns ilustres membros do Governo, nomeadamente a Sr.' Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento, queria referir o seguinte: no sábado, foi assinado, entre alguns parceiros sociais, um acordo de concertação social que tem incidências orçamentais. O texto do acordo refere-se a vários aspectos que se prendem com o IRS e, inclusivamente, com os ordenados da função pública. Ora, atendendo a que esüvemos a discutir, na generalidade, a proposta de orçamento há poucos dias, é necessário que a Comissão de Economia, Finanças e Plano seja rapidamente esclarecida sobre as consequências orçamentais do referido acordo.
A presença do Ministério das Finanças nesta Comissão está prevista para quinta-feira, o que é muito tarde, visto que as votações, na especialidade, do orçamento da despesa começarão exactamente nessa tarde. Assim, queria apelar ao Sr. Presidente para que se fizessem algumas diligências no sentido de que fosse possível, com a maior urgência, ouvir o Ministério das Finanças sobre as consequências orçamentais desse acordo, sobretudo ao nível do aumento das despesas, que parece óbvio, e também ao nível da diminuição de receitas, que parece evidente. Afinal, importa saber qual é a situação em matéria de défice público.
Gostava de saber quais as diligências que o Sr. Presidente pensa fazer neste sentido.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, se bem entendo, a sua interpelação é, no fundo, um pedido ou um requerimento para que o presidente da Comissão diligencie no sentido de, ainda antes de quinta-feira, ser ouvido o Sr. Ministro das Finanças sobre os temas que expôs.
Como sabe, está prevista a presença do Sr. Ministro das Finanças na próxima quinta-feira, dia 20, pelas 10 horas, e os nossos trabalhos estão extremamente sobrecarregados. Apesar de não ver qualquer inconveniente em fazer essa diligência, não sei muito bem como é que poderemos «encaixar» uma audição dessa natureza.
Do ponto de vista político, acho que há alguma pertinência na sua observação, mas a única coisa que posso fazer é entrar rapidamente em contacto com o Ministério das Finanças — aliás, temos aqui a Sr.1 Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento — e tentar ajustar a vinda do Sr. Ministro numa data que anteceda aquilo que estava previsto.
N3o lhe podendo dizer muito mais, refiro-lhe só, em comentário de natureza política que não tem directamente a ver com a sua interpelação, que a sensação que tenho, enquanto presidente, Deputado e cidadão, é que na Assembleia da República discutimos cada vez menos os orçamentos; eles acabam por ser discutidos noutras sedes, com parceiros sociais, sejam eles sindicais ou de poder local. Mas isso é uma questão de regime, que não se resolve com a vinda do Sr. Ministro das Finanças, na terça--feira, quarta-feira ou quinta-feira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Gostava de dividir a minha questão em duas partes.
Na primeira parte, gostaria de saber, e julgo que é possível, uma vez que se encontra aqui a Sr.* Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento, quando é que o Governo entrega na Assembleia da República aquilo que decorre deste acordo social em matéria de alterações orçamentais.
No que se refere à segunda parte da questão, gostava de saber quando é que o Governo está disponível para prestar os esclarecimentos que a lei e o funcionamento da Assembleia da República impõem. Isto terá, certamente, de ser feito em tempo útil, para que a Assembleia se possa pronunciar sobre essas alterações e sobre o que delas decorre e, eventualmente, apresentar propostas alternativas.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, como já referi, o Ministro das Finanças estará presente nesta reunião na quinta-feira, às 10 horas — trata-se de algo que está agendado há muito tempo. No entanto, a Sr.1 Secretária de Estado Adjunta, que tem acompanhado os nossos trabalhos, também pode intervir a propósito dessa matéria.
Quanto à primeira parte da sua questão, não lhe sei responder mas vou fazer diligências nesse sentido, a não ser que a Sr.' Secretária de Estado possa dar alguma informação complementar.
A Sr.1 Secretaria de Estado acha útil dar essas informações neste momento?
A Sr.' Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento
(Manuela Leite): — Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.' Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento.
A Sr.' Secretária de Estado Adjunta e do Orçamento: — Tenho todo o gosto em prestar alguns esclarecimentos sobre o acordo, que, evidentemente, traz imensas esperanças não só ao Governo como também, com certeza, a todos os portugueses.
É evidente que vai ser necessário fazer algumas alterações de natureza legislativa no Orçamento do Estado para 1992. Não será fácil fazê-lo hoje, uma vez que o acordo só foi assinado no sábado, mas durante esta semana apresentaremos, com certeza, as alterações que é necessário introduzir e que se reflectem basicamente na área fiscal.
Quanto às despesas, a que vai implicar a medida tomada, a correcção feita no vencimento dos funcionários que não têm 10 % de aumento é um valor que está evidentemente contemplado e que decorre da dotação provisional, razão por que não será necessário fazer depois um acerto. Até porque neste momento não lemos conhecimento, relativamente a cada um dos ministérios, de quais são os funcionários que não têm esse aumento.
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No que se refere à receita, existe, com certeza, uma perda, especialmente na autonomização da dedução dos encargos com a habitação, juros e amortizações. No entanto, o montante dessa perda de receita terá efeitos em 1993 e não em 1992, sendo no orçamento de 1993 que se reflectirá essa perda de receita. Existe também alguma perda de receita no aumento da dedução em IRS dos rendimentos do trabalho dependente. Esta não é tão significativa quanto a anterior, mas tem efeitos na estimativa
da receita, e certamente que faremos a respectiva correcção.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, penso que nesta fase não é possível ir muito mais longe e, se estiver de acordo, vou ultrapassar esta questão. Aliás, estamos numa reunião com o Ministério da Defesa Nacional.
Entretanto, combinarei com a Sr.* Secretária de Estado Adjunta uma forma, não digo mais correcta, mas mais adequada, para podermos ter essa informação, agrade-cendo-lhe, desde já, os esclarecimentos que deu.
Aproveito para lembrar que há dois dias de reunião nos quais temos apenas quatro módulos de trabalhos, razão pela qual, por parte do presidente e julgo que por parte da mesa, estamos disponíveis para «encaixar» aqui uma reunião, se for essa a vontade do Governo e dos Srs. Deputados, com o Ministério das Finanças, que anteceda a prevista para quinta-feira.
Antes de dar a palavra ao Sr. Ministro, aproveito para o saudar e para lhe agradecer a sua presença. Lembro-lhe que, porque estamos numa discussão na especialidade, é exactamente esse o objectivo dos nossos trabalhos, ou seja, a apreciação e discussão, na especialidade, do Orçamento do Estado.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Presidência e da Defesa Nacional.
O Sr. Ministro da Presidência e da Defesa Nacional
(Fernando Nogueira): — Sr. Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano, Sr. Presidente da Comissão de Defesa Nacional, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, queria pedir desculpas pelo meu atraso.
Gostaria de fazer uma apresentação sumária do orçamento da defesa para 1992, que, de resto, já foi debatido duas vezes, como é do conhecimento dos Srs. Deputados, em sede da Comissão de Defesa Nacional.
As principais prioridades políticas definidas no orçamento da defesa nacional para 1992 têm a ver, em primeiro lugar, com a continuação das medidas de controlo e redução de efectivos, a par da finalização ou da ultimação do novo sistema retributivo dos militares. O ano de 1992 será um ano de pico em despesas de pessoal, por força dos desenvolvimentos do referido sistema retributivo, e esse aumento só não é mais acentuado porque, entretanto, já se produziu alguma redução de efectivos no activo e na reserva, de acordo com medidas tomadas em anos anteriores.
A segunda prioridade será a manutenção da despesa em níveis que garantam uma boa operacionalidade e prontidão das Forças Armadas e, portanto, um bom uso dos meios de que dispomos. Trata-se de um objectivo que julgamos estar salvaguardado no orçamento da defesa para 1992.
Em terceiro lugar, haverá a preocupação de continuar o processo de reequipamento e modernização das Forças Armadas. Nesse sentido, serão ultimados os programas que vêm do passado e prevê-se, como eu próprio já anunciei na Comissão de Defesa Nacional, a apresentação à
Assembleia da República, provavelmente em Abril, da segunda lei de programação militar.
Em quarto lugar, prosseguir-se-á o esforço de melhoria e racionalização das infra-estruturas de defesa, capítulo dentro do qual continuaremos a apostar numa alienação racional do património das Forças Armadas, de forma a reinvestir em novas construções mais afastadas dos centros urbanos e mais adequadas às finalidades a que se destinam.
Haverá, também, como linha prioritária de acção, o reforço do investimento em projectos de investigação e desenvolvimento. Pensamos que mais de 900 000 contos irão ser investidos este ano neste domínio, em diversos projectos, numa tentativa, que vai dando os seus frutos, de interessar a inteligência nacional, a investigação científica, a indústria e as Forças Armadas para o desenvolvimento de projectos de chamado «duplo uso», que permitem fazer avanços tecnológicos e uma melhor simbiose entre a comunidade científica, a comunidade económica e a comunidade militar, no nosso país.
Iremos prosseguir, desenvolver e reforçar a linha de cooperação militar com os países lusófonos. Para este efeito temos inscrita uma verba de 530 000 contos e há 27 projectos em curso com os cinco países de expressão portuguesa, no domínio da cooperação militar, que, paulatinamente, se vêm afirmando como algo que reforça a nossa presença nesses países, num plano de igualdade, amizade e cooperação entre Estados.
Vamos prosseguir a implementação do novo conceito de serviço militar obrigatório. O ano de 1992 é um ano de transição em que têm de ser tomadas algumas medidas com expressão orçamental, estando previstas as verbas respectivas.
Por último e ainda no domínio da reestruturação, irá prosseguir a revisão das leis orgânicas do Estado-Maior--General das Forças Armadas, dos estados-maiores dos ramos e do Ministério da Defesa Nacional, no sentido de construir um verdadeiro Ministério da Defesa, o que será também uma das prioridades durante o ano em curso.
Será dada alguma atenção, como no passado, às missões de interesse público nos mais diversos domínios, havendo cobertura orçamental para fazer algumas melhorias também neste âmbito.
Em termos muito resumidos, Sr. Presidente, são estas as grandes prioridades do orçamento da defesa para 1992.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está aberta a discussão.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: O orçamento do Ministério da Defesa Nacional, e creio que se poderá dizer, faz mais ou menos o contrário daquilo que havia sido anunciado, ou seja, diminui as verbas para investimento, material e equipamento, programação militar, manutenção e funcionamento, em termos reais, e, por outro lado, aumenta a verba de pessoal. Assim, em termos de grandes reformas, tudo o que tinha sido anunciado para este orçamento e para o sector está, neste momento, e podemos dizê-lo, para ser executado no futuro.
A verba para pessoal aumenta de uma forma que se justifica, tanto quanto nos foi dado a conhecer em sede de comissão, por razões que têm a ver com a aplicação do novo sistema retributivo, mas não só. Esse aumento deve-se também, no que se refere a uma parte significa-
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tiva — creio que 1,9 milhões de contos—, a um novo conceito de serviço militar, isto é, às reduções de tempo que se procuram implementar. Neste sentido, gostaria que o Sr. Ministro me confirmasse se é ou não verdade.
Quanto à rubrica «Programação militar», há uma descida nas verbas previstas, mas há mais do que isso. Há
informação de que uma parte da verba é destinada à execução da anterior Lei de Programação Militar e outra é destinada à futura lei de programação militar. Quanto à parte destinada à anterior lei, cujo período de vigência terminou em 31 de Dezembro e que se reporta a prolongamentos de execução, o Sr. Ministro ficou de entregar uma descrição de quais os programas a que se aplicava esta previsão de verba, isto é, quais os programas em que teria havido deslizamento e onde se inscrevia, neste orçamento, uma verba para cumprimento da anterior Lei de Programação Militar. Essa entrega ainda não foi feita.
Quanto à futura lei, não é possível, evidentemente, descrever quais as rubricas a que se vai aplicar, embora se deva dizer, Sr. Ministro, que muito tem sido dito aí acerca do que serão as futuras aquisições. Mas, de qualquer forma, é natural que não possa ser dado qualquer esclarecimento, pois a lei não está aprovada.
Relativamente às rubricas para funcionamento, há uma descida em termos reais e, nalguns casos, há descidas em termos nominais que não são tranquilizantes. Por exemplo, em termos do que se chama o treino operacional, recorde-se que a rubrica para munições, por exemplo, desce qualquer coisa como 782 000 contos — na Marinha desce 180000 contos, no Exército 65 000 contos, na Força Aérea 97 000 contos e no Gabinete do Ministro da Defesa Nacional 412000 contos. A descida total de previsão de despesa é muito significativa, ronda os 800 000 contos.
Uma outra informação que solicitava refere-se aos quantitativos de incorporados no serviço militar obrigatório, bem como os quantitativos de voluntários e contratados. Neste caso, é a Lei do Serviço Militar, na sua versão original e depois na sua revisão, que impõe que estes números figurem junto ao Orçamento. O Orçamento já foi entregue há cerca de um mês, já se efectuaram as reuniões da Comissão de Defesa Nacional e tem havido a sucessiva informação de que esses números serão entregues; só que daqui a pouco aprovamos o Orçamento e os números não são entregues. Eles têm uma função, que é a de dar uma estimativa quantificada do que são as opções de política para o ano e devem figurar nos anexos do Orçamento, continuando por ser fornecidos.
Creio ainda que convinha esclarecer alguma coisa quanto à autorização legislativa que está prevista no Orçamento para este sector. Essa autorização legislativa, que figura no artigo 6.° da proposta de lei do Orçamento do Estado, refere que «fica o Governo autorizado a legislar em matéria de efectivos militares». Foi explicado no debate em comissão que ainda não havia uma ideia sobre o seu conteúdo concreto e foram colocadas algumas hipóteses em abstracto. O que pergunto ao Sr. Ministro é se neste momento já há uma ideia concreta sobre qual é o seu conteúdo e alcance, de forma a poder haver uma melhor apreciação da autorização legislativa.
Para terminar, quero só acrescentar um ponto, que é muito simples, referindo-se às indústrias de defesa e estabelecimentos fabris. A situação não tem sido muito clara, nomeadamente no que toca às intenções quanto ao futuro dos estabelecimentos fabris e quanto à situação da INDEP (Indústrias Nacionais de Defesa, E. P.).
Em relação à INDEP, como o Sr. Ministro sabe, tem sido sucessivamente dito que desta vez é que está realizado o saneamento financeiro, desta vez está estabilizada a situação, e o que pergunto é se é desta vez que está
efectivamente estabilizada a situação, se vai haver aquisições por parte das Força Armadas e programas adequa-
dos para porem a INDEP a funcionar.
Quanto aos estabelecimentos fabris, qual é o ponto da situação no quadro das previsões orçamentais?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, começaria por chamar a atenção da Comissão para o que me parece ser a falta de convergência entre o Programa do Governo, a apresentação feita por V. Ex.* na parte que lhe dizia respeito e este Orçamento. Claro que se pode, de uma forma simplista, chegar à conclusão de que o Ministério da Defesa Nacional não pôde, em virtude de dificuldades gerais do Governo, levar a cabo ou propor o orçamento que pretendia. Mas penso que isto não explica tudo, porque, na realidade, se há uma convergência nacional para em determinado prazo podermos estar a par dos nossos parceiros comunitários e em condições de acesso comunitário adequado, este orçamento não traduz nenhuma convergência de defesa nem nenhuma convergência militar. Não é possível pensar dessa forma aumentando os gastos com pessoal, diminuindo os gastos com material de equipamento e mantendo, praticamente, os gastos de manutenção.
Por outro lado, nem mesmo aspectos como os do investimento do Plano, em que se diminui 20 %, saem fora do que acabei de citar. De acordo com uma informação que o Sr. Ministro prestou na Comissão de Defesa Nacional, o Ministério estaria empenhado em fazer uma redução de pessoal que o levasse, dos números de 67 % de despesas com pessoal, à média comunitária áe 50%. E diz o Sr. Ministro que esse objectivo, embora não se possa atingir em 1992, está previsto para 1993, ou seja, para o próximo orçamento.
Bem, é difícil acompanhá-lo nessa sua afirmação, de acordo com o que poderá ser um sistema de forças adequado. Isso não me parece evidente pela forma lenta e pouco significativa como diminuem as despesas com o pessoal do serviço militar obrigatório e, simultaneamente, pelas verbas que são aumentadas no orçamento — que poderia ser normal — relativamente às verbas necessárias pelo novo conceito de serviço militar, ou seja, continuam a aparecer mais verbas ainda do que aquelas que seria
normal, tendo em atenção a manutenção do serviço anterior. E é insignificante, na minha opinião, a verba de 1,9 milhões de contos prevista para dar satisfação ao novo conceito. Os anos de 1993, 1994 e 1995 serão novamente de transição, mais ou menos, de acordo com as dificuldades que o Sr. Ministro das Finanças tiver.
O Ministério da Defesa irá ter, em minha opinião e pela análise deste orçamento — e, portanto, pela amostra que está sobre a mesa—, dificuldades acrescidas nos próximos anos. Na verdade, pode chegar-se também a esta ideia quando se observam as verbas destinadas a dar cumprimento à segunda lei de programação militar. O Sr. Ministro diz que inclui uma verba de 16,1 milhões de contos para esse efeito, mas acrescenta logo a seguir, ou melhor, acrescenta-se no Orçamento, que, destes 16 milhões, 8 milhões são para dar satisfação a compromissos exis-
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tentes e os outros 8 milhões são para dar satisfação a compromissos a criar por essa segunda lei de programação militar. Se tivermos em atenção os rumores que correm neste país, se atendermos a que só um programa de draga-minas podia custar vinte e tal milhões de contos — bem sei que não seriam gastos todos num único ano, mas é só um programa, e é só para um ramo —, não se vê facilmente que, não só a quebra de anos anteriores, como os mais de 40 % de quebra em material e equipamento deste ano, a par de uma verba relativamente modesta para ser utilizada este ano de acordo com a segunda lei de programação militar, possam permitir que os anos de 1993 e seguintes não sejam igualmente difíceis para o Ministério da Defesa, e, o pior, para as Forças Armadas e para a segurança do País.
Gostava que o Sr. Ministro, quando respondesse a algumas destas questões, me esclarecesse ainda sobre alguns pontos concretos. Embora se fale de uma verba de quase 2 milhões de contos, que são necessários para despesas que o novo conceito de serviço militar vem trazer, não encontro em parte nenhuma verbas destinadas à alimentação, a fardamentos e outros gastos com pessoal voluntário e contratado.
Como o Sr. Ministro deve estar recordado, para além das verbas de 35,3 milhões de contos para pessoal da Marinha, de 58 milhões de contos para o Exército e de quase 28 milhões de contos para a Força Aérea, ainda aparecem, noutra rubrica, mais verbas — de 3 milhões de contos para alimentação na Marinha, de 300 000 contos para fardamento na Marinha, de 8 milhões de contos para alimentação no Exército, de 3,4 milhões de contos para fardamento no Exército, de 1,6 milhões de contos para alimentação na Força Aérea e mais cerca de 600 000 contos para fardamentos na Força Aérea. Isto é de considerar porque são verbas da ordem de 2 % a 8 % dos orçamentos de pessoal que estão colocadas noutras rubricas e que pesam sobre a conta de pessoal, pelo que esta sobe bastante mais do que está considerado na rubrica respectiva e não se vê onde é que se poderão encontrar estas verbas para os voluntários e contratados que voltem a ingressar.
Estas são as dúvidas que se me colocam nesta primeira intervenção.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Campilho.
O Sr. Pedro Campilho (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, uma pergunta muito curta relativa também a despesas com pessoal. Nota-se o aumento de despesas com pessoal neste orçamento da defesa nacional e pensamos que se traia ainda de um primeiro passo na reestruturação e no redimensionamento das Forças Armadas, que, no fundo, sofreram de uma pirâmide invertida e não foram sendo reestruturadas ao longo dos anos, como deveria ter acontecido, na nossa opinião. Estamos agora, é público, nesta reestruturação e neste redimensionamento das Forças Armadas, pelo que a pergunta que vou colocar é muito curta. Entende V. Ex.! que chegámos ao ano de pico do redimensionamento e da reestruturação? A partir do próximo ano começaremos a ver a redução do pessoal nas Forças Armadas, por via das reformas, dos incentivos à passagem à reserva e à reforma? Entende o Sr. Ministro que é este o ano de pico ou ainda vão passar mais alguns anos antes de se começarem a ver os resultados desse esforço de redimensionamento e de reestruturação?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.
O Sr. Marques Júnior (PS): — Sr. Presidente, peço desculpa por ter chegado um pouco atrasado e não sei se alguma das questões que vou colocar já aqui foi referida pelos Srs. Deputados que me antecederam, mas a intervenção do Sr. Deputado Pedro Campilho suscitou-me, de uma forma geral, um comentário.
Independentemente da resposta que o Sr. Ministro der à pergunta feita pelo Sr. Deputado Pedro Campilho, aproveito para o questionar sobre se é ou não verdade que este orçamento, em concreto, corresponde a uma política contrária às pretensões do Governo, pois vai ao arrepio de uma afirmação repetida pelo Governo — e com a qual até estou de acordo — de que há a necessidade de um equilíbrio ajustado entre despesas com pessoal e despesas com equipamento para que as Forças Armadas sejam minimamente operacionais. Assim, o desequilíbrio que neste momento existe deve ser atenuado com uma correspondência mais correcta e adequada entre os gastos com pessoal e os gastos com a operacionalidade das Forças Armadas, porque não nos interessa nada ter militares ou Forças Armadas que se limitem, pura e simplesmente, a existir, sem terem qualquer capacidade operacional.
Face a esta intenção do Governo, creio que este orçamento, em concreto, espelha exactamente o contrário.
O Govemo tem manifestado a ideia de que é necessário reduzir as verbas para pessoal e, no entanto, a aplicação do novo conceito de serviço militar obrigatório, de serviço efectivo normal, já demonstra neste momento — e estamos no início da sua aplicação, ainda nem sequer podemos dizer que se começou a implementar—, um aumento dessas verbas.
Está inscrita uma verba de 1,9 milhões de contos, mas suponho que tem um carácter previsional na medida em que não se sabe exactamente o que é que vai acontecer com a implementação do novo sistema de serviço militar obrigatório, pois desconhecemos quantos voluntários e contratados vamos ter até ao fim do ano.
Para o próximo ano, na esperança de concretizar plenamente este conceito, as verbas com pessoal terão naturalmente um aumento bastante acrescido, a que pode, como é óbvio, não corresponder o esforço do Govemo na diminuição de verbas para pessoal, em remunerações certas e permanentes, relativamente a outras rubricas como os incentivos previstos na proposta de lei do Orçamento para a passagem dos militares no activo e na reserva à situação de reforma.
Portanto, este orçamento vem ao arrepio dessa política do Governo, porque, simultaneamente com este agravamento em termos de pessoal, dá-se uma diminuição brusca muito grande em equipamento e material. Nesta situação, o fosso existente entre pessoal, equipamento e material foi aumentado com este orçamento e teria de haver uma recuperação muitíssimo grande nos próximos orçamentos em investimento no equipamento e material para que esta diferença entre pessoal e equipamento fosse atenuada.
Como comecei por dizer, gostava de saber se é ou não verdade — independentemente da resposta que o Sr. Ministro der ao Deputado Pedro Campilho e sabendo que este orçamento corresponde à referida política do Governo — que, neste caso concreto, este orçamento vem ao arrepio dessa política, ainda que como medida transitória Talvez seja isto que o Govemo vai dizer, explicando que não podia ser de outra maneira.
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Passo a apresentar a questão seguinte, a que o Sr. Deputado Eduardo Pereira já se referiu, mas que gostava de ver mais explicitada.
A implementação do novo conceito de serviço militar obrigatório, a sua diminuição para quatro meses, vai dar um acréscimo grande de despesas com pessoal e, em simultâneo, de despesas com outras rubricas, nomeadamente fardamento, calçado, alimentação e outros equipamentos relacionados com a própria instrução, uma vez que há muito mais pessoal na instrução e a rotação é muito maior.
Também me parece que o orçamento não espelha este aspecto de uma forma clara e adequada. Daí, sou levado a perguntar se é neste momento possível ao Governo explicitar, por exemplo, quais são as verbas responsáveis pelo acréscimo da despesa relativamente a estas matérias, com a implementação do novo conceito de serviço militar obrigatório.
Para termos uma ideia clara sobre os custos e encargos que a implementação deste novo sistema vai ter face ao serviço efectivo normal, é possível, neste momento, com a verba de 1,9 milhões de contos inscritos no pessoal, fazermos uma ideia de como as coisas se vão passar relativamente aos mais de 20000 elementos voluntários e contratados?
Parece que, no futuro, estaremos em situação difícil, porque talvez tenhamos de admitir que é necessário diminuir a incorporação do pessoal, o que trará implicações no sistema de forças. Contudo, esta hipótese é possível do ponto de vista técnico — o sistema de forças ficará a 6 % em termos operacionais. Em lugar de estar tudo a 100 %, estará a 50 % em termos de pessoal; eventualmente, estará a 100 % em termos de equipamento.
Se for mantida a incorporação e o sistema de forças, terá de haver períodos de licença do pessoal para este não gastar em alimentação, vestuário, etc. Portanto, até do ponto de vista técnico há possibilidades de compatibilizar estas situações.
Gostava de saber se, na perspectiva do Governo, há algo feito nesse aspecto ou se, previsivelmente, haverá, a curto prazo.
Esqueci-me de apresentar uma dúvida na reunião da Comissão de Defesa Nacional — a qual, provavelmente, tem uma explicação simples—, que se refere a uma diminuição de despesas com contrapartidas nas receitas, que é significativa. O Sr. Ministro pode dar uma ideia do porquê deste facto? Com certeza que algumas explicações serão relativas ao acordo da Base das Lajes e às negociações que estão em curso, mas outros casos, provavelmente, não têm uma explicação tão visível face aos próprios elementos fornecidos pelo Ministério da Defesa Nacional. Nuns casos, é clara essa diminuição de despesas com contrapartidas em receitas, mas noutros não é tão clara, pelo que gostava de ouvir a explicação que o Sr. Ministro tem para dar.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, uma vez que não há mais inscrições, para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Defesa Nacional.
O Sr. Ministro da Defesa Nacional: — Sr. Presidente, quero começar por agradecer aos Srs. Deputados que me colocaram questões. Muitas delas giram à volta da configuração do orçamento da defesa nacional para 1992 e de uma pretensa incoerência com aquilo que é anunciado no Programa do Governo e que foi por mim referido também na sua apresentação.
Sinceramente, julgo que não há qualquer tipo de incoerência. O que se passa é que 1992, em termos de quadros permanentes das Forças Armadas, é o ano de pico na despesa com pessoal. Porquê? Por causa do novo sistema retributivo.
O ano de 1992 será o último em que haverá descongelamento de escalões e, portanto, atinge-se o máximo de
recuperação dos escalões que tinham ficado congelados nos
anos anteriores, após a aprovação do novo sistema retributivo dos militares.
Por outro lado, é o ano em que se faz o último acerto do subsídio da condição militar. A partir de agora, não haverá mais aumentos deste subsídio.
Estas parecem-me ser razões óbvias para explicar por que é que 1992 é o ano de pico em termos do quadro permanente das Forças Armadas.
Há uma outra razão, mas que já é subsequente. É que, segundo a política do Governo assumida pelas chefias militares, deve haver redução do pessoal do quadro permanente das Forças Armadas, o que, evidentemente, vai ter repercussões durante este ano, mas reflectir-se-á, sobretudo, no ano que vem, porque não são todos aqueles que passarão ao estado de reforma no dia 1 de Janeiro de 1992. Será ao longo do ano que esse processo se irá desenvolver. Logo, a diminuição de encargos não se reflecte totalmente em 1992 e não nos podemos esquecer de que temos inscrito no orçamento o dinheiro para pagar a todos aqueles que estão no activo e que podem deixar de o estar durante este ano. Por conseguinte, isto significa que não nos devemos alarmar tanto com as verbas inscritas para pessoal já que se trata, apenas, da previsão pelo máximo das despesas que ocorrerão e que não aumentarão...
O Sr. João Amaral (PCP): — Dá-me licença que o interrompa?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral Q?CP): — É só para um pequeno esclarecimento sobre este ponto. O Sr. Ministro informou a Comissão de que a rubrica «Pessoal» do Ministério não inclui nem o aumento de 8 % — não se sabe se é de 8 %, mas provavelmente será — nem os aumentos derivados do novo sistema retributivo.
Ora, se não inclui os aumentos derivados do novo sistema retributivo, por que é que o Sr. Ministro diz que este aumento excepcional deriva dele?
O Orador: — É muito simples, Sr. Deputado. Quando falei na Comissão de Defesa Nacional, efectivamente, não estava previsto esse aumento nos números que discutimos, mas os documentos actualizados já foram entregues pelo Ministério das Finanças à Comissão de Economia, Finanças e Plano.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Ministro, peço desculpa, mas na rubrica «Pessoal» o aumento que está previsto, por exemplo, para o Exército, 6 de 21,48 % e esse aumento, que é o que está no orçamento, tal como nos foi entregue, não inclui nem o aumento normal nem os aumentos decorrentes do novo sistema retributivo. Isto é, no caso concreto...
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O Orador: — É verdade, Sr. Deputado, mas não vamos sofismar. É que o Sr. Deputado, por um lado, diz: «Acrescenta 1,9 milhões de contos para o Exército.» É verdade, é isso que dá os 11 % de aumento; porém, não se trata de despesas com o pessoal do quadro permanente, mas, sim, com a aplicação do novo conceito de serviço militar obrigatório.
Não escamoteei esse facto, até fui eu que forneci esse número aos Srs. Deputados. Portanto, o Sr. Deputado está a sofismar quando diz que há um aumento de 11,4 %! Há, por força dessa circunstância, mas estava a enquadrar a minha resposta naquilo que é o quadro permanente das Forças Armadas.
Quanto ao novo conceito de serviço militar obrigatório, recordar-se-ão os Srs. Deputados das visões alarmistas e catastróficas quando o discutimos, que já em 1992 previam 10 milhões de contos a mais no orçamento da defesa nacional e eu dizia: «Não é tanto!» Sempre admiti que havia aumento de encargos por força do novo conceito de serviço militar obrigatório, mas não os números catastróficos que os Srs. Deputados apresentavam.
E posso dizer mais ao Sr. Deputado: estou convencido de que o Exército não vai gastar 1,9 milhões de contos com o novo conceito de serviço militar obrigatório. Simplesmente, para que cultural e psicologicamente o Exército não ficasse abalado, admiti inscrever tudo aquilo que me foi pedido. O Exército pediu-me exactamente esse número e foi inscrito, de modo a não prejudicar a operacionalidade e a composição do sistema de forças de que falava o Sr. Deputado Marques Júnior.
Temos prevista uma preparação estratégica em termos plurianuais do orçamento do Ministério da Defesa Nacional. A este propósito, queria fazer uma correcção ao Sr. Deputado Eduardo Pereira.
É verdade que eu disse na Comissão de Defesa Nacional que a percentagem de despesas com pessoal, neste momento, nas Forças Armadas portuguesas, é, em média, de 67 %, mas não disse que íamos baixar para 50 % em 1995. Isso seria uma revolução! O que disse, e os Srs. Deputados que integram a mencionada comissão parlamentar devem ter isso presente, é que prevemos que, em 1995, as despesas com pessoal sejam de 62 %. Portanto, haverá uma baixa de 5 % —de 67 % para 62 % — até 1995. Baixar para 50 % é um objectivo de muito longo prazo. De outra forma, seria extremamente traumatizante para as Forças Armadas portuguesas. O ganho que vamos ter nesta matéria reverterá directamente para as verbas de operação e manutenção e também para a Lei de Programação Militar. Prevejo que possamos aumentar a presente percentagem da rubrica «Operação e manutenção» de 18 % para 22 %, em 1995.
Também quero dizer-vos que, em termos de «Operação e manutenção», não é verdade — como já expliquei em sede da Comissão de Defesa Nacional — que haja redução real ou nominal das despesas. O que se passa é que nesta rubrica estavam confundidos — digamos assim — muitos aspectos para além dos que verdadeiramente podem caracterizar-se como sendo de operação e manutenção. Entre estes estavam as despesas de infra-estruturas, isto é, obras físicas realizadas em aquartelamentos, que, do nosso ponto de vista, não devem estar inscritas nesta rubrica mas, sim, no PIDDAC ou na Lei de Programação Militar. Por isso foi vedado aos ramos das Forças Armadas efectuarem despesas com infra-estruturas financiadas através de verbas de «Operação e manutenção», porque nem isso era curial do ponto de vista orçamental nem era prioritário,
em prejuízo da «Operação e manutenção», tanto mais que o dispositivo está a ser revisto e mandámos suspender a realização de reparações em infra-estruturas que não sabemos se não terão de ser desactivadas a curto prazo. É essa a razão por que, na aparência, há uma redução de verbas na rubrica «Operação e manutenção». É que, pelo contrário, o nível de crescimento das verbas nesta rubrica mantém-se em termos reais ao nível do ano anterior. Só que, Srs. Deputados, no ano anterior, estas mesmas verbas cresceram 23 % no seu conjunto, tendo havido ramos em que cresceram mais de 50 %.
Portanto, isto significa que o esforço feito no ano passado, que foi extraordinário e constitui um salto qualitativo, foi conservado este ano relativamente ao que é a despesa para manter os meios de que dispomos. Por conseguinte, posso garantir-vos que haverá bons níveis de operacionalidade dos meios afectos às Forças Armadas de momento.
Ainda quanto ao planeamento a médio prazo — que está em discussão com o Ministério das Finanças por entendermos que, neste domínio, deve haver um grau mínimo de previsão para podermos desenvolver a nossa política —, à Lei de Progamação Militar será consignado, em média anual, um esforço do Orçamento do Estado que, sem considerarmos 1992, corresponde a um valor superior a 20 milhões de contos. Isto significa que retomaremos os níveis de investimento dos anos anteriores, com um ligeiro reforço.
Assim, em termos de programação militar, prevejo que, em 1993, venham a ser inscritos, no mínimo, 20 milhões de contos no Orçamento do Estado para novo equipamento.
Aproveito estar a falar na Lei de Programação Militar para dizer aos Srs. Deputados que era impensável que não houvesse transição da anterior lei durante mais algum tempo, após o seu período de vigência. Quer dizer, os programas arrastam sempre despesas, mesmo para anos subsequentes àqueles em que foram lançados.
Portanto, relativamente à discriminação dos 8 milhões de contos que correspondem a encargos anteriores, de que falava o Sr. Deputado João Amaral, diz-me o Sr. Secretário de Estado que já enviou o documento para a Assembleia e os Srs. Deputados que integram a Comissão de Defesa Nacional recordar-se-ão que discriminei verbalmente os programas. Se quiserem posso repeti-lo...
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Ministro, creio que deve haver aqui um problema de correio, já que esse documento ainda não foi avistado na Assembleia. Portanto, talvez houvesse toda a vantagem em que o Sr. Ministro o lesse pausadamente para que fique registado em acta, assim substituindo o inconveniente provocado pelo atraso dos CTT.
O Orador: — Se o Sr. Presidente estiver de acordo com a metodologia proposta pelo Sr. Deputado João Amaral, procederei à leitura.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: —Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Sr. Presidente, se o Sr. Ministro satisfazer essa pretensão, levará toda a manhã a ler porque, para além do mapa de encargos com a Lei de Programação Militar, o correio também ainda não trouxe os mapas com os quantitativos de contratados e
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voluntários para 1992, os mapas dos sistemas de ensino comparados com os de outros países da NATO, ou os mapas de comparação das idades médias nos diversos postos da hierarquia militar. Provavelmente, até terão sido enviados em envelopes separados...
De qualquer maneira, julgo que seria muita leitura.
O Sr. Presidente: — Como calcularão, a adopção ou não do critério da leitura compete ao Sr. Ministro, o que é óbvio.
Queira continuar a sua exposição, Sr. Ministro.
O Orador: — Sr. Presidente, tenho todo o gosto em enviar elementos à Assembleia, mas não vejo em que é que os mapas comparativos sobre as escolas militares da NATO têm a ver com o Orçamento do Estado para 1992.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — É só porque o respectivo envio estava prometido, Sr. Ministro.
O Orador: — Estava prometido o envio à Comissão de Defesa Nacional, noutro contexto que não o da discussão do Orçamento...
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Exacto, exacto.
O Orador: — Como o Sr. Deputado sabe, somos muito pródigos em dar informações aos Srs. Deputados. No entanto, isso não vem a propósito do Orçamento do Estado.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Claro! Trata-se só de cumprir promessas, mas nada tem a ver com o Orçamento.
O Orador: — Também posso dizer que, tal como tinha afirmado em sede da Comissão de Defesa Nacional, já estão aprovados os números dos incorporados para 1992. Tinha dito aos Srs. Depoutados que o meu propósito era o de não autorizar um número superior ao do ano passado. Posso dizer-vos que assim procedi, pelo que, no Exército, será de 44 400 o número dos incorporados autorizado para 1992, partindo do princípio de que nem todos serão incorporados. Portanto, trata-se de um plafond máximo que, seguramente, não será atingido devido à revisão do dispositivo que, entretanto, está a ocorrer.
O Sr. Presidente da Comissão de Defesa Nacional acaba de vir em meu auxílio, entregando-me um documento que já deu entrada na Assembleia da República e que vai ser distribuído...
O Sr. Presidente: — Este documento veio dirigido à Comissão de Economia, Finanças e Plano e à de Defesa Nacional. Pela minha parte, despachei-o, pelo que julgo que os Deputados da Comissão de Economia já estão de posse dele. Estava convencido de que o Sr. Presidente da Comissão de Defesa Nacional também já o teria despachado. Aparentemente, assim não aconteceu e, portanto, peço aos serviços que distribuam o documento a todos os Srs. Deputados presentes.
O Sr. João Amara) (PCP): — Sr. Ministro, como vê, havia um problema de correio.
O Orador: —Quanto às munições, também foi esclarecido aos Srs. Deputados da Comissão de Defesa Nacional que, depois de um esforço consecutivo durante anos, os stocks das munições dos ramos estão preenchidos. Foram
os próprios ramos que nos dispensaram de inscrevermos verbas significativas para este fim, uma vez que. a partir de agora, essas munições, a serem adquiridas, só causariam embaraços ao ramo, o que, naturalmente, não desejamos.
Passo às verbas para fardamento e alimentação. É preciso que entendamos que o que importa ter em conta relativamente a despesas de alimentação não é o número de pessoas que passam pelas fileiras mas o número de mancebos/dia que estão nos quartéis.
Claro que, quando o serviço militar obrigatório era de 12 meses, havia que prever a despesa por cada homem para 365 dias de almoços e jantares. Havendo um serviço militar de oito meses, já não são 365 dias de refeições, mas dois terços destes. Logo, com o mesmo número de incorporados do ano passado, as despesas de alimentação não vão aumentar e, pelo contrário, até podem diminuir, porque os que estão a cumprir um serviço de oito meses não comerão mais nem melhor do que os que cumpriam um serviço militar de 12 meses. Assim, o item que conta para apreciação das despesas de alimentação é o dp número de homens/dia nas fileiras. Não é verdade, Sr. Deputado Eduardo Pereira?
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Não, Sr. Ministro. E não é verdade se o Sr. Ministro quiser manter um sistema de forças de que possa socorrer-se em qualquer momento.
Se, após os oito meses de serviço, o Sr. Ministro mandar para casa todos os homens, então seria como diz. Mas o Sr. Ministro deve necessitar, durante alguns anos, de manter conjuntamente os incorporados no serviço militar obrigatório e os novos contratados. Portanto, não poderá haver grande diminuição desta verba, tendo mesmo de haver aumento.
O Orador: — Sr. Deputado, se o número de incorporados este ano é o mesmo do ano passado, não vejo como é que vou gastar mais dinheiro em alimentação.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Sr. Ministro, é porque ainda vai ter mais contratados e voluntários para além destes.
O Orador: — Claro que sim! Simplesmente, há pessoal que, entretanto, passou à reserva e à reforma e que deixa de ser alimentado nos quartéis. Portanto, a verba que está inscrita para alimentação é suficiente.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Sr. Ministro, esta é uma questão de aritmética. Se aumentaram os gastos com o pessoal, não percebo porque é que diminuíram os da alimentação, que constituem uma das suas parcelas. É que, neste orçamento, aumentaram todos os gastos, pelo que, aritmeticameme, poderíamos ver que também vão aumentar os gastos com alimentação e fardamentos.
O Orador: — Em relação ao fardamento, tenho um esclarecimento a dar ao Sr. Deputado.
Com o novo conceito de serviço militar obrigatório, o Exército procedeu a alterações no fardamento que permitem uma poupança de cerca de um terço da verba que era gasta normalmente. Por isso, aí está outra razão pela qual a rubrica relativa ao fardamento não tem de aumentar. É que não é tão exigente o espólio entregue a cada um
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dos recrutas, o que já está em aplicação. Assim, não há qualquer receio quanto à suficiência da verba para fardamento prevista no orçamento da defesa.
Quanto às outras questões que me foram colocadas, penso que já as respondi de modo geral. Falta apenas acrescentar, em resposta ao Sr. Deputado Marques Júnior, que as despesas com compensação em receita são, normalmente, infra-estruturas da NATO. Ora, neste momento, há alguma indefinição quanto às infra-estruturas da NATO que serão realizadas em Portugal, devido a cortes orçamentais.
Portanto, não há problema quanto a essa rubrica porque ela corresponde àquilo que a NATO vai investir no nosso país.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Eduardo Pereira.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Sr. Ministro, sobre a Lei de Programação Militar, V. Ex.* disse que 1993 seria um ano em cujo Orçamento deveriam aparecer 20 milhões de contos relativos a programação militar.
Gostaria de saber se, de acordo com o seu conceito, parte destes 20 milhões será para pagamentos de matérias em curso e novas. É porque, este ano, temos 16 milhões e é oito por oito, portanto, poderemos estar ao mesmo nível. Se o Sr. Ministro não me responder, presumo que os em curso diminuem bastante.
A segunda questão prende-se, ainda, com a rubrica «Alimentação e fardamento». Sr. Ministro, não lhe parece que na alínea «Manutenção e funcionamento» deveria estar incluída a parte de alimentação e fardamentos, já que houve certas estruturas que foram retiradas?
O Sr. Ministro da Presidência e da Defesa Nacional:— Antes de iniciar a minha resposta, parece-me que o Sr. Deputado João Amaral também quer colocar outra questão, pelo que, se o Sr. Presidente assim o entender, eu responder-lhes-ia em conjunto.
O Sr. Presidente: — Se bem percebi, o Sr. Ministro já deu por terminada a sua resposta ao primeiro conjunto de perguntas que lhe foram colocadas, pelo que vamos dar início a uma segunda ronda de pedidos de esclarecimento. Assim, tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Ministro, começarei por voltar à questão do envio de documentos à Assembleia. O documento que nos foi agora entregue engloba indicações sobre contingentes de pessoal incorporados no serviço militar. Segundo o Sr. Secretário de Estado informou, também já foi enviado o documento contendo a lista dos programas militares que se referem à verba prevista em «Programação militar» para o corrente ano e que ainda decorre da Lei de Programação Militar anterior. Se, como parece, este documento ainda não chegou, gostaria de saber se o Sr. Ministro o tem consigo ou, então, pedir-lhe que promovesse o respectivo envio, conforme tinha ficado assente, pois trata-se de um documento de trabalho essencial.
Por outro lado, além desta informação sobre os contingentes de pessoal incorporado no serviço militar, a lei — que foi aprovada na Assembleia da República — também obriga à remessa dos números previstos de voluntários e contratados relativamente ao corrente orçamento. Esses elementos não constam deste ofício que tenho em meu
poder, constando só os números relativos ao contingente de pessoal incorporado nos termos da Lei do Serviço Militar.
Quanto à questão da rubrica «Pessoal», só quero fazer um reparo. Não sei se a palavra «sofismar» significa para o Sr. Ministro o mesmo que para mim próprio, mas, se tem o mesmo significado, então, diria que V. Ex.* é que está a sofismar, porque a rubrica «Pessoal» é a única em que há um crescimento significativo no orçamento para 1992. É que a rubrica «Material e equipamento» desce notoriamente, a rubrica «Manutenção e funcionamento» cresce 33 %, a da «Programação militar» desce e a que sobe é, precisamente, a rubrica «Pessoal». Ora, um sofisma seria dizer que esta última rubrica sobe por causa das incidências do novo sistema retributivo no Orçamento para 1992, quando, afinal, essas incidências não constam da proposta de lei do Orçamento do Estado no respeitante ao orçamento da defesa nacional tal como ela foi apresentada à Assembleia da República e defendida na Comissão de Defesa, tal como ela está a ser explicada aqui neste momento.
Por outro lado, também em relação ao novo conceito de serviço militar, há uma margem razoável de sofisma por uma razão muito simples: a verdade é que se propalou a ideia de que o novo conceito ia embaratecer o sistema e este orçamento demonstra que, afinal, o encarece. Dirá o Sr. Ministro que não encarece tanto como alguns sectores militares e algumas informações dadas no âmbito das Forcas Armadas disseram na altura; mas a verdade é que os níveis de aplicação do novo conceito de serviço militar, que estavam previstos nessas informações para o corrente ano, não se verificam, nem de perto nem de longe. O nível de aplicação do novo conceito de serviço militar está bem demonstrado neste orçamento no facto de o contingente a incorporar ser sensivelmente o mesmo do ano passado, isto é, não há praticamente aplicação de novo conceito de serviço militar nenhum.
Aliás, também está bem demonstrado o facto de ser muito difícil ao Ministério informar esta Assembleia sobre qual é o número de voluntários e contratados que prevê que, ao abrigo da nova Lei do Serviço Militar, será definido e pago pelo Orçamento de 1992. Na verdade, como muito bem observou o Sr. Deputado Eduardo Pereira, será sempre um acréscimo a um número de incorporados nos termos gerais, que corresponda ao mesmo número do ano passado e ao mesmo de há dois anos, ou até mais.
Portanto, Sr. Ministro, vamos ter muitas oportunidades de falar de sofismas, incluindo quando discutirmos a Lei de Programação Militar e as razões do seu atraso, razões essas que se prendem com os atrasos de financiamentos externos que o Governo tem e com as dificuldades que o Governo dos Estados Unidos da América está a colocar à negociação do Acordo das Lajes — mas essa é outra área que de que não vale a pena falar agora.
O Sr. Presidente: — Dado que não há mais inscrições, dou a palavra ao Sr. Ministro da Presidência e da Defesa Nacional, para responder.
Q Sr. Ministro da Presidência e da Defesa Nacional: — Respondendo ao Sr. Deputado Eduardo Pereira, devo dizer que na Lei de Programação Militar estão previstos 16,1 milhões de contos, destinando-se, como já disse, cerca de 8 milhões a compromissos anteriores. Isto reduzirá abruptamente os encargos da primeira lei de programação militar em 1993, isto é, será um número
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muito longe dos 8,5 milhões de contos. Não é possível desde já adiantar o número, porque há o processo de revisão de preços e esse é ligeiramente incontrolável, mas será um número muitíssimo mais pequeno do que os 8,5 milhões de contos.
De pouco adiantaria inscrever este ano 20 milhões de contos no orçamento, porque se a lei der entrada em Abril, se a aprovarmos em Maio, publica-se em Junho, pelo que não haveria tempo útil para utilizar o remanescente. De todo o modo, na economia global do orçamento, parecia-nos não haver espaço para inscrever mais verbas, pelo que se juntou uma circunstância de facto a outra circunstância de facto.
Quanto à inscrição orçamental da alimentação e fardamento, ela inicialmente estava na rubrica «Pessoal», só que as regras da contabilidade pública exigem outra inscrição e nós cumprimo-las; por isso a inscrevemos numa outra rubrica orçamental que não era a tradicional há uns anos atrás.
Sr. Deputado João Amaral, a norma que invoca, do estatuto dos militares e das Forças Armadas, foi alterada pela Lei do Serviço Militar Obrigatório, que diz que, nos anos de 1991 e 1992, a fixação dos efectivos de voluntários e contratados será feita por portaria do Ministro da Defesa. Essa portaria já foi assinada — sem ela não poderia ter feito o despacho dos incorporados — e será remetida à Assembleia da República — embora conste do Diário da República terei todo o gosto em remeter uma cópia dessa portaria.
Sr. Deputado, vamos lá ver se nos entendemos: também já disse, na Comissão de Defesa Nacional — e é natural que, no meio das muitas informações que procuro dar, algumas escapem aos Srs. Deputados—, que as despesas com pessoal em 1991 e 1992 não permitem uma comparação perfeita, porque gastámos em 1991 mais dinheiro do que aquilo que foi inscrito inicialmente no Orçamento do Estado para 1991. A diferença foi suportada por transferências do Ministério das Finanças, porque se constatou, ao longo do ano, que a verba inscrita para pessoal não era suficiente. Portanto, não podemos comparar aquilo que é verba de pessoal inscrita inicialmente no Orçamento de 1991 com aquilo que é verba de pessoal inscrita inicialmente no Orçamento de 1992. A verba que foi executada em 1991 foi de cerca de 123 milhões de contos e aquilo que está inscrito para 1992 é de 126 milhões— a explicação está no tal reforço de pessoal por força do novo conceito de serviço militar obrigatório.
A propósito do novo conceito de serviço militar obrigatório, devo esclarecer que nunca disse (podemos constatar isso nas actas da discussão dessa matéria) que não haveria aumento de encargos. O que disse sempre foi que os aumentos de encargos seriam absorvidos por outras poupanças que deveríamos fazer, em virtude das reformas que estão a ser levadas a cabo nas Forças Armadas. Além do mais, quando o Sr. Deputado diz que os contratados, os voluntários e os mancebos têm de cumprir o serviço militar durante oito meses, está a esquecer-se de uma outra norma da Lei do Serviço Militar Obrigatório que diz que pode ser antecipada a saída dos mancebos, mesmo antes dos oito meses, à medida que forem substituídos por voluntários e contratados. Isto está na lei.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Mas as verbas não apontam para aí, Sr. Ministro! Não há verbas no Orçamento deste ano e presume-se que não as haverá no próximo ano para fazer isso.
O Orador: — Porquê, Sr. Deputado? Se vamos contratar este ano mais 3000 pessoas para o Exército, podemos dispensar 3000 cidadãos de fazer o serviço efectivo normal, à medida que esses contratados entrarem. Porque os tais 1,9 milhões de contos são para pagar a remuneração aos contratados e aos voluntários. Portanto, à medida que esses entrarem, podem ser dispensados outros, antes de cumprirem os oito meses.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Portanto, no máximo, passa a ser igual, mas a tendência é para que haja sempre, durante algum tempo, sobreposição dos outros ao contingente normal.
O Orador: — Muito pequena!
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Sr. Ministro, para 1992, se V. Ex.' contratar 3000 ou 4000 pessoas, posso dizer-lhe desde já que passa de 44 000 para 47 000 incorporados este ano...
O Orador: — Não é necessário.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Sr. Ministro, V. Ex.» mandou incorporar 44 000, e é também V. Ex.1 que está a dizer...
O Orador: — Como limite máximo, Sr. Deputado.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Mas eu suponho que estas coisas não se travam assim com essa facilidade!
O Orador: — Travam, sim. Quer ver, Sr. Deputado?
O Sr. Eduardo Pereira 0?S):—Tem de se comprar fardamentos, etc.
O Orador: — Há um outro factor muito importante que é a revisão do dispositivo que, como já anunciei na Comissão de Defesa Nacional, durante o 1.° trimestre deste ano iria acontecer.
O Sr. Presidente: — Permitam-me que faça uma pequena observação: todos confiamos muito nos serviços de redacção e na sua capacidade para identificar as várias vozes, desde que não se sobreponham. Porém, sugiro que façam uma pausa entre as intervenções para que os serviços de redacção possam identificar devidamente cada um dos oradores e fazer o registo adequado.
Faça o favor de continuar, Sr. Deputado.
O Sr. Eduardo Pereira ÇPS): — Queria apenas perguntar ao Sr. Ministro se considera este orçamento ideal para a nossa posição nas Comunidades e na NATO, para as necessidades de defesa, para resolver os problemas de pessoal, etc? Consideramos que este orçamento está completamente distorcido, que devia haver uma melhor transição do serviço militar anterior para o novo conceito de serviço militar, que não devia ter sido feita essa poupança ou que essa despesa devia (cr sido socorrida por verbas de equipamento e que o que este ano se faz se irá repercutir por mais dois ou três anos sem possibilidade de modificação, a não ser com verbas astronómicas transferidas do Ministério das Finanças para o da Defesa.
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O Orador: — Presumo que isso não foi um pedido de esclarecimento.
O Sr. Eduardo Pereira (PS): — Não, não. Foi uma afirmação.
O Orador: — Uma afirmação que merece a nossa discordância, porque, tal como já tive ocasião de dizer a todos os Srs. Deputados, o nosso propósito — e julgamos que está ao nosso alcance, dado que estão feitas todas as análises — é o de reduzir as despesas com pessoal, de uma forma global, de 67 % para 62 % em 1995, aumentando até 1995 as despesas com operação e manutenção de 18 % para 22 %, no mínimo, e garantindo uma lei de programação militar que tenha uma transferência anual, em média, superior a 20 milhões de contos na segunda lei de programação militar. E acreditamos sinceramente — no que somos acompanhados pelas chefias militares — que o processo de mudanças que está em curso permitirá chegar a 1995 com estes objectivos plenamente atingidos.
O Sr. Presidente: — Não há mais inscrições. Porém, antes de encerrar os trabalhos, e ainda sobre a questão colocada há pouco pelo Sr. Ministro da Defesa e por mim próprio, quero esclarecer, para que fique registado, que o documento a que alguns Srs. Deputados se referiram, e que receberam durante esta reunião, só chegou ao Sr. Presidente da Comissão de Defesa Nacional exactamente no decurso da reunião. Por isso é que os Srs. Deputados também não o tiveram antes.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, o documento em relação ao qual coloquei a questão da sua falta e que o Sr. Secretário de Estado diz que já remeteu à Assembleia é o que se refere à lista de investimentos que o Governo projecta na Lei de Programação Militar. O documento foi agora distribuído, por iniciativa do Sr. Ministro, através de fotocópia, mas por via oficial ainda não chegou à sua mão.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, dou por encerrada esta parte da reunião, agradecendo a presença do Sr. Ministro da Presidência e da Defesa Nacional, bem como da sua equipa.
Eram 11 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados, vamos reiniciar os nossos trabalhos.
Eram 11 horas e 40 minutos.
Prosseguindo na apreciação e debate na especialidade das propostas de lei do Orçamento do Estado e das Grandes Opções do Plano para 1992, temos agora connosco o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território e da sua equipa governamental e, à semelhança do que tem sucedido noutros casos, desde que o St. Ministro não veja nisso inconveniente, dar-lhe-ei a palavra para uma intervenção introdutória.
Estamos num debate na especialidade — reafirmo-o mais uma vez —, pelo que é possível, mas não obrigatório, nesta fase proceder à entrega de propostas de alteração, bem como até ao momento da votação, o que tem sido habitual. Peço aos Srs. Deputados que
tenham isso em consideração, sem prejuízo da liberdade que têm para intervir no sentido com a latitude que julgarem mais conveniente.
Tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território (Valente de Oliveira): — Como sabem, estão comigo os Srs. Secretários de Estado da Administração do Território, do Planeamento e do Desenvolvimento Regional e da Ciência e Tecnologia. Portanto, é sobre estes três domínios que irei falar.
No que respeita ao domínio das autarquias locais e do ordenamento do território, gostaria de dizer que as transferências para as autarquias são no montante de 178,8 milhões de contos e que teremos agora uma série de verbas complementares, como as das sedes das juntas de freguesias, que são de 450 000 contos, as das assembleias distritais estão em vias de perder o peso que tinham antigamente na versão das suas funções e a que agora se atribuem 50 000 contos; temos um programa em curso de apoio aos planos directores municipais, que estão a ser desenvolvidos por lodo o País em bom andamento e com todo o entusiasmo, que vão ter, para serem acelerados, orçamentados 200000 contos; temos 1,6 milhões de contos destinados ao financiamento de projectos das autarquias locais no âmbito da celebração de contratos-programa, e 50 000 contos para a instalação das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, sendo 30 000 contos a verba destinada à Área Metropolitana de Lisboa e os restantes 20 000 contos destinados à do Porto. Isto nada tem a ver com o funcionamento das áreas metropolitanas, como já tive ocasião de referir, mas somente com a sua instalação.
No que respeita às verbas do PIDDAC atribuídas ao Ministério, verbas de transferência para as autarquias — e agora não estou a falar no PIDDAC geral, nisso falarei mais adiante—, temos uma correspondente ao PIDDAC co-ñnanciado de 28,4 milhões contos, que tem muito a ver com a parte dos incentivos e a área da ciência e tecnologia.
Quanto aos investimentos no âmbito da administração local e do ordenamento do território, temos 3,9 milhões de contos, dos quais 2,7 não co-financiados para a área da ciência e tecnologia, sendo, como é hábito na Secretaria de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional, a parte não co-financiada muito pequena — são só 300 000 contos.
Dito isto, gostava de referir que, no que toca à administração local, acolheram-se sugestões que vinham há muito a ser produzidas, tendo sido encontrados mecanismos que lhes dessem consequência, particularmente no que respeita à distribuição e aos seus critérios, tendo em atenção e como preocupação de maior a situação dos concelhos mais desfavorecidos. Curiosamente, verifica-se que a nova distribuição dos aumentos, que, aliás, foi acordada com a Associação Nacional de Municípios em trabalho conjunto, é quase coincidente, ou pelo menos muito próxima, com o mapa dos decréscimos demográficos nos últimos 10 anos — os dois mapas são quase a imagem um do outro —, o que significa que, efectivamente, são as zonas menos atraentes que vão receber mais. Portanto, isto significa que, tirando alguns casos em que há desvios — e a regra geral tem sempre um ou outro desvio que contém seguramente algum desajustamento —, a verdade é que há uma proximidade muito grande nos dois mapas, o que indica que deve dar certo.
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Pede-se para alterar o regime de lançamento da derrama e de todas as coisas que há pouco referi (as finanças distritais, as juntas de freguesia, os auxílios financeiros às autarquias locais, a cooperação técnica e financeira, o apoio de meios técnicos...), mas há uma coisa que me parece importante, que é a possibilidade de começarmos a negociar com a Associação Nacional de Municípios Portugueses a transferência de funções. Como já tive ocasião de referir, gostaríamos que fossem conjuntos coesos, inteligíveis e coerentes de funções a passarem para as autarquias, negociando essa passagem com a sua associação representativa.
No que toca ao PIDDAC geral, propomos um crescimento em termos reais de cerca de 20 %, o que significa o maior crescimento dos últimos anos, naturalmente porque temos de acelerar a realização do quadro comunitário de apoio (QCA).
O peso do PIDDAC no PIB passará de 2,4 %, em 1991, para 2,7 %, em 1992, e representa, em termos do total da despesa pública, 8,2 %, incluindo os juros da dívida pública.
No investimento global, na formação bruta de capital fixo, o PIDDAC representa cerca de 10 % e se ao valor orçamentado no PIDDAC forem aditados os fundos associados à contrapartida interna, portanto aquilo que na nossa arrumação se chama PIDDAC — Apoios, a participação eleva-se a 15 %, ou seja, 310 milhões de contos, mais 155 milhões de contos, dá um total de 465 milhões de contos.
Suponho, Sr. Presidente, que, para economizar tempo, não valerá a pena repetir aqui o que tive ocasião de referir nas diversas comissões especializadas, particularmente na Comissão de Economia, Finanças e Plano, sobre a distribuição e a estrutura do PIDDAC, isto é, as referências que então fiz e a chamada de atenção relativamente à nitidez das opções, que são efectivamente claras no que nos propomos fazer.
Quanto à matéria de fundos estruturais que, ao fim e ao cabo, são a causa desta tão grande insuflação do PIDDAC e do nosso investimento, gostaria de dizer que a meta de pagamentos incluída nas Grandes Opções do Plano foi ultrapassada em 1991, pois estavam previstos 250 milhões de contos de pagamentos e fizemos 300 milhões de contos. Deste modo, o montante transferido em 1991 foi superior ao próprio PIDDAC, e, para referir números, em seis anos os fundos estruturais foram multiplicados por 7, passaram a cerca de 42 milhões de contos, em 1986, e para 300 milhões de contos, em 1991.
Podemos ainda dizer que desde 1986, desde a adesão, não contando com os fundos de pré-adesão, o total dos fundos estruturais transferidos foi de 850 milhões de contos, dos quais 450 milhões de contos dizem respeito ao FEDER.
Portanto, com estas subidas que têm vindo a ocorrer, o peso dos fundos estruturais do PIB passaram de 2 %, em 1990. para 3 %, em 1991, prevendo-se já em 1992, se tudo correr como queremos, uma transferência mínima de 350 milhões de contos, o que significa ter-se uma percentagem de peso dos fundos estruturais no PIB de 3,1 %.
No que toca à distribuição do FEDER são-nos feitas, muitas vezes, observações pelas diversas entidades. Ora, eu gostaria que ficasse claro que há uma grande distribuição pelas mesmas e que o peso das autarquias nessa distribuição é muito elevado. Assim, em 1991, relativamente à distribuição do FEDER, só a administração
central teve 15% — valor igual ao das Regiões Autónomas—, as autarquias levaram um quarto (25 %), as empresas públicas 19 % e as privadas, especialmente no sistema de incentivos, 26 %.
Se os Srs. Deputados quiserem depois alguma referência concreta acerca dos problemas propriamente ditos, os problemas operacionais, é evidente que teremos muito gosto em dá-la.
Ainda nesta apresentação inicial, gostaria de fazer uma referência, suscinta, no que toca à ciência e tecnologia.
A parte do Orçamento dedicada à ciência e tecnologia tem vindo a subir. Assim, o que vamos ter em 1992, com excepção das universidades, são cerca de 55,8 milhões de contos, mas se incluirmos as universidades e o que vem a ser o valor estimado para os seus gastos temos 67 milhões de contos.
Gostaria ainda de referir que os encargos na percentagem dos organismos financiadores e executores em relação ao total das despesas do Estado, incluindo as universidades e os encargos da dívida pública, passam a ser de 1,4 % e sem os encargos da dívida pública de 2,07 %.
Ora, o número mais indicativo e o mais referido relativamente a 1992, na perspectiva de previsão, é o que respeita à ciência e tecnologia, pelo que gostaria de dizer que temos vindo efectivamente a incrementá-lo, lentamente mas de forma constante, de tal maneira que essa percentagem para este ano, exceptuando as empresas e as instituições privadas sem fins lucrativos, ou seja, contando com as universidades, mas não com as outras, é de 0,6 %, e que contando com tudo — e a parcela respeitante às universidades, refere-se aos vencimentos pagos aos investidores— temos já em 1992 qualquer coisa como 0,86 %, o que é uma subida muito substancial relativamente a tudo aquilo que encontrámos quando tomámos conta desta área.
Srs. Deputados, se houver, como é natural, interesse em saber alguns pormenores relativamente à parte do que vêm a ser os gastos nas diversas áreas, terei muito gosto em esclarecer. De qualquer forma, para introdução, Sr. Presidente, suponho que o que acabei de referir é suficiente para podermos encetar uma análise mais profunda.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimento, inscreveram-se os Srs. Deputados Guilherme de Oliveira Martins, Jorge Lacão, Luís Sá, Fernando Sousa, Fialho Anastácio, Eurico Figueiredo, Manuel Castro Almeida, Helena Torres Marques, José Manuel Maia, Octávio Teixeira, Alberto Avelino, Duarte Pacheco, Marques da Costa, Gameiro dos Santos, Fernando Pereira Marques e António Costa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins.
O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, a questão que gostaria de suscitar neste momento, uma vez que estamos num debate da especialidade, reporta-se ao articulado da proposta de lei do Orçamento do Estado, concretamente aos artigos 12.8, 13." e48.°
O artigo 12." (Regime de distribuição do Fundo de Equilíbrio Financeiro para 1992) diz que «no ano de 1992 fica suspensa a aplicação da fórmula de cálculo do FEF», o que, em minha opinião, é uma disposição controversa— não irei falar da controvérsia política, mas da questão jurídica.
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Penso que esta fórmula de suspensão é, além de extraordinariamente discutível em termos de um ordenamento jurídico, anómala e que, fundamentalmente, se estão a atingir dois dispositivos constitucionais, concretamente os artigos 108.' e 240.", n.° 2, da lei fundamental.
Como sabemos, o artigo 108.° da Constituição prevê, de uma forma bastante clara e desde a versão original de 1976, que na elaboração do Orçamento do Estado se tenham em consideração as obrigações decorrentes de lei ou de contrato. É de lei que aqui se trata, uma vez que uma determinada lei das finanças locais estava, inequivocamente, em vigor no momento em que foi elaborado e apresentado o Orçamento do Estado nesta Assembleia. Portanto, o Governo exime-se ao cumprimento dessa mesma lei.
Como argumento, tem sido apresentada pelo Govemo a alteração de base de incidência do imposto sobre o valor acrescentado, consequência essa que envolveria uma afectação as autarquias de um montante muito significativo, que não estava no horizonte do legislador quando adoptou a fórmula da Lei das Finanças Locais.
No entanto, o Govemo, ao propor a suspensão da aplicação da fórmula de cálculo do Fundo de Equilíbrio Financeiro, tal como o faz, põe em causa não só a permanência de um determinado regime jurídico mas, também, a previsibilidade, relativamente às próprias autarquias locais, quanto aos meios de que são dotadas em razão da aplicação do FEF.
A meu ver, se se viola de uma forma clara a Constituição quanto à suspensão no tocante ao artigo 108.°, também se viola relativamente ao 240.", n.° 2, que prevê, como se sabe, a equidade relativamente à distribuição de recursos pelas autarquias locais.
Por outro lado, põe-se também em causa, através da fórmula anómala de suspensão de um mecanismo legal, a própria natureza jurídica da Lei do Orçamento do Estado, como lei de programação financeira de âmbito anual, que, naturalmente, deve respeitar o ordenamento jurídico em vigor. É verdade que não há no nosso ordenamento jurídico, salvo as que estão previstas na Constituição, a figura das leis reforçadas. No entanto, temos de entender que, neste particular, a Lei das Finanças Locais teria de ser respeitada. Portanto, a fórmula de suspensão é, a meu ver, inconstitucional.
Acresce ainda que as autorizações legislativas constantes do artigo 48." não respeitam minimamente os requisitos apontados no artigo 168.°, n.fi 2. É uma autorização vaga que, nesse mesmo sentido, não salvaguarda minimamente aquilo que se pretende em termos da Constituição.
Perante isto, Sr. Ministro, gostaria que pudesse haver uma reacção da sua parte, relativamente a esta questão.
O Sr. Presidente: — Não sei se o Sr. Ministro deseja responder de imediato, mas, tratando-se de uma questão que poderá ser retomada pelos Srs. Deputados que ainda estão inscritos, talvez valesse a pena responder só no fim de todos os pedidos de esclarecimento...
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Exactamente, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, também partilho da apreciação que acabou de ser feita
pelo Sr. Deputado Guilherme de Oliveira Martins, no que diz respeito às preocupações, que acabaram de ser fundamentadas, quanto à inconstitucionalidade, muito provável, da metodologia jurídica utilizada pelo Govemo quanto à suspensão da aplicação da fórmula de cálculo relativamente ao FEF. Não vou, portanto, reproduzir essa argumentação, mas dou-a como partilhável, em resultado das preocupações que já tive ocasião de exprimir em Plenário e às quais, agora, também desejo aderir.
Gostaria, para além disso, de suscitar outro tipo de preocupações.
Relativamente aos critérios do FEF, tal como foram apresentados nesta proposta de lei do Orçamento — e sem discutir já a questão, mais do que discutível, de ser este o instrumento jurídico adequado para produzir essa alteração—, o Sr. Ministro referiu que eles tiveram uma preocupação de valorizar as zonas do interior com maiores dificuldades de desenvolvimento. O princípio em si não se me afigura contestável; o que se me afigura contestável é, isso sim, a circunstância de a aplicação de novos critérios do FEF vir revelar que os métodos em curso de financiamento às autarquias são insusceptíveis de responder a problemas de financiamento fundamentais, designadamente para os municípios das grandes metrópoles e das grandes cidades.
A problemática urbana é hoje — e todos convergiremos nisso — uma problemática extremamente específica e com exigências cada vez maiores. As exigências de qualidade das populações urbanas impõem novas políticas de resposta a essa saturação urbana de que lodos somos testemunhas.
Todavia, no plano da política autárquica e com os actuais instrumentos de financiamento, não se vê como responder a esta situação. De onde resulta que uma das questões que deve merecer reparo seja, por um lado, a alteração aos critérios do FEF e, por outro, a alteração ao regime de derramas, alteração essa que — sublinho — o PS todos os anos tem vindo a suscitar e com a qual estamos, enquanto princípio, de acordo. Mas os dois factores conjugados mais deixaram em aberto o problema do financiamento autárquico às grandes metrópoles.
Sabemos que os aumentos para as grandes cidades, que em boa parte não ultrapassa os 7 %, de acordo com a correcção estabelecida, vão ser, em grande medida, absorvidos pela inflação, pela alteração das próprias taxas do IVA, com incidência nas empreitadas, a que as câmaras também têm que recorrer. Nessa medida, se o aumento do FEF, com a alteração dos critérios, em nada vai favorecer os mecanismos de financiamento às autarquias e se, futuramente, o regime de derramas vai limitar a fonte de financiamento por essa via, o que é que fica, então, de financiamento complementar, suficientemente pensado, para acorrer às dificuldades dos municípios urbanos?
A proposta de lei do Orçamento do Estado não nos dá resposta a esta questão. A resposta terá vindo no discurso de V. Ex.*, em sede de Plenário. Peço-lhe por isso, Sr. Ministro, que, se possível, aprofunde o seu pensamento sobre o assunto, na medida em que abriu uma outra porta, a porta para o financiamento autárquico, por via dos impostos próprios, no que diz respeito, designadamente, aos que têm que ver com a contribuição autárquica, que, como sabemos, têm incidência sobre os prédios urbanos e rústicos.
Se esta porta for aberta, será justamente através de uma proposta de pedido de autorização legislativa para rever o Código das Avaliações.
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Portanto, como e de que modo o Código das Avaliações vai permitir criar novas fontes de financiamento aos municípios?
No entanto, isso levanta um novo problema: se este for o mecanismo que o Governo prevê — e gostaria que pudéssemos sair daqui, hoje, esclarecidos quanto ao facto ou, pelo menos, quanto à intenção — para suscitar novas fontes de financiamento às autarquias urbanas, tal facto não deixará de implicar um novo agravamento da carga fiscal sobre os contribuintes. Teremos, então, aqui um agravamento da carga fiscal encoberto, que não está quantificado e que pode resultar do funcionamento do novo Código das Avaliações.
Seria, pois, necessário que este aspecto pudesse ser suficientemente esclarecido.
Como o Governo sabe, quanto ao PS, a metodologia para a revisão do regime das finanças locais passava pela utilização de outro tipo de dispositivos, designadamente pela possibilidade de as autarquias acederem — e têm esse direito constitucional de participação nos impostos directos—, numa percentagem, à cobrança dos impostos directos (IRS e IRC) feita na área do respectivo concelho.
Do nosso ponto de vista, essa percentagem poderia oscilar entre um mínimo de 2 % e 2,5 % e um tecto a prazo de 5 %, criando, de alguma maneira, mecanismos de flexibilidade na fonte de financiamento às autarquias, o que responderia ao tipo de problemática que acabei de referir.
Este problema está, todavia, ligado a este outro: o das transferências de novas competências da administração central para a administração local. Também aqui o que o Governo até agora nos disse não passou de uma vaga promessa. De facto, o Sr. Ministro, na sua intervenção inicial, referiu a intenção do Governo de transferir conjuntos coesos de funções da administração central para a administração local.
Sr. Ministro, não seria exigível, por razões de transparência, de coerência, de inelegibilidade, naquilo que deve ser uma reforma administrativa com pés e cabeça, que, antes de nos lançarmos a qualquer transferência em concreto, de atribuições da administração central para a local, em primeiro lugar, fizéssemos a apreciação de uma lei quadro de atribuições e competências susceptíveis de serem passadas para a área das autarquias locais? Se o fizéssemos, não estaríamos com isso a definir, à partida, quais eram as áreas de intervenção possível em lodos os domínios que deveriam ser susceptíveis de transferência da administração central para a local?
Sendo assim, não estaríamos em muito melhores condições políticas e técnicas para lançar o que o Sr. Ministro referiu, isto é, um processo de contratualização entre o Governo, a Assembleia da República e a Associação Nacional de Municípios Portugueses, de forma a envolver os próprios municípios num acordo de princípio quando essas áreas de transferência vierem a ser concretizadas?
Por outro lado, o Sr. Ministro sabe, seguramente, que uma coisa é um acto de delegação de competências que pode ter, tão-só, um fundamento administrativo e outra coisa é um acto de transferência de competências que implica disposições jurídicas da competência do Parlamento. Daí que o próprio processo de reforma neste domínio tenha de envolver muito directamente a Assembleia da República, mais uma razão, portanto, para que a Assembleia pudesse—e devesse — ser chamada a tornar uma posição à cabeça num processo de descentralização administrativa, com base na definição de uma lei quadro de atribuições e competências para as autarquias locais.
Devo dizer-lhe, Sr. Ministro, que esta é uma matéria que já está concretizada num projecto de lei apresentado pelo PS. Nesse sentido, desafio o Governo para que tome uma iniciativa semelhante, a fim de que o processo de transferência de funções a que aludiu seja feito com a clarificação suficiente, na base de dispositivos legais previamente estabelecidos quanto ao universo das atribuições e das competências em que haja vantagem de serem transferidas para as autarquias. Até porque, se assim não for feito, há um outro risco que se pode correr e que é grave, qual seja o de que haja uma tentativa de a administração central vir a transferir para as autarquias não aquelas áreas de atribuição que pela natureza de uma descentralização saudável devessem concretizar-se mas apenas aquelas áreas de encargos de que a administração central queira, por vantagem, aligeirar-se, sem que isso corresponda verdadeiramente a uma descentralização criteriosa e, portanto, a uma verdadeira reforma da Administração Pública.
Esta é uma outra área de preocupações que gostaria, sinceramente, que o Governo pudesse aprofundar.
Um outro domínio de preocupações tem a ver com o desenvolvimento regional lato sensu e os instrumentos ao nosso dispor para a sua promoção, designadamente a utilização das verbas disponíveis por parte dos fundos comunitários.
Estamos no meio de um ciclo de concretização do Plano de Desenvolvimento Regional (PDR), mas já estamos a entrar na nova fase em que teremos de encetar negociações para a concretização de um quadro comunitário de apoio tendente a um novo ciclo de utilização dos fundos comunitários.
Parece-me extremamente censurável — e digo-o por razões políticas muito reflectidas por parte do meu partido— que os objectivos do desenvolvimento regional continuem em Portugal a fazer-se à margem de uma participação democrática das regiões e que os objectivos do planeamento não possam, em Portugal, concretizar-se na base de uma participação das regiões na contra tualização desses mesmos objectivos de planeamento regional.
Parece-me ainda mais censurável que tudo isto possa ser feito quando a utilização das verbas comunitárias — ao contrário dos instrumentos clássicos do PIDDAC — não são susceptíveis de fiscalização directa por parte da Assembleia da República, quanto muito por alguma modalidade de fiscalização política, mas não com base, digamos, em competências formais de fiscalização por parte do Parlamento, ou seja, o Plano de Desenvolvimento Regional não é objecto de votação na Assembleia da República (para concretizar a minha ideia) e, nesse sentido, não há instrumentos de controlo democrático suficientemente apurados que garantam, por um lado, uma participação e, por outro, uma fiscalização adequada. Daí que também pergunte ao Governo se é ou não admissível, da sua parte, que a estratégia de concretização das regiões administrativas em Portugal possa ser estabelecida de acordo com um calendário que facilite a criação das regiões em simultâneo com as próximas eleições autárquicas.
E não se diga que esta matéria, porventura, tem menos a ver com o que estamos a discutir em matéria de Grandes Opções do Plano e de Orçamento do Estado para 1992, porque é exactamente ao nível do Plano que deve concretizar-se uma estratégia de desenvolvimento regional que, infelizmente, não vimos aí minimamente sedimentada pelas razões a que acabei de me reportar.
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São estes três blocos de questões que eu gostava de aprofundar no nosso diálogo desta manhã.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Lu/s Sá, refiro apenas que, hoje, lemos uma reunião relativamente complexa, na medida em que, para além da Comissão de Economia, Finanças e Plano, temos presentes as Comissões de Assuntos Europeus e de Educação, Ciência e Cultura, o que resulta da natureza horizontal do Ministério do Planeamento e da Administração do Território.
Temos regras previstas — e, sobretudo, rígidas — para orientar o debate. Este é o momento da afirmação política — trata-se de uma reunião pública e gravada —, portanto é perfeitamente legítimo aos Srs. Deputados intervirem no sentido e do modo que entenderem. De qualquer maneira, chamo a atenção para o facto dc se tratar de uma reunião carregada, pelo que lhes peço que, na medida do possível, simplifiquem as vossas intervenções.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.
O Sr. Luís Sá (PCP): — Sr. Presidente, quero começar esta intervenção — para além dc cumprimentar o Sr. Presidente, o Sr. Ministro, os Srs. Membros do Governo e todos os presentes — assinalando a magnífica reunião que se realizou no passado sábado na FTL, ou seja, o Encontro Nacional de Autarquias. Creio ser importante registar que havia uma sala preparada para este encontro e encheram-se quatro salas, o que representa, creio cu, uma resposta à altura da gravidade do que está em causa e que é um fortíssimo corte nas verbas que estão previstas ser atribuídas às autarquias, facto que já tive oportunidade de assinalar aquando do debate na generalidade, altura em que citei os pareceres dos Profs. Doutores Joaquim Gomes Canotilho e Marcelo Rebelo de Sousa, o qual, que eu saiba, não se passou para a oposição!... Segundo esses pareceres, estamos, efectivamente, perante normas institucionais, muito em particular no que se refere à suspensão da Lei das Finanças Locais e à alteração dos critérios de distribuição das verbas na própria Lei do Orçamento do Estado.
Relativamente a esta distribuição, o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território referiu — e tem-no feito com alguma frequência — que os critérios adoptados foram acordados com a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Creio ser necessário, neste aspecto, referir toda a extensão do acordo. A Associação Nacional de Municípios Portugueses concordou com o objectivo geral de o FEF ter uma função redistributiva maior do que a actual, mas colocou um largo bloco de questões, inseparável dos critérios de distribuição. Entre essas questões estava a exigência de os municípios da Grande Lisboa, do Grande Porto e do litoral não serem prejudicados em relação aos níveis de financiamento actuais.
Penso que esta questão foi claramente colocada, mas, se o não foi explicitamente, ela resulta já de reivindicações como, por exemplo, a de que as isenções das contribuições que revertem para as autarquias, particularmente a sisa e a contribuição autárquica, sejam objecto de indemnização por parte do Governo às autarquias locais. Era esta uma das questões importantes e decisivas. Creio, portanto, que o Governo conseguiu, nesta matéria, obter uma larga unanimidade das autarquias locais.
No passado sábado, na FIL, estiveram presentes várias dezenas de representantes das autarquias do PSD e são
públicas as declarações desses autarcas contra o Orçamento do Estado para 1992.
Em relação aos critérios de distribuição do FEF, no que se refere a função redistributiva que eles teriam, não posso deixar de anotar o facto de, por exemplo, o município de Aljustrel — que suponho não ter passado a ser, de repente, banhado pelo mar—
Risos.
... ter um aumento de 7 %, o de Vendas Novas de 8 % e o de Campo Maior, que tem fronteira com a Espanha, de 7 %, para além de muitos outros estarem ao nível da média nacional — isto é, cerca dos 13 %, ou menos que isso —, apesar de serem municípios do interior, de áreas deprimidas e até por vezes fortemente deprimidas. Portanto, passa-se qualquer coisa bastante estranha nesta matéria e que não pode deixar de levantar interrogações sobre as quais gostava de ouvir o Governo.
Um outro aspecto que queria assinalar diz respeito ao apoio a municípios para efeitos de conclusão dos planos directores municipais, apoio que o Sr. Ministro referiu e que consta da Lei do Orçamento do Estado. Esta, aliás, é apenas parte de uma questão muito mais vasta que tem a ver com o facto de, simultaneamente, haver cortes muito significativos no FEF e inscrição de verbas para financiamento de algumas autarquias. Francamente, isto é um mistério!... Podem, naturalmente, fazer-se suposições, mas elas não são muito lisongeiras para o Governo, sobre aquilo que o leva a financiar alguns municípios e a não financiar outros.
Já tive também oportunidade de questionar o Sr. Ministro do Ambiente e Recuros Naturais acerca deste mesmo assunto, isto é, sobre o que é que leva o Governo a financiar o abastecimento de água e as obras de esgoto de um município e a não financiar outros. Podíamos estender esta questão, por exemplo, a equipamentos culturais e a outras matérias. Para estes financiamentos usa-se hoje a designação de contratos-programa, quando antigamente se lhes chamava comparticipações, o que motivou uma grande luta por parte dos municípios.
Uma análise dos financiamentos concedidos por alguns ministérios leva-nos a concluir que há algum equilíbrio entre municípios — e eu reconheço que há — com maioria de vários partidos. Porém, noutros ministérios não há qualquer equilíbrio, o que não conduz a relações financeiras saudáveis entre os municípios e o Governo.
Por mim, considero até que a via justa é transferir os 233 milhões de contos do Fundo de Equilíbrio Financeiro e pôr termo a actuações deste tipo, que correm sempre o risco de ser muito arbitrárias e discricionárias.
De resto, nesta matéria, há um outro tipo de retaçôcs financeiras entre o Governo e as autarquias locais que considero viciadas. Não se trata do financiamento por parte da administração central a investimentos da competência municipal, mas, sim, do financiamento por parte da administração local a obras que são da competência da administração central. A não ser que, por exemplo, as escolas C+S tenham passado a ser competência dos municípios e não da administração central!...
De resto, o Governo ameaça — eu acho que se trata, efectivamente, de uma ameaça — aumentar o fianciamento municipal por via de contratos-programa a outras áreas, particularmente no domínio da saúde. Há também toda a questão contenciosa da transferência da rede dc estradas para as autarquias locais, a que naturalmente, perante uma
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situação tão caótica, um município ou outro adere e resolve fazer o financiamento. Estes problemas, que continuam em aberto, degradam a situação financeira das autarquias locais.
Em matéria de degradação da situação financeira das autarquias locais não posso deixar de sublinhar o facto de os municípios, para além de terem visto degradada, ao longo dos anos, a sua participação nas receitas fiscais, vêem agora também degradada a sua situação enquanto pagadores de impostos. A inquietação das autarquias locais é particularmente grande em relação ao problema da passagem de 8 % para 16 % da taxa do IVA sobre empreitadas de obras públicas.
Tive já oportunidade, por exemplo, de ouvir referir as consequências que trará, para muitos municípios, o facto de a taxa do IVA sobre o consumo da água ter passado de 0 % para 5 %. É evidente que quem vai pagar este aumento é o consumidor, mas também é evidente que entre o momento da emissão da factura — e, portanto, do pagamento por parte dos municípios ao Fisco — e o momento da cobrança efectiva há uma diferença importante, com consequências financeiras para as autarquias locais, para além de haver sempre muitos consumidores que não pagam e, portanto, isto poder ser suportado por elas. Este ponto causa já inquietação entre muitos eleitos autárquicos. Embora a questão central seja, efectivamente, a das empreitadas de obras públicas, este problema não deixa de ter também bastante importância para as autarquias locais.
Por outro lado, há inquietação entre muitos eleitos autárquicos— mas, com certeza, o Governo vai dizer que não há motivo para preocupação... —, particularmente os dos municípios mais penalizados financeiramente, quer pelo corte do FEF quer pela sua condição de pagadores de impostos, com o facto de a sua situação poder afectar a candidatura a fundos comunitários, o que afectaria, no fim de contas, o País, não apenas este ou aquele município, mas, sim, o País, no seu conjunto.
A preocupação é de um número muito significativo de municípios c, com certeza, o Govemo terá uma palavra a dizer sobre esta matéria.
Muito rapidamente, quero ainda referir algumas outras questões. O Sr. Ministro disse que as verbas atribuídas para a instalação da Área Metropolitana de Lisboa e para a Area Metropolitana do Porto são, respectivamente, de 30 000 e 20 000 contos e «sossegou-nos» a todos — reparem que ponho aspas no sossegou-nos —, dizendo que essas verbas eram apenas para instalação. O que lhe pergunto concretamente, Sr. Ministro, é se a instalação destas instituições custará tão pouco e se esta não é uma matéria susceptível de causar, igualmente, justas preocupações.
Quanto às sedes de juntas de freguesia, a verba que está orçamentada é exactamente igual à do ano passado, o que significa haver também um corte bastante significativo para estes órgãos autárquicos. Já tive a oportunidade de ouvir do Sr. Ministro palavras, com as quais, francamente, não estou de acordo, acerca do papel das juntas de freguesia na administração local portuguesa, na administração pública em geral. Na minha opinião, as juntas de freguesia têm um papel muito importante a desempenhar.
O meu partido terá oportunidade de, tal como fez o ano passado, apresentar uma proposta de reforço desta verba, isto é, propor a sua elevação de 450 000 contos para 1 milhão de contos. Espero, naturalmente, que haja receptividade por parte do Governo — embora sem muita esperança —, por uma razão fundamental: é que há muitas freguesias neste país em que a sede da junta de
freguesia não é apenas um local onde são exercidas as suas funções administrativas, mas, sim, um local de convívio, de encontro e de participação dos cidadãos no exercício do poder, que queremos cada vez mais constante e quotidiano e não restringido ao mero exercício do voto.
Finalmente, e agora para acabar, farei uma observação final acerca da verba prevista para as assembleias distritais. Gostaria muito que o Sr. Ministro dissesse que a exiguidade desta verba era justificada pelo facto de os distritos irem acabar e de o Governo ter um projecto de instituição das regiões administrativas, a breve prazo.
Infelizmente, face a tudo aquilo que tem acontecido nos últimos anos e às posições que, nesta matéria, têm sido adoptadas, particularmente pelo PSD, não é essa a esperança. Assim sendo, essa exiguidade não deixa de causar alguma preocupação, particularmente tendo em conta a actividade de algumas assembleias distritais que procuram ter uma intervenção na luta pelo desenvolvimento à altura das aspirações do respectivo distrito e exercer cabalmente as competências que, nesta matéria, lhes são atribuídas por lei.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Sousa.
O Sr. Fernando Sousa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, a minha pergunta é muito concreta e diz respeito ao Instituto Nacional de Estatística (INE).
Recentemente, V. Ex.' criou as condições para efectuar a modernização dos serviços do INE, mas, paradoxalmente, parece que o Orçamento do Estado para 1992 prevê um corte no seu orçamento de mais de 2 milhões de contos, corte esse que vai impedir o seu funcionamento normal, o cumprimento dos compromissos internacionais e o pagamento das dívidas do Censol91 — para já não falar nas obras de remodelação e modernização, uma vez que, creio, estava previsto que elas se iniciariam no ano em curso.
Assim, gostava de saber o que pensa sobre o assunto e como vai resolvê-lo.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Fialho Anastácio.
O Sr. Fialho Anastácio (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, algumas das questões que lhe queria colocar já foram aqui levantadas, no entanto existem ainda alguns aspectos sobre os quais gostaria de questionar V. Ex.*
Com certeza, todos nós temos intenção de utilizar racionalmente os bens disponíveis e proceder a uma justa repartição dos meios financeiros, fundamentalmente entre o poder central e o poder local, e da apreciação do Orçamento do Estado parece-me que há, de facto, repartição de meios financeiros, só que não é justa e as provas que têm sido constatadas justificam esta minha afirmação e demonstram a injustiça que existe quando, numa determinada distribuição, a administração central fica com a «parte de leão», deixando a parte mais pequena para a administração local.
No que se refere a este assunto, gostaria de colocar duas ou três questões ao Sr. Ministro: julgo que o Governo pretende — e é perfeitamente legítimo que assim seja — que se cumpra rigorosamente a lei, mas para isso deve dar o exemplo e não está a dá-lo — aliás, já se falou aqui sobre a questão do FEF.
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Agora, irei falar, fundamentalmente, sobre um problema que afecta substancialmente as autarquias e que se prende com a compensação das isenções que têm vindo a ser criadas pelo Governo. Penso que deve haver isenções, mas a Lei das Finanças Locais determina exactamente que, nesse caso, haja compensações para os municípios, o que não se tem vindo a verificar.
Portanto, gostaria de pedir que, mais uma vez, esta situação fosse muito bem clarificada, isto é, gostaria de saber se, de facto, o Governo pretende ou não cumprir o que estipula a Lei das Finanças Locais nesse sentido.
Por outro lado, gostaria também de saber o que se passa sobre as dívidas das autarquias à EDP, porque este assunto também as afecta e tem andado em tribunal, dado que o Govemo tomou uma atitude administrativa. Como sabe, alguns municípios têm levado essas questões a tribunal e têm ganho as acções, porque essa avaliação de dívidas tem problemas muito mais profundos. Esta prática de, administrativamente, retirar uma percentagem do FEF ou da cobrança da sisa para pagamento das dívidas à EDP continuará a ser seguida pelo Govemo?
Uma outra questão que queria colocar-lhe diz respeito a um assunto que já foi aqui levantado e que tem a ver com as finanças distritais. Sobre esse assunto espero também a resposta do Sr. Ministro, porque me parece que estamos a esvaziar de todo o conteúdo as assembleias distritais, pois, quando elas eram presididas pelo governador civil, como representante do Govemo na região, tinham determinados fundos e desenvolviam-se de uma determinada maneira, mas, a partir da altura em que o governador civil deixou de ser o seu presidente e esse lugar passou a ser ocupado por um eleito, deixou de ser dado às assembleias distritais o mínimo dos mínimos de meios Financeiros para elas poderem funcionar, o que constitui mais uma sobrecarga para todos os municípios. Aliás, veja-se que, em 1991, havia 150000 contos para as assembleias distritais e que, para 1992, apenas estão previstos 50000 contos.
Por outro lado, gostaria ainda de saber o que se passa sobre os programas operacionais, pois tive conhecimento de que há indicações para serem suspensos alguns projectos dos programas operacionais que não tiveram um desenvolvimento célere em 1991 porque tiveram atrasos — alguns por falta de visto do Tribunal de Contas — ou por outras razões.
Em relação a este assunto, tenho conhecimento de que houve indicações dadas pela CCR do Algarve a algumas câmaras no sentido de que iriam suspender alguns projectos que não tinham tido a celeridade adequada em 1991, embora já tivessem feito despesas, o que põe esses municípios numa situação extremamente difícil.
E esta a postura que o Govemo pretende pôr em prática?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Eurico Figueiredo.
O Sr. Eurico Figueiredo (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, obviamente que eu, preocupado com a saúde mental de V. Ex.8, vou ser o mais sintético possível na minha pergunta...
Risos.
Sr. Ministro, compreende-se que lhe ponha uma questão que tem a ver com as assimetrias do desenvolvimento
regional. Nesse sentido, gostaria de chamar a atenção de V. Ex." para o seguinte: se tivermos em linha de conta o índice do poder de compra — e obviamente numa perspectiva puramente didáctica—, podemos dividir o nosso país cm regiões ou distritos e Regiões Autónomas «de alto índice de consumo» ou «de elevado índice de consumo»
— a que eu, por uma metáfora adaptada ao tvosso país,
chamaria de litoral — e que compreenderiam Lisboa, Porto, Faro, Setúbal, Aveiro, Leiria e a Região Autónoma da Madeira, e «de baixo índice de consumo» ou «de muito baixo índice de consumo», que abrangeriam grandes áreas que vão de Vila Real a Bragança, Viseu, Beja, Guarda, Braga, Portalegre, Viana do Castelo, Castelo Branco, Região Autónoma dos Açores, Santarém e Évora, e a que chamaremos de interior.
O litoral corresponde a uma área inferior a um quarto do território nacional, que tem cerca de 21 000 km2 e uma população de cerca de dois terços do total nacional, isto é, pouco mais de 6,5 milhões de habitantes, mas que absorve, todavia, cerca de 140 milhões de contos do PIDDAC em 1992, ou seja, cerca de três quartos do seu total; o interior, com cerca de um terço da população total do País — um pouco menos de 3,5 milhões de habitantes —, corresponde a um pouco mais de três quartos da área nacional e absorve apenas cerca de 50 milhões de contos do PIDDAC em 1992, ou seja, cerca de um quarto.
Resumindo o que acabo de dizer: um quarto do território nacional — o litoral —, mais rico, com dois terços da população, vai usufruir três quartos do total do PIDDAC de 1992, e, por outro lado, três quartos do território nacional — o interior —, mais pobre, com cerca de um terço da população, recolhe apenas um quarto do PIDDAC de 1992.
Gostaríamos, portanto, de perguntar a V. Ex.9 se é assim que o Governo, a que V. Ex.' pertence, pretende corrigir — se é que pretende?!... — as grandes assimetrias do desenvolvimento regional.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida.
O Sr. Manuel Castro Almeida (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, compreendo as razões que o Governo tem apresentado para a norma constante da proposta de lei do Orçamento do Estado que estipula a suspensão dos critérios das transferências no âmbito do FEF.
Por outro lado, recordo que, quando a norma agora suspensa foi adoptada nesta Assembleia, a transferência fundada no valor do IVA tinha a ver com o facto de se estimar que ele seria o melhor indicador do crescimento da actividade económica e, portanto, a ideia era a de associar os municípios aos ganhos resultantes do crescimento da acuviadde económica.
Nessa medida, dado que no ano de 1992 há uma alteração dos critérios de incidência do IVA que não têm estritamente e ver com o crescimento da actividade económica, julgo que estará encontrada a razão para se proceder a essa suspensão.
Creio mesmo que a previsibilidade de receitas por parte das autarquias locais não seria razão para não adoptar esta figura da suspensão, tanto mais que elas, que também têm de elaborar os seus orçamentos, não contavam necessariamente com a harmonização fiscal que o Governo resolveu adoptar neste ano dc 1992. Imprevisível para as
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autarquias seria, com certeza, o crescimento anormal do FEF, que resultaria da adopção da fórmula de transferência. ;;
Mas a questão que lhe coloco é a seguinte: como é".que o Governo pensa proceder no próximo ano? Será queüen-ciona repor uma fórmula de indexação do FEF ao IVA? Será que tenciona adoptar uma outra fórmula que tome previsíveis as receitas que os municípios podem receber do FEF? Ou será que o Governo tenciona não adoptar qualquer fórmula e, assim, cada ano ajuizar e trazer à Assembleia uma proposta aleatória do Fundo de Equilíbrio Financeiro?
Esta era a primeira questão.
Em relação as alterações dos critérios de distribuição do Fundo de Equilíbrio Financeiro, o Sr. Ministro tem referido — e já o ouvi algumas vezes — que tinha havido conversações com a Associação Nacional de Municípios Portugueses sobre esta matéria e que a proposta que traz à Assembleia resultou exactamente desse acordo.
Se o Govemo e a Associação Nacional de Municípios Portugueses se entenderam completamente sobre a alteração de critérios, a mim basta-me que eles não me repugnem para que os aceite imediatamente, desde que haja, repito, esse acordo entre a Associação Nacional de Municípios Portugueses e o Governo.
Contudo, gostaria de saber qual a extensão desse acordo, ou seja, gostaria de saber se há um acordo integral da Associação ou se houve apenas um acordo de princípios. Como é que foi obtido e qual a sua extensão? Isto porque presumo que a Associação terá assumido que esta alteração de critérios iria trazer vantagens para uns e desvantagens para outros municípios, pelo que, suponho, a Associação deve estar suficientemente representada quanto aos interesses dos municípios urbanos e aos dos do interior.
Claro que é sempre fácil criticar nesta matéria e se não houvesse esta alteração era fácil dizer e questionar o Governo sobre o atraso a que votava os municípios do interior e sobre o facto de não arranjar alterações estruturais que pudessem retirar os municípios do interior do isolamento em que se encontram. Mas se o Governo adoptar a fórmula que adoptou sempre se poderá dizer que os municípios urbanos têm grandes carências, que é nestes e nos do litoral que está a maior concentração demográfica... Enfim, «é preso por ter cão e preso por não ter»!... Assim, gostaria de saber qual foi a posição da Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Em terceiro lugar, Sr. Ministro, começo por confessar o meu desconhecimento sobre qual o valor jurídico ou político do relatório geral do Orçamento do Estado que é presente à Assembleia da República em anexo à proposta de lei do Orçamento do Estado.
De facto, não sei se é um documento adoptado em Conselho de Ministro ou se é um relatório explicativo das intenções do Ministério das Finanças, o que sei, sim, é que na proposta de lei do Orçamento, no respeitante ao Código das Avaliações, o Governo pede autorização legislativa no sentido de aprovar o Código das Avaliações «referentes à propriedade rústica e urbana, por forma a conseguir-se uma maior equidade de tributação, um reforço das garantias dos contribuintes e uma determinação mais rigorosa da matéria colectável através da aplicação de critérios objectivos».
Em todo o caso nada se diz nas intenções sobre a carga fiscal deste imposto, mas é certo que no relatório que o Govemo apresentou está expressamente dito que, no
âmbito desta autorização legislativa, o Governo não iria aumentar a carga fiscal deste imposto.
Gostaria apenas de perguntar, sabendo que parte deste
relatório possa comprometer o Ministério das Finanças, se da parte do Ministério do Planeamento e da Administração do Território há também a intenção, e se pode haver o compromisso, de não proceder ao aumento da carga fiscal em matéria de avaliações dos prédios rústicos e urbanos.
Finalmente, Sr. Ministro, sei que é preocupação, muitas vezes manifestada pelos municípios portugueses, a redução das suas comparticipações nas empreitadas e nas obras que constam dos programas operacionais de que fazem parte. Assim, gostaria de saber se está já acordado com a Comunidade Económica Europeia esta redução pedida pelos municípios, ou seja, se os municípios vão poder participar com um menor esforço financeiro nas obras que decorrem com financiamentos da CEE respeitantes aos programas operacionais de natureza regional.
Gostaria ainda de saber se, quanto à verba inscrita para a instalação de áreas metropolitanas — e tenho presente que estas foram apenas criadas na parte final da anterior legislatura como órgãos bipartidos entre a administração central e a local —, foi presumido que as autarquias locais iam também participar nas despesas da sua instalação e se é possível conceber apoio de algum programa operacional com essa finalidade.
O Sr. Presidente: —Tem a palavra a Sr.1 Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.» Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, gostaria de fazer duas sugestões à mesa: a primeira é a de que a importância desta reunião, dos temas em questão e da necessidade que lemos de o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado responderem a todas as perguntas que foram formuladas, não se compadece com o regime de «mata cavalos» que estamos a seguir ao ouvir dois ministros por reunião.
Assim, sugiro ao Sr. Presidente e à Mesa que estudem a hipótese de voltarmos a convidar o Sr. Ministro logo à noite, por exemplo, por forma a podermos prolongar esta reunião, pois o que não pode acontecer é o Sr. Ministro não ter tempo para responder às questões solicitadas.
A segunda questão tem a ver com o pedido que fiz ao Sr. Presidente da Comissão para que a Sr." Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional passasse a estar presente nas reuniões, tal como está a Sr.' Secretária de Esiado do Orçamento, porque nós estamos sempre a fazer perguntas sobre o P1DDÂC e, muitas vezes, os membros do Govemo não sabem responder, pelo que, creio, a presença da Sr.' Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional ajudaria muito ao desenrolar dos nossos trabalhos.
O Sr. Presidente: — Sr.! Deputada, gostaria apenas de fazer uma pequena correcção: é que nós não estamos a receber dois ministros por dia, mas, sim, quatro e, inclusivamente, em alguns dias recebemos cinco, o que é diferente!
Quanto à sua primeira sugestão, posso dizer-lhe que a mesa, nomeadamente eu, na qualidade de presidente, estou disponível para ficar aqui todo o tempo possível e imaginário. Aliás, penso que o Sr. Ministro ainda não colocou qualquer questão quanto à limitação da sua presença aqui, que aproveito para saudar, porque ele é, provavelmente, o ministro que participou em mais reuniões
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de comissões — todos o reconhecemos, sem qualquer dificuldade! — e, decerto que, participando nesta reunião até ao fim, vai esclarecer todas as questões que lhe forem colocadas, pelo que a sua sugestão está ultrapassada.
Quanto a segunda sugestão da Sr.1 Deputada, fica registada e penso que se a Sr.1 Secretária de Estado estiver disponível acorripanhar-nos-á, cabendo esta decisão ao ptóprio Qovemo.
A Oradora: — Muito obrigada, Sr. Presidente, por ter precisado a minha inexactidão quanto ao número de ministros que estamos a ouvir por reunião.
Sr. Ministro, o que se passa neste Orçamento relativamente à Lei das Finanças Locais tende a criar — aliás, parece que já criou — uma situação de inconstitucionalidade. Assim, a primeira pergunta que faço é a seguinte: tem o Governo consciência de que o Orçamento, apesar deste esforço que a Assembleia da República está a fazer para não retirar estes artigos do Orçamento, terá uma inconstitucionalidade que impedirá que o Orçamento do Estado para 1992 entre em vigor só depois de o Tribunal Constitucional se pronunciar, isto é, depois de se refazer todo o Orçamento?
Tem o Govemo consciência de que considerada a inconstitucionalidade será por sua culpa que o Orçamento não entrará em vigor no princípio do próximo mês, como o Governo diz pretender?
A segunda questão que gostaria de colocar respeita às autarquias locais. Tenho muita pena de que o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida, que ainda por cima é coordenador do PSD nesta Comisssão, não conheça a Lei das Finanças Locais e vá para a televisão, com um ar sério, dizer que a Assembleia da República aprovou por unanimidade, em 1987, uma lei que fixou arbitrariamente a percentagem do IVA a atribuir às autarquias locais.
Sr. Deputado Manuel Castro Almeida, aproveito para ensinar-lhe — e aprenda, porque não duro sempre! —...
Risos do PS.
... que o que a Lei das Finanças Locais diz é que as receitas do FEF crescem tanto quanto crescerá o IVA, isto é, não há qualquer percentagem arbitrária; o que é arbitrário é o crescimento do IVA este ano, por causa do aumento e não da mudança dos critérios, que foi uma conversa sofisticada que o senhor arranjou para a televisão. De facto, há um aumento arbitrário do IVA e é isso que traz a grande complicação! Não há qualquer arbitrariedade na fixação do IVA!
Ora bem, o que acontece é o seguinte: se se mantiver a proposta que os senhores fazem, com os 7 % para um elevado número de câmaras e com verbas inferiores aos 13,5 % para muitas ideias, pergunto ao Sr. Ministro como é que as câmaras, com o novo acordo de concertação social, vão ter possibilidade de pagar os novos vencimentos com aumentos de 7 %, 8 % e 10 %?
Sr. Ministro, então como é que é possível ao Estado pagar as empreitadas a 16 % em vez de 8 %? Bem, isso não tem problema porque, por um lado, o Estado recebe mais receitas, por via do IVA, e, por outro, paga! Portanto, para o Estado isso é neutro!
Mas como é que as câmaras vão pagar o aumento de 8 % para 16 %? E que isso para elas não é neutro! Além disso, elas não podem recorrer ao défice, porque já têm a sua «união económica e monetária» fixada de há muito, pois há muito tempo que elas não podem endividar-se mais
do que determinado limite, o que só vai acontecer para os governos a partir de 1997 — creio eu. Então, como é que o senhor quer que as câmaras ultrapassem esta situação?
Não acha o Sr. Ministro perfeitamente injusto que, por exemplo, para construir habitação social as empresas privadas e as cooperativas paguem 5 % de IVA e as câmaras paguem 16 %? Será que isto é perseguição especial às
câmaras?!
O.que é que está a passar-se, Sr. Ministro? É que isto não tem qualquer lógica, tem de concordar!
Por que razão é que, repito, uma empresa privada que construa habitação social paga 5 % de IVA e as câmaras pagam 16 %? Isto para não falar do que as câmaras pagam em água e em telefone, pois tudo aumenta para 16 % sem que haja correspondência de qualquer espécie no sistema de finanças locais que os senhores querem impor.
Quanto a este sistema, e como o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida fez questão de dizer, ninguém sabe o que é que o Governo vai fazer a seguir, ou seja, se o PSD viesse, por acaso, a votar favoravelmente esta proposta estava a votar em branco. É porque o Governo suspende a Lei das Finanças Locais para fazer o quê? O Sr. Deputado Manuel Castro Almeida acabou de dizer, na frente de todos nós — e isso ficou gravado — que não fazia a menor ideia!... Ora, isto atesta, realmente, a facilidade com que o PSD vota tudo o que o Governo quer, mesmo que esteja às escuras e não saiba o que as propostas significam...
Relativamente ao Código das Avaliações, também gostava que o Sr. Ministro explicasse exactamente o que vai acontecer, porque eu já estava a ver «nascerem asas» ao Sr. Deputado Manuel Castro Almeida!... Como é que ele quer que se façam as avaliações sem haver aumento da carga fiscal?! Isso só não acontece nos pedidos de autorização legislativa!... Aliás, a este propósito creio que, Sr. Ministro, convinha que esta legislação saísse em 1993-1994! Era um bom ano para o Código das Avaliações sair!...
Quanto aos assuntos regionais, respeitantes a Beja, gostaria que o Sr. Ministro ou a Sr.' Secretária de Estado me pudesse explicar o seguinte: o IP 2 tem sido anun-ciadíssimo na minha região, porém acontece que só se fazem as variantes à saída das cidades, 10 km de um lado e 10 km de outro, faltando fazer 23 km, entre Albemoa e Castro Verde, que estão num estado miserável.
Bom, para a maioria dos Deputados este assunto nada dirá, mas para quem lá vive diz alguma coisa. De facto, a estrada é em linha recta, plana, pelo que, em princípio, nada custa o seu arranjo!
Pois bem, esta estrada, que parecia poder fazer-se num ano — aliás, o director da Junta Autónoma de Estradas de Beja disse-me o mesmo —, vai ser feita em quatro anos!... A verdade é que a construção desta estrada, tal como estava previsto no PIDDAC do ano passado, era para ser feita entre 1991 e 1992, mas é claro que entretanto, como o PSD já ganhou as eleições, não é preciso fazer a estrada, que acabará — façam lá uma ideia — em que ano? Em 1995!... Não podia ser de outra maneira! Então, 23 km de estrada demorarão quatro anos a fazer, para poder estar pronta na altura das próximas eleições!...
Os últimos três pontos que quero abordar respeitam à educação no distrito de Beja e têm a ver com o seguinte: a Escola Superior de Educação de Beja tinha previsto um investimento de 673 000 contos no PIDDAC de 1991 e
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tem 0 em 1992, acontecendo praticamente o mesmo com a Escola Superior Agrária, cujas verbas desaparecem do PIDDAC para este ano.
A acção social escolar 6 um aspecto absolutamente
fundamental em Beja. Aliás, o Sr. Ministro, que foi professor, perceberá com certeza o que lhe vou dizer muito rapidamente. Tive uma conversa com todas as associações de estudantes em Beja que me disseram não terem as menores condições, porque não têm quadros, não têm transportes, não têm onde ir, porque nem sequer cinema há, e a pergunta que me fizeram foi: «O que é que querem que a gente faça? Drogamo-nos?!...»
Ora bem, as verbas da acção social escolar são drasticamente reduzidas. Gostava, pois, que o Sr. Ministro me dissesse o que é que pensa sobre isto, sobretudo face às prioridades que o Governo define.
Sobre o Hospital Distrital de Beja, houve uma reunião, em que tanto eu como o Sr. Ministro da Saúde participámos, e em que V. Ex.1, Sr. Ministro, se comprometeu a fazer um conjunto de obras que são fundamentais para o Hospital. No orçamento não foi atribuída qualquer verba. O que é que o Sr. Ministro tem a dizer sobre isto?
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, obviamente que o Governo aqui representado vai responder às questões relevantes. Há pouco talvez tenha induzido os Srs. Deputados em erro: é que a Comissão de Educação, Ciência e Cultura só está aqui reunida por causa da componente científica, portanto não está cá o Ministério da Educação, enquanto tal, pois esse estará cá esta tarde, a partir das IS horas.
Por motivos óbvios, vou dar a palavra ao Sr. Deputado Manuel Castro Almeida; de todo o modo, pediria aos Srs. Deputados que guardassem as perguntas recíprocas para uma altura em que esteja reunida apenas a Comissão de Economia, Finanças e Plano, e vamos ter essa oportunidade. Posto isto, pedia para não entrarem em diálogo, senão, o que também não é problema, nunca mais damos por terminada a ordem de trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida, para responder.
O Sr. Manuel Castro Almeida (PSD): — Sr. Presidente, a Sr.! Deputada Helena Torres Marques fez-me referências pessoais, pelo que gostava de esclarecer algumas coisas. Pelos vistos, hoje não é o dia «dos bons humores» da Sr.1 Deputada Helena Torres Marques, uma vez que vem de mau humor, vem até com um ar irritado...
A Sr.9 Julieta Sampaio (PS): — Até está muito bem disposta!
O Orador: — Não gostaria que assim fosse, porque não gosto de ver ninguém irritado. Provavelmente, está irritada porque não terá gostado do acordo de concertação social. Porém, fico mais descansado quando, depois, esclarece que, afinal, não terá gostado do acordo de concertação social porque ele vai onerar os municípios, uma vez que os funcionários públicos vão ter um aumento maior do que o que estava previsto e os municípios vão pagar por isso.
Sr. Deputada, gostava apenas de esclarecer o seguinte, já que levantou aqui a questão: aquilo que eu disse, e mantenho, relativamente à indexação do FEF ao IVA foi que o valor que, em cada ano, é transferido a título de
FEF não é um valor científico, não foi através de nenhum cálculo matemático que se chegou à determinação de que
os municípios deveriam receber, em cada ano, um valor x
sobre o IVA.
Na altura em que a lei foi aprovada, o que aconteceu foi que, face ao valor previsível que o Governo, naquele ano, se propunha transferir para as autarquias, se chegou a um valor que foi determinado e que passou a condicionar as transferências dos anos seguintes.
Eu não quero acreditar que a Sr.1 Deputada esteja contra esta norma pelo facto de, no tempo em que exerceu funções no governo, as transferências do FEF se fazerem de forma completamente aleatória e discricionária! Julgo que terá concordado com a determinação de uma base que seja clara e previsível para os municípios do valor que em cada ano podem receber a título de FEF.
Mas dizia eu que'a razão por que se chegou ao IVA e não a qualquer outra receita do Estado foi porque se considerou que o IVA era o melhor indicador do crescimento da actividade económica e que, portanto, os municípios deveriam partilhar das vantagens desse crescimento, que teria uma tradução fiscal no IVA. Essa seria a medida que haveria de servir para a transferência a título de FEF.
Relativamente à questão que coloquei ao Sr. Ministro sobre o que iria acontecer ao FEF a partir de 1992, Sr.* Deputada, é evidente que eu não desconheço que, ao inscrever esta norma na lei do Orçamento, ela tem uma duração anual, assim como também não desconheço — e com certeza que a Sr.1 Deputada também não, portanto não precisarei de a ensinar — que, se não acontecer mais nada, a partir de 1993, retoma-se a fórmula originária. Entre os Deputados, ninguém desconhece isto!
O que eu perguntei ao Sr. Ministro foi se era intenção do Governo, já que mexeu neste assunto em 1992, voltar a mexer-lhe em 1993 e o que aconteceria a partir dessa data ou se era intenção, simplesmente, retomar a fórmula normal de cálculo do valor do Fundo de Equilíbrio Financeiro.
A Sr.» Helena Torres Marques (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — A Sr.* Deputada Helena Torres Marques pediu a palavra para que efeito?
A Sr.* Helena Torres Marques (PS): — Para responder, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr.» Deputada Helena Torres Marques...
A Sr.1 Helena Torres Marques.(PS):—O Sr. Presidente desculpar-me-á, mas...
O Sr. Presidente: — Sr.* Deputada, não tenho nada a desculpar, pois não me ofendeu, nem a mim nem a nenhum Deputado. Sc quer responder, responde. Mas, com certeza, que depois o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida também quererá responder...
A Sr.* Helena Torres Marques (PS): — Não, não!
O Sr. Presidente: — Não quer? Risos.
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Eu estava apenas a sugerir que a Sr.' Deputada se inscrevesse para uma segunda intervenção.
A Sr.' Helena Torres Marques (PS): — Não, não, Sr. Presidente, quero responder.
O Sr. Presidente: — Então, tem a palavra.
A Sr.* Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida falou invocando o facto de eu já ter usado da palavra. Muito bem, mas também eu tenho o direito de responder.
O Sr. Presidente: — Sr.* Deputada, já percebi. Entendeu que o Sr. Deputado fez um protesto e a Sr.9 Deputada vai, agora, dar explicações.
Para dar explicações, tem a palavra a Sr.1 Deputada Helena Torres Marques.
A Sr.1 Helena Torres Marques (PS): — Sr. Presidente, o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida, afinal, não sabe várias coisas, mas tenho muito gosto em lhas explicar.
Primeiro, a Lei das Finanças Locais foi aplicada, pela primeira vez, em 1978, exercia eu as funções de director--geral da Acção Regional e Local. Desde essa altura, já se fez outra lei — até fui eu que fiz uma quando estava no governo — e esta que está em vigor foi feita por uma comissão, da qual fazia parte o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território, alguns Deputados, de entre os quais eu, e a Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Nada há de arbitrário, foi estudada a solução considerada mais conveniente e é essa que está em vigor e que, pelos vistos, o Sr. Deputado, que ainda não é secretário de Estado, mas que para lá caminha com esse tipo de intervenções...
Protestos do PSD.
O Sr. Deputado Manuel Castro Almeida pensa que, afinal, o processo é bom, pois está pronto a suspendê-lo e a fazer que ele volte a vigorar para o próximo ano da mesma forma, mesmo sem derramas, etc. Isso é que está mal! Mas, sobre finanças locais, não vou explicar-lhe mais nada, pois penso que o Sr. Secretário de Estado está perfeitamente à altura de lhe explicar tudo o que pretender saber daqui para a frente.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Maia.
O Sr. Manuel Castro Marques (PSD): — Sr. Presidente, peço desculpa, mas queria usar, em trinta segundos, por razões óbvias...
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não vamos criar um problema por trinta segundos. Há aqui uma coincidência que é esta: as duas intervenções verificaram-se sequentemente. Por razões de inscrição, o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida fez uma intervenção, por sua vez a Sr.* Deputada Helena Torres Marques fez, a seguir, também uma intervenção, mas como nesta se referiu à intervenção do Sr. Deputado Manuel Castro Almeida põe-se o problema de saber se lhe fez perguntas ou quem fez perguntas a quem, etc. E, pois, difícil «desembrulhar» esta situação.
Como penso que o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida vai falar, apenas, trinta segundos, vou dar-lhe a palavra, pedindo-lhe, em todo o caso, que seja rápido, objectivo e, sobretudo, que não deixe margem a que haja qualquer outro tipo de intervenção.
O Sr. Manuel Castro Almeida (PSD) —Sr. Presidente, queria não só constatar o que todos perceberam, ou
seja, que a Sr.' Deputada Helena Torres Marques não me veio explicar coisa nenhuma que não fosse já sabida, não só para mim, como para todos os que estão nesta sala, como também clarificar, mais uma vez, que eu nunca disse nem nunca pensei que a fórmula de cálculo do FEF fosse aleatória, salvo erro foi o termo que a Sr.* Deputada usou. O que eu disse, isso sim — e vai uma grande diferença entre ser aleatória e não ser científica—, foi que essa fórmula não era científica e não que era aleatória, e a Sr.* Deputada terá percebido isso muito bem, tal como toda a gente o percebeu.
O Sr. Presidente: — O que os Srs. Deputados Manuel Castro Almeida e Helena Torres Marques disseram ficou registado, pelo que este diálogo pode ser retomado noutra oportunidade, depois de conhecermos o registo.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Maia.
O Sr. José Manuel Maia (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, queria apenas colocar-lhe uma questão, embora seja das «gordas», permitir-me-á esta expressão, pelo impacte directo que tem em milhões de pessoas — pelo menos, em mais de 2,5 milhões de pessoas. Refiro-me às travessias do Tejo, sem, contudo, fazer grandes considerações, tendo em conta que é um problema de mais sentido e, como tal, conhecido.
Assim, pergunto: em que fase estão os estudos quanto à nova travessia — se estivesse aqui o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações perguntar-lhe-•ia em que fase estão as obras relativamente à nova travessia, mas, como não está, pergunto-lhe a si, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, em que fase estão os estudos — e que tipo de travessia: rodoviária e ou ferroviária? Se já tiver esses estudos, pergunto qual o modo de transporte relativamente à nova travessia.
Penso que era bom equacionar o que pretendem: uma ponte com função predominantemente inter-regional, que faça a ligação Norte-Sul, ou, pelo contrário, com predominância metropolitana, funcionando como alternativa à actual Ponte de 25 de Abril? Será uma ponte apenas rodoviária ou visa-se promover o sistema nacional e regional de transportes, considerando a modernização e evolução da sua componente ferroviária?
Acima de tudo, importava saber quais os efeitos urbanísticos prioritários que se pretendem alcançar: de expansão ou de renovação urbana?
Na opinião do Govemo, em particular do Ministério do Planeamento e da Administração do Território, a opção quanto à nova ponte, tendo em conta os estudos que estão a ser feitos, deve ou não ser articulada com a actual travessia — a Ponte de 25 de Abril? Ou seja, são dois problemas separados ou deve haver alguma conexão?
Penso que todos estarão de acordo com a travessia por carril no tabuleiro inferior da Ponte de 25 de Abril, mas já lhe coloco a dúvida quanto ao modo de transporte a
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percorrê-lo, tanto mais que, por afirmações até do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, feitas no dia 14 do mês passado, na presença.de
presidentes de câmaras da Área Metropolitana de Lisboa,
já estaria adjudicado o reforço da Ponte, o que mc adrhira.
Pois se ainda não se sabe que modo de transporte vai ser utilizado, como é que pode estar já adjudicado o reforço da actual: Ponte de 25 de Abril? Mas o Sr. Ministro dirá!
Ainda-relativamente ao modo de transporte da actual ponte, pergunto-lhe se equaciona a questão em termos de um transporte rápido e de massas ou de um comboio tradicional, servindo o carril até para mercadorias. A ligação Norte-Sul, a ser feita, seria pela actual ponte? O Sr. Ministro dirá para onde apontam as opções ?e os estudos. .
Pretende que o tabuleiro inferior da actual ponte.sirva Norte-Sul ou que sirva, fundamentalmente, a Área Metropolitana de Lisboa e que, nomeadamente, tenha em conta as necessidades e aspirações das populações do norte da península de Setúbal mas, também, de toda a Área Metropolitana de Lisboa? Penso que a questão do trabalho/ casa para o norte da península de Setúbal, do norte da península de Setúbal para Lisboa e, além disso, o recreio, o lazer e as férias das populações da Área Metropolitana de Lisboa também devem ser equacionadas neste contexto.
Não tenho dúvidas de que este problema seria melhor discutido e esclarecido numa reunião conjunta e com a presença dos Srs. Ministros do Planeamento e da Administração do Território e das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, pois só assim conseguiríamos, finalmente, saber se se faz, em primeiro lugar, o planeamento e, depois, a obra ou se se faz, primeiro, a obra e só depois o planeamento. Mas o Sr. Ministro dirá!
0 Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, com a brevidade que a hora impõe, colocar-lhe-ei duas ou três questões.
Em primeiro lugar, ainda a questão do Fundo de Equilíbrio Financeiro. Não é a primeira vez que o Govemo, através da Lei do Orçamento, lesa os municípios em relação ao que está consagrado na Lei das Finanças Locais. Até este ano, tem usado o expediente da subavaliação da previsão de cobrança do IVA. Porém, este ano, o Governo foi mais longe. Permita-se-me a expressão, este ano, a «alhada» em que se meteu é bastante mais complicada, pois é inequívoco, julgo eu, que o problema da inconstitucionalidade da proposta do Govemo é um facto. Aliás, o meu partido teve oportunidade de, atempadamente, quer na Assembleia da República, quer fora dela, chamar a atenção para isso. Como o problema da inconstitucionalidade está colocado e como o Govemo e o PSD apenas se têm referido à problemática da proposta apresentada este ano, em sede do Orçamento, sobre o FEF numa perspectiva financeira, os municípios não devem, não podem, pois não há razão moral, receber aquilo que resulta do agravamento da carga fiscal sobre os contribuintes — apenas o Estado central tem esse direito e essa legitimidade.
Como têm colocado a questão apenas em termos financeiros, colocaria uma outra, que, aliás, já aqui foi abordada, também em termos financeiros. Tem o Governo pelo menos a consciência de que o custo financeiro da declaração de inconstitucionalidade deste Orçamento vai
ser de longe muito superior, para o Estado e para o País, àquele que o Governo diz que resultaria para ele, como receitas do Estado, do cumprimento puro e simples da Lei
das Finanças Locais?
Ainda quanto à questão do Fundo de Equilibrio Financeiro, gostaria que satisfizessem a minha curiosidade quanto a um outro aspecto. O Govemo não cumpre a Lei das Finanças Locais e resolve atribuir, em termos de FEF, um aumento de 13,5 % sobre a verba do ano anterior. Consultei o orçamento, as projecções macroeconómicas, etc., e não consegui encontrar este aumento de 13,5 %. Onde é que o foram descobrir? Não é a evolução prevista do consumo privado, não é a evolução prevista do produto interno bruto, não é a evolução prevista da formação bruta de capital fixo, não é a evolução prevista das despesas públicas, não é muito menos a evolução prevista das receitas públicas, etc. Ou seja, não há nenhum número 13,5 %! Onde é que o foram descobrir?!
A segunda questão, na medida em que as outras duas foram acerca do FEF, é a seguinte: tendo eu consciência de que o Ministério do Planeamento e da Administração do Território e concretamente o Sr. Ministro, em matéria de PIDDAC, não se preocupam e não se iludem apenas por execuções financeiras, porque têm a preocupação da execução material, admito que o Ministério do Planeamento e da Administração do Território já tenha feito o cálculo de quanto significará, em termos de afectação de execução material do PIDDAC proposto este ano, o impacte da alteração da taxa do IVA para as empreitadas.
A minha terceira e última questão, com a qual o Govemo, na sua globalidade, deveria preocupar-se, mas, pelo menos, o Ministério do Planeamento e da Administração do Território tem obrigação disso, é a seguinte: o que é que se pretende fazer com o Instituto Nacional de Estatística (TNE) e com a transferência de verbas que é proposta neste orçamento? Propõe-se uma redução para metade daquilo que é considerado necessário pelo Conselho Superior de Estatística! Isso é uma afectação brutal do orçamento proposta pelo Instituto Nacional de Estatística! Uma afectação brutal que vai implicar que as francas melhorias que o Instituto Nacional de Estatística vinha a demonstrar nos últimos anos, em termos de produção de material estatístico, quer do ponto de vista quantitativo quer do ponto de vista qualitativo, vão ser postas claramente em causa. E já não me refiro à questão das instalações, porque, se ao orçamento apresentado pelo LNE retirarmos cerca de 1 milhão de contos previsto para novas instalações, para o avançar com a edificação do novo edifício, mesmo assim há um corte brutal e substancial de cerca de 50 % no orçamento do DNE. Lógica e naturalmente, terá de ser afectada a produção de estatística que é claramente essencial, no momento presente e na sociedade actual, para todos os agentes económicos e não apenas para o agente governamental. Aliás, o EUROSTAT já teve a oportunidade de exprimir, junto da Comissão das Comunidades Europeias, a sua preocupação face a esta proposta de dotação do orçamento do DNE.
Sr. Ministro, o que se pretende fazer com o INE? Pretende-se acabar com o INE? Pretende-se acabar com o material estatístico? Pretende o Govemo passar a governar, avançando com os números que quiser, sem haver qualquer possibilidade de um confronto com a realidade estatística do LNE? Certamente que essa opção não pode existir, porque seria uma opção «louca» para o próprio Governo. Então porquê esta opção do Governo em, draconianamente, cortar o orçamento do INE, impedindo
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que ele faça e continue a executar aquilo que são as suas tarefas normais — e, ao mencionar este aspecto, já nâo me refiro a nada de novo. É que reduzir, como o faz, em termos de funcionamento, o orçamento do LNE implica que o próprio Censo/91 não seja completado e que o material que foi recolhido não seja tratado.
O que é que se pretende fazer com o INE, Sr. Ministro? Vamos ou não alterar a proposta de lei na parte relativa às transferências para o LNE?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Avelino.
O Sr. Alberto Avelino (PS): — Sr. Ministro, o Orçamento do Estado para 1992 prevê 50 000 contos para as assembleias distritais. Relativamente ao ano passado, já foi dito que esse valor equivale a um terço dessa verba, embora, no ano passado, as assembleias distritais, nomeadamente a de Lisboa, não tenham recebido um tostão desse dinheiro. E isto porque surgiu uma comissão que se substituiu às assembleias distritais, e, em nome delas, recebeu o dinheiro que lhes cabia. Procedimento muito estranho este, para o qual, ainda hoje, aguardamos a explicação do Ministério do Planeamento e da Administração do Território!
Para a atribuição deste montante, que é escasso, certamente que o Ministério do Planeamento e da Administração do Território ter-se-á apoiado no Decreto-Lei n." 5/91, de 8 de Janeiro, que diz respeito à nova eleição da mesa das assembleias distritais e segundo o qual, por imperativo da revisão constitucional, os governadores civis deixam de ser por inerência presidentes das assembleias. E digo que o Ministério certamente ter-se-á apoiado neste decreto-lei, uma vez que as fontes de receita prevêem, entre outros, os proveitos dos serviços, de rendas e de alienação de património das assembleias distritais, a participação de municípios, etc. Só que, de acordo com um despacho de sexta-feira passada, é possível fazer-se um autêntico esbulho e uma extorsão de todo o património das assembleias distritais. Isto é, nomeadamente o edifício da Assembleia Distrital de Lisboa, da qual sou presidente, pode ser alienado, excepto o 3.° andar, que é uma biblioteca pública. Mas não sei o que fazer a todo o resto do edifício — aliás, a todo o património da Assembleia Distrital, onde estão milhares de livros —, não sei o que irão fazer à Escola Agrícola da Paia, na Pontinha, em relação à qual houve uma vontade bastante grande, por parte do ex-presidente da Associação Distrital de Lisboa, de tentar alienar o património para lá criar o mercado abastecedor de Lisboa, o que ele disse várias vezes. Trata-se de 160 ha que, também por este despacho, imagine-sè, se permite alienar de um património que é de uma assembleia distrital!
Ora, em face disto, a minha pergunta é muito simples: por que é que nâo acabam com as assembleias distritais? Dirão que é inconstitucional! É, com certeza! Mas também têm praticado tantos actos inconstitucionais!... O Decreto-Lei n.° 5/91 é disso um exemplo e o Sr. Dr. Rui Machete, num estudo feito para a Assembleia Distrital de Lisboa, não o diz expressamente mas é fácil inferir da sua inconstitucionalidade. O certo é que, ao abrigo deste decreto-lei, têm-se esquecido, pura e simplesmente, as assembleias distritais, primeiro, não permitindo o acesso aos dinheiros a que têm direito e, segundo, indo «secando» aos poucos o próprio património.
O que pergunto é o seguinte: com que base legal é que se faz um despacho que vai permitir a alienação de milhões de contos que são fruto do património da Assembleia Distrital de Lisboa?
Por último, quero sugerir o seguinte: por que não fazer umiinquérito à anterior presidência da Assembleia Distrital de Lisboa, o que talvez fosse muito mais importante
para se saber o que lhe tem sido feito e a todo o seu
património, parte dele alienado em proveito próprio e outra
parte sem sua autorização expressa.
OrSr. Presidente: — Srs. Deputados, estão ainda cinco Srs. 'Deputados inscritos para pedir esclarecimentos e faltam dez minutos para atingirmos o limite normal desta sessão. É claro que ainda teremos de ouvir o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território e, provavelmente, alguns membros do Governo.
Tem a palavra o Sr. Deputado Duarte Pacheco.
O Sr. Duarte Pacheco (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, Srs. Secretários de Estado: Antes de mais, gostaria de esclarecer duas questões, a primeira das quais tem a ver com algo que tem sido dito, que já aqui foi reafirmado e que tem sido manipulado pela comunicação social. Esse algo tem a ver concretamente com o FEF, sendo afirmado que as câmaras estão a ser lesadas, porque aquilo que elas vão receber é inferior àquilo que têm recebido. De facto, isso não é real e a maneira como tem sido transmitido para a opinião pública é incorrecta. Ora, aquilo de que nos apercebemos é que o FEF cresce 13,5 % e, portanto, há 5 % de crescimento real. Esta é que é a verdade e estes é que são os resultados dos números e não todas as manipulações que a comunicação social, por intermédio de algumas pessoas, tem transmitido.
O segundo esclarecimento que pretendia dar diz respeito à questão dos 13,5 % colocada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira. Na Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, isso foi devidamente debatido e, para além disso, num parecer elaborado e aprovado em sede de comissão, esclarece-se precisamente a origem desses 13,5 %. No entanto, se mesmo assim o Sr. Deputado ainda tem dúvidas, posso tentar esclarecer...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Orador: — Faça favor.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — É só para dizer-lhe, Sr. Deputado, que faço as perguntas ao Sr. Ministro, e não a si.
O Orador: — Como queira, Sr. Deputado. Mas, como esta questão já é do conhecimento público, poderia também ser já do vosso.
No entanto, penso que esses 13,5 % têm muito a ver com a própria filosofia, como o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida referiu, do próprio indicador. É que o IVA foi utilizado como indicador do crescimento da actividade económica e o crescimento efectivo do IVA, de 13,5 %, é o crescimento efectivo da actividade económica. Por isso mesmo é que o FEF e as transferências para o FEF crescem nesse montante. O resto, o outro montante, que a Sr.1 Deputada Helena Torres Marques chamou de um aumento arbitrário e que eu prefiro designar de aumento
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extraordinário, não é um aumento efectivo da actividade económica e, por isso, o FEF não cresce em 48 %, mas
somente em 13,5 %.
As questões que quero colocar ao Sr. Ministro do Pla-
jivumenio.e.da Administração do Território são muito
concretas. O FEF cresce em termos médios de 13,5 % e a
alteração dos critérios do FEF tem o acordo da Associação
Nacional de Municípios Portugueses. No entanto, se os critérios fossem aplicados na íntegra, sabemos que existiam concelhos e municípios com decréscimos efectivos do FEF. O Govemo teve a preocupação de que isso não acontecesse e, por isso, estabeleceu um tecto mínimo de 7 %, tendo salvaguardado, este ano, a situação desses municípios. Pergunto ao Sr. Ministro se o aumento para o ano vai continuar a estabelecer um tecto mínimo ou se vamos aplicar os critérios na íntegra, visto que o Governo é de quatro anos. É que, ao estabelecermos os critérios na íntegra, vai acontecer que alguns municípios vão registar um decréscimo do FEF. Portanto, a preocupação com as áreas metropolitanas e com esses grandes concelhos existiu e esteve presente neste orçamento.
Por fim, a transferência de mais verba não está inviabilizada neste orçamento e está previsto que ela seja acompanhada da transferência de competências. A questão que lhe coloco, Sr. Ministro, é a de saber se poderíamos ter essas transferências de competências já em 1992 ou se já haverá alguma perspectiva sobre essa questão.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.
O Sr. António Costa (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, Srs. Secretários de Estado: O PSD apresentou como grande leit moíiv da sua última campanha eleitoral o conceito da estabilidade — Portugal estava no bom caminho, estava mesmo a meio da ponte, tínhamos de chegar ao outro lado da ponte e a estabilidade era a varinha mágica. Ora, o que nós constatamos, logo com este primeiro Orçamento deste segundo mandato maioritário do PSD, é que é o Orçamento que nos «instala a instabilidade». A instabilidade para o próprio Estado, que está em risco de ver a entrada em vigor do Orçamento adiada, não sabe até quando, em virtude do risco sério de lhe ser suscitada a questão da fiscalização preventiva da constitucionalidade; mas instabilidade, sobretudo, para a vida dos próprios municípios. A resposta à questão sobre se os municípios foram lesados é esta: foram-no, efectivamente. A lei impõe que os municípios aprovem os seus orçamentos, a tempo e horas. Ora, os municípios fizeram-no, naturalmente na previsão de que a Lei das Finanças Locais seria cumprida. Só que, depois dos seus orçamentos e planos de actividades aprovados e em execução, o Estado, atrasado, vem apresentar o seu Orçamento, em que, violando a Lei das Finanças Locais, vem pôr em causa aquilo que tinha sido a base estável de elaboração dos próprios planos de actividades e orçamento das câmaras municipais. Ou seja, os municípios que cumpriram a lei, fazendo aprovar os seus planos de actividade e orçamentos, a tempo e horas, viram precisamente prejudicadas as suas expectativas concretizadas no plano de actividades, em função da redução da contribuição para o FEF.
Onde é que isto acontece com maior gravidade? Sobretudo, nos municípios com grandes concentrações urbanas. O Sr. Deputado Jorge Lacão já o referiu, mas valeria a pena explicitar que, neste caso, há mesmo
municípios que se tomaram contribuintes líquidos do Estado. Se se fizer contas, por exemplo, em relação ao município de Lisboa, somando aquilo que o município vai
pagar em IRS, mais IVA, mais imposto sobre os produtos
petrolíferos, verificamos que este vai rjagac siais m
Estado no ano dc 1992 do que aquilo que vai receber do
mesmo por via do FEF.
Tendo tido a cautela de prever, no meio de tudo isto, uma cláusula de ressalva de 7 % em função da aplicação dos novos critérios e admitindo que não tenha sido ponderada, aquando da elaboração da lei, estas situações de municípios que, por via do agravamento fiscal ou da harmonização fiscal, se os Srs. Deputados do PSD preferirem, irão pagar mais impostos, pergunto ao Sr. Ministro se não admite que seria de encarar, em sede de especialidade, a introdução de uma ressalva que evite e previna as situações em que os municípios se tomem contribuintes líquidos entre aquilo que vão pagar ao Estado por via de impostos e aquilo que vão receber do mesmo por via do FEF.
No seu discurso, o Sr. Ministro abriu a porta à participação directa dos municípios noutros impostos e referiu--se, concretamente, aos impostos directos.
Nos grandes centros urbanos, uma das causas mais significativas da sobrecarga dos encargos dos municípios é a utilização da rede viária municipal. Ora, há um imposto que, de alguma forma, tem a ver com a própria utilização da rede viária municipal e da sobrecarga do parque automóvel, quer o existente, quer aquele que utiliza diariamente os centros urbanos, e refiro-me ao imposto sobre os produtos petrolíferos.
Gostava que o Sr. Ministro me dissesse se admite a hipótese de a porta que abriu relativamente aos impostos directos ser também encarada em relação ao imposto sobre os produtos petrolíferos.
A última questão que gostava de colocar diz respeito às áreas metropolitanas. Já lhe coloquei esta questão em sede de comissão e, na altura, o Sr. Ministro remeteu-me para o Sr. Secretário de Estado, que, entretanto, não remeteu para ninguém, mas também não respondeu.
A resposta que V. Ex.3 deu, apesar de tudo, foi relativa à verba e disse: «Bom, esta verba é simplesmente para a instalação.» Mas o problema é que a instalação, nos termos da lei, lem de processar-se até ao final do 1." semestre de 1992 e, portanto, a partir daqui, deveremos entrar em fase de funcionamento das áreas metropolitanas.
A lei aprovada na legislatura passada não resolve o problema do financiamento, o qual não vem aclarado neste Orçamento do Estado, pelo que gostava que o Sr. Ministro ou o Sr. Secretário de Estado me esclarecessem sobre qual é a ideia que o Governo tem quanto ao financiamento das áreas metropolitanas. Imagino que me dirão que tem de haver uma comparticipação municipal — é natural que sim! —, porém neste momento não é isso que está em causa, mas saber qua! será a comparticipação da administração central, visto que a área metropolitana não é, simplesmente, uma associação de municípios, mas, isso sim, nos termos da lei, uma p'ataforma institucional de concertação entre as administrações central e local. Por consequência, é necessário saber qual é a comparticipação financeira por parte da administração central no funcionamento das áreas metropolitanas.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Gameiro dos Santos.
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O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Sr. Ministro, em primeiro lugar, quería dar-lhe uma informação, pois pré-' sumo que não a conhece. No sábado passado, de manhã, na FIL, houve o Encontro Nacional de Autarcas onde estiveram mais de 4000 autarcas — e o Sr. Ministro, por'' certo, saberá que as suas orelhas arderam muito nesse sábado de manhã!... Curiosamente, muitos autarcas do PSD criticaram a forma leviana como o Fundo de Equilíbrio Financeiro foi calculado em 1992. Sr. Ministro, era bom que ouvisse os autarcas do seu próprio partido e não só da oposição, já que nesse Encontro as críticas foram
unânimes. E foram unânimes porque não deixa de ser curioso que neste Orçamento do Estado para 1992, com o argumento da harmonização fiscal, se aumente unicamente o Fundo de Equilíbrio Financeiro em 13,5 %.
Também não deixa de ser curioso que, em 1988, o governo aplicou a Lei das Finanças Locais e aumentou unicamente o FEF em 1,9 %. Quer dizer, nessa altura, houve uma desarmonização, mas estava bem, era belíssima!... O governo transferia menos,... era óptimo, era sempre óptimo!... Neste caso, como o cumprimento da Lei das Finanças Locais implicava um acréscimo de verbas para as autarquias, então já não falam em IVA, mas em harmonização fiscal. De facto, parece-me que se trata de um novo imposto, que nos deve deixar preocupados.
Há pouco o Sr. Deputado Manuel Castro Almeida perguntou ao Sr. Ministro — é uma pergunta curiosa em relação à qual é importante conhecer a resposta! — o que é que se vai passar em 1993. Decerto que para 1993 já não há harmonização fiscal!..., nessa altura o IVA já vai ser calculado em função da previsão para 1992, ou seja, dos tais 900 milhões de contos!... Quer dizer, agora não são 900 mas 610 milhões de contos, no entanto, para o Orçamento do Estado para 1993 a base vai ser os 900 milhões de contos!... Não há dúvida de que o Governo está a portar-se bem!... Aliás, quando é para a administração central, é só puxar as mãos para dentro, mas quando é para as autarquias locais é sempre a recusar, neste caso, que é ainda mais grave, recusar o cumprimento da própria lei, o que em nosso entender é muito grave!
Mas, Sr. Ministro, debrucemo-nos sobre outras questões, também muito importantes, e uma delas prende-se com algumas posições que o Governo vem assumindo. Por exemplo, há quem diga que temos uma «tia rica» em Bruxelas, há quem diga que a entrada na Comunidade foi um «bom negócio»... Mas, de facto, para as autarquias locais, em 1992, não sei se foi um «bom negócio», já que, a dada altura, o Sr. Ministro e os membros do seu Ministério iam sensibilizando as câmaras para serem expeditas, para apresentarem os seus projectos e executá-los rapidamente, isto é, para avançarem com as empreitadas, porque o dinheiro apareceria muito rapidamente. Agora, depois de tantas pressões, o facto é que, de há uns meses a esta parte, os dinheiros não aparecem, as empreitadas fizeram-se e as câmaras estão aflitas porque assumiram compromissos com os fornecedores e não podem pagá-los. E agora, até, depois de tantas pressões, o Sr. Presidente da Comissão de Coordenação de Lisboa e Vale do Tejo teve que, à última da hora, em Janeiro de 1992 — vejam bem, o ano de 1991 já acabou! —.pedir paciência às autarquias porque, afinal, parece que há um atraso nos pagamentos por parte da Comunidade Económica Europeia!
De facto, isto é curioso! Numa dada altura, pede-se aos municípios para serem expeditos, garantem-lhes, como, aliás, foi feito, que as verbas apareceriam atempadamente.
mas estamos em Fevereiro de 1992 e os municípios ' — perdoem-me a expressão — continuam a arder! Quando é que esta situação vai ser resolvida?
Sr. Ministro, outra questão que pretendo colocar-lhe tem a ver com a linha de crédito prevista no quadro comunitário de apoio, ou seja, a linha de crédito do Banco Europeu de Investimentos. Foi aberta uma primeira linha em cerca de 10 milhões de contos — se a memória não me atraiçoa —, que já foi esgotada e os municípios, neste momento, estão na expectativa de saberem se, de facto, vai haver reforço ou não, se vai haver bonificação ou não. É evidente que o quadro comunitário de apoio aponta para que esta linha venha a ser reforçada, mas, neste momento, ninguém sabe de nada. Gostava, pois, de saber se esta linha de crédito vai ser reforçada, se vai continuar a bonificação, porque é fundamental, como é obvio, que do FEDER surjam verbas para a bonificação desta linha de crédito.
Outra questão, a meu ver, fundamental, tem a ver com a transferência de novas competências. O Governo tem transferido competências, diz sempre, aquando da discussão do Orçamento do Estado, que não há problemas porque se transferem competências, também vai transferir os recursos financeiros, mas o que não deixa de ser curioso é que, sempre que isso se verificou, o FEF nunca sofreu a competente ponderação. Então, o que é que aconteceu? Os municípios, num determinado ano, receberam a compensação, chamemos-lhe assim, mas no ano seguinte perderam-na, já que tiveram de a ir buscar aos seus próprios orçamentos, porque o Fundo de Equilíbrio Financeiro não foi ponderado. Aconteceu isso com os transportes escolares, com o IRS e com inúmeras situações. Portanto, não estamos contra a transferência de competências — aliás, o meu camarada Jorge Lacão já se referiu à apresentação de projecto de lei do PS sobre essa matéria —, agora o que é um facto é que tem de haver alguma equidade, que é o que lem faltado nos últimos anos.
Uma outra questão é relativa aos investimentos, que são da responsabilidade da administração central e que têm sido sucessivamente transferidos — pelo menos, parte da sua responsabilidade financeira — para as próprias autarquias, como é o caso das escolas. Agora já não são só as escolas, mas são, também, os hospitais. O Ministério da Saúde já diz: «Querem um hospital? Arranjem um terreno e comparticipem nas infra-estruturas. Querem um centro de saúde? Arranjem um terreno e comparticipem nas infra-estruturas.» Quer dizer, o Govemo cada vez quer transferir mais responsabilidades para as autarquias, mas meios financeiros é que cada vez transfere menos.
Sr. Ministro, uma outra questão está relacionada com o denominado «IVA turístico», e aqui também o Governo não tem cumprido nos últimos anos. Gostaria de lembrar, porque me parece importante, que os 37,5 % sobre as actividades turísticas apareceu em 1987, se bem se recordarão, para substituir o antigo imposto de turismo, que era de 3 % sobre o valor da prestação de serviços. De facto, os tais 37,5 % sobre 8 % é que dá os 3 % do antigo imposto de turismo. O que é um facto é que, apesar de ter sido este o espirito do legislador, isto nunca não foi cumprido. O Governo agarrou-se à filosofia do funcionamento do próprio imposto sobre o valor acrescentado e, em vez de transferir esta verba em função do IVA liquidado, ou seja, do IVA liquidado sobre o valor das prestações de serviços, não, vai sobre — chamemos--lhe assim — o IVA, depois de deduzido dos encargos e das aquisições.
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Ora bem, isto é lamentável porque nestes úlimos anos retirou aos municípios, principalmente os que estão nas zonas de grande turismo, largos milhões de contos, sem que estes tenham obtido as respectivas compensações. Isto
para já nâo falar da taxa da primeira venda do pescado,
sobre a qual o Governo mudou de opinião. Num ano diz uma coisa, no outro diz outra, mas para nós é igual,
porque, como nunca transferiu nada para as autarquias, provavelmente, o melhor era também suspender este artigo da Lei das Finanças Locais. Era preferível!... Ao fim e ao cabo, os municípios nunca receberam nada!... Por que é que andamos aqui nesta brincadeira?! Um ano diz-se uma coisa e outro ano diz-se outra!...
Uma coisa, de facto, complicadíssima é o Código das Avaliações. Em 1991, houve rumores de que o Código estaria para se fazer, mas foi logo tudo desmentido. No entanto, é evidente que a avaliação cadastral, principalmente a rústica, é, de facto, complicada, já que a maioria dos prédios estão subavaliadíssimos, as avaliações já foram feitas há dezenas de anos. Mas, mais grave do que isso — e esta é uma questão que gostava de deixar ao Sr. Ministro —, é saber como pensa que isto vai ser feito. De facto, conheço a forma como o Instituto Geográfico e Cadastral tem funcionado, conheço a sua estrutura, e não sei quantos anos é que vai demorar a fazer a revisão do cadastro dos prédios rústicos, principalmente, porque, como é óbvio, o Instituto tem um papel determinante neste processo.
Por último, as questões regionais. Sr. Ministro, desejava colocar-lhe duas questões regionais ligadas ao Ribatejo — desculpar-me-á introduzi-las aqui —, mas uma delas é extremamente importante, dado que consideramos ser um projecto estruturante para o desenvolvimento da região. Trata-se da regularização e da navegabilidade do rio Tejo. O Sr. Ministro foi o defensor de um projecto semelhente para o rio Douro, e nós somos defensores de um projecto igual para o rio Tejo, pois parece-nos que ele seria fundamental. Aquando das campanhas eleitorais e mesmo agora o seu partido fala tanto disto, mas o certo é que, de orçamento em orçamento e de PIDDAC em PIDDAC, nem para os estudos respectivos há verba. A verba é zero! Todos os anos a verba para um projecto estruturante como este é zero!
Isto para já não falar — pois esta matéria é talvez da competência do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, só que é também estruturante para o desenvolvimento harmonioso da região — da conclusão do IP 6 e dos IC 3 e 10, que atravessam transversal e longitudinalmente o Ribatejo. Como sabe, o IP 6 continua atrasadíssimo e a sua conclusão é fundamental, os IC 3 e 10 praticamente ainda não começaram e, agora, até o PSD reivindica também a construção da nova ponte em Santarém, mas, no PIDDAC, as verbas para essa obra continuam a ser rigorosamente nulas.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.
O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território, Srs. Secretários de Estado: Vou tentar ser o mais breve possível, colocando algumas questões relativas à área da investigação científica. Em sede de comissão, o Sr. Ministro tentou responder a algumas inquietações que Deputados do meu grupo parlamentar transmitiram em relação à situação do ÜNIC, no entanto, julgo haver ainda
matéria para que essas inquietações subsistam, apesar de todos sabermos que com um primeiro-ministro como aquele que temos não há razão nenhuma para inquietações neste país! Mas a verdade é que a situação indefinida do
INIC continua a preocupar muita geme, no que diz respeito, nomeadamente, à sua ligação ao ensino e à formação pós-graduada, à execução de investigação fundamental sem
preocupação de retorno económico a curto prazo, pelo menos, e no que diz respeito à compatibilização entre a investigação científica fundamental e a autonomia universitária.
A verdade é que, para este ano, de acordo com os elementos que nos foram gentilmente enviados pela Secretaria de Estado respectiva, está prevista uma dotação para o INIC no valor de 2,93 milhões de contos, o que significa uma redução de cerca de SOO 000 contos em relação à dotação do ano passado, quando o INIC se inseria no quadro do Ministério da Educação.
Por consequência, esta situação de forma nenhuma nos tranquiliza, se não quanto ao futuro do INIC, pelo menos relativamente ao futuro das funções desempenhadas por esse Instituto, nomeadamente no domínio da investigação no âmbito das ciências sociais e humanas, se tivermos em conta que, pelo menos, até há cinco anos atrás, cerca de 50 % dos investigadores se encontravam nas universidades, só 20 % nos laboratórios do Estado, 15 % nas empresas e 5 % em instituições privadas. Donde, a componente universitária ter, de facto, um peso extremamente forte no domínio da investigação.
Neste sentido, pediria que, tanto quanto possível, o Sr. Ministro ou o Sr. Secretário de Estado me pudessem concretizar o que é o Programa de Estímulo no Domínio das Ciências Sociais e Humanas para o qual está prevista uma dotação de 120 000 contos.
Por outro lado, e entrando num outro âmbito da investigação científica não menos importante, gostaria que o Sr. Ministro ou o Sr. Secretário de Estado me pudessem comentar um anúncio publicado nos semanários deste fim--de-semana pelos trabalhadores do Laboratório Nacional de Engenharia Civil protestando contra os cortes orçamentais que, nos sucessivos anos, esse laboratório tem sofrido e manifestando as suas preocupações em relação ao futuro do mesmo.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, uma vez que a Sr.* Deputada Lourdes Hespanhol anulou a sua inscrição, dou a palavra, para responder, ao Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Srs. Deputados, em primeiro lugar, quero agradecer a quantidade de perguntas e o interesse que manifestou toda esta área do Orçamento em que1 estou envolvido, pela qual tenho responsabilidade e que, manifestamente, reclama uma grande atenção, justificando toda a série de perguntas que VV. Ex* fizeram.
Antes de mais, quero referir que, quando decidimos esta suspensão da aplicação da fórmula de cálculo do FEF, naturalmente que nos debruçámos sobre a sua constitucionalidade e que foi com a opinião de vários constitucionalistas que avançámos com ela, conciliando a questão jurídica com a questão política. Por consequência, ao contrário daquilo que foi sugerido, houve cautela, houve avaliação prévia e houve escolha do melhor caminho a seguir.
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Aproveito também para dizer que uma das questões que foi considerada foi exactamente aquela que há pouco foi verberada contra nós relativamente às expectativas de receitas que perturbariam a elaboração dos orçamentos. Foi exactamente porque se estimava que houvesse uma evolução do IVA de certo modo contínua relativamente ao antecedente que se deixaram as coisas seguir e que, em termos políticos — agora não constitucionais—, houvesse uma progressão muito contínua, no sentido de ser assegurada uma continuidade relativamente àquilo que foi o antecedente.
E respondendo já ao Sr. Deputado Octávio Teixeira, que andou à procura de números para justificar os 13,5 %, devo dizer-lhe que pode verificá-los na p. 2 do mapa I, da parte respeitante às receitas, onde se diz que a previsão da cobrança em termos normais do IVA, para 1992, deverá ser de 690 milhões de contos. Esse valor, para o ano de 1991, era de 608 milhões de contos e, se fizer as contas, encontra o valor de 13,49 %. São 13,5 %, porque a harmonização é responsável por 210 milhões de contos. Os números são esses!
Houve, portanto, cautelas, tanto na questão da avaliação política como na questão da avaliação constitucional, e, por consequência, o Govemo não foi nem inconsciente nem desacautelado. E fica assim respondida esta questão da suspensão da aplicação da fórmula de cálculo do FEF.
Relativamente a este ponto, houve uma outra referência, tendo sido perguntado o que é que acontecerá para o ano. Para o ano, se entretanto não houver modificação da Lei das Finanças Locais, o que haverá é o retomo à fórmula habitual, pois, de facto, esta harmonização foi pontual e para ser aplicada em condições muito ligadas à preparação da união económica e monetária, avançando no tempo medidas que poderiam ser avançadas.
Quanto ao caso das grandes cidades, que também preocupou alguns dos Srs. Deputados, devo dizer que estamos, naturalmente, atentos ao que se passa nas grandes cidades. Mas a cidade de Lisboa, que tanto preocupa os Srs. Deputados Jorge Lacão e António Costa, tem, do FEF, somente 10 % do valor total do seu orçamento e a cidade do Porto não deve andar muito acima dos 20 %. Ora, 10 % é não digo que uma quantidade residual, mas uma pequena percentagem do conjunto.
Hoje foi muito acentuada, pelo interesse dos Srs. Deputados, a questão das grandes cidades e das áreas metropolitanas, mas a verdade é que, várias vezes, em sessões como esta, tenho sido muito incentivado a olhar para os desequilíbrios. Ainda hoje o meu ilustre colega de Vila Real, Prof. Eurico de Figueiredo, referiu isso, fazendo também contas relativamente à distribuição entre o litoral e o interior.
Esta é uma «manta» que tem de cobrir tudo, que terá de dar para um lado e para o outro. Devo dizer que sou, naturalmente, muito compreensivo relativamente à necessidade de financiamento dos locais onde está muita população aglomerada, mas a verdade é que há outros locais em que há também necessidades e o equilíbrio das disparidades regionais tem de ser feito com alguma compensação, mesmo no financiamento.
Eu compreendo e muitas vezes me tem sido dito que faço afirmações desassombradas relativamente a quem vive pior em Portugal, dizendo que quem vive pior em Portugal é quem está nas periferias das áreas metropolitanas. Sustento essa afirmação e digo que, efectivamente, é nas periferias das duas áreas metropolitanas que isso acontece e, Sr. Deputado António Costa, não é à força de dinheiro
injectado, mas por alívio nessas áreas que conseguiremos resolver o problema, indo favorecer e dando condições de fixação às pessoas, nos locais onde, finalmente, temos vindo a conseguir maior acessibilidade, melhores condições de fixação de jovens, melhor qualidade de vida e maior viabilidade da actividade económica.
Isto, felizmente, tem sido conseguido, bastando olhar para o que se passa em Vila Real, em Viseu, em Castelo Branco e, mesmo, em Évora, onde a cidade não é particularmente activa debaixo deste ponto de vista, mas onde tem havido alguma compensação. É por esse alívio que
vamos tentar resolver a situação, criando condições de
retenção onde as pessoas têm a sua residência inicial e a sua origem dentro das migrações internas.
O Sr. Deputado Jorge Lacão quer que eu comente — e faço-o com gosto — a questão do aprofundamento da via dos impostos directos, tecendo um comentário mais elaborado acerca daquilo que eu disse no meu discurso de apresentação do Orçamento do Estado em Plenário. Há que, efectivamente, prosseguir no sentido de dar a possibilidade de quem cobra ter mais meios, mas ser também responsabilizado e responder pela cobrança desses mesmos meios. Aqui é que nós divergimos, Sr. Deputado Jorge Lacão. V. Ex.1 sugere que seja uma fatia do IRS e do IRC, cobrados pela administração central, sem qualquer espécie de possibilidade de fiscalização directa pela parte de a quem ele é cobrado nos sítios em que o deve ser. Será, portanto, uma cobrança sem rosto.
Nós aquilo que propomos é alargar às autarquias — e gostaria bem que isso assim acontecesse — a possibilidade de imporem mais taxas, no sentido de virem a ter mais meios, mas serem muito responsabilizadas, tal como nós o estamos a ser, pela carga fiscal que será nesse caso cobrada.
O Sr. Jorge Lacão (PS): — O Sr. Ministro desculpe-me a interrupção, mas não resisto. O Sr. Ministro está a sugerir-nos uma emenda à Constituição?
O Orador: — Estamos a sugerir coisas tão grandes como uma revisão que tem implicações constitucionais. Tem toda a razão! Mas estou a sugerir isto convencido de que há necessidade de uma transparência cada vez maior dos dinheiros, porque os dinheiros só têm uma fonte. São sempre do contribuinte e, consequentemente, o contribuinte deve saber para onde vai o seu dinheiro e deve pedir contas a quem o administra. Se há funções locais, havendo para elas receitas locais, deverá haver uma ligação directa entre quem cobra, quem gasta e quem administra. Entendeu perfeitamente, é isso mesmo que propomos.
O Sr. Deputado falou, bem como outros Srs. Deputados — e peço desculpa por ir já elaborando sobre algumas questões que foram colocadas a seguir, mas depois passarei mais depressa sobre o que agora referir—, na questão das transferências e de uma lei quadro. Nós temos de andar depressa em alguns sectores, e não vejo, de modo nenhum, qualquer inconveniente em que tenhamos uma lei quadro de atribuições e competências que sirva de referência geral — será bom que a aprovemos —, mas também sou e sempre fui contra o ficar-se à espera da última moda ou do figurino elegante que nos vá orientar em toda a atribuição de competências. Há efectivamente competências que um ou outro autarca ou um grupo significativo de autarcas está na disposição de assumir e não vejo qualquer razão para não se explorar essa disposição, a fim de se obter um maior protagonismo em muitas destas funções.
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Os Srs. Deputados criticam muito a questão desta transferência de responsabilidades, como sucede nos casos das escolas C+S, dos hospitais e das estradas, mas a verdade é que, se olharem para essa associação de um outro modo, verificarão que ela não é Ião irracional como isso e até corresponde a uma optimização da utilização dos meios. Andamos sempre à procura da optimização dos
meios, da racionalização da aplicação dos fundos e do
enunciado das maiores prioridades, sem que haja necessidade de recorrer a grandes métodos complicados de matrizes de avaliação das diversas perspectivas por que pode ser olhado um investimento, mas, se nós, na administração central, conseguirmos que haja por parte da administração local a definição das maiores prioridades em matéria de um determinado investimento, se tivermos a administração central a dizer que determinada escola é prioritária e investirmos nela dinheiro e tivermos a administração local a dizer que tal escola é muito prioritária e que até está na disposição de arranjar terreno e contribuir com mais alguma coisa, começaremos a ter uma perspectiva local e uma perspectiva central convergentes, sendo certo que, quando há convergência, se verifica um grande acerto na escolha do empreendimento.
Não vejo, pois, que haja qualquer coisa de negativo nisto. Se houver muitos outros empreendimentos em que haja convergência de pontos de vista relativamente à relevância de uma determinada infra-estrutura ou equipamento, penso que se deve prosseguir e continuar a explorar este objectivo, mesmo antes de ser aprovada a grande lei. A lei quadro será, naturalmente, útil — não digo o contrário. Acho que a lei quadro é muito útil e constitui um importante elemento de racionalização e clarificação. Não deveremos é estar à espera de tão elaborado documento, se entretanto houver a possibilidade de antecipar optimizações e racionalizações.
No âmbito do desenvolvimento regional e local, referiu ainda o Sr. Deputado — o que, aliás, já tinha dito em reunião da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente — que seria bom que o próximo quadro comunitário de apoio tivesse já a participação das regiões. Tenho dito muitas vezes que as regiões em Portugal hão-de ser feitas, mas que, para ficarem consolidadas, não deverão sê-lo de afogadilho. Essas coisas têm um calendário e haveremos de arranjar maneira de participar, tal como o fizemos no quadro comunitário de apoio e nos PDR anteriores.
Temos uma participação muito maior do que todos os outros países, porque efectivamente tem havido uma associação enorme. Lanço ao Sr. Deputado o desafio de verificar se nos restantes países comunitários beneficiários dos fundos estruturais há, como em Portugal, tantos autarcas a saber tanto de fundos e do uso de fundos e tantos parceiros associados a programas e projectos. Não cometerei a deselegância de nomear outros países, mas sempre lhe direi que em Portugal há um grande envolvimento de muitos agentes, o que nos dá uma grande satisfação.
A participação, a critica e a transparência — estou inteiramente de acordo consigo — nunca são suficientes. No plano dos princípios, suponho que estamos de acordo, em termos de ter de haver, designadamente, transparência e responsabilização. Deveremos, em minha opinião, prosseguir sempre no aprofundamento de todos esses aspectos. Se ficarmos à espera de que haja uma lei, que vai ser discutidíssima e vai implicar muita análise, para termos acesso a novos fundos, iremos, seguramente, aumentar o grau de crítica relativamente ao anterior.
Devo referir que não temos tido qualquer espécie de reserva às críticas que fazemos e que a oposição nos tem castigado suficientemente quando mostramos cá fora coisas que não nos têm corrido tão bem como o que gostaríamos. Isso faz parte do jogo e não lenho qualquer espécie de reserva em relação a isso. Já teria reservas se, por acaso, num qualquer ministério ou num seu serviço estivesse a esconder coisas do respeitável público. Ninguém esconde nada, supondo eu que não há a falta de controlo democrático que o Sr. Deputado refere, nem sequer quanto aos grandes princípios.
Os grandes princípios estão contidos nas Grandes Opções e estas são suficientemente pormenorizadas para se ter a possibilidade de criticar as grandes linhas. Suponho que são precisamente as grandes linhas que devem ser criticadas nesta Câmara, para depois não se ocupar tempo nas pequenas.
Fiz já um comentário à questão das normas inconstitucionais, suscitada pelo Sr. Deputado Luís Sá.
Quanto à questão da função redistributiva, os critérios foram efectivamente afinados com recurso a vários cenários e em colaboração com a Associçâo Nacional de Municípios Portugueses e seus técnicos. Tínhamos a consciência de que, ao querer estabelecer regras gerais — e foram por vezes utilizados muitos pesos e combinações de indicadores —, algumas das coisas não iriam jogar a favor de um ou outro município, mas a verdade é que introduzir alguma margem de discricionariedade para um ou outro município seria viciar uma regra que se quer geral.
Fez o Sr. Deputado referência a Vendas Novas, Campo Maior e Aljustrel. Infelizmente, em especial nos casos de Aljustrel e Campo Maior, o que se passa é que perderam muita população. Se atribuímos um peso grande à população (e aí temos os Srs. Deputados das áreas metropolitanas a querer atribuir ainda mais peso ao das populações), o Sr. Deputado concordará em que o resultado não possa satisfazer um lado e o outro, o que nos é muito penalizante. Não há nenhum ministro, secretário de Estado ou deputado (como se verificou pelas intervenções anteriores aqui produzidas) que não goste de fazer o seu papel de bon prince. Toda a gente gosta de o fazer; qualquer pessoa gosta de, cheia de dinheiro no bolso, ir por aí fora e o distribuir, agradando a toda a gente. Não nos movemos nessa perspectiva. Queremos, isso sim, assegurar uma equidade, e é com base em princípios e critérios que gostamos de trabalhar.
Falou depois da questão do apoio aos PDM, dizendo que esta faz parte de uma questão mais vasta, e referiu-se a falta de critérios, o que — direi eu — não acontece. A elaboração dos PDM — e ainda na passada sexta-feira live uma longa reunião com pessoas que a aplaudiram — é um exercício de uma extrema importância.
Nessa reunião, chamaram-me a atenção para o perigo de haver algumas autarquias que, por falta de meios, os não estão a levar a cabo no alto nível em que eles têm de ser desenvolvidos. Estou de acordo com essa chamada de atenção, sobretudo ao nível de municípios periféricos e municípios que não dispõem de técnicos para os acompanhar, tendo de se entregar nas mãos de gabinetes. Alguns deles, inteligentemente, têm feito associações para minimizar os custos da realização de três ou quatro PDM, em especial na fase de análise, para assim pouparem, no que suponho ser uma actuação muito inteligente. A verdade é que realmente alguns municípios se deparam com dificuldades nesta preparação técnica.
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Não há, segundo penso, falta de critérios, porque só quando se demonstra necessidade evidente a esse respeito é que tais instrumentos são conferidos, sendo, aliás, de referir que tudo isso é publicado no Diário da República. A tal falta de crítica democrática não existe, porque estamos ai para responder e justificar por que é que as coisas são feitas da forma como o são.
No que se refere à questão de saber, quanto aos contratos-programa, por que é que não é tudo englobado no FEF, a explicação tem de ser encontrada na resposta que dei anteriormente. É que os contratos-programa constituem a forma de estímulo que temos para juntar perspectivas centrais com perspectivas locais, associando-nos em coisas que, em conjunto, garantem a optimização da aplicação dos meios.
O Governo não ameaça transferir para outros sectores o mesmo procedimento. Há voluntários nesta área e devo dizer que há sempre mais voluntários do que verbas, o que é efectivamente um indicador de que as medidas são interessantes e populares, se assim lhes podemos chamar. Se por acaso andássemos para aí atrás de um ou outro autarca a dizer «Por amor de Deus, assine aqui este contrato!», talvez então estivéssemos a fazer qualquer coisa de negativo.
Há sempre muito mais candidatos do que aqueles que são contemplados, razão pela qual suponho que as medidas são populares e interessantes.
As questão das verbas para a instalação e funcionamento das áreas metropolitanas foi coisa que preocupou vários Srs. Deputados. Terei muito gosto, Sr. Deputado António Costa, em falar quer sobre a instalação quer sobre o funcionamento.
Diria, em primeiro lugar, que é emblemática a austeridade das verbas. O público tem de saber que se trata de uma contribuição, mas de uma contribuição exígua — e digo-o de propósito. Não pode haver ostentação nem esbanjamento, tem de se procurar instalações já existentes, dando-se-lhes uso, e não se pode construir um grande edifício que porventura fique a constituir uma grande sede. A exiguidade dos meios, que se confirma, tem de ser entendida como um sinal de austeridade, de economia e do aproveitamento que deve ser dado às coisas. É evidente, Srs. Deputados, que nunca nos passou pela cabeça dar tudo, já que ninguém aprecia nada do que lhe é dado de graça e, assim, alguém tem de complementar os meios. Esta verba deve, pois, ser entendida exclusivamente como um «dinheiro-semente» para outras coisas mais amplificadas.
Em relação à questão do funcionamento, não sabemos ainda como é que irão funcionar as áreas metropolitanas e se irá ou não haver grandes projectos. Neste momento as coisas estão a correr razoavelmente em matéria de fundos estruturais e as áreas metropolitanas têm tido ajudas muito substanciais em matéria de fundos estruturais, havendo mesmo programas operacionais para as aludidas áreas. Entendemos que o principal problema agora não é o funcionamento, mas sim o investimento, em relação ao qual houve já dois programas operacionais, um para um lado e outro para o outro, que são realmente muito importantes e têm andado menos mal, embora não esgotando tudo como eu gostaria que esgotassem, porque têm uma dinâmica especial. Há zonas rurais que têm gasto os dinheiros atribuídos melhor e mais depressa do que as áreas metropolitanas. De qualquer das formas, as estruturas das áreas metropolitanas são hoje patentemente, de acordo com o que foi resolvido no Parlamento, mais
estruturas de coordenação de vontades e definição de percursos comuns do que propriamente um nova fonte de dispêndios, em contraposição a tudo o resto.
Não se esqueçam os Srs. Deputados — tive ocasião de o dizer no passado sábado, numa reunião no âmbito da Área Metropolitana de Lisboa — de que o País também é paisagem fora de Lisboa e esta conta tanto como a cidade. Portugal não é só Lisboa e Porto. O resto também conta e a solução dos problemas de Lisboa e do Porto — insisto em dizê-Io — passa pela resolução dos problemas do resto do País.
No que respeita às juntas de freguesia, vai o Sr. Deputado Luís Sá propor 1 milhão de contos — acho bem! — e diz que há juntas que são mais do que meros centros administrativos. Devo referir que tenho estado presente nalgumas inaugurações desses novos edifícios e que o Sr. Deputado tem toda a razão quando diz que elas são algumas vezes centros de saúde, locais de reunião, locais de festa, etc. Tenho de dizer que, tendo sido eu — nesta matéria não foram outros, mas eu mesmo — o responsável pela inscrição de uma verba destinada à instalação de juntas de freguesia, como fui eu o responsável pela abertura de uma linha de apoio à construção e melhoria de edifícios de câmaras municipais, pelo que estou à vontade para dizer que não posso ser mais sensível à dignidade dos locais onde se exercem as funções autárquicas.
Agora, se a junta da freguesia vai ter um consultório para o médico, uma sala de festas, uma sala para treinos dos ranchos, um bar para a população fazer ponto de encontro, então, terão de ir buscar a outros lados os meios e as comparticipações porque o nosso objectivo é proporcionar um local de reunião da assembleia de freguesia e um gabinete para o presidente da junta.
Sei muito bem que dizem que 3500 contos não chegam mas quanto mais elevar o quantitativo per capita menos instalações se fazem — e a experiência mostra que as pessoas colaboram muito em tudo isto.
O Sr. Secretário de Estado vai falar sobre a questão das assembleias distritais e sobre os dinheiros. Os Srs. Deputados Fernando de Sousa e Octávio Teixeira falaram do 1NE. Quero dizer-lhes que ninguém mais do que eu compreende a importância do INE. Com efeito, tive a honra — e repito, tive a honra — de vir defender nesta Câmara a reforma dc sistema estatístico nacional a qual foi iniciada, também por mim, com a nomeação de uma comissão que estudou, profundamente, todas as implicações do assunto, até à sua concretização final com o Instituto. Portanto, ninguém gosta de ver uma «criatura» sua começar a tremer e eventualmente a não cumprir as suas funções. Isto é evidente! É evidente também que ela não vai tremer e que não está em causa a anulação das suas funções!
Há um pedido que foi feito a toda a gente no sentido de se racionalizar funções, gastos e tudo quanto seja exploração corrente daquilo que se faz, aumentando a produtividade. Nestes termos, tendo em conta os tectos fixados para o Ministério, tive de ratear por todos os magros meios disponíveis, que, apesar de serem magros, aceitei por se tratar de uma orientação geral para toda a Administração Pública.
Devo dizer também que, pela primeira vez na Comunidade, se Financiou um programa de estatísticas regionais, negociado por nós, pela Sr.' Secretária de Estado e por mim, e, portanto, não vamos deixar de atender às contrapartidas nacionais.
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Tenho, porém, a impressão de que, relativamente aos funcionários do LNE, não podemos é alimentar expectativas de aumentos muito elevados de salários. Por outro lado, nâo podemos tolerar que, em matéria de investimentos, tudo se faça ao mesmo tempo. Os Srs. Deputados que intervieram a este respeito falaram na questão do edifício. O edifício não pode ser realizado este ano. O censo é também um investimento, os recenseamentos são um investimento e aquilo que ficou determinado — as pessoas, no INE, e o País sabem-no, até porque eu já disse isso numa intervenção pública e ficou registado — foi que, tratando-se de investimentos, não podemos fazê-los todos ao mesmo tempo.
Há, com efeito, delegações regionais que foram bem instaladas, como, por exemplo, as do Porto e Coimbra, que têm condições muito desafogadas para exercer as suas funções nos locais onde elas devem ser exercidas.
Porém, o prolongamento do edifício de Lisboa, que foi projectado com desvelos de cuidado arquitectónico porque se trata de ampliar uma peça muito importante da arquitectura portuguesa e para o qual foi feito um bonito projecto, está garantido, mas não se faz este ano, porque, em 1992, ainda há investimentos a fazer no censo e o que se passa em matéria de PIDDAC visa dar prioridade àquilo que não pode deixar de não ser aproveitado.
Portanto, não fique intranquilo, Sr. Deputado Octávio Teixeira, porque o censo, o recenseamento e os respectivos dados não vão ser postos para o lixo, mas, sim, aproveitados e devidamente resumidos, agregados e publicados, não havendo qualquer receio de que isso não se possa fazer.
Agora, os Srs. Deputados não queiram é que se faça tudo ao mesmo tempo porque não há meios para isso. O edifício custa 1 milhão de contos e há-de fazer-se em dois anos, em que não haja censos ou recenseamentos complicados como, por exemplo, os da agricultura ou da população.
Portanto, o edifício virá ocupar o lugar do PIDDAC em dois anos consecutivos em que não haja outro tipo de investimentos, que, embora sendo diferentes, são investimentos.
Sr. Deputado Fialho Anastácio, detesto, no Orçamento, aquela disposição de pagamento à EDP, como prioritário, como, também, detestei que houvesse uma coisa similar para a EPAL. Mas, quando há uns anos aceitei tal disposição no que respeita à EDP, foi porque, em termos financeiros, aquela empresa se encontrava numa situação em que se tomava extremamente difícil arranjar créditos externos para fazer aquilo que tem de fazer, que é dar-nos energia, porque a sua situação financeira era, como disse, muito desajustada, particularmente por causa das dívidas que eram de milhões e milhões de contos.
Devo dizer ainda que, apesar de detestar, aceitei tal disposição como um estímulo muito eficaz e foi por isso que foi introduzida no Orçamento do Estado de há três ou quatro anos, mas, a partir daí, tem-se vindo a recuperar tanto no caso da EPAL como no caso da EDP, forçando-se alguns acertos.
Era, de facto, melhor que houvesse autodisciplina suficiente e que ninguém ficasse a dever a água ou a luz que consome, mas, porque tal não sucedeu, teve de se adoptar esta solução. Efectivamente detesto que tenha sido assim, mas é o que é.
Sobre problemas operacionais e atrasos, só suspendemos projectos se, efectivamente, não houver qualquer possibilidade de virem a ser concretizados. Mas isso faz-se com
avisos prévios numerosos: acendem-se as luzes amarelo ligeiro, amarelo mais carregado, amarelo às riscas de encarnado, enfim, acendem-se todos os tons de amarelo antes de chegarmos à luz encarnada. E digo que assim é mesmo sem saber exactamente a que projecto específico se está a referir.
Houve, na verdade, alguns atrasos no programa relativo ao Sotavento. Suponho, porém, que este programa está a voltar aos «carris». Vamos ver se ele não se desencaminha outra vez.
Sr. Deputado Eurico Figueiredo, grande parte das considerações que tenho a fazer à sua intervenção estão justificadas por outras anteriores. É evidente que há esta pressão muito grande dos que dizem «mas as pessoas estão no litoral» e dos outros que, também, dizem «mas não devem estar e deviam estar no interior, porque é lá onde ainda têm condições de vida e as outras não podem ser esquecidas».
Ora, devo dizer que as contas que fez do PIDDAC não são as contas certas para traduzir a realidade dos instrumentos a que temos de lançar mão. O PIDDAC deve promover equilíbrios regionais, mas não é um instrumento de equilíbrio regional, tem também de atender onde estão as pessoas e as grandes concentrações.
Porém, se quiser um instrumento de política regional, esse é o FEDER, dos quais 70 % têm sido aplicados no interior, englobando a posição de Setúbal (naturalmente por razões que não vale a pena agora explicar) e as Regiões Autónomas (que também estão autojustificadas a este respeito) e, portanto, esse espaço é que tem de subir 70 %.
Sr. Deputado Manuel Castro Almeida, suponho que já referi a questão da constitucionalidade e da harmonização. A previsibilidade que referiu é perfeitamente certa. As câmaras fizeram os seus orçamentos no devido tempo, nós não fizemos por razões óbvias ligadas ao processo eleitoral, mas, com efeito, as câmaras não previram o acréscimo de 30 % no FEF, mas, sim, acréscimos muito menores e, portanto, não estão, neste momento, com os seus orçamentos desconjuntados por causa de uma previsão errada.
A alteração dos critérios foi combinada, como já tive ocasião de dizer, com a Associação, vendo, naturalmente, todas as suas repercussões e sabendo que umas subiriam e outras não.
A definição do limiar dos 7 % foi referida, fizemos vários ensaios e mesmo aquela curva, que tive ocasião de mostrar na nossa reunião da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, foi afinada, mostrada e devidamente elucidada.
Quanto ao valor jurídico e político do relatório anexo, como se sabe, o relatório é do Governo e dimana da lei e, portanto, o que se verifica é o cumprimento de um preceito legal.
Qualquer alteração do Código das Avaliações — e isso já foi objecto de várias intervenções —, como é óbvio, tem de ser baseada em critérios objectivos. Contudo, suponho que, em qualquer ocasião, nos dias futuros, ou hoje ainda, a Sr.8 Secretária de Estado do Orçamento poderá debruçar--se sobre isto, com mais detença, mas, de qualquer das formas, não pode deixar de não ser com base em critérios muito objectivos.
Sr.9 Deputada Helena Torres Marques, sobre as áreas metropolitanas, estou inteiramente à disposição e, sempre que quiserem ou acharem bem, aqui virei para responder.
Nós partimos do pressuposto que o Orçamento é constitucional, como é evidente. Não nos passava pela cabeça o
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contrário, porque, então, vínhamos atrasar o processo e arranjar aqui um sarilho enorme. O nosso pressuposto é de que é constitucional e temos bons apoios para pensar assim. Porém, quando pergunta «se o Governo tem a consciência», devo dizer-lhe que o Governo é muito consciente e, por isso, avança na presunção fundada de que ele é constitucional.
Quanto à questão dos «próximos anos», como já referi e é evidente, o Orçamento do Estado é para este ano. Acaba este Orçamento e volta-se à lei em vigor.
Sr.* Deputada Helena Torres Marques, devo referir que a inauguração a que fez menção já se verificou depois das eleições. Eu próprio estive nessa inauguração, foi a do IP 2, e, repito, não foi antes, mas, sim, depois das eleições.
São, afinal, coisas tão pequenas! Mas compreendo. É o Hospital Distrital de Beja, as escolas, etc.
Agradecia-lhe que me comunicasse, se não conseguir obter uma resposta dos Srs. Ministros da Saúde e da Educação,...
A Sr.» Lourdes Hespanhol (PCP): — Mas a lista é grande, Sr. Ministro!
O Orador: —... para que lhe possa enviar uma nota, uma vez que não tenho aqui elementos tão específicos.
Relativamente à questão do trecho do IP 2, entre Castro Verde e Albemoa, espero que haja mais fundos. Temos de reformular todo o esquema e todo o programa rodoviário, uma vez que vai haver, seguramente, antecipação dos trechos principais de todos os IP e de todos os IC. Os Srs. Deputados sabem, e o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações já o referiu, que em virtude da prioridade a dar a todos os IP, o trecho do D? 2 será terminado muito brevemente.
Sr. Deputado José Manuel Maia, a questão que colocou é realmente uma questão gorda, como a classificou, e lamento não estar em posição de me pronunciar muito sobre ela. Há perguntas que foram feitas ao próprio gabinete, ao GATTEL, e que ainda não foram devidamente respondidas, havendo, portanto, factores que precisam de ser analisados.
No entanto, posso adiantar algumas coisas que já tive ocasião de referir quando recebi os Srs. Presidentes das Areas Metropolitanas. E que, embora isso se possa pensar, não há decisões irreversíveis e estamos abertos a todas as alternativas. Por questão de minoração da portagem da próxima travessia, vai englobar-se a exploração da actual, o que significa uns milhões de contos em termos de investimento. Mas isto vai acontecer exactamente para que haja um equilíbrio e não haja deformações da procura devidas à existência de portagens baratas e portagens caras.
O Sr. José Manuel Maia (PCP): — Isso quer dizer que perspectivam um aumento da portagem da Ponte de 25 de Abril?
O Orador: — Eu não disse isso. Foi uma conclusão que V. Ex.s retirou, sem que eu o tivesse afirmado. O que disse é que as portagens têm de ser um instrumento de racionalização de comportamentos e, portanto, não podemos deixar que uma fique sobrecarregada com tudo, o que aconteceria se não se atendesse a esse elemento de racionalização. A ser assim, uma dessas travessias não cumpriria a sua função de acomodação de tráfego.
Sr. Deputado Octávio Teixeira, tenho impressão de que já referi a questão dos 13,5 %, bem como a questão do INE.
Vou pedir ao Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território para responder à questão que o Sr. Deputado Alberto Avelino colocou, a propósito das assembleias distritais.
Relativamente à questão colocada pelo Sr. Deputado Duarte Pacheco, os critérios foram negociados e suponho que, por isso mesmo, permanecerão. O que imagino é que nos próximos critérios vamos voltar a fórmulas de cálculo do FEF, tal como se verificava anteriormente.
Sr. Deputado António Costa, já me debrucei sobre a questão das áreas urbanas e sobre o aumento das receitas próprias, que comentei brevemente. No tocante à questão das áreas metropolitanas, já referi que a exígua verba, e insisto em dizer que é exígua, é emblemática e impõe austeridade.
Sr. Deputado Gameiro dos Santos, relativamente às questões que colocou e que ainda não comentei, devo dizer-lhe que os projectos foram apresentados rapidamente e têm de o continuar a ser.
Já tive ocasião de dizer em público e em sede de comissão que, efectivamente, houve atrasos na transferência de Bruxelas para Lisboa. Trata-se de uma questão que a imprensa me coloca muitas vezes e como não tenho grande memória para números, para além de que detesto não ser rigoroso, aponto-os num papelinho que tenho aqui.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Pensei que já fosse o cheque!
O Orador: — Não, ainda não é o cheque, são fatias.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Mas, já agora, diga a data para eu anotar.
O Orador: — De Bruxelas já vieram cerca de 106,6 MECU e 191 MECU estáo a caminho. No entanto, devo dizer-lhe uma coisa que, segundo suponho, lhe agrada. As câmaras municipais estiveram a ser pagas por verbas da administração central, a qual sofreu o grosso dos atrasos que não nos são imputáveis. Sempre arranjámos meios de não desiludir quem depositou confiança em nós e, portanto, se houve alguém que ficou prejudicado foi a administração central e não as autarquias locais.
Efectivamente, lamento dizer-lhe que a culpa não foi nossa e, sim, de Bruxelas, mas não vou agora reelaborar aquilo que disse na ocasião. Contudo, também aqui houve falhas: foram erros administrativos processuais por parte da própria administração comunitária e foi um erro de julgamento, pois eles nunca pensaram que os quadros comunitários de apoio pudessem ser executados com tanta velocidade.
Quanto ao reforço da linha de crédito, Sr. Deputado, acho interessante que a tenha invocado como bonificação do BEI, porque na ocasião em que ela foi lançada recebi críticas de sinal contrário, ou seja, dizia-se que o que era preciso era mais subsídios e que a linha de crédito não servia para nada.
No entanto, a linha de crédito esgotou-se rapidamente e devo dizer-lhe que a Caixa Geral de Depósitos achou tão interessante a colaboração estimulada por essa linha de crédito que continua a mantê-la, mas, naturalmente, só com a bonificação da própria Caixa.
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O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Isso nâo interessa!
O Orador: — O Sr. Deputado está a dizer que isso não interessa mas interessa, porque as câmaras estão a ir lá outra vez.
Afinal, tínhamos razão quando fizemos uma linha de crédito desse género para complementar os fundos comunitários. Assim, é nossa intenção repetir e multiplicar uma história de sucesso, pelo que a Sr.1 Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional já tem indicações no sentido de ver se prolongamos a linha de crédito.
O Sr. Secretário de Estado vai comentar a questão do IVA turístico e dó Código das Avaliações já referido.
Ontem tive uma grande satisfação porque, pela primeira vez, saiu um navio do Douro carregado de granito. Trata--se de um navio não só comercial, turístico, mas para cargas. E compreendo que para granéis daquele género as vias navegáveis têm de ser aproveitadas. Não posso pronunciar-me longamente acerca disto mas há manifestações de interesse em levar a via navegável, de imediato, até Vila Franca, e isso é só uma questão de dragagens.
Daí para cima gostaríamos que houvesse uma participação mais clara de...
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — Mais clara?!
O Orador: —... outros agentes, para a qual estamos abertos, até porque já houve expressão, nesse sentido, por parte de um grupo particular que acabou por não formalizar as contrapartidas que gostaria de receber em virtude da concessão da exploração da navegação, e era importante que tal acontecesse. De qualquer das formas, nunca será uma coisa que vá até à fronteira, na medida em que não há possibilidades, mas irá seguramente bastante mais a montante de Vila Franca de Xira. Imagino que o limite se situará em Abrantes, por causa dos granéis de carvão.
Quanto aos atrasos que referiu, o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações vem cá e o Sr. Deputado poderá perguntar-lhe tudo acerca dos IP, nomeadamente do IP 6, e dos IC 3 e 10, bem como dos respectivos calendários que sei já estarem marcados.
Finalmente, Sr. Deputado Fernando Pereira Marques, quando estive na Comissão de Educação, Ciência e Cultura tive ocasião de referir que as funções do INIC não vão ser anuladas e, sim, reconvertidas e compatibilizadas com funções de financiamento na JNICT, que tem de ser o órgão de coordenação do financiamento de todas as instituições de investigação.
Sei, e por isso estamos a agir com toda a cautela, que há muitas funções anteriores a salvaguardar, como a função editorial e a função de apoio a teses em áreas que não são habitualmente subsidiadas.
No entanto, tudo isso tem de ser feito de uma forma compatibilizada c não desgarrada, introduzindo variações de condições muito grandes. Efectivamente, tal como diz, a componente de investigação, especialmente na educação a nível superior e na formação de professores, é naturalmente indispensável e é por isso que a Comissão, que está a trabalhar diligentemente para propor as medidas de racionalização das funções que estavam atribuídas ao INIC, tem um reitor, o presidente do Conselho de Reitores, que vai acautelar todos os cuidados e inquietações que o Sr. Deputado manifestou.
O Sr. Deputado lamentou, ainda, a redução das verbas, mas foi exactamente para isso que se fez a fusão, ou seja, para racionalizar e poder fazer o mesmo, ou mais, gastando menos. Assim, essa é a razão última da operação a que se procedeu, mas, de qualquer das formas, vou pedir ao Sr. Secretário de Estado dá Ciência e Tecnologia para comentar a questão do programa de estímulo no domínio das ciências sociais e humanas e dos 120 000 contos que referiu.
Sr. Presidente, com a sua autorização pedia então muito rapidamente ao Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território para falar sobre as assembleias distritais e o IVA turístico, à Sr.' Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional para falar na questão da linha de crédito, em que ela está tão empenhada, e ao Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia para abordar a questão do programa de estímulo.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, vamos ter outra reunião as IS horas e, por isso, não sei se dará tempo, mas vamos tentar geri-lo da melhor forma. De todo o modo, julgo que o Sr. Ministro ainda terá de usar da palavra, uma vez que há quatro Srs. Deputados que me pediram curtíssimas intervenções, para efeitos de registo.
Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território.
O Sr. Secretário de Estado da Administração Local e do Ordenamento do Território (Nunes Literato): — Sr. Presidente, serei muito breve.
Em relação ao IVA turístico, como sabem, o imposto de turismo foi extinto quando foi instituído o imposto sobre o valor acrescentado e encontrou-se um sucedâneo.
A informação de que disponho é de que a cobrança tem sido feita a um nível e as transferências para as autarquias a um nível muito superior ao que a lei prevê — acima de 4 milhões de contos —, o que tem causado, nomeadamente, alguns problemas. Naturalmente que os Srs. Deputados poderão vir a concretizar melhor as suas questões para que se possa realmente estudar o problema.
O Sr. Gameiro dos Santos (PS): — É só falar das regiões de turismo, mais nada!
O Orador: — Quanto às assembleias distritais, o que gostaria de dizer é que o processo de desafectação iniciou--se antes de estarmos no Governo e, a meu ver, muitíssimo bem.
Tratava-se de um órgão que era um resquício de antes do 25 de Abril e que não correspondia realmente a uma solução adequada para a situação que se vivia, nomeadamente, um órgão colegial que geria aeródromos, as coisas mais diversas e não fazia o menor sentido que continuasse.
Com efeito, esse processo de desafectação que herdámos, mas em relação ao qual assumimos toda a responsabilidade, prosseguiu e mesmo quando o governador civil presidia ainda a esse órgão, nessa altura, foi feita uma desafectação em termos orçamentais da ordem dos 500 000 contos, por exemplo, para cerca de 150 000—estou a falar de cor, mas em números dessa grandeza.
Por isso, agora que estamos nessa fase terminal, vamos continuar a desafectação procurando realmente a poupança de recursos para outras coisas mais importantes do que propriamente o financiamento das assembleias distritais.
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As assembleias distritais na sequência da revisão constitucional são aquilo que as câmaras municipais naturalmente quiseram que fossem.
Quanto à questão da Assembleia Distrital de Lisboa, em especial, que foi referida pelo Sr. Deputado, a questão co\oca-se ao nível do cumprimento rigoroso do Decreto--Lei n.° 5/91, diploma que teve alguma polémica na sua concretização. O Governo decidiu ouvir a Procuradoria--Geral da República sobre a matéria e, portanto, toda a sua actuação tem sido pautada exactamente por esse parecer, que conduz, relativamente ao património, a que ele seja realmente afecto às actividades que a assembleia distrital no passado quis exercer, reservando para o Estado aquelas actividades que as assembleias distritais não quiseram realizar. Aliás, devo dizer que da parte das câmaras municipais houve sempre o maior desinteresse pelas actividades das assembleias distritais em todo o País, havendo muitas que durante anos não conseguiram reunir por falta de quórum.
Gostaria só de fazer mais dois comentários muito breves, se me permitirem, sobre questões que foram aqui salientadas.
Uma em relação aos 7 % que Aljustrel cresce em termos de Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF). Realmente é verdade, mas em especial o Sr. Deputado Luís Sá — que citou o caso de Aljustrel — esqueceu-se de referir que nos três anos anteriores cresceu 146 %, o que corresponde a uma média de mais de 40 % por ano, o que naturalmente explica o valor relativo a este ano.
Depois gostaria de fazer uma «provocaçãozinha», que me parece adequada no sentido de dizer que nenhum dos Srs. Deputados — e tão preocupados estiveram com questões de constitucionalidade — referiu a questão das retenções do FEF para os gabinetes de apoio técnico. Naturalmente tiveram as suas razões!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.* Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional.
A Sr." Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional (Isabel Mota): — Vou apenas fazer um pequeno comentário ao Sr. Deputado Gameiro dos Santos. Penso que já terá percebido com certeza que não há nenhuma lia rica em Bruxelas! É errado que o Partido Socialista continue a insistir nessa tecla — que de facto nada tem a ver com a realidade — e não assuma de uma vez por todas que o que tem havido é capacidade de negociação, boa execução por parte do País e além disso que temos pela frente uma máquina complexa e complicada de lidar, que é a máquina comunitária.
Relativamente às questões que me foram colocadas, uma por um Sr. Deputado do Algarve e outra pelo Sr. Deputado Gameiro dos Santos, que estão ligadas e que têm a ver com as regras do jogo, muito rigorosas e complicadas, estabelecidas para o quadro comunitário de apoio, se bem se recordam, faz agora um ano, o tom da nossa preocupação era que estávamos atrasados por razões diversas, imputáveis ao País — com certeza — e imputáveis também à Comissão Europeia.
Foi largamente debatido e, de comum acordo entre as diferentes partes envolvidas — que são muitas como sabem e o nosso Quadro Comunitário de Apoio é, conforme o Sr. Ministro disse, o mais descentralizado em termos de acesso aos fundos comunitários de todos os Estados membros, o que muito nos apraz registar, dizemos isto com apreço c com muita responsabilidade por essa actua-
ção —, foram estabelecidas regras de gestão por objectivos assumidas por todas as partes. Quer dizer, fez-se uma análise do que é que poderiam ser as nossas capacidades de execução caso a caso e concluiu-se claramente por uma gestão por objectivos.
Felizmente os resultados foram óptimos, tirando alguns casos, entre os quais o Algarve—já foi referido pelo Sr. Ministro—, em que não foi possível atingir essas metas. Tirando isso, houve, de facto, uma recuperação notável e nalguns casos até ultrapassámos as metas, o que é extremamente positivo.
Por isso, e não só, também por outras razões que têm a ver com a gestão orçamental que a Comissão Europeia faz das verbas, assistiu-se ao problema, por de mais conhecido e muito divulgado, que foi o de a CEE não ter correspondido aos nossos pedidos de pagamento a tempo, o que, neste momento, penso estar ultrapassado.
O Sr. Ministro já referiu que fizemos uma gestão dos recursos escassos de forma a não prejudicar as autarquias, o que foi por elas reconhecido, tendo sido possível dar resposta às suas necessidades até ao final do ano. Houve um problema no princípio do ano, está resolvido e hoje mesmo vamos passar o cheque. Não foi assim a expressão que um dos Srs. Deputados referiu? Vamos começar a passar os cheques porque o dinheiro começou a chegar.
Voltando aos objectivos e para responder à pergunta que o Sr. Ministro me propôs responder sobre a linha de crédito aos municípios, quero dizer que vamos tentar reforçá-la, mas para isso teremos de retirar verbas dos programas que não atingiram as metas. Com essa gestão estamos a tentar ver o que traz mais problemas. Por exemplo, o caso dos programas do Algarve poderão dar algum dinheiro este ano para fazer face a outras necessidades. São estas as regras do jogo, claramente assumidas por todos, assinadas em actas do quadro comunitário de apoio, com os representantes de todas as autarquias. Estamos a analisar em conjunto com a Associação Nacional de Municípios (ANMP) qual é a melhor maneira.
No entanto, penso que a questão da linha de crédito não é tão complicada quanto isso, dado que, como conseguimos o aumento das taxas de comparticipação dos programas autárquicos, praticamente todos os municípios que quiseram já estão a 75 %. Só não estão aqueles que não quiseram. Isso vai ficar em acta na próxima reunião do quadro comunitário de apoio, esgotando-se o assunto. Mas já estamos a pagar à taxa nova. O que acontece é que o conjunto das verbas entre o Banco Europeu de Investimentos e o FEDER não podem ultrapassar 90 %, de acordo com as regras comunitárias. Há casos em que já nem sequer se pode pôr o problema, já não há margem, pelo que estamos a ver isso em conjunto com a ANMP.
Penso, pois, que em breve poderemos ter uma resposta, face à gestão por objectivos que acordámos e temos levado a cabo, para a questão da linha de crédito para os municípios, que, conforme o Sr. Ministro disse, foi um caso de sucesso.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretario de Estado da Ciência e Tecnologia.
O Sr. Secretário de Estado da Ciência e Tecnologia (Manuel Fernandes Thomaz): — Vou procurar ser muito breve relativamente a algumas questões que me foram colocadas e particularmente à do Programa de Ciências Sociais e Humanas.
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Quanto à problemática geral da investigação fundamental, gostaria de dizer que tem sido uma preocupação importante e prioritária deste governo e de outros governos anteriores. £■
E, a propósito, cite-se que, num relatório recente da OCDE, Portugal é apontado como o país que proporcionalmente mais tem investido na investigação fundamental. Este dado não é tão significativo como parece à primeira vista, na medida em que o nosso sistema científico e tecnológico é um bocado distorcido, com fraca participação no sistema da investigação e desenvolvimento feita nas empresas, que, em Portugal, se limita a cerca de
vinte e tal por cento, não chega a 30 % e nos outros países chega a ser de 60 % e 70 %.
O fNIC era, de facto, uma das agências financiadoras da investigação fundamental, mas já não era desde há uns anos a agência maioritária no que respeita a esse financiamento. Era ultrapassada já por outras agências, designadamente aquelas que geriam programas apoiados por fundos comunitários.
Quanto ao Programa de Ciências Sociais e Humanas, que é um dos que se destinam a apoiar aspectos de investigação fundamental, gostava de dizer que também neste caso a contribuição do INIC já não era maioritária. Não digo que fosse minoritária, mas devia estar ftfty-fifty com outras agências, embora fosse importante. E há que mantê-la, não vamos cortá-la, evidentemente.
Relativamente ao programa, propriamente de estímulo, para as ciências sociais e humanas é um programa que existe no âmbito da JNICT e que implica um apoio de cerca de 120 000 contos ao longo de três anos. Isto sem referir outras componentes que também vão dirigir-se ao âmbito das ciências sociais e humanas, como é o caso das bolsas, apoio à realização de congressos e outras participações, às sociedades científicas, etc., que são abertas a todas as áreas e naturalmente as ciências sociais e humanas vão aí buscar também a respectiva fatia.
O problema dos cortes no LNEC, penso que é um assunto que deve ser colocado ao Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações. No entanto, poderia adiantar, talvez como ajuda para reflexão do que se passa, que organismos desse ripo, quer no País, quer no estrangeiro, são organismos a que se tem exigido crescentemente ao longo dos anos uma atitude de irem encontrar receitas próprias em projectos que resultem da grande competência científica e tecnológica que está acumulada nesses organismos. O LNEC é nitidamente um dos organismos com uma grande competência científica e técnica acumulada e que, portanto, parece legítimo solicitar-lhe que vá buscar receitas próprias resultantes desse seu know-how acumulado.
O Sr. Presidente: — Quero agradecer ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado.
Num sentido positivo, tiro a conclusão de que o diálogo com o Sr. Ministro do Planeamento é inesgotável, pelo que ia sugerir aos Srs. Deputados, nomeadamente da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, que prossigam depois este diálogo no âmbito da respectiva Comissão, uma vez que agora estamos a discutir exclusivamente, na especialidade, o Orçamento do Estado e as Grandes Opções do Plano para 1992 — exclusivamente e já não é pouco, porque isto é muito.
De qualquer modo, disponho ainda de três inscrições, que presumo serão para ficarem registados três comentários
finais. Vou dar a palavra aos Srs. Deputados, mas pedia que fossem muito rápidos, atrevia-me mesmo a sugerir que não demorassem mais do que um minuto, uma vez que, como calculam, vamos ter de prosseguir com o Sr. Ministro da Educação dentro de alguns minutos. No fim darei a palavra ao Sr. Ministro para, em termos equitativos, tecer um comentário final a estas últimas intervenções. Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Vou ser o mais rápido possível e agora o Sr. Deputado Duarte Pacheco compreenderá porque há pouco disse que queria que fosse o Sr. Ministro a responder-me.
Agradeço, desde já, a resposta que o Sr. Ministro me deu em relação à questão do FEF. Ficou registado, e isso é importante para nós, do ponto de vista político, que o Governo prevê (admite) que a evolução normal da cobrança do IVA em 1992 seria de 13,5 %, porque, de facto, não é isso que consta na distribuição do FEF.
É que este ano já temos a execução do IVA de 1991, coisa que não costuma suceder nos outros anos, e não foram 608 mas 646. Por conseguinte, é preciso meter-lhe os 13,5 % e, então, a verba, mesmo que não cumprissem aquilo que não querem cumprir, terá de ser bastante superior para as autarquias locais!
Segunda questão: desiludiu-me, Sr. Ministro.' Deixo-lhe este reparo pelo facto de, relativamente ao PIDDAC, afinal me ter dito, por não me ter respondido, que nem o Ministério do Planeamento teve a preocupação de ver o impacte do IVA sobre as empreitadas em termos da concretização material dos projectos de investimento.
Em relação já agora à questão de Aljustrel, Sr. Secretário de Estado, o exemplo é infeliz, na medida em que significa que todas as alterações que anualmente o Governo introduz na distribuição do FEF não têm qualquer objectividade.
A última questão, Sr. Ministro, é relativa ao INE. Eu próprio tive a oportunidade de referir logo de início que excluiria a questão da verba de 1 milhão de contos. Mesmo assim os cortes são substanciais na actividade que deve ser a normal e corrente do INE. Com toda a sinceridade lhe digo — e assim termino, Sr. Presidente — que as explicações do Sr. Ministro não me deixaram nada descansado em relação aquilo que vai ser o INE em 1992 e o que vai ser a produção estatística nacional.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.
O Sr. António Costa (PS): — Três notas apenas.
O Sr. Ministro sabe melhor do que eu que a questão da equidade impede-nos de dizer que este conceito significa dar mais a quem tem menos. Não é só isso! É necessário dar mais a quem necessita mais. Por essa razão, a comparação entre Lisboa e Aljustrel t bastante desajustada e se a luta de classes já não está muito na moda, a que se estabelece entre o interior e o litoral, entre as grandes e as pequenas cidades ou os concelhos rurais está de todo em todo desajustada. Portanto, o Sr. Ministro sabe, e tem-no dito — aliás, tenho-o elogiado por esse facto —, que, efectivamente, onde se vive pior em Portugal é nas periferias das grandes cidades.
O Sr. Ministro dirá: «Lisboa tem 10 % de FEF.» De acordo, mas das receitas correntes de Lisboa, a derrama constitui 25 %.
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E aqui entramos na segunda questão, que é essencial. É que, face a este Orçamento, sendo para mais o do primeiro ano desta legislatura, com uma clara incidencia plurianual, é extremamente difícil fazer esta apreciação sem que o Sr. Ministro nos responda claramente a algumas questões essenciais.
O Sr. Ministro diz: «A regionalização vai fazer-se. Mas estas coisas não se fazem de afogadilho. Temos um calendário.» Mas qual é o calendário? A isso o Sr. Ministro não respondeu e devia responder.
O Sr. Ministro diz: «É necessário alterar o regime das derramas para termos maior justiça.» Muito bem! Mas qual é a alteração do regime das derramas? Qual é o critério que lhe vai presidir? É o do número de trabalhadores? É o do número de estabelecimentos? Qual é o que vai existir?
O Sr. Ministro diz: «Damos o exemplo e queremos dar o exemplo. Quanto às áreas metropolitanas é necessária contenção.» Sr. Ministro, subscrevemos essa ideia, porque ninguém quer estruturas pesadas, ninguém quer sorvedores de dinheiro, mas queremos saber qual é o modelo efectivo do financiamento das áreas metropolitanas. Ninguém quer que as áreas metropolitanas tenham os 900 000 contos que os gabinetes de membros do Govemo do seu Ministério têm inscritos nesse orçamento, mas de 900 000 a 30000 contos vai uma diferença brutal. É preciso saber qual é, efectivamente, o modelo.
Finalmente, coloco uma questão concreta que tem a ver com este Orçamento e, mais uma vez, com os orçamentos. O Sr. Ministro agarrou-se com satisfação ao meu argumento.
Os orçamentos prevêm receitas e despesas, mas não previam claramente a duplicação da taxa de IVA das empreitadas. Então, é aceitável que, estando as autarquias locais e as cooperativas com uma taxa reduzida de 8 %, estas se mantenham com uma taxa reduzida — que, agora, é de 5 % — e as câmaras municipais passem para a taxa normal de 16 %? Faz isto sentido no esforço de habitação e de obras públicas que é necessário? Prejudica todo o esforço de negociação que a Sr.' Secretária de Estado do Planeamento e do Desenvolvimento Regional tem feito com êxito para Portugal em Bruxelas, porque a comparticipação comunitária implica uma comparticipação nacional. Muitas vezes, são as próprias câmaras que vão ter de diminuir essa comparticipação. Por exemplo, a Câmara Municipal de Coimbra já anunciou que vai ter de reanalisar a sua comparticipação em diversos projectos de âmbito comunitário porque, precisamente, não tem verba, neste momento, no seu próprio orçamento, para acompanhar esse investimento em resultado da duplicação da taxa do IVA.
O grande receio que tenho, Sr. Ministro, é que enuncie objectivos políticos consensuais, em relação aos quais estamos de acordo, mas que depois suceda, relativamente ao seu colega das Finanças, o que nos vai acontecer nas Obras Públicas: o Sr. Ministro tem a preocupação de planear, de nos projectar no futuro. Elabora os PDM, insiste na elaboração dos PROT, vai elaborando, laboriosamente, o PROT da Área Metropolitana de Lisboa e, quando estiver concluído, já o seu colega das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, que todos os dias tem uma nova manchete nos jornais — ou é um aeroporto ou uma ponte ou uma auto-estrada—, ocupou totalmente o território da Área Metropolitana de Lisboa.
Risos do PS.
«Mas também tenho medo que isso seja contagioso em relação ao Ministério das Finanças e nos fiquemos com a soa política mas com a obra do Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, sem qualquer planeamento, e com as verbas das Finanças, que não permitem nem a política nem coisa nenhuma.
Esta é que é a nossa grande preocupação!
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■f Vozes do PS: — Muito bem!
, O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacâo.
O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr. Presidente, tinha pedido a palavra para, inicialmente, interpelar a mesa.
Aproveito, pois, para dizer o seguinte: há debates e há debates! Desenvolvemos um longo trabalho durante toda a manhã, reconheça-se. Em todo o caso, optámos por um sistema de perguntas de Deputados e de resposta global por parte do Ministro e dos restantes membros da equipa ministerial aqui presentes. Isto não é suficiente, porque um debate profundo não é apenas saber da intenção do Govemo, é ir ao fundo dos problemas numa dialéctica entre as opiniões políticas justificáveis do Governo e as opiniões políticas justificáveis dos Deputados, designadamente dos da oposição.
Não é culpa do Ministro, é um problema do método de trabalho com o qual estamos todos confrontados. Neste sentido, limito-me a exprimir um reparo.
Colocaram-se questões de constitucionalidade ao problema da suspensão da fórmula do IVA. O Sr. Ministro revelou-se conformado com a ideia de que inconstitucionalidade não haverá, mas não aduziu nenhum argumento aos que lhe foram levantados.
Colocaram-se problemas de fiscalidade, mas o Sr. Ministro nada disse quanto ao alcance, designadamente, que deve vir a ter proximamente o Código das Avaliações e, portanto, o impacte desta medida nas contribuições autárquicas, logo, nas receitas próprias das autarquias.
Falou-se no problema da distribuição equitativa de receitas, inclusivamente, salientando o consenso para os novos critérios por parte da Associação Nacional de Municípios, mas não se disse que esta associação, complementarmente, reivindica novas fontes autónomas de financiamento, designadamente pela participação nos impostos directos, e que só essa solução global faria o equilíbrio que, não existindo, desequilibra completamente os dados da questão.
Falou-se em política urbana e em política para as grandes cidades e o mais que se ouviu foi uma insinuação de que a «manta» não é suficientemente grande e que, portanto, quando se está a falar da política das grandes cidades, implicitamente se estaria a querer diminuir o alcance da política para o mundo rural português. As questões não são contraditórias mas complementares e, como tal, têm de ser consistentemente vistas.
Falou-se de descentralização administrativa, insinuaram--se algumas medidas futuras, mas não se apresentou nenhuma visão estratégica da reforma administrativa pelo que ficámos sem saber completamente quais os passos seguros que essa descentralização deve vir a ter no futuro.
Falou-se de desenvolvimento regional, mas não se explicou nenhuma estratégia de desenvolvimento regional.
Concluo: as questões fundamentais ficaram no final tal como estavam no princípio — sem resposta suficiente do ponto de vista político.
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Faço ao Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território um convite: se o debate parlamentar em si é insuficiente, estou disponível para debater consigo, publicamente, se assim o entender, todos estes aspectos. Penso que, com isso, ganhará o País.
Pela minha parte, estou inteiramente disponível. É um desafio construtivo que aqui lhe faço: vamos publicamente debater todos estes aspectos fundamentais para o desenvolvimento do País!
O Sr. Presidente: — Para responder aos três comentários finais, tem a palavra o Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território.
O Sr. Ministro do Planeamento e da Administração do Território: — Sr. Presidente, muito rapidamente, começo por fazer uma rectificação a solicitação da Sr.0 Deputada Helena Torres Marques, que me lembrou muito justamente que já havia, no tempo em que desempenhou as funções de Secretária de Estado da Administração Autárquica e de director-geral da Acção Regional e Local, contribuições para a construção das juntas de freguesia. É perfeitamente certo. Quando cheguei ao Governo, apenas retomei uma boa ideia e reforcei-a financeiramente, mas, pelos vistos, ainda não suficientemente. Efectivamente, esse apoio vem de trás, tal como a Sr.9 Deputada pediu que clarificasse.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira está a esquecer-se de que os cálculos são feitos sobre previsões e não sobre receitas cobradas. Todos os anos temos de o repetir porque todos os anos ouvimos essa observação, mas, enfim, cumprimos o ritual!
Sr. Deputado António Costa, quanto ao regime das derramas, os critérios a utilizar têm de ser muito transparentes e muito simples. Poderíamos criar fórmulas muito complicadas de promover uma justiça distributiva a esse respeito, nomeadamente com o valor acrescentado, com o pessoal e com muitos outros aspectos.
Aqui, o critério que propomos é muito simples e não pode determinar custos adicionais para as empresas em matéria de contabilidade. Vai ser, seguramente, qualquer coisa relacionada com a massa trabalhadora e, portanto, com o número de trabalhadores num lado e no outro.
Não é o melhor dos critérios. É passível das maiores críticas e aceito antecipadamente aquelas que quiser fazer, porque tem toda a razão, mas não é praticável optarmos por outro. De maneira que, em vez de uma coisa mais justa mas inexequível, preferimos ter algo que talvez não seja muito justo, mas que tem a vantagem de ser exequível.
Gostava que a questão relativa à luta entre o litoral e o interior ficasse clarificada. Não há luta entre o litoral e o interior! Repito aquilo que disse: suponho que, neste momento, os problemas do litoral e, especialmente, os das zonas congestionadas do litoral, que são as áreas metropolitanas, não se resolvem directamente pela actuação sobre elas, mas por alívio da sua pressão, reforçando o papel das cidades intermédias e dos centros de dimensão média, porque há uma potencialidade de espiral não virtuosa de agravamento da situação nas partes congestionadas. Resolvendo determinados problemas, aumenta-se a sua capacidade de atracção, que é um vórtice contínuo.
Sr. Deputado Jorge Lacão, não estou nada de acordo com as suas observações. Não tem razão, porque fui dizendo aqui/o que um debate desta natureza me permitia relativamente a cada um dos pontos focados. O Sr. Depu-
tado queria que eu fizesse aqui uma grande elaboração sobre a política urbana, mas nos minutos de que disponho é impossível. Também se referiu a uma visão estratégica da reforma administrativa, mas cada um destes temas reclama, naturalmente, muito tempo.
Dei os traços gerais de cada um desses aspectos e suponho que está a ser injusto quando se refere à falta de debate porque, tal como já recordou o Sr. Presidente, estive presente em cinco ou seis comissões, sem limite de tempo, esgotando todas as questões que me foram colocadas. Aí, sim, poderia ter sido aprofundada a discussão de cada um destes temas, até porque me coloquei inteiramente ao dispor dos Srs. Deputados.
Quero realçar que estou sempre disponível para toda a sorte de trocas de impressões e para prestar esclarecimentos. Gosto de esclarecer e de ser esclarecido e acho que é nossa obrigação que a população também seja esclarecida acerca de todos estes pontos. Quer dentro do Parlamento quer fora dele estou naturalmente interessado em que a população entenda o sentido profundo daquilo que temos em mente fazer.
Sr. Presidente, fico-lhe muito grato pela paciência que teve em deixar prolongar esta reunião. Em nome dos Srs. Secretários de Estado aqui presentes e no meu próprio, fico reconhecido pela grande quantidade de perguntas que os Srs. Deputados nos colocaram, as quais deram oportunidade de esclarecer o que o Governo tenciona fazer sobre esta matéria.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, penso que a intervenção do Sr. Deputado Jorge Lacão, há pouco, se dirigia mais à matéria e ao conjunto de políticas prosseguidas no seu Ministério do que propriamente à disponibilidade de V. Ex.1 Tenho a certeza de que o Sr. Deputado Jorge Lacão coincide comigo na apreciação que faz da sua permanente disponibilidade, que, aliás, foi bem patente aquando da discussão do Orçamento nas comissões especializadas e até no facto de estar aqui, uma vez que tínhamos previsto que este módulo decorresse durante duas horas e acabou por se prolongar por três horas e meia. Realmente, não é possível, nesta fase, prolongar mais os trabalhos.
Agradeço ao Sr. Ministro bem como à sua equipa a disponibilidade que manifestaram e a vossa presença aqui. Também agradeço aos Srs. Deputados o calor que puseram nesta interessante discussão.
Suspendo os trabalhos por quinze minutos, após o que recomeçaremos com a presença do Sr. Ministro da Educação.
Srs. Deputados, está suspensa a reunião. Eram 15 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados, vamos retomar os trabalhos com o debate relativo ao Ministério da Educação
Eram 15 horas e 50 minutos.
Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo: Agradeço a vossa presença, bem como a vossa disponibilidade para colaborar connosco neste debate na especialidade das Grandes Opções do Plano para 1992, embora o Orçamento do Estado e as GOP já estejam aprovados na generalidade pelo Plenário.
Estas sessões, realizadas no âmbito da Comissão de Economia, Finanças c Plano e com a presença das co-
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missões especializadas, neste caso concreto, a Comissão de Educação, são públicas e são gravadas. Portanto, tudo aquilo que é aqui referido acaba por constar em actas, que são elaboradas posteriormente, como se se tratasse de uma sessão plenária.
O objectivo destas reuniões na especialidade é o de preparar a votação na especialidade à qual a Comissão de Economia terá de proceder brevemente, neste caso concreto, e em relação ao Orçamento deste ano, nas próximas quinta-feira e sexta-feira. De forma que cu iria sugerir ao Sr. Ministro que fizesse uma curta intervenção inicial, eventualmente dando a palavra a algum dos membros do seu Ministério que entenda que deva intervir neste momento. De seguida, os Srs. Deputados colocarão as questões que entenderem. Penso que a melhor metodologia (o Sr. Ministro decidirá quanto a isso), a mais eficaz, será a de o Sr. Ministro responder globalmente no final.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Educação.
O Sr. Ministro da Educação (Diamantino Durão): — Srs. Deputados, gostaria de mencionar muito brevemente alguns aspectos sobre o orçamento do Ministério da Educação— todos terão, certamente, o documento que foi por nós distribuído há cerca de 15 dias mas podemos referir alguns valores que constam da documentação apresentada.
Começo por referir, sob o aspecto global, que queremos fazer o desenvolvimento integral do sistema educativo. O que é que isto quer dizer? Quer dizer que queremos melhores escolas no ensino básico, no ensino secundário, no ensino superior, seja ele universitário, seja ele politécnico, e que cada vez os professores e os alunos se sintam melhor nas escolas.
Neste sentido e para 1992, nós temos um orçamento que rondará os cerca de 660 milhões de contos, mais exactamente, 659,43 milhões de contos. Se compararmos com o orçamento de 1991, que era de 548,52 milhões de contos (o orçamento corrigido), temos aqui um acréscimo de 20 %. Isto mostra a importância que o Governo dedica aos aspectos da educação, mostra o empenhamento que existe no Governo para termos uma educação cada vez melhor e cada vez mais alargada.
Nas chamadas despesas de gestão flexível, o acréscimo, comparando com 1991, 6 de 19,8 % — assim, em 1992, é de 599,43 milhões de contos. E, nos investimentos do plano, o acréscimo, comparando com 1991, é de 30,3 %, ou seja, em 1992 vamos ter 44,5 milhões de contos, enquanto o valor de 1991 foi de 34,14 milhões de contos. Resumindo, vamos ter um aumento de cerca de 20 % em relação a 1991.
Quanto a este aumento de 20 %, na informação que foi distribuída há cerca de 15 dias, está um mapa que refere os diversos valores, a distribuição pelas diversas rubricas e pelos diversos tipos de ensino que planeamos fazer para 1992.
Assim, em 1992, podemos verificar que temos os seguintes dados: para o ensino não superior, cerca de 467 milhões de contos, comparando com os 393 milhões de contos de 1991; para o ensino superior, cerca de 97 milhões de contos, que podemos comparar com os cerca de 78 milhões de contos que tínhamos em 1991; para o ensino particular e cooperativo, vamos ter, em 1992, cerca de 18 milhões de contos, que podemos comparar com os 11,8 milhões de contos de 1991; para a divulgação da cultura e o ensino de português no estrangeiro, temos 5,6 milhões de contos — aqui, permitia-me referenciar a im-
portância que o Instituto de Camões, recentemente aprovado em Conselho de Ministros, irá ter na divulgação da cultura e da língua portuguesa no estrangeiro.
Verifica-se ainda que para a educação especial estão previstos 10,2 milhões de contos de gasto para 1992; para escolas profissionais, 2,48 milhões de contos; para educação de adultos, 3,8 milhões de contos.
Em relação à acção social, permito-me referir aqui o que já tem vindo a ser dito noutros locais: o nosso grande interesse é o de fazer cada vez mais justiça social. Isto quer dizer facilitar aos jovens, independentemente da sua capacidade financeira, cada vez mais, o acesso ao ensino, seja ele superior ou outro. Temos, pois, para esta rubrica 22,2 milhões de contos, o que, comparando com os 16,7 milhões de contos de 1991, corresponde a um aumento de cerca de 32 %.
Estes valores mostram bem o desejo que o Govemo tem, em particular o Ministério da Educação, de promover justiça social, nomeadamente no âmbito deste Ministério.
No ensino não superior temos um aumento de 29 % e em acção social para funcionários do próprio Ministério cerca de 1 milhão de contos.
Outras acções no âmbito do apoio e desenvolvimento pedagógico: 3,7 milhões de contos e 15 milhões de contos na administração; para o desporto estão previstos 12 milhões de contos. E se somarmos estes valores todos que aqui mencionei, dá um total de 659,42 milhões de contos, que é o orçamento do Ministério da Educação para 1992.
Talvez, mais do que estar a referir números e valores, seja melhor uma troca de impressões, pelo que tanto eu como o Sr. Secretário de Estado nos colocamos à disposição dos Srs. Deputados para responder às perguntas que desejem formular. Termino por aqui, realçando o desejo de fazer cada vez melhor na educação, proporcionando aos Portugueses, e, em especial, aos jovens, um sistema educativo cada vez melhor para Portugal.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, os dados que mencionou constam de um documento que V. Ex.» disse ter sido fornecido à Comissão de Educação?
O Sr. Ministro da Educação: — Foi há cerca de 15 dias, foi da última vez que estive aqui.
O Sr. Presidente: — É óbvio que se trata de elementos que foram fornecidos à Comissão de Educação, mas há Deputados da Comissão de Economia que revelam interesse em ter também esses mapas, pelo que já solicitei aos serviços de apoio a sua distribuição se possível ainda durante esta reunião.
Não se trata de documentos que a lei do enquadramento obrigasse a que fossem entregues à Comissão de Economia, pelo que não se trata de nenhuma falta por parte do Governo, mas, dado que foram entregues à Comissão de Educação e agora há outros Deputados que revelam interesse em conhecê-los, os elementos serão facultados logo que possível.
Antes de passar às inscrições dos Srs. Deputados que pretendem intervir nesta matéria, dou a palavra à Sr.' Presidente da Comissão de Educação, que também o solicitou. Tem a palavra a Sr.* Deputada Julieta Sampaio.
A Sr.* Julieta Sampaio (PS): — Sr. Ministro, ouvi religiosamente atenta a sua intervenção e pensei que não estaríamos aqui a falar da prioridade das prioridades do
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governo de Cavaco Silva e do governo do PSD desde há 12 anos! O enumerar de números que nem o Ministro das Finanças se atreveu a fazer no Plenário deixou-me reà&s mente muito gelada, apesar de o ambiente aqui estar úfrfc pouco quente... v.
Risos. "
Na verdade, a política educativa devia merecer-nos muito mais atenção por parte do Governo, e não é vindo aqui dizer que tem dinheiro, que subiu as verbas de x para y, que tinha no ano transacto x e que agora tem x + y, que vai melhorar a qualidade da educação em Portugal. '
Muitos dè nós não temos consciência de que, ao estarmos aqui a discutir um orçamento, ele tem de estar sedimentado em políticas e essas políticas têm de ter opções, porque tudo isto tem a ver com o quotidiano da vida dos Portugueses, não só da sociedade em geral, mas em particular dos pais, das crianças e até do próprio futuro do País, porque se trata da educação, ou seja, do investimento na criança e no Portugal do futuro. E, quem o ouvisse aqui, poderia pensar que estávamos a tratar de uma mera conta contabilística!
Realmente, fiquei perplexa perante a intervenção inicial do Sr. Ministro, dado que, quando na discussão na generalidade nos entregou estes documentos, foi bastante parco na sua intervenção, deixando-nos sem muitos esclarecimentos, com muitas questões colocadas pela oposição que ficaram sem respostas, pelo que esperaríamos que o Sr. Ministro hoje, aqui, fizesse um discurso em que a oposição ficasse, de uma vez por todas, a saber quais são as suas opções políticas nos vários sectores de ensino.
Certamente que os meus colegas de bancada se irão dedicar a outras temáticas, pelo que vou dedicar-me especialmente a uma temática muito importante, que é o ensino especial. O Sr. Ministro disse que a verba para o ensino especial subia não sei quanto, até deu a impressão de que era um acréscimo de tal forma que este país iria ficar todo iluminado e que não haveria mais problemas no ensino especial em Portugal.
Mas quero dizer-lhe — e caindo no seu erro — que, afinal, o acréscimo de 1991 para 1992 não é nenhum, porque, em 1991, o ensino especial cresce 40,7% e em 1992 vai crescer 22 %, o que quer dizer que há uma diminuição no crescimento do ensino especial.
Mas não quero referir mais essa questão porque, na verdade, a afirmação de que há muito dinheiro não é, para mim, uma questão única, embora seja importante; o principal é que esse dinheiro seja bem empregue. Então, vamos ver como é que ele é empregue.
Já há dias perguntei ao Sr. Ministro qual era a opção política deste governo e deste Ministro da Educação: se a opção política era investir na qualidade do ensino público ou se era na qualidade do ensino privado. E o Sr. Ministro deixou-nos sem resposta, pelo que espero que hoje não me deixe sem resposta em relação a esta questão: qual é a sua opção política? Se a sua opção política é o público, então pergunto-lhe se acha que o ensino público no ensino especial vai suprir todas as carências deste país, que, como V. Ex* sabe, são muitas. Se a sua opção é pelo ensino privado, então, Sr. Ministro, vamos apoiar devidamente o ensino privado e não vamos brincar com coisas sérias porque há crianças que têm de recorrer ao ensino privado porque o ensino público é insuficiente para que elas possam adaptar-se e preparar-se para se integrarem na vida do futuro e na sociedade. Aliás, sabe perfeitamente que,
hoje, o ensino privado está sem meios para poder atender devidamente essas crianças, apesar de o Sr. Ministro ter desafiado as escolas particulares, como pode verificar-se pelo recorte do jornal Público de sexta-feira ou sábado passados, que tenho comigo, em cujo artigo o Sr. Ministro desafia 20 colégios de ensino especial da área de Lisboa a mostrarem as respectivas contas.
Assim, Sr. Ministro, desafio-o a que receba esses professores e a que dialogue com eles, pois, segundo sei, estão prontos a apresentarem-lhe as contas. O Sr. Ministro tem é de recebê-los e dialogar com eles e não desafiá-los através da comunicação social, e, depois, não os receber para que possam expor-lhe as carências que realmente têm. E que são 3500 crianças, Sr. Ministro, que estão em risco de ficar em casa se os colégios fecharem.
Assim, pergunto ao Sr. Ministro se entende que o ensino público tem condições para poder recebê-las. Penso que não, mas se tem condições, então, diga-o concretamente e calar-me-ei, ficando muito satisfeita.
É que os pais destas crianças têm o direito e o dever de exigir ao Estado que os ajude a prepararem os seus filhos para a vida futura. Na Constituição está consignada a igualdade de oportunidades para todos e estas crianças, por serem diferentes, e os seus pais, por terem crianças diferentes, são os que devem ser mais apoiados pelo Estado.
Tenho uma outra pergunta para colocar ao Sr. Ministro. Por que é que o PRODEP, que é o Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Educação não tem articulação com o ensino especial? Por que é que essas escolas particulares de ensino especial não podem também concorrer aos programas do PRODEP, articulando-se com os respectivos fundos comunitários?
O Sr. Ministro sabe perfeitamente que o custo diário de uma criança que frequenta o ensino especial ronda 60 000$ por mês. Ora, por não haver articulação entre o Ministério da Educação e o do Emprego e da Segurança Social, o Sr. Ministro sabe que, por portaria, foi decretada a verba de 43 000$ como subsídio. Então, como é que as escolas de ensino especial vão suprir o défice entre o subsídio que lhes é atribuído e o custo real? Serão os pais que têm de supri-lo?
Aliás, noutro dia, falei com um pai que me disse que tinha procurado pôr o seu filho numa escola pública, só que não conseguiu encontrar nenhuma que lhe desse garantias de adequabilidade. Não há ensino público de qualidade e o Sr. Ministro sabe-o. De facto, visitei algumas escolas de ensino público destinadas ao ensino especial e verifiquei que não dispõem de terapeutas, nem de especialistas, nem de nada.
Repito que o Sr. Ministro sabe bem que o ensino público especial não tem qualidade, pelo que, neste momento, é o ensino particular que está a suprir essa grave lacuna do ensino público.
Sr. Ministro, é obrigação do Estado e do Ministério da Educação apoiarem esse ensino privado que, hoje em dia, está a colmatar uma grave deficiência numa temática muito importante do sistema educativo português.
Sr. Ministro, sabe que, hoje mesmo, já há escolas de ensino especial que têm salários em atraso, para além de estarem a pagar salários que não estão actualizados? Sr. Ministro, tem consciência destas graves lacunas que existem no domínio do ensino especial?
Acho que todos temos direito a viver numa sociedade livre e também temos direito a respeitarmo-nos uns aos outros. Mas estas crianças diferentes têm mais direitos do que qualquer um.
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Por isso, peço ao Sr. Ministro que olhe para o ensino especial com atenção e que não «se perca», olhando para o lucro que diz que as escolas particulares querem ter. É que, mesmo que queiram ter algum lucro, é legítimo, já que os donos dos colégios não vivem do ar, tendo que usar os seus lucros para poderem sobreviver.
Portanto, o Sr. Ministro tem de ter consciência de que se uma criança custa em média 60 000$ por mês e se, por portaria, o Estado concede um subsídio mensal de 43 000$, então o lucro é nenhum.
Assim sendo, o Partido Socialista vai apresentar na mesa uma proposta de alteração ao Orçamento para inscrever uma verba destinada ao ensino especial, a qual será retirada das dotações do próprio gabinete do Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se dois Srs. Deputados para protestos e o Sr. Deputado Carlos Lélis para uma interpelação à mesa, o que tem precedência sobre os outros dois.
Como o Sr. Deputado Carlos Lélis compreenderá, a mesa não podia interromper o uso da palavra da Sr.* Deputada Julieta Sampaio. Assim, visto que já terminou, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis, para uma interpelação à mesa.
O Sr. Carlos Lélis (PSD): — Sr. Presidente, inscrevi--me enquanto a Sr.» Deputada ainda estava a usar da palavra porque, na verdade, já não sei quando devo fazê-lo.
Não costumo ser reivindicativo nem açambarco intervenções, mas, pelas minhas funções de coordenador, tenho de saber que regras imponho a mim próprio e quais aquelas em que devo enquadrar os meus colegas.
Esta minha interpelação envolve o Sr. Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano, Sr. Deputado Manuel dos Santos, que habitualmente preside a estas reuniões, e a Sr.1 Presidente em exercício da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, Sr.1 Deputada Julieta Sampaio.
Creio que estou a ser justo no reparo que faço, pois assim ficarei a saber qual é o procedimento, para que, de futuro, também saiba que a minha iniciativa termina onde começa a dos outros.
Sr. Presidente, não só nesta reunião como em outras em que tenho participado, costumo inscrever-me quando o presidente da mesa declara aberta a sessão. Assim o fiz hoje. No entanto, reparo que houve inscrições que já tinham sido feitas anteriormente, pelo que, Sr. Presidente, gostaria de saber se devo ou não inscrever-me no corredor antes do início da reunião.
Devo esclarecer que isto não é ironia, pois não costumo utilizá-la nas minhas intervenções, antes é uma pergunta concreta, talvez não de todo ao meu jeito, mas que constitui a minha única hipótese de prever essa inscrição antecipada. Não é que tenha razões para pretender falar em primeiro lugar, pois até sou dos que defendem que a oposição deve ter um lugar de prioridade nas intervenções, dado ser menos dialogante com o Governo.
Há ainda uma segunda questão que também envolve a Sr.* Deputada Julieta Sampaio, cujo perfil muito reconheço, mas que, hoje, não reconheci.
Na realidade, estando no exercício das suas funções e embora considere que, como Deputada por um partido da oposição, está no seu direito, esperava que não tivesse proferido a sua intervenção da mesa da presidência, mas sim da bancada do PS, junto dos seus camaradas, tal como nós próprios estamos na bancada do PSD junto aos
nossos companheiros. A diferença de posição e o tom da sua intervenção não correspondem ao que conheço do seu exercício de funções de presidente de uma comissão, em cuja actuação têm presidido regras não direi suprapartidárias mas, tanto quanto possível, isentas.
Aqui deixo o meu reparo, Sr. Presidente. Passarei a saber se devo ou não inscrever-me antecipadamente, aguardarei pacientemente a minha vez de intervir, sem qualquer necessidade de prioridade, mas com o conhecimento^ das regras.
O Sr! Presidente: — Sr. Deputado Carlos Lélis, muito obrigado pela sua intervenção, que foi dupla, já que começou por ser uma interpelação à mesa, tendo passado para uni protesto. E, como viu, também não determinei a separação das duas figuras regimentais...
O Sr: Carlos Lélis 0?SD): — É sobre o funcionamento dos trabalhos!
O Sr. Presidente: — Exactamente, fez muito bem, Sr. Deputado. Só tenho de agradecer-lhe o facto de ter juntado as duas coisas, pois, assim, evitamos perda de tempo.
Quanto à parte que me diz respeito, obviamente a da interpelação a mesa, devo dizer-lhe que comecei a tomar nota das inscrições pouco tempo antes de dar início aos trabalhos — não posso dar conta certa da hora, mas presumo que terá sido um ou dois minutos antes.
Assim, posso informar o Sr. Deputado de que a sua inscrição está em terceiro lugar, após a da Sr.' Deputada Julieta Sampaio e a do Sr. Deputado António Filipe. Repito que foi assim que registei as inscrições, embora admita que o Sr. Deputado possa ter-se inscrito em segundo lugar, como também poderia tê-lo feito em quarto.
De qualquer maneira, com toda a franqueza, digo-lhe que não me parece que isto seja relevante.
A verdade é que, antes de lhe dar a palavra, tenho de dar prioridade a dois pedidos de intervenção para protesto — um do Sr. Deputado Guido Rodrigues e o outro do Sr. Deputado Lemos Damião —, pelo que peço a sua atenção, pois dar-lhe-ei a palavra logo em seguida.
Entretanto, como o Sr. Deputado Carlos Lélis já formulou um protesto em relação à Sr.1 Deputada Julieta Sampaio, pergunto à Sr.' Deputada se quer responder de imediato, embora preferisse que respondesse só depois de ouvir os outros dois protestos, para economizarmos tempo.
Como a Sr.' Deputada não se opõe, dou a palavra ao Sr. Deputado Guido Rodrigues, para um protesto.
O Sr. Guido Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente, evidentemente, faço o meu protesto na qualidade de Deputado e não na de vice-presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Sr.1 Deputada Julieta Sampaio, na verdade, estamos numa reunião conjunta da Comissão de Economia, Finanças e Plano com a de Educação, Ciência e Cultura para discutir, na especialidade, o Orçamento do Estado para 1992. Ora, a Sr.1 Deputada iniciou a sua intervenção tecendo grandes considerações sobre matérias que já tinham sido mais do que analisadas aquando da reunião dos representantes do Ministério da Educação com a comissão especializada.
É que, desde sexta-feira passada, a Comissão de Economia, Finanças e Plano tem estado reunida, fazendo uma
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«maratona», a fim de terminarmos a discussão e votação do Orçamento na especialidade antes da próxima sexta--feira.
Portanto, protesto pelo facto de a Sr." Deputada vir, de novo, referir, em termos genéricos, matérias que já estão mais do que analisadas e fazendo a sua intervenção em termos que demonstram que, pura e simplesmente, quer é fazer show off para ficar gravado, mais do que propriamente para ser esclarecida.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Lemos Damião, para um protesto.
O Sr. Lemos Damião (PSD): — Sr. Presidente, o meu protesto vai no mesmo sentido do dos meus colegas, embora queira acentuá-lo mais num aspecto.
Possivelmente, a Sr.» Deputada Julieta Sampaio só agora despertou para a realidade do ensino especial em Portugal. E que tenho acompanhado a sua carreira política ao longo destes anos — a Sr.a Deputada já exerce este cargo há bastante tempo — e o certo é que me parece que nunca a Sr.5 Deputada Julieta Sampaio linha descoberto que havia deficientes em Portugal e que as entidades que lhes ministram ensino e os acolhem estão em dificuldades.
Por isso mesmo, creio que o Partido Social-Democrata de maneira alguma pode aceitar que se faça especulação ou aproveitamento político desta matéria, que foi o que a Sr.9 Deputada Julieta Sampaio fez até agora.
Porventura, algum dia, V. Ex.1 teve a preocupação de saber se os colégios tinham ou não terapeutas e psicólogos, quantos eram os alunos, onde é que havia incidências na qualidade do ensino, se, de facto, os respectivos professores eram colocados a tempo e horas e se eram ou não qualificados, se eram ou não recrutados no Instituto de António Aurélio da Costa Ferreira? Certo é que V. Ex.» se preocupou agora porque, nas galerias, estão presentes representantes destes colégios, pelo que pensa colher alguns votos desta forma. Mas V. Ex.» vem «procurar lã e vai ser tosquiada»! É que as pessoas presentes nas galerias apenas representam colégios com um total de 3123 alunos, ou seja, 10 % dos alunos com necessidades educativas especiais, apoiados em diversas modalidades pelo Ministério da Educação.
Também quero dizer-lhe que, até agora, os alunos internos representavam para o Estado um encargo financeiro de 874 900$, os semi-internos um encargo de 506 400S e os externos um encargo de 416 200$.
Verfico que V. Ex.9 ri e só é pena que não tenha um espelho pela frente para ver a triste figura que fez, porque, de facto, ...
O Sr. José Apolinário (PS): — Sr. Presidente, isto não é um protesto! É uma intervenção!
O Orador: — É um protesto, Sr. Deputado! É um protesto porque estou profundamente...
Protestos de alguns Deputados do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o Sr. Deputado Lemos Damião está no uso da palavra. Dei-lhe a palavra para formular um protesto relativamente à intervenção da Sr.» Deputada Julieta Sampaio e espero...
A Sr.e Marília Raimundo (PSD): — Agora já interrompe!
O Sr. Presidente: —Eu não sou juiz das intenções e das subjetividades do Sr, Deputado Lemos Damião, que, até agora, tem dito estar a formular um protesto relativamente à intervenção proferida pela Sr.» Deputada Julieta Sampaio, que depois terá o direito de dar explicações.
A Sr.8 Edite Estrela (PS): — Mas não está a fazer um protesto!
O Orador: — Posso continuar, se o Sr. Presidente me der licença.
O Sr. Presidente: — Peço a todos os Srs. Deputados, por um lado, que procurem fazer que a reunião decorra normalmente e ao Sr. Deputado Lemos Damião, por outro, que acabe o seu protesto o mais rapidamente possível.
O Orador: — Muito obrigado pela atenção, Sr. Presidente.
Para tranquilizar os Srs. Deputados do Partido Socialista, devo dizer que o que quero é que eles não sejam socialistas só no nome, mas que sejam solidários em lodos os momentos, solidários com as crianças que não só estão nestes colégios, mas também com os outros 90 % que o Ministério da Educação tem apoiado. E aqui felicito esta e as outras equipas ministeriais, porque temos deficientes em todas as escolas e nunca houve tantos professores para as apoiar como nos últimos anos.
A proposta deste ano — tomem nota — contempla quantitativos, relativamente a anos anteriores, de 1 031 900$ para os alunos internos, 601 580$ para os semi-intemos e 495 540$ para os externos. Ou seja, passa de 95 000$/ aluno para 120 000$/aluno, o que reflecte um aumento de 26,3 % em relação a 1991.
Aliás, também quero informar os Srs. Deputados e a Sr.» Deputada Julieta Sampaio de que as despesas com os colégios aumentaram nos últimos três anos em 18 %, depois 15 % e este ano em 26,3 %.
O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): — Sr. Presidente, peço a palavra para fazer um ponto de ordem à mesa.
O Orador: —Portanto, superiores à taxa de inflação.
O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): — Gostaria de fazer um ponto de ordem à mesa, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, não se importa que eu o interrompa? Quero apenas fazer um ponto de ordem à mesa, uma vez que não é, manifestamente, em termos regimentais...
O Orador: — Sr. Presidente, desculpe, mas não dou licença ao Sr. Deputado, por todo o respeito que lhe tenho, que interrompa a minha intervenção, porque estou a fazer um protesto.
A Sr.» Edite Estrela (PS): — Intervenção, disse bem!
O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS):—É uma intervenção, portanto, Sr. Presidente!
O Orador: — Não é uma intervenção, mas um protesto. Ao protestar, Sr. Presidente, tenho de esclarecer a Sr.» Deputada Julieta Sampaio, porque, além das suas declarações me terem chocado como Deputado por estar
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a fazer um aproveitamento dos deficientes, chocou-me por estar na mesa na qualidade de presidente da Comissão de Educação, Ciência e Cultura e eu não lhe reconheço legitimidade nem para me representar nem para fazer essa intervenção.
O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS): — Sr. Presidente, penso que o melhor seria fazer-se um intervalo de cinco minutos, para se recuperar a dignidade dos trabalhos...
O Orador: — Sr. Presidente,...
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Lemos Damião, peço-lhe o favor de aguardar um pouco.
O Orador: — Gostaria de terminar, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe o favor de aguardar um pouco mais, porque depois voltar-lhe-ei a dar a palavra.
Srs. Deputados, até agora tenho seguido um critério que vou continuar a seguir até ao fim, com todas as consequências.
No entanto, peço ao Sr. Deputado Lemos Damião, que realmente está a fazer uma intervenção — e até o tinha inscrito para uma intervenção de seguida, mas, perante isto, já não sei se devo ou não retirar a sua inscrição, não faço ideia,...
O Orador: — Pode continuar a manter-me inscrito, Sr. Presidente.
O St. Presidente: —... mas o Sr. Deputado dir-me-á no fim —, que termine a sua intervenção-protesto dirigida à Sr.! Deputada Julieta Sampaio.
O Orador: — Sr. Presidente, para acabar, quero dizer à Sr.1 Deputada Julieta Sampaio que, para além de ter ficado chocado, e já demonstrei porquê, estamos a discutir o Orçamento do Estado para 1992, razão por que, em minha opinião, o Sr. Ministro da Educação fez muito bem em mencionar os números.
Já agora, e porque o Sr. Ministro ainda não referiu, permito-me dizer-lhe que a educação custa ao País 1,8 milhões de contos/dia, o que demonstra ser de facto a prioridade das prioridades e a primeira prioridade do Partido Social-Democrata.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, há três pedidos de palavra que, presumo, são para interpelar a mesa, mas não nos podemos esquecer de que a Sr.* Deputada Julieta Sampaio tem o direito regimental de dar explicações aos protestos formulados.
Sendo assim, pergunto aos Srs. Deputados que solicitaram o uso da palavra se vêem, com toda a franqueza, interesse em fazê-lo neste momento ou se é melhor dar de imediato a palavra à Sr.1 Deputada Julieta Sampaio?
O Sr. José Apolinário (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Faça favor.
O Sr. José Apolinário (PS): — Sr. Presidente, pedi a palavra no sentido de colaborar com a mesa na orientação dos trabalhos.
Independentemente da classificação da intervenção precedente, penso que o Sr. Presidente deu bem a palavra ao Sr. Deputado Carlos Lélis, para uma interpelação, que é regimental, mas já não vejo a figura regimental que dá cabimento à intervenção do Sr. Deputado Lemos Damião, uma vez que a figura regimental de protesto já nem sequer consta do Regimento, pelo que a única a fazer seria uma interpelação.
Portanto, a minha interpelação é no sentido de que daqui para o futuro, atendendo a que temos um calendário bastante apertado, se possa prescindir deste momento um pouco triste, embora cada um dos partidos possa fazer as leituras que entender sobre as diferentes figuras. Não se pense é que a intervenção formulada pelo Sr. Deputado Lemos Damião, como ele próprio a classificou, lenha qualquer cabimento regimental.
Perante isto, gostaria de saber em que artigo é que se insere a intervenção do Sr. Deputado Lemos Damião, porque protesto não é certamente, uma vez que essa figura regimental já não existe.
O Sr. Presidente: — Obrigado, Sr. Deputado José Apolinário, pelo contributo dado à orientação dos trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho, para interpelar a mesa no sentido de a ajudar.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Sr. Presidente, não tenho presunção para tanto, mas gostaria de fazer dois breves comentários, embora estivesse já disposto a fazê--los após as explicações da Sr.1 Deputada Julieta Sampaio, uma vez que o Sr. Deputado José Apolinário sentiu necessidade de fazer o mesmo neste momento, pelo que espero que me seja permitido o mesmo impulso.
O Sr. Presidente tem conduzido os trabalhos, se me permite, sem qualquer intenção de ferir, com bastante generosidade. V. Ex.* tem de pôr cobro a essa generosidade e seguir o Regimento da Assembleia da República por analogia.
Neste sentido, proponho que V. Ex.8, se no seu alto critério considerar isso razoável, limite temporalmente as figuras regimentais, uma vez que não podemos ter um qualquer Sr. Deputado a intervir durante quinze minutos a propósito de uma interpelação ou de uma defesa da consideração, que são figuras regimentalmente limitadas no tempo.
O Sr. José Apolinário (PS): — Muito bem!
O Orador: — Se assim não for, acabaremos por prescindir do essencial deste debate, que é o debate na especialidade — e sublinho — do Orçamento do Estado.
Neste momento estamos reunidos com o Ministério da Educação, com a presença do Sr. Ministro, mas por volta das 17 horas e 30 minutos, presumo, a reunião já será com outro ministério e a prática dos dias anteriores revela rigoroso cumprimento destes horários.
No entanto, com esta liberalidade na utilização das figuras regimentais arriscamo-nos, seguramente, a perder tempo que seria necessário para a discussão do essencial, que é, sem dúvida, o que está na ordem do dia.
O Sr. José Apolinário (PS): — Excelente autocrítica!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Carlos Coelho, agradeço-lhe sinceramente o bom contributo dado, embora o final da sua intervenção seja incorrecto, como terei oportunidade de demonstrar.
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Respondendo ao Sr. Deputado José Apolinário, devo dizer que utilizei o artigo 85.° do Regimento, que se refere ao exercício do direito de defesa, mais conhecido por protesto, mas, realmente, a figura regimental de protesto deixou de constar no Regimento.
Srs. Deputados, nunca surgiu uma situação destas, é a primeira vez, razão por que não houve necessidade, por parte da mesa e, nomeadamente, do presidente, de aplicar, como, aliás, propôs, e muito bem, o Sr. Deputado Carlos Coelho, o procedimento regimental adequado. Até porque as intervenções, quer do Sr. Deputado Guido Rodrigues quer do Sr. Deputado Carlos Lélis, estou seguro disso sem ter feito qualquer contabilização de tempo, ajustaram-se perfeitamente ao tempo limitado regimen tal-mente. Realmente só o Sr. Deputado Lemos Damião não o fez, mas essa situação, como disse, está a surgir pela primeira vez, e espero que seja a última, e que não haja mais protestos e contraprotestos, porque se os houver aplicaremos, obviamente, o Regimento.
Quanto à crítica relativa aos desajustamento dos horários, devo dizer que o Sr. Deputado Carlos Coelho esteve desatento porque não foram dias, mas, sim, dia, uma vez que ainda só trabalhámos um dia, e os trabalhos terminaram precisamente à hora prevista. Foi mera coincidência, como calcula, mas no primeiro dia...
O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Mas houve membros do Govemo à espera, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: —... terminámos as audições exactamente à hora prevista. Houve alguns ajustes pelo meio, que foram sempre negociados entre mim e o Governo, e a hora a que se terminou foi exactamente a que tínhamos regimentalmente fixado.
Portanto, para dar explicações, se assim o entender, tem a palavra a Sr.1 Deputada Julieta Sampaio. Peço-lhe, no entanto, que não utilize mais de cinco minutos, embora regimentalmente tivesse direito a nove minutos. Não é assim, Sr. Deputado Carlos Coelho?
O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Sr. Presidente, penso que regimentalmente não é assim, mas, em minha opinião, ninguém levará a mal que a Sr.a Deputada Julieta Sampaio ultrapasse um pouco esse tempo, porque a atribuição de tempo para as explicações tem de ser dada caso a caso e não há lugar à acumulação de tempos.
O Sr. Presidente: — Muito bem, mas a Sr.» Deputada não vai, com certeza, utilizar tanto tempo, pelo que, deste modo, iremos recuperar algum do tempo perdido entretanto.
Tem a palavra a Sr.1 Deputada Julieta Sampaio.
A Sr.* Julieta Sampaio (PS): — Muito obrigada, Sr. Presidente.
Efectivamente, não vou utilizar muito tempo, porque, muito serenamente, vou dizer ao Sr. Deputado Carlos Lélis que quando estou a dirigir os trabalhos da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura — e agradeço que tenha realmente reconhecido aqui a minha isenção, só que neste momento não estou a dirigir os trabalhos da Comissão,...
Vozes do PSD: — Então, deve passar para a bancada!
A Oradora: —... quem o está a fazer é o Sr. Deputado Manuel dos Santos...
Vozes do PSD: — Então, deve passar para a bancada!
A Oradora: — Eu já passo para a aí!
A Sr.' Marília Raimundo (PSD): — Agora já obteve o que queria!
A Oradora: — Se os senhores querem coarctar-me o direito de me exprimir a partir da mesa, passo já para a bancada, não há problema algum. Vou já passar.
Neste momento, a Sr." Deputada Julieta Sampaio abandona a mesa, dirigindo-se para a bancada.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, sobre este incidente quero dar um pequeno esclarecimento. Os Srs. Presidentes das Comissões, sejam os próprios ou os em exercício, que são tão presidentes como os primeiros, têm sido, todos, convidados por mim para fazerem parte da mesa, uns não têm aceitado, outros nem sequer cá têm vindo, como, por exemplo, o presidente da Comissão de Administração do Território, Poder Local e Ambiente, e talvez devesse estar.
Assim, tenho convidado todos os presidentes de comissões presentes para fazerem parte da mesa. Já esteve na mesa o Sr. Deputado Miranda Calha, como presidente da Comissão de Defesa, e, agora, a Sr* Deputada Julieta Sampaio por o Sr. Deputado Pedro Roseta não poder estar presente, pois havia-me comunicado pessoalmente que a presidência da Comissão de Educação, Ciência e Cultura seria representada pela Sr.1 Deputada, aliás, o Sr. Deputado Pedro Roseta fez parte da mesa há uns tempos atrás.
A Sr.* Edite Estrela (PS): — Na sexta-feira!
O Sr. Presidente: — Portanto, todos os Srs. Presidentes têm o direito de estar deste lado, e foi nessas condições que a Sr.' Deputada Julieta Sampaio aqui esteve.
A Sr.' Marília Raimundo (PSD): — O problema não é esse, mas outro!
O Sr. Presidente: — Faça favor de continuar, Sr.1 Deputada Julieta Sampaio.
A Oradora: — Sr. Presidente, se me der licença vou continuar, agora da bancada, porque, na verdade, estou nesta Casa para exprimir livremente o que penso e sempre que assim o entenda.
Como disse o Sr. Deputado Carlos Lélis — e é verdade —, quando estou a presidir à Comissão de Educação, Ciência e Cultura procuro ser sempre o mais isenta possível. Claro que erros lodos nós cometemos, mas penso que não tenho cometido assim muitos.
Porém, não era eu que estava a dirigir os trabalhos desta Comissão, pois se assim fosse teria, naturalmente, deixado de o fazer, porque não podia deixar de intervir neste debate.
Sr. Deputado Guido Rodrigues, V. Ex.1 não está autorizado a pronunciar-se sobre o que se passou no debate do Orçamento na generalidade na Comissão de Educação, Ciência e Cultura, quando o Sr. Ministro lá esteve, porque não esteve presente.
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0 Sr. Guido Rodrigues (PSD): — Mas sei o que se passou!
A Oradora: —O Sr. Deputado não estava lá, por isso
não sabe.
Cada um de nós é que tem de ajuizar se foi ou não cabalmente respondido às perguntas colocadas e, na altura, entendi que as perguntas que fiz ao Sr. Ministro tinham ficado sem resposta, pelo que voltei a fazê-las hoje aqui.
Em relação ao protesto do Sr. Deputado Lemos Damião, não vamos perder mais tempo sobre se fez ou não uma intervenção.
No entanto, quero dizer-lhe que não é verdade que seja a primeira vez que falo nesta Casa sobre o ensino especial.
No anterior mandato, quando o PCP fez uma interpelação...
A Sr.» Marília Raimundo (PSD): — Isso é uma intervenção!
A Oradora: —... sobre a problemática dos deficientes, subi à tribuna, pelos socialistas, e falei sobre a problemática do ensino especial em Portugal. Irei até mandar fazer uma cópia dessa intervenção, pois terei muito gosto em lha oferecer.
O Sr. Presidente: — Prosseguindo o curso dos nossos trabalhos, a mesa informa que se encontram inscritos para formularem intervenções, uma vez que, de algum modo, se pode ter perdido a respectiva ordem, os Srs. Deputados António Filipe, Carlos Lélis, Ana Maria Bettencourt, Fernando de Sousa, Edite Estrela, Guilherme Oliveira Martins, Marques da Silva, António José Seguro, José Apolinário, António Martinho, Helena Torres Marques, Fernando Pereira Marques, Pereira Crespo, José Cesário, Antunes da Silva e Carlos Coelho.
O Sr. Antunes da Silva (PSD): — Sr. Presidente, eu pedi a palavra para interpelar a mesa.
O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Deputado. Fiz confusão.
Sr. Deputado Lemos Damião, ainda pretende usar da palavra para uma intervenção?
O Sr. Lemos Damião (PSD): — Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Fica inscrito, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, não quis intervir em todo este incidente por respeito pelos colegas que presidem aos trabalhos, mas creio que estava inscrito em primeiro lugar, segundo informação que me foi prestada pelo Sr. Presidente quando me inscrevi. Não ficaria bem comigo se não considerasse, com toda a simpatia que tenho pela Sr.1 Deputada Julieta Sampaio, que ela utilizou de forma algo abusiva a sua qualidade de membro da mesa, no sentido de trocar a ordem das inscrições.
Digo-o com toda a simpatia, mas creio que, do ponto de vista ético, não é o mais correcto. Devo dizer-lhe. sinceramente, que não teria procedido dessa forma.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Ministro, Srs. Deputados: Creio que agora poderemos entrar na discussão mais em pormenor. Devo dizer que voltarei ainda à questão do ensino especial, designadamente aos colégios particulares de ensino especial. É uma questão extremamente relevante, mas gostaria de fazer ainda outras considerações, na especialidade, sobre este orçamento da educação e, particularmente, sobre alguns dos números que o Sr. Ministro aqui referiu.
Se repararmos no orçamento de funcionamento do Ministério da Educação que nos é apresentado, verificamos que há uma diferença de cerca de 99 milhões de contos entre o orçamento corrigido para 1991 e o orçamento para 1992, o que corresponde, nominalmente, segundo nos é dito, a um aumento de 19,8 %. Temos, porém, a informação de que desta verba, cerca de 46 milhões de contos são exclusivamente destinados ao descongelamento dos escalões da carreira docente.
Por isso, deduzido este montante — na medida em que, como se sabe, o Ministério está em dívida para com os professores, nos casos de alguns professores do ensino superior está em dívida desde Julho de 1990—, que se destina a cumprir encargos já assumidos, verificamos que estamos perante um crescimento nominal da ordem dos 10,5 % do orçamento para a educação, o que terá de suportar não apenas os aumentos de vencimentos, como todo o aumento de custo de vida que se verificará durante o ano de 1992.
É com este aumento que o Ministério terá de fazer face a vultosos encargos com o funcionamento do sistema educativo, que, como se sabe, tem ainda carências estruturais bastante graves a nível das instalações, dos equipamentos, da acção social escolar e de outros aspectos, que poderia aqui focar.
Por outro lado, a nível do orçamento de investimento, o PIDDAC, verificamos que a diferença, em relação ao orçamento inicial do Ministério para 1991 — é de recordar aqui que o orçamento de investimento foi severamente cortado em mais de 10 milhões de contos, aquando do Orçamento rectificativo, por opção do Governo para acorrer a carências orçamentais de funcionamento —, era de 43,1 milhões de contos e o actual é de 44,5 milhões de contos, o que representa qualquer coisa como 3 %, em termos nominais. Isto significa que a evolução do orçamento de investimentos em relação a 1991 é, de facto, diminuta, não falando já no facto de, há mais de um ano, aquando da discussão do Orçamento para 1991, o Govemo ter anunciado qualquer coisa como 48,1 milhões de contos no PIDDAC, considerando o FEDER adicional.
Também é interessante reter que no Orçamento para 1991, o PIDDAC, na sua previsão para 1992 — e esta previsão constava no Orçamento rectificativo, portanto, é uma previsão que tem poucos meses —, era de 102 milhões de contos para a educação.
Não sei quem fez esta previsão, ela foi-nos apresentada pelo Ministério, consta dos mapas do Orçamento rectificativo, publicado em Dezembro de 1991, mas, de facto, o que se verifica é que em vez dos 102 milhões de contos previstos para o PIDDAC estão apenas 44 milhões de contos.
Reparando ainda noutros aspectos deste PIDDAC, verifica-se que a quebra para o ensino oficial, falando sempre em termos nominais, é de 12,8 % em relação ao PIDDAC inicial para 1991 e no ensino não superior essa quebra é de 30,39 %.
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Estes cortes afectam, sobretudo, os programas de instalações para os ensinos básico e secundário, que sofrem um corte de cerca de 3 milhões de contos em relação ao PIDDAC inicial para 1991, e ainda os programas de apetrechamento, que têm um corte de cerca de 400000 contos.
Não quero deixar de notar que, no que se refere à educação pré-escolar —e todos reconhecemos e o Sr. Ministro será o primeiro a reconhecer o atraso estrutural do nosso país em matéria de taxa de cobertura da educação pré-escolar —, o aumento não ultrapassou a casa dos 30 %, uando a média comunitária se aproxima dos 90 %. , pois, uma área onde é necessário investir decididamente, mas o que se verifica é que o orçamento de funcionamento é de 12,9 milhões de contos, o que corresponde a 2,8 % do orçamento de funcionamento do ensino não superior oficial. Este número dá-nos uma ideia de como a educação pré-escolar é preterida no plano das prioridades do Ministério da Educação, para já não dizer que no PIDDAC está contemplada com 46 000 contos, quando no orçamento inicial para 1991 estava contemplada com 300 000 contos, que foram cortados no Orçamento rectificativo.
Não posso deixar de salientar o que se passa com a difusão da cultura e o ensino da língua portuguesa no estrangeiro, onde há um corte em relação a 1991. Sc repararmos, no Orçamento para 1991 havia 5,888 milhões de contos e no orçamento para 1992 constam apenas 5,61 milhões de contos. Nesta diferença, as quebras verificadas são, sobretudo, nas bolsas, na publicação de revistas e obras portuguesas, na cooperação com os PALOP e no apoio às escolas portuguesas na Guiné-Bissau, Angola e Moçambique.
Convém dizer ainda que a rubrica, inscrita em 1991, da Direcçâo-Geral do Ensino Superior, para expansão da língua e cultura portuguesa, foi suprimida, tendo sido também suprimida a dotação no PIDDAC, que cm 1991 foi de 490 000 contos.
Ainda sobre o ensino superior, e procurando abreviar, verificam-se algumas disparidades no orçamento de investimento, no PIDDAC, sobre o qual gostaria de pedir alguns esclarecimentos. Existe uma disparidade imensa entre as previsões feitas em 1991 no Orçamento rectificativo e os números efectivamente inscritos. Posso dar a título de exemplo, embora o panorama geral seja este, que a Universidade de Lisboa tinha uma previsão de 2,608 milhões de contos e tem inscritos 519 000 contos.
Por outro lado, há uma disparidade entre a execução orçamental e a dotação inscrita no Orçamento rectificativo. Embora me congratule com o facto de haver uma execução superior à verba que estava inscrita, na medida em que a verba inscrita no Orçamento rectificativo era de facto diminuta para as necessidades de investimento, não consigo perceber como é que a execução foi, em muitos casos, muito superior à verba que estava inscrita, em Dezembro de 1991. Posso também dar o exemplo, que dei há pouco, da Universidade de Lisboa, em que o Orçamento rectificativo continha uma dotação de 268 000 contos e a execução é de 485 000 contos.
Acontecendo isto em quase todas as universidades, gostaria de ser esclarecido sobre as razões desta disparidade.
Um outro aspecto, que é importante ainda salientar, diz respeite à acção social escolar. O Sr. Ministro, segundo foi noticiado na imprensa deste fim-de-semana, fez algumas declarações públicas sobre a matéria e creio que era interessante conhecermos aqui quais são as intenções do
Governo no que respeita à aceâo social escolar. Foi anunciada a intenção do Governo de que os encargos a suportar pelos estudantes com a alimentação nas cantinas e as residências correspondam aos custos reais dos serviços que são prestados. Ora, isto vai contra a intenção, várias vezes anunciada pelo Govemo, de dignificar o apoio social aos estudantes, quando, afinal, o que se anuncia é não mais apoio, mas sobretudo pagar mais.
Relativamente ao que se refere ao ensino não superior há um decréscimo de 5,15 % em relação ao orçamento inicial para 1991, pois passa-se de 8,5 milhões de contos para 8,1 %, afectando sobretudo a alimentação, incluindo o leite escolar e a acção sócio-económica. Nota-se já o abandono de mecanismos de apoio social em diversas escolas, nomeadamente no distrito de Setúbal, onde se verificam situações muito graves a nível da falta de prestação de alimentação aos estudantes que frequentam a escola.
No que se refere ao ensino superior, apesar de muitos anúncios de aumento das bolsas de estudo e sabendo-se os níveis ridículos em que funciona o apoio social ao ensino superior, também se verifica que, afinal, a dotação prevista para bolsas de estudo é de 1,9 milhões de contos, o que está próximo do que dizia, há pouco, o Sr. Deputado Lemos Damião, que era a despesa diária do Ministério da Educação.
Portanto, para que conste, a verba anualmente destinada ao pagamento de bolsas de estudo aos estudantes do ensino superior equivale, sensivelmente, a um dia da despesa do Ministério da Educação, para além do facto de existirem cinco universidades no nosso país que nem sequer têm serviços médico-sociais.
Gostaria ainda de me referir à área do desporto. Não está presente o Sr. Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Educação, José Briosa e Gala, que tem feito declarações públicas sobre esta matéria, mas, de qualquer forma, no que se refere à comparticipação do Orçamento do Estado no orçamento do desporto, o aumento é de 4 %, segundo os números que nos foram apresentados. Creio que é manifestamente indigno quando se conhecem as carências estruturais do sistema desportivo nacional, a necessidade de também aí se dar um forte impulso para nos colocarmos ao nível de outros países comunitários, que têm sistemas desportivos muito mais avançados.
Portanto, não é com um aumento de 4 % de comparticipação do Orçamento do Estado que vamos lá, ainda que possa ser ocultado, aqui e ali, em termos nominais, com um crescimento das receitas próprias do Instituto Nacional do Fomento Desportivo.
Por outro lado, também não é com um investimento de 1,13 milhões de contos, na rede integrada de infra-estruturas desportivas — partindo do princípio que ele seja executado, porque o ano passado, como sabe, o RIID (Programa da Rede Integrada de Infra-Estruturas Desportivas) não foi integralmente executado —, que se começa a alterar uma situação de carência nessa área, que a comissão do programa integrado para o desenvolvimento desportivo estimava em qualquer coisa como 290 milhões de contos. É evidente que não é num ano, nem em cinco anos, que se vai resolver um défice desta natureza, mas não é com 1,13 milhões de contos, inscritos para 1992, que a situação se começa, pelo menos, a alterar.
Gostaria que o Sr. Ministro se pronunciasse sobre notícias vindas a público este fim-de-semana na imprensa, segundo as quais o desporto escolar acumula dívidas, e que desde Novembro que não recebe quaisquer verbas para
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suportar encargos já ssumidos com o seu funcionamento, ainda que deficiente. Até ao momento, o desporto escolar tem funcionado, sobretudo, na base da carolice de professores e alunos.
Creio que se impunha uma informação sobre quais são as verbas afectas para 1992 para o desporto escolar c sobre a forma como vão ser resolvidos estes problemas de falta de verbas, assim como das dívidas já acumuladas ao longo do ano de 1991.
Como sabe, o Governo publicou recentemente um despacho sobre desporto escolar, em relação ao qual a única coisa que se pode dizer é que está a brincar com as pessoas, pois fê-lo depois de a Assembleia da República ter discutido, em 23 de Março de 1991 (ainda não passou um ano), a ratificação do Decreto-Lei n.B 95/91, de 26 de Fevereiro, que o Govemo aprovou com pompa e circunstância.
Nesse debate, o então Ministro da Educação, engenheiro Roberto Carneiro, disse textualmente: «Passaram os tempos de estruturas de coordenação frágeis e vulneráveis como passaram os tempos de governar por despachos transitórios. Agora, com o Decreto-Lei n.° 95/91, tudo fica devidamente estruturado e financiado e em condições de massa crítica propícias a um constante e irreversível avanço para diante.» Disse ainda que «a partir do decreto-lei, nunca mais o desporto escolar andará para trás, com tudo o que isso representa de múltiplos benefícios para os jovens e para a sociedade portuguesa».
Ora bem, há menos de um ano vem o Govemo publicar um despacho onde reconhece que este decreto-lei, de que também falava o engenheiro Roberto Carneiro, é inaplicável e que, apesar de terem sido criadas múltiplas estruturas para o desporto escolar, gabinetes e conselhos do desporto escolar, este decreto-lei não pode aplicar-se, e vem criar um novo grupo de trabalho para vir propor um outro diploma sobre o desporto escolar.
Sr. Ministro, o mínimo que se pode dizer é que andam a brincar com a Assembleia da República e, sobretudo, com os jovens que legitimamente têm direito à prática do desporto na escola e a quem esse direito tem sido negado.
Terminarei com algumas questões muito breves.
Gostaria de saber se, no PIDDAC, os projectos co-fi-nanciados, designadamente os do PRODEP, estão inscritos pela totalidade ou apenas com aquela comparticipação nacional.
Pelo estudo que fiz do Orçamento, no que se refere ao ensino superior, está inscrita a comparticipação nacional, através do Programa PRTNCES, mas nos programas para o ensino não superior está inscrita a verba na totalidade. Peço-lhe a confirmação deste dado, porque tem obviamente consequências.
Por outro lado, no que se refere ao Programa PRINCES, gostava de saber quantos projectos serão financiados através desse programa e qual será o peso do ensino público nesses projectos.
Termino, Sr. Presidente — agora é que é mesmo—, chamando a atenção para a questão, já aqui colocada, dos colégios particulares do ensino especial. Obviamente que o Sr. Ministro estará dentro do problema, sabe a situação em que estas escolas se encontram, sabe que a comparticipação do Estado para o seu funcionamento é manifestamente inadequada, sabe que existem estudos que confirmam essa realidade e a necessidade de reforçar o apoio a estas escolas para que continuem a funcionar.
Além disso, creio que as pessoas que aqui se deslocaram à espera de saber uma resposta quanto à sua situação
e à situação em que vão ficar as suas escolas são merecedoras de todo o nosso respeito. Elas exigem não apenas uma resposta neste debate mas, sobretudo, que haja uma resposta à sua situação, para que as escolas de ensino especial possam ser viabilizadas e não seja negado a essas crianças o ensino a que, acima de tudo, têm direito.
O Sr. Presidente: — Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Carlos Lélis, o próximo orador inscrito, gostava de dizer — por uma questão de registo — que há pouco invoquei o artigo 85.° quando devia ter invocado o artigo 92.°, pois é esse que se Tefere a protestos e contraprotestos. Espero, aliás, que não seja necessário voltar a este tema, mas como ficou registada a invocação que fiz do artigo 85." tinha de fazer esta correcção, aliás com a prestimosa ajuda do Sr. Deputado Carlos Coelho, que, realmente, sabe muito disto.
Quero também lembrar que temos 15 inscrições para pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro da Educação. Dispomos de duas hora e meia para esta audição do Sr. Ministro, que tínhamos previsto começar às 15 horas e terminar às 17 horas e 30 minutos. Como não começámos às 15, mas, sim, às 16 horas, temos de terminar, impreterivelmente, às 18 horas e 30 minutos. Aliás, já tomei providências no sentido de que o Sr. Ministro da Indústria e Energia atrase a sua vinda, o que, aliás, foi ao encontro —as coisas ajustam-se sempre— da própria necessidade do Sr. Ministro. Como vê, Sr. Deputado Carlos Coelho, no fundo vai ficar tudo certinho.
De todo o modo, como disse, temos ainda 15 inscrições e, embora seguindo o critério generoso que adoptei desde o princípio — e agora talvez seja difícil mudá-lo dado aos precedentes —, peço aos Srs. Deputados que vão intervir que tenham em consideração e em conta, fundamentalmente, o facto de todos querermos, independentemente do
registo das nossas opiniões políticas, ouvir o Sr. Ministro da Educação. Deixem, pelo menos, tempo para que ele possa falar na sequência dos vossos pedidos de esclarecimento.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Parece muito razoável.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Lélis.
O Sr. Carlos Lélis (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, o hábito não faz o monge, mas o hábito, felizmente, não é uma segunda natureza.
No orçamento do Ministério da Educação há o dispêndio de 1,8 milhões de contos por dia, uma verba que impressionou — parece agora já não impressionar — alguns dos Srs. Deputados. O Sr. Deputado António Filipe acaba de referir-se a essa verba como sendo «apenas» um dia de funcionamento do Ministério da Educação.
Não consigo, apesar do hábito, dizer, em relação a essa verba, «apenas». Ela provoca-me, na verdade, algumas preocupações, na medida em que também a área des recursos humanos me preocupou cm tempos. Quero perguntar ao Sr. Ministro, tão rapidamente quanto possíveí, por respeito às outras 14 inscrições — e faço-o na medida em que essa verba para a educação, na óptica aos recursos humanos, tem de ser uma verba de investimento—, se nessa contenção de despesa ou se nesse corte de despesas não haverá — e baseio-me na análise que fiz dos
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documentos que nos distribuiu —, entre as direcções--gerais e o seu funcionamento e as direcções regionais, alguma duplicação em matéria de despesas gerais e permanentes.
As vezes, com esses cortes de despesas, Sr. Ministro,
temos surpresas — e isso foi-nos já aqui apresentado na reunião que tivemos com o Sr. Secretário de Estado da Cultura—, até com simples cortes e melhor gestão dos telefones.
Uma outra pergunta que queria colocar-lhe — isto para abreviar considerações — tem a ver com o ensino especial.
O meu colega Lemos Damião fez já uma intervenção sobre o assunto e, portanto, salto números como os 100 %, os 10 %, os 30 %. Não saltarei, porém, os 10,2 milhões de contos atribuídos ao sector, mas há uma dúvida que ainda mantenho: o aumento de 100 % que era reivindicado, Sr. Ministro, refere-se ao subsídio do Ministério da Educação— e não só ao do Ministério da Educação, mas também ao de outros ministérios que convergem para esse efeito — ou à actualização de um plafond máximo que costuma ser fixado pelo Ministério da Educação?
Tenho, portanto, dúvidas se esse aumento é em relação ao subsídio ou se é em relação ao tecto da mensalidade. Creio que esse esclarecimento poderá pôr alguma tranquilidade neste assunto, numa área em que tem de falar-se de crianças com carências especiais, mas em que também não esqueceremos os sobredotados.
Quero ainda colocar-lhe uma outra pergunta, também ela relacionada com a questão da gestão dos recursos humanos. Para o Instituto Camões, de que o Sr. Ministro hoje nos deu mais algumas indicações, foram atribuídos
5,6 milhões de contos.
Naveguei um pouco — naveguei porque foi lá fora, pelo estrangeiro — nas águas em que o Instituto Camões singrará — certamente muito bem — e, por isso, sei como é elevado o preço de pessoal no estrangeiro. Por isso, pergunto ao Sr. Ministro se, numa boa gestão de recursos humanos, conta associar ao Instituto Camões, no estrangeiro, unidades como os leitores e os adidos culturais. Por experiência própria nesta área sei como é difícil a conjugação de esforços.
Tinha mais questões a colocar-lhe, Sr. Ministro, mas algumas foram já abordadas intempestivamente e, por isso, já não as faço tempestivamente.
Teríamos algumas ideias de necessidades, mas não faremos reivindicações porque sabemos, Sr. Ministro, que alinhar as necessidades por nós sentidas ou as reivindicações pelos outros feitas, alinhá-las todas em linha recta, é a mais curta distância para o desastre.
O Sr. Presidente: — A Sr.1 Deputada Helena Torres Marques desistiu da sua intervenção, mas isso não quer dizer que os outros intervenientes tenham mais tempo para as suas intervenções.
Tem a palavra a Sr.1 Deputada Ana Maria Bettencourt
A Sr.» Ana Maria Bettencourt (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Educação, quero dizer-lhe, em primeiro lugar, que nos parece que este orçamento para a educação continua ainda envolto numa nuvem de indefinição de prioridades. É a quarta vez que o Sr. Ministro vem a esta Assembleia e ainda não conseguimos perceber quais são as suas prioridades. Este orçamento vai servir para què? As suas verbas podem ser altas ou podem ser
baixas — esta questão já foi aqui discutida —, mas o que é que se vai fazer com este orçamento?
A questão que me parece mais importante esclarecer —já lhe foi colocada várias vezes e o Sr. Ministro ainda não respondeu — é a das metas para este orçamento. O Sr. Ministro diz que ele vai servir para melhorar a qualidade do ensino, mas quando fala no que é essa qualidade não explica nada. Melhores escolas não é nada!... E preciso saber no que é que essas escolas vão ser melhores, tanto no ponto de vista da expansão do sistema como no da melhoria qualitativa do sistema. Até agora ainda não disse nada.
Portanto, este orçamento pode ser suficiente para uma política sem ambições, onde não se perceba onde quer chegar-se, mas não o é se recuperarmos as ambições assumidas pelo Governo em 1990 — não há muito tempo — com o PRODEP. Embora não perdendo a noção de que estou a discutir o Orçamento do Estado para 1992, na especialidade, acho que vale a pena recuperar aqui algumas questões que foram levantadas com o PRODEP em 1990, nalgumas áreas, com uma grande esperança de que, desta vez, o Sr. Ministro responda.
Em 1990 com o PRODEP fez-se uma análise das necessidades do sistema educativo português e estabeleceram-se metas e subprogramas para a recuperação do atraso do sistema português relativamente a outros países da Comunidade Europeia e para as necessidades do desenvolvimento em Portugal. Estabeleceu também dois conjuntos de programas, um que seria financiado pela Comunidade Europeia e outro que não teria o seu financiamento. Podemos não estar de acordo com esses subprogramas, mas alguns deles são essenciais para a melhoria da qualidade do ensino.
Dê o Sr. Ministro as voltas que der por esses países da Europa e verá que há áreas que é essencial contemplar e que não estão contempladas neste orçamento.
Nesses documentos de 1990 havia uma programação plurianual que contemplava verbas previstas para 1992. Apontava-se, por exemplo, como metas para o ensino especial — que, na altura, cobria 26,5 % da população necessitada desses cuidados —, atingir 40 % em 1993. Onde é que estamos e onde é que se vai com este orçamento?
Relativamente ao problema do ensino pré-escolar, que já foi aqui levantado várias vezes, cobríamos, na altura, 30 % das crianças em idade de o frequentar e pretendia--se, em 1993, atingir 90 % das crianças com 5 anos e 50 % das crianças entre os 3 e os 4 anos. Em 1992, estamos em menos de 40 %. Onde é que estão as verbas? Já aqui foi dito —não vou repeti-lo— que não se encontram verbas que permitam caminhar para estas metas. Se não são estas as metas, então quais são elas? Diga-me, Sr. Ministro, porque isso é muito importante. Se o Sr. Ministro passa a vida a falar de rigor, então, diga-me para onde é que se vai em matéria de ensino especial e de educação pré-escolar.
Mas há outras áreas fundamentais a abordar, como a promoção do sucesso educativo e a formação contínua de professores. Estas áreas estavam também inscritas nesses subprogramas e apontavam, por exemplo — se esses programas fossem cumpridos —, para uma verba de 57 milhões de contos no PIDDAC para 1992, só para cobrir as contrapartidas e mais o PRODEP nacional — isto, mais ou menos. O Sr. Ministro vem agora dizer que 44 milhões de contos no PIDDAC é óptimo. Então como é que é?
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Por isso, gostava que o Sr. Ministro me dissesse que projectos abandonou e para onde é que se vai em termos das áreas essenciais à renovação do sistema educativo.
Dou-lhe alguns exemplos, e começo pelas mediatecas. Pode parecer um luxo que os alunos aprendam a compreender o mundo actual em escolas dotadas de televisões, quando a maior parte delas tem más instalações e problemas de recuperação. No entanto, é importante saber-se para onde se vai em termos das mediatecas.
Ora bem, nesse projecto previa-se, para 1992, uma dotação de 2 milhões de contos para mediatecas. Neste orçamento estão previstos cerca de 70 000 contos e, em 1991, foram gastos 600 000 contos. Gostava de saber o que é que aconteceu ao projecto das mediatecas. Vai acabar? O Sr. Ministro fala em bibliotecas, mas não é a mesma coisa. Isso é uma conversa de há 10 anos atrás. Vamo-nos habituando à sua conversa um bocado antiga, mas, já agora, assuma-o.
No programa da formação contínua de professores, o centro de recursos é outro projecto identificado como essencial à melhoria da qualidade do ensino. Foi identificado na aluíra e é identificado por qualquer país que queira fazer uma reforma. Desafio-o a ver o que se passa com a França, com a Espanha e com outros países que, já antes de nós, perceberam isto.
Uma voz do PSD: — A França napoleónica?
A Oradora: — Não, a França de agora. Sr. Deputado, a França napoleónica não tinha formação de professores, não ligava a isso. Era como agora entre nós e como o Sr. Ministro, ao que parece.
Procurando o que está previsto para este ano em termos do centro de recursos, a única coisa que encontrei foi uma dotação de 12 894 contos. Sr. Ministro, a verba prevista andava à volta de 3 milhões de contos para 1992, na programação plurianual. Temos aqui 12 000 contos. Significa isto que o projecto vai ser abandonado? O que é que isto quer dizer?
Gostava também de perguntar-lhe, Sr. Ministro, se esta verba se destina a pagar o concurso que foi lançado pelo GEP e que não foi cumprido por não haver verba, segundo disse. Há mais alguma verba para o centro de recursos, para a formação de professores? Gostava de saber o que é que se passa com a formação de professores e se o programa desaparece de facto.
Gostava também de saber — e esta é uma pergunta que lhe faço com muita insistência — como é que que o Sr. Ministro vai lançar a reforma sem formação de professores.
O Sr. Ministro anunciou várias vezes que vai ser lançada e generalizada a reforma do sistema educativo. Por isso, pergunto-lhe como é que ela vai ser lançada sem formação de professores.
Um outro subprograma é o da orientação escolar e vocacional. Trata-se de um programa que todos os países da Comunidade Europeia que quiseram fazer prevenção dos abandonos adoptaram e que é fundamental para prevenir a marginalidade, para ajudar os alunos a escolher. Já lhe fiz esta pergunta quatro vezes, mas ainda não consegui perceber o que é que se vai passar em matéria de orientação escolar e profissional.
Relativamente aos professores, como o Sr. Ministro sabe, neste momento, há muito descontentamento entre eles. Uma das origens desse descontentamento tem a ver não só com a formação de professores, mas também com
a falta de condições de trabalho nas escolas, que, muitas vezes, é reflexo do seu orçamento.
Um dos problemas que temos com os orçamentos das escolas do ensino básico e secundário é que as verbas destinadas ao seu funcionamento são, em grande parte, absorvidas por vencimentos. Da última vez que o Sr. Ministro cá esteve, perguntei-lhe se era verdade que, por exemplo, nas escolas C+S o orçamento de funcionamento era absorvido em 97 % pelos vencimentos dos professores. Gostava que me respondesse.
Risos do Ministro da Educação.
Isto não é para rir, Sr. Ministro, porque escolas onde grande parte do orçamento de funcionamento é absorvido em vencimentos só se encontram no Terceiro Mundo e não em países da Comunidade Europeia.
Portanto, é fundamental que o Sr. Ministro nos esclareça sobre isto. Provavelmente existem outras verbas, só que gostaríamos de saber quais são.
Quanto ao insucesso escolar, o Sr. Ministro tem dito muitas vezes que quer acabar com ele e prevenir os abandonos precoces da escolaridade, mas, no seu Gabinete, há apenas uma verba destinada a uma coisa mista e nebulosa que é o PIPSE — Educação para todos. Ora, como o PIPSE acabou, vai começar outro projecto que se chama «Educação para todos»? Se é assim, será que nos pode dar a avaliação do PIPSE e explicar-nos o porquê da sua substituição pelo projecto «Educação para todos»? É que, em termos de estratégia de inovação, há um mínimo que se pode fazer, que é exigir uma avaliação do que se passou e justificar o que vem a seguir.
O Sr. Ministro pode dizer-me que o PIPSE já cumpriu as suas funções, mas gostava de lhe dizer que quase todos os ministros têm a tentação de arranjar um programa seu, só que isso já não se usa também. É importante haver uma avaliação. O que é que aconteceu ao PIPSE? O PIPSE teve vida efémera, mas que estruturas é que ficaram?
Falei aqui de centros de recursos, de mediotecas, de formação de professores, de programas de combate ao abandono e insucesso escolar, que são áreas fundamentais de uma reforma do sistema educativo, no entanto, estes pontos parecem não representar prioridades. Quais são, então, as suas reformas ou as suas melhorias? Como é que se propõe gastar este orçamento para que se verifique uma melhoria nas escolas? Não se percebe!
Finalmente, para não gastar muito tempo, não posso deixar de invocar aqui a questão da prova geral de acesso (PGA). É certo que estamos numa discussão do Orçamento do Estado, mas, já agora, ouvi ontem o Sr. Pedro Lynce,...
O Sr. Carlos Coelho (PSD): — O Sr. Prof. Pedro Lynce!...
A Oradora: —... o Sr. Prof. Pedro Lynce, desculpem, a fazer uma manifestação trágica sobre esta prova, uma defesa mais que desastrosa desta prova, no entanto, referiu um aspecto que deixou toda a gente interessadíssima: é que parece que ele tem um grupo de notáveis, de pessoas acima de toda a suspeita em termos de competência.
Sr. Ministro, já agora, gostava imenso de saber onde é que está a verba para pagamento a estas pessoas, qual a avaliação que faz desta prova geral de acesso e dos custos que ela causa não só ao orçamento do Ministério, mas também aos alunos e às suas famílias, pois há mui-
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los que ficaram pelo caminho por causa dela, sendo certo que V. Ex.!, da última vez que cá esteve, disse que, este ano, não ia haver qualquer problema, pois a prova estava completamente aferida e acertada e, por isso, era uma prova que se justificava.
A minha última questão diz respeito ao ensino superior. Estão a ser dadas às escolas do ensino superior instruções para se adaptarem a um programa de normalização que vai no sentido de diminuir, a curto prazo, o número de professores — a expressão é «dispensar professores».
Gostava que o Sr. Ministro nos dissesse que verbas é que vai recuperar, que princípios é que estão a ser utilizados nesse programa de normalização, em que é que ele vai contribuir para a sua qualidade e quais são as contrapartidas que dá às instituições, se é que isso é verdade.
Há uma outra questão, que se prende com a da normalização do ensino superior, que gostava de colocar ao Sr. Ministro.
Têm aparecido insistentemente boatos de que o Ministério da Educação se prepararia para alienar escolas de ensino superior, nomeadamente escolas superiores de educação. Não acredito nisso, mas, entretanto, gostava muito de ouvir o seu desmentido, porque o pânico nas escolas é grande. Era interessante saber se as não vai alienar ou se tem intenção de as integrar em outras instituições, pois isso é muito importante para a formação de professores. E que, se calhar, o orçamento que falta em outras rubricas pode estar aqui.
Por último, queria colocar-lhe ainda uma questão quanto às carreiras de professores e aos diplomas agora publicados. Como eles são para aplicar este ano, gostava de saber qual é verba que o Sr. Ministro vai arrecadar com a criação para os professores da prova geral de acesso ao 8.9 escalão, com o numeras clausus que pretende criar no acesso a esse escalão e também com a célebre supressão do artigo 55.° do Estatuto da Carreira Docente, que é a maior aberração que lerá sido discutida nos últimos anos.
E muito importante que o Sr. Ministro esclareça se o que está nas suas intenções é proibir, impedir ou dificultar os professores do ensino primário, que adquirem uma licenciatura, de continuarem no ensino primário com melhores vencimentos, podendo subir na carreira, porque, se é isso, não estamos a voltar 10 anos atrás, mas, sim, 30.
Sr. Ministro, se o Piaget fosse vivo morria só de ouvir que, depois de se ter feito um avanço interessante em Portugal nessa matéria, se voltaria 30 anos atrás.
Para finalizar, Sr. Ministro, invoquei aqui várias rubricas que, eventualmente, implicam pagamentos, em 1992, de verbas referentes a 1991, como, por exemplo, o descongelamento das carreiras dos professores, a questão dos centros de recursos e a questão do ensino particular.
No que se refere ao ensino particular, há um aumento muito grande nas verbas que lhe são atribuídas. Por isso, gostava de lhe perguntar se esse aumento implica um aumento de custo por aluno de cerca de duas vezes e meia, que é o que vem no orçamento que nos foi disponibilizado, ou, se assim não é, se esse aumento é para pagar, cm 1992, vencimentos aos professores referentes a 1991. Sendo isto verdade, o Sr. Ministro é capaz de nos dar o orçamento verdadeiro para 1992, depois de retiradas as verbas para pagamento de encargos referentes a 1991?
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, aproveito para informar que ainda temos 11 inscrições e que, se se mantiver a «moda» — não digo a média —, que é um
conceito de estatística que alguns conhecerão, que é de quinze minutos neste momento, isto significa que só para os Srs. Deputados pedirem esclarecimentos precisamos de mais de três horas. Mas como o Sr. Ministro vai precisar de trinta minutos, pelo menos, teremos ainda três horas e trinta minutos, tempo que terá de ser reduzido, como calculam.
Portanto, faço um apelo ao bom senso dos Srs. Deputados, pois, a partir de agora, irei ser um pouco mais rigoroso, como compreenderão, na gestão dos tempos.
Entretanto, dá-se a feliz coincidência de já terem falado, entre outros Srs. Deputados, os três coordenadores dos três grupos parlamentares inscritos (PSD, PS e PCP). O CDS está presente, mas não se encontra inscrito.
Assim, proponho ao Sr. Ministro, se estiver de acordo, que faça uma intervenção agora, uma vez que já falaram os coordenadores dos três grupos parlamentares, pois, não o fazendo, no final terá de responder a IS intervenções. Tal facto permilir-nos-ia orientar melhor os nossos trabalhos.
O Sr. Deputado Marques da Silva pediu a palavra para que efeito?
O Sr. Marques da Silva (PS): — Sr. Presidente, era para dizer que, para alegria da Assembleia, me abstenho de fazer qualquer pergunta ao Sr. Ministro, uma vez que as perguntas que tinha para fazer já foram aqui feitas e, portanto, não as vou repelir.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, para que fique registado, quero dizer-lhe que a alegria da Assembleia é o facto de as suas perguntas já terem sido assumidas e não o facto do Sr. Deputado deixar de falar, porque isso não é uma alegria, mas, sim, uma tristeza.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Educação para responder às questões já colocadas, na forma e tempo que entender, sujeitando-se também a estas regras que acabei de anunciar, porque, depois, ainda terá de responder a mais 12 pedidos de esclarecimento.
O Sr. Ministro da Educação: — Sr. Presidente, ouvi aqui algumas intervenções, nomeadamente a da Sr.' Deputada Julieta Sampaio, às quais já respondi mais do que uma vez, mas, dado que esta reunião está a ser gravada, talvez possamos ficar esclarecidos para sempre.
Por outro lado, é também um pouco incomodativo para os outros Srs. Deputados estarem sempre a ouvir as mesmas perguntas, feitas por quem está à espera que a televisão apareça, só pelo facto de aí poder aparecer a falar.
Em relação aos colégios particulares, que aqui foram referidos tantas vezes, quero dizer que, por um lado, me congratulo —e até certo ponto admiro— que uma Deputada socialista esteja tão preocupada em defender o ensino privado com fins lucrativos. Ainda bem que já pensam dessa maneira e, com certeza, irão melhorar ao longo dos próximos quatro anos. É com uma certa surpresa que verifico isso!
Referi aqui muitas vezes o aspecto dos números, porque estamos numa comissão de economia e julgo que o que interessa aqui à maior parte dos Deputados é o Orçamento do Estado, pois já estivemos variadíssimas horas na Comissão de Educação, Ciência e Cultura a tratar dos outros aspectos, que julguei terem sido bem esclarecidos. Mas, como agora a reunião está a ser gravada, repeti-los--ei. Só espero que, para a próxima vez, possamos andar para a frente e que não estejamos sempre a tratar dos mesmos assuntos.
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Um desses aspectos tem a ver com colégios particulares de ensino especial. Trata-se de colégios que têm, no seu conjunto, 3123 alunos, que representam cerca de 10 % dos alunos com necessidades educativas especiais e que são apoiados pelo Ministério da Educação. Estes colégios são financiados em conjunto pelo Ministério do Emprego e da Segurança Social e pelo da Educação.
Para o presente ano a proposta feita coloca os quantitativos para o ensino especial em regime de internato, semi-internato e externato em 1031 contos, 601 contos e 495 contos, respectivamente, por aluno e por ano. Ora, o que tem acontecido no Ministério da Educação nos últimos anos é que houve um aumento de 18 % num ano, de 15 % no ano a seguir e, este ano, estamos a propor um aumento de cerca de 30 %.
Portanto, a Sr.a Deputada compreenderá que é um aumento bem superior à taxa de inflação. Estamos a falar de 30 %, Sr.9 Deputada, e não de um aumento sem significado.
Efectivamente, os colégios solicitaram um aumento do subsídio do Ministério da Educação na ordem dos 100 %. Ora, do meu ponto de vista, isso não pode ser. Mas, a Sr.s Deputada e os Srs. Deputados presentes dirão, já que o Orçamento está aqui para ser discutido e aprovado por VV. Ex."
Não sei se isto já terá ficado claro, mas trata-se de um aumento da ordem dos 30 % que o Ministério da Educação quer dar para uma zona de escolas particulares com fins lucrativos. Por isso, não parecerá mal que se pergunte e que se queira saber as contas, quantos alunos os colégios têm e qual é a relação entre o número de alunos e o número de professores, entre outros factores.
A Sr.9 Deputada referiu também um aspecto, que julgo ser de considerar, referente ao ensino especial, nomeadamente aos colégios com fins lucrativos. Ora, neste caso, tem toda a razão de ser a solicitação que lhes foi feita e aquilo que lhes foi dito pelo Sr. Secretário de Estado do Sistema Educativo, aconselhando-os a concorrerem ao Fundo Social Europeu, que dispõe de verbas e programas próprios, uma vez que são organizações privadas com fins lucrativos.
Portanto, aconselharia que tomassem em conta a sugestão do Sr. Secretário de Estado e se mexessem no sentido da procura dos financiamentos do Fundo Social Europeu, que dispõe das verbas e programas para o efeito.
Gostaria também de referir que nós estamos sempre e completamente abertos para discutir com estas escolas do ensino especial.
Por outro lado, entristece-me um bocado o facto de a Sr.9 Deputada defender tanto um conjunto correspondente apenas a 10 % do ensino especial, querendo dizer que o resto não presta. Neste caso, Sr.s Deputada, não posso concordar consigo porque julgo que as outras escolas, correspondentes a 90 % do mesmo ensino, dispõem de bons profissionais, bons professores que ensinam igualmente bem. Não quero dizer que ensinem melhor ou pior, mas, sim, que ensinam igualmente bem.
Já agora, também gostava de referir que o Ministério da Educação gasta, ou melhor, estamos aqui a gastar 1,8 milhões àe contos por dia, o que corresponde a cerca de 800 000 contos por hora, ou seja, aquilo que já devemos ter gasto desde o princípio desta reunião.
Ao Sr. Deputado António Filipe desejava dizer...
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, o Sr. Deputado António Filipe não está presente neste momento, pelo que sugeria que deixasse a resposta para depois.
Gostaria de referir — e isto talvez tenha sido ventilado também por outros Srs. Deputados — que a este orçamento que temos aqui presente há que juntar o orçamento específico do PRODEP que, neste caso, ultrapassa ou ronda os 18 milhões de contos. Portanto, nos 44,5 milhões de contos deve ter-se em conta a participação adicional de mais 18 milhões de contos. Assim, adicionando estas importâncias temos cerca de 62 milhões de contos, no conjunto.
Em relação à difusão da cultura e da língua portuguesa, nós estamos a propor um aumento da ordem dos 17 %, o que me parece ser bastante significativo.
Em relação à acção social escolar, estamos efectivamente muito interessados em desenvolver maior justiça social nas escolas, sejam elas do ensino secundário, básico ou superior, e, se olharam para o orçamento que foi distribuído, verificarão um aumento da ordem dos 23 %. Nalguns casos, há quase 100 % de aumento. Julgo que não poderão pedir mais para além deste esforço que o Ministério da Educação está a fazer para uma maior implementação da justiça social.
Em relação ao desporto, temos um aumento da ordem dos 27,2 %, o que também me parece ser suficiente.
Gostaria ainda de referir-me aos gastos que estão a ser feitos com as direcções-gerais e com as direcções regionais. Estamos, de facto, genuinamente interessados em aumentar o rigor nas despesas, isto é, não queremos dinheiro mal gasto. Queremos, sim, ser rigorosos para ser ricos. Não haverá, com certeza, ninguém que não procure, no seu orçamento pessoal ou em qualquer casa, evitar fazer desperdícios. É isso que nós temos de desenvolver na área da educação e do Ministério da Educação.
Portanto, estamos a propor aumentos da ordem dos 18 %. São dos aumentos menores que, efectivamente, se verificam no nosso orçamento, e isso é propositado. Nós, organismos centrais das direcções-gerais e regionais, temos de dar o exemplo do rigor. Para tanto, precisamos de gastar o mínimo possível em administração para o financiamento ir para as escolas. É que para termos melhores escolas precisamos de, a nível central, dar o exemplo da poupança para que os montantes assim conseguidos possam ser distribuídos a fim de termos mais e melhores escolas.
Em relação à pergunta feita pelo Sr. Deputado Car)os Lélis quanto ao Instituto Camões, devo dizer que, realmente, a filosofia deste Instituto é no sentido de haver uma integração de toda a gama do ensino no estrangeiro. Portanto, pretendemos ir para o ensino superior, que, aliás, era a zona do ICALP, mas também queremos ir para os ensinos secundário e básico. Queremos, com efeito, ir mais para baixo. E dar-nos-ia muita alegria se conseguíssemos montar, nomeadamente nos países africanos de língua oficial portuguesa, um «Liceu Camões» — utilizando o nome mais antigo. Dá-me a impressão que tinha todo o significado e era muito bom para Portugal se houvesse «Liceus Camões» em Angola, em Moçambique, em Cabo Verde, etc.
Esta é, portanto, a filosofia. Trata-se de uma integração de todo o ensino no estrangeiro, seja ele básico, secundário ou superior.
Outro aspecto que talvez também seja de referir, ainda em relação ao Instituto Camões, é o de que nós queremos que haja delegações do Instituto nos próprios países. É que não podemos ter a pretensão de daqui, de Portugal, estarmos completamente ligados por cordelinhos a financiar, tostão a tostão, conto a conto, milhar a milhar, o que SC passa por esse mundo fora.
O Orador: — Então, fica para depois.
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Portanto, pretendemos que haja delegações do Instituto Camões nos países europeus, africanos ou outros com os quais Portugal tem tido relações mais do âmbito da -educação e da cultura. Pretendemos também que haja muita delegação de poderes nesses institutos ou centros e que os mesmos tenham autonomia financeira para terem de gerar parte dos seus lucros. E para que tal aconteça''têm de ser, com certeza, liderados localmente. Tem de haver, igualmente, uma grande ligação entre os emigrantes, entre a sociedade local e esses centros ou institutos.
Em relação às perguntas da Sr.1 Deputada Ana Maria Bettencourt, vou dar algumas respostas, mas, se continua com tantas dúvidas, sugiro a minha vinda aqui para uma conversa especial com a Sr.' Deputada, ou então teremos muito gosto em que a Sr.* Deputada se desloque ao Ministério onde a esclareceremos acerca dos diversos aspectos, pois parece-me que, por muito que se diga, a Sr.9 Deputada continuará sempre com dúvidas.
A Sr.1 Ana Maria Bettencourt (PS): —Não sou só cu! É o País inteiro. Veja as manifestações que o senhor tem diariamente à porta!
O Orador: — Aí, tenho mais dúvidas.
Em relação à educação, Sr.* Deputada, permitia-me referir que o Ministério da Educação tem cerca de 6 % do PIB. Ora, esta era uma meta que todos pretendíamos e que, realmente, acarreta para nós, Ministério da Educação, muita responsabilidade, porque estamos ao nível dos países mais avançados da Europa. Portanto, temos de ter rigor no nosso orçamento para que estes 6 % dêem para a educação. Mas repare que são 6 % do PIB, sem incluirmos o PRODEP — como já referimos só aí eram mais 17 milhões de contos! Também não referimos o Programa Ciência, donde saem também montantes significativos para o sistema educativo! Não mencionamos igualmente o programa PEDIP e outros!
Portanto, Sr.' Deputada, o País ultrapassou os 6 % do PIB para a educação, o que nos impõe maior rigor nas contas.
Sr.1 Deputada, só para fazer comparação, sabe quantas centenas de escolas existem com menos de quatro alunos? Sabe, não é verdade?
A Sr.* Ana Maria Bettencourt (PS): — Sei, sei!
O Orador: —Então, ainda bem. É que se fizermos a comparação, por exemplo, com um país como a Holanda, que acabou de ter a presidência da Comunidade Europeia, verifica-se que lá não existe nenhuma escola com menos de 19 alunos. Porém, nós temos centenas e centenas de escolas com quatro alunos e temos quase 1 milhar de
escolas com menos de 10 alunos. Ora bem, temos de, efectivamente, melhorar esta situação para depois termos orçamento e valores para distribuir por todo o sistema educativo.
Neste momento, acredito plenamente que o orçamento que temos é suficiente para a educação. Temos é de o gerir bem para agradar a todos, estudantes, alunos e mais jovens, e não só aos professores, ponto este que gostaria de frisar bem.
A Sr.» Julieta Sampaio (PS): — Mas nada se faz sem eles!
O Orador: — Há um outro aspecto que gostava de mencionar e que é o seguinte: nós vamos, no próximo ano lectivo, apesar de a Sr.* Deputada pôr em dúvida, iniciar os novos curricula nas escolas do 2.B, do 7." e do 10.° anos de escolaridade.
De facto, estamos interessados em que isso aconteça — e assim vai acontecer — porque não tem sentido que, havendo já muitos estudos completos sobre os novos curricula, eles não sejam proporcionados aos alunos, isso não faz sentido! Se houve tanto trabalho feito para proporcionar aos alunos os melhores curricula, os mais actualizados, temos de fazer um esforço suplementar, nós, Ministério, professores, instituições, para que essas novas matérias sejam rapidamente postas à disposição dos nossos alunos. E é o que vamos fazer!
Para além disso, e certamente a Sr.* Deputada concordará, vamos trabalhar nos seguintes parâmetros: primeiro, o ensino superior, nomeadamente as escolas superiores de educação, que têm de ter cursos adequados e com a duração suficiente e necessária para o mercado de emprego.
De facto, não faz sentido termos, em Portugal, cursos muito mais longos do que nos outros países da Europa e, ainda por cima, taxas de reprovação muito superiores ao que se passa nos outros países da Europa. Por isso, temos de fazer esse esforço, que será, obviamente, complementado com a formação contínua dos professores.
A Sr.* Deputada — que, aliás, já foi presidente de uma escola superior de educação — terá de compreender que, relativamente a estas escolas, o Estado gasta cerca de 1000 contos por ano/aluno, o que é de mais!
Portanto, temos de trabalhar na formação contínua dos professores. As escolas, as universidades e os institutos politécnicos têm de dar formação de base forte. Aliás, neste momento, não podemos ter a veleidade, atendendo à formação tecnológica que existe, de pensar que um professor saia de uma escola superior de educação ou de uma universidade e que depois nunca mais precise de reciclagem. Assim, temos de ter cursos, temos de ter uma taxa de sucesso como os outros países da CEE e, depois, de vez em quando, por exemplo, de cinco cm cinco anos, ou o que for achado por mais conveniente, os professores terão de fazer formação contínua e reciclagem. Este é o meu ponto de vista sobre esta matéria.
A Sr.8 Ana Maria Bettencourt (PS): — E a venda das escolas?
O Orador: — Isso já não me diz respeito, mas com certeza que não vamos vender as escolas!
A Sr.* Ana Maria Bettencourt (PS): — Fico muito mais descansada!
O Orador: — Ainda bem! Se já a descansei em alguma coisa já foi bom ter vindo cá.
Há um outro aspecto, com o qual a Sr." Deputada certamente concordará —aliás, já o referi a alguns sindicatos—, que é o seguinte: se calhar todos os professores quando estão nas suas escolas até acham que ganham pouco, o que, aliás, até pode não estar tão errado como isso.' Mas os sindicatos e quem está a tratar dos assuntos macro é que tem de ver os diversos aspectos do que vem a acontecer.
Senão repare: se compararmos o que se passa em Portugal com o que se passa nos outros países mais avan-
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çados veremos que para o mesmo número de alunos temos muito mais professores do que nos outros países da Europa. Ora, se tivéssemos o índice correcto, se calhar teríamos a possibilidade de proporcionar um bem-estar muito maior aos professores, aos alunos, a todos e, portanto, a própria sociedade portuguesa estaria muito melhor e com melhor formação.
A Sr.* Deputada não acha que trinta e cinco horas de aulas por semana para os alunos é de mais? Certamente que é! Na verdade, se pensarmos que cada aula tem de ser trabalhada em casa, julgo que os alunos não terão tempo de recuperação e, então, acontece uma coisa estranha, que é o seguinte: por um lado, os alunos portugueses têm o horário mais sobrecarregado que existe na Europa e, por outro, têm, frequentemente, os horários anuais mais curtos. A Sr.' Deputada deve tirar daqui as ilações que entender!... Mas, seja como for, temos de pensar nesta matéria.
Relativamente ao ensino superior e ao que se passa com os contratos-programa, posso dizer-lhe que estamos muito interessados em celebrar este tipo de contratos com todo o ensino superior, com todas as universidades e com os institutos politécnicos, porque todos os dirigentes, nomeadamente os reitores, reconhecem que o seu orçamento está desproporcionado.
Na verdade, as razões são várias, mas não vale a pena falar do passado! Vamos é detectar e ver qual a situação presente e como é que temos de evoluir por forma que haja uma relação correcta entre a percentagem de funcionamento versus verbas para pessoal.
Aliás, neste momento, já existe um trabalho muito elaborado, no qual participaram reitores e o Secretário de Estado dos Recursos Educativos, e a Sr.1 Deputada não se surpreenderá se, a curto prazo, conseguirmos estabelecer os contratos-programa com as universidades no sentido de melhorar a situação presente. Julgo que todos devemos trabalhar para que isso aconteça no futuro.
Em relação à passagem do 7.9 para o 8.9 escalão, aproveito a oportunidade para dar algumas explicações sobre esta matéria. No estatuto da carreira docente, como sabe, a passagem do 7.° para o 8.* escalão é feita em condições diferentes das dos outros escalões, estando prevista a apresentação de curriculum, a elaboração de um trabalho e a sua discussão em provas públicas.
Ora bem, neste momento posso dizer-lhe que haverá cerca de 10 000 professores nestas condições que já têm uns anos de actividade. Então, acha que não deve ser dada outra oportunidade, outra forma de trabalhar, a esses professores? Não será melhor do que forçá-los a ir para provas públicas, onde, certamente, vai estar muita gente a verificar o que se vai passar? Não acha que a existência de métodos alternativos será positiva? Pessoalmente, penso que sim!
Além disso, na nossa proposta, também pensamos que pode haver professores que passem automaticamente do 7.8 para o 8.s escalão. São aqueles professores que têm mestrados, doutoramentos, que escreveram obras de certo valor para o sistema educativo. Portanto, no nosso entender, a esses professores não vale a pena estar, de novo, a exigir mais provas públicas.
Julgo que a nossa proposta é bastante equilibrada e acredito que os professores, quando a perceberam completamente, acolhê-la-ão com grande agrado.
Já agora, Sr.' Deputada, peço-lhe que leia a nossa proposta com algum cuidado e que...
A Sr.' Ana Maria Bettencourt (PS): — Já li!
O'Orador: —... divulgue a informação correcta que dela consta.
Quanto ao artigo 55.fi, julgo que o que propusemos é, novamente, uma flexibilidade na carreira. A Sr.» Deputada sabe, com certeza, que existem zonas do País, nomeadamente a nível do sistema educativo básico e secundário, onde há excesso de professores e outras, mesmo ao lado, onde existe grande carência de professores.
A Sr.1 Deputada sabe também que no 1." ciclo do ensino básico existe um excesso de professores, enquanto no 3.° ciclo há falta de professores. Então, por que razão é que não havemos de permitir a estes professores, que se licenciaram, que têm as qualificações necessárias para poder ensinar nos outros ciclos, seja o 2.°. o 3.9 ou até o secundário, a mudança de carreira? Por que é que havemos de espartilhar os professores e não deixar que eles «saltem» para os outros ciclos, atendendo a que, muitos deles, têm uma grande actividade pedagógica?
Portanto, o que propusemos foi exactamente isso: permitir aos professores, que tenham as licenciaturas adequadas, exercer as suas actividades nos ciclos mais adequados às licenciaturas e às novas qualificações que, entretanto, obtiveram.
A Sr.1 Ana Maria Bettencourt (PS): — E para isso é necessário terem licenciatura?
O Orador: — É! Mas nós não queremos forçar nenhum professor a saltar do 1." ciclo para os outros ciclos. O que pretendemos, isso sim, é alterar a situação presente, uma vez que, hoje em dia, um professor do 1.° ciclo não pode sair daí. Ora, é exactamente isto que pretendemos alterar! Queremos que aos professores do 1.° ciclo, que tenham licenciaturas, seja permitido passar para o 2.9 ciclo e depois, se quiserem e se tiverem as qualificações, passar para o 3.9 ciclo e mesmo para o secundário. É isto que pretendemos, ou seja, não obrigar, mas, sim, flexibilizar, dando maior possibilidade de movimentação entre os diversos ciclos do ensino básico.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, uma vez que estão inscritos para pedir esclarecimentos sete Deputados do PS, três do PSD e um do PCP, e como provavelmente não poderei dar a palavra a todos, vou, de acordo com o artigo 81.9 do Regimento, fazer um pequeno arranjo.
Assim, e segundo este artigo, que diz que «a palavra é dada pela ordem das inscrições, mas o presidente promoverá de modo a que não intervenham seguidamente, havendo outros inscritos, Deputados do mesmo grupo parlamentar ou membros do Governo», a nova grelha de inscrições passará a estar constituída do seguinte modo: Fernando de Sousa e Edite Estrela, do PS, José Cesário, do PSD, Lourdes Hespanhol, do PCP, Guilherme Oliveira Martins e António José Seguro, do PS, Carlos Coelho, do PSD, etc., evitando-se, desta forma, que todos os Deputados do PS falem primeiro e que todos os do PSD falem no fim, o que me parece ser um critério mau, sobretudo se chegarmos às 18 horas e 30 minutos sem toda a gente ter falado.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, creio que pretende referir-se ao facto de não ter estado presente quanâo o Sr. Ministro esteve a responder. Em todo o caso,...
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O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, creio que durante a minha ausência o Sr. Ministro não respondeu às perguntas que coloquei, pelo que gostaria de saber se tenciona ou não fazê-lo.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado António Fdipe, fui eu próprio que pedi ao Sr. Ministro para não responder, uma vez que, segundo supus, V. Ex.*, como Deputado cumpridor e seguidor dos trabalhos das várias comissões em que participa, não demoraria muito tempo. Assim, penso que
quando o Sr. Ministro intervier outra vez certamente responderá às questões que o Sr. Deputado colocou. Tem a palavra o Sr. Deputado Fernando de Sousa.
O Sr. Fernando de Sousa (PS): — Sr. Ministro, Srs. Membros do Governo, passo a colocar três curtas questões.
A primeira é a de saber se o Ministério da Educação incorporou no seu orçamento as verbas relativas ao aumento dos vencimentos dos professores. Naturalmente que não nos referimos aos 10 % acordados, mas, sim, ao limite mínimo que o Governo tinha inicialmente estabelecido, ou seja, 6 % a 7 %. É que parece-nos inaceitável que se registe em 1992 o que aconteceu no ano findo, em que o processo de reforço do Orçamento, derivado dos aumentos de vencimento, veio até Dezembro de 1991 e transitou mesmo para 1992, prática esta que, aliás, já tinha acontecido também em 1990.
Segunda questão: dos 97 milhões de contos referidos para o ensino superior no Orçamento deste ano estão previstas as verbas de actualização e pagamento de retroactivos dos escalões dos docentes universitários?
A terceira questão prende-se com o facto de o Ministério da Educação ter prescindido, de bom grado, da tutela do INIC — e dizemos «de bom grado» porque não temos conhecimento, até agora, que o Ministério da Educação tenha tomado qualquer posição conca a sua transferência para outro ministério. Sabemos que o INIC garantia boa parte do esforço de financiamento da investigação universitária. Assim sendo, gostaríamos de saber quando é que as universidades serão dotadas com verbas próprias para a investigação científica.
O Sr. Presidente: —Tem a palavra a Sr.1 Deputada Edite Estrela.
A Sr.a Edite Estrela (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, em sede da Comissão de Educação, Ciência e Cultura, o Sr. Ministro e também o Sr. Secretário de Estado da Cultura, na mesma sede, durante o debate do orçamento para o sector cultural, aqui realizado, na sexta-feira passada, sublinharam a prioridade dada à língua portuguesa e valorizaram a criação do Instituto Camões. Congratulo--me, naturalmente, com isso.
Mas, Sr. Ministro, para ajuizarmos da validade desses propósitos seria necessário conhecer, por um lado, as orientações políticas e, por outro lado, as verbas consagradas para a sua realização, uma vez que, lamentavelmente, Portugal, ao contrário do que acontece com os outros países mais desenvolvidos da Europa comunitária, designadamente a França, a Grã-Bretanha, a Alemanha e a Espanha, Portugal não tem uma política do idioma.
Certamente que compreenderá esta minha preocupação se atentarmos na redução das verbas consagradas à promoção e difusão internacional da língua e da cultura portuguesas. Contrariamente ao que diz o Sr. Ministro, há, de facto, uma redução.
Sr. Ministro, esperava um aumento substancial. É que falar do Instituto Camões, valorizar o papel que pode vir a desempenhar, obrigaria a dotações correspondentes. Ora, as dotações que lhe são atribuídas são insuficientes. Parece, pois, haver nisto uma certa incoerência.
Para além disso, há pouco o Sr. Ministro referiu-se a este assunto de uma forma um tanto confusa: falou no Instituto Camões, depois falou em Centros Camões, em Liceu Camões. Ora, certamente que estas entidades terão competências diferentes e também dotações orçamentais diferentes porque, por muito que se queira autonomizar financeiramente esses institutos, penso que não haverá estudos — e se os há, gostaria de os conhecer—que permitam levar à conclusão de que ou haverá mecenas que apoiem ou os emigrantes, como o Sr. Ministro referiu, poderão estar ou não disponíveis para apoiar essas iniciativas.
Sr. Ministro, promover internacionalmente a língua portuguesa é também promover, de facto, o ensino — e o ensino nos países africanos de língua oficial portuguesa. Ora, a verba prevista para esta acção parece-me irrisória: 200 000 contos é uma verba ridícula.
Sr. Ministro, terá de ser a Gulbenkian a continuar a ter um papel supletivo em relação às competências do Estado neste domínio?
Mas se é necessário e urgente promover internacionalmente a língua portuguesa, parece-me que é igualmente urgente valorizar o seu ensino internamente. A política do idioma, aliás, contempla essas duas vertentes: a vertente externa e a vertente interna.
Ora, Sr. Ministro, parece-me ser um imperativo nacional investir no ensino/aprendizagem da língua portuguesa e também na reciclagem dos professores. Diria mesmo que a recente polémica em tomo da famigerada PGA veio provar que isso é urgente; é que não são só os alunos que necessitam de melhorar o domínio da língua materna, parece-me que há, também, alguns professores, até mesmo doutorados, que necessitam de melhorar o domínio da língua portuguesa, como, naturalmente, há alguns quadros superiores do Ministério da Educação nessa mesma situação.
Estas considerações, Sr. Ministro, podem parecer um pouco extemporâneas, mas não são; é que, na grelha de correcção da PGA, distribuída aos correctores, indicia-se já a aplicação das alterações preconizadas pelo acordo ortográfico, que deverá entrar em vigor apenas em 1994.
Pois bem, a minha pergunta vai neste sentido: que verbas estão inscritas no orçamento do Ministério da Educação para o funcionamento do grupo de trabalho criado pelo Despacho n.B 165/91, e para a execução das medidas por esse grupo preconizadas? Isto é, verbas para preparar e minorar os efeitos da aplicação do acordo ortográfico, designadamente ao nível dos manuais escolares, dos dicionários, dos prontuários, das gramáticas, dos glossários, enfim dos cânones da língua que, como o Sr. Ministro sabe, estão muito desactualizados, precisando de ser feitos quase de raiz. Ora, com a aplicação do acordo ortográfico poderão aproveitar essa oportunidade para levarem a cabo um trabalho de fundo.
Porém, não vejo qualquer verba prevista para essa acção e não me parece que seja apenas num ano que se possa realizar esse trabalho, pois é um trabalho complexo e muito sério que tem de ser devidamente valorizado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.9 Deputada Lourdes Hcspanhol.
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A Sr.« Lourdes Hespanhol (PCP): — Sr. Ministro, há pouco afirmou que estávamos aqui a debater um orçamento que vai ser votado nesta Casa. Atrevo-me a fazer futurologia, Sr. Ministro: não só atendendo aos resultados da votação, na generalidade, deste Orçamento do Estado, como também em relação ao Orçamento do Estado de anos passados, atrevo-me a dizer que, com certeza, este Orçamento vai ser aprovado com os votos únicos do PSD.
Sr. Ministro, há muita coisa à qual não podemos dizer sempre ámen, ámcn, ámen. Começava, por isso, por colocar algumas questões concretas que se prendem com o distrito de onde venho: o distrito de Beja.
Trata-se de um distrito onde a população com menos de 15 anos é muito reduzida, factor que levou a que várias autarquias locais fossem penalizadas na transferencia do FEF. O Ministério da Educação voltou, pois, a penalizar o distrito de Beja neste Orçamento do Estado.
Previa-se, em instalações para este distrito, no Orçamento de 1991 para 1992, cerca de 4,5 milhões de contos; depois, na alteração orçamental, subiu-se este valor e agora passou para 1,78 milhões de contos.
Sr. Ministro, já estou um pouco saturada de ouvir dizer «mas isso é só a comparticipação nacional, e o resto que aí vem?». É que aquando da discussão do Orçamento do ano passado também me disseram isso, e a verba que lá estava era esta, Sr. Ministro.
Em relação ao apetrechamento, vamos pelo mesmo caminho: passamos de cerca de 600 000 contos para 337 000 contos. Em relação à conservação e remodelação, ficamos por metade. Quanto à acção social do Instituto Superior Politécnico de Beja, ainda na alteração orçamental, os senhores previam 150 500 contos e agora passou para 80000.
Está em causa uma cidade onde o ensino superior está a despontar, uma cidade sem capacidade para receber os estudantes, uma cidade que necessita — e as associações de estudantes são unânimes em afirmá-lo —, urgentemente, de medidas discriminatórias, mas de sentido positivo para que, realmente, os alunos possam em Beja ter direito a estudar. Precisam, pois, concretamente, de uma residência de estudantes que albergue um número significativo de alunos, quer da universidade privada quer do Instituto Superior Politécnico.
Sr. Ministro, queria colocar-lhe ainda uma outra questão relacionada com a Escola C+S de Ferreira do Alentejo. Esta questão integra-se numa questão mais vasta pois esta escola precisa de um alargamento, de uma expansão — e, como esta, outras escolas, por esse País fora.
Não se vê qualquer verba inscrita no Orçamento que nos mostre donde é que vão sair dinheiros para essas expansões e devo dizer que este ano a inovação da humanização e modernização dos espaços é realmente uma moda muito interessante, mas que não pega, Sr. Ministro!
Podemos pensar nesta questão das instalações em termos globais ou nacionais e, ao fazê-lo, vemos que em 1991 estavam inscritos para 1992 na rubrica «Instalações, apetrechamento, conservação e remodelação» 94 781 330 contos; em 1992, mesmo juntando a «humanização e a modernização» temos 45 532 377 contos.
Sr. Ministro, não sei como é que isto se explica! É difícil, com certeza.
Não queria duplicar considerações que já foram aqui feitas, no entanto, em relação à educação e ensino espe-cia/, não posso deixar — e agora faço-o à vontade, porque as galerias já não têm pessoas em número significativo para que me digam que estamos a querer também pôr uma
bandeira neste aspecto — de chamar a atenção para algumas questões. E faço desde já uma a que o Sr. Ministro se referiu há pouco: por que é que essas escolas não recorrem aos fundos comunitários?
Sr. Ministro, as escolas podem fazê-lo, mas ainda na sexta-feira passada recebi uma instituição que trabalha com crianças deficientes — por acaso até não é uma escola desta natureza, é uma CERO — que desde 1990 tem dinheiros a receber do Fundo Social Europeu. Portanto, ainda espera por dinheiros de 1990. Isto, Sr. Ministro, mostra bem que não há em Portugal uma política para o desenvolvimento da educação especial. Não coloco aqui a questão do particular e do oficial, coloco-a de uma forma geral.
Assim como não há uma política para a integração dos deficientes neste país. Este problema não tem sido encarado de forma séria e segura; são feitas pequenas coisas, e essas pequenas coisas são «remendos mal deitados» que não servem e não põem em prática os princípios constitucionais por que nos regemos no nosso país.
Penso que ainda há muito para fazer em termos de educação pré-escolar. Se formos ver o que foi feito em termos de investimento no ano passado veremos que foi feito zero, pois toda a verba foi varrida para pagar o tal «buraco» que conhecemos. E este ano a verba é reposta sem os 300 000 contos que estavam previstos para o ano passado. Andamos, pois, a brincar um pouco ao «esconde--esconde» porque a verba que eslava prevista de 1991 para este ano era uma verba elevadíssima, e nós compreendemos porquê...
Só queria colocar mais duas ou três questões que se prendem com o apoio e desenvolvimento pedagógico. A reforma educativa, Sr. Ministro, a educação para todos e o PIPSE passa de uma verba de 1 milhão de contos no Orçamento inicial de 1991 para 969 000 contos em 1992. Baixa!
A verba da Direcção-Geral dos Ensinos Básico e Secundário para apoios educativos passa de 72 446 contos para 50 000 contos. Baixa!
No PIDDAC, este sector cai de 2,7 milhões de contos para 1 485 351 contos. Baixa!
Gostava de referir a questão do Projecto MINERVA. Fala--se de modernização, de actualização e de como são importantes todas estas questões na vida activa, defende-se a escola ligada à vida prática, mas a verba destinada ao Projecto MINERVA passa de 1,4 milhões de contos para 1,1 milhões de contos e a informática para a vida activa—pasme-se! — passa de 400 000 para 300 000 contos!
Quanto as mediatecas escolares, como já aqui foram referidos os números, não vou falar disso.
No que toca à formação continua de professores, entristeceu-me, ainda mais sendo eu professora, a falta de sensibilidade do Sr. Ministro a este respeito, quando há pouco se referiu a esta questão. Por um lado, afirma que temos de fazer ensino de qualidade, a reforma educativa, etc., mas, por outro, vem dizer que «primeiro cortamos o tempo dos cursos e depois vamos para as formações continuas».
Sr. Ministro, estou muito apreensiva relativamente a este orçamento, que não representa 6 % do PIB, mas, sim, 5.6%.
Em relação à questão do PRODEP, o Sr. Ministro reafirmou que ele não está inscrito no orçamento do Ministério da Educação. Mas, com o desenrolar dos trabalhos e se o Orçamento não for considerado inconstitucional, depois vamos ver se o PRODEP está ou não inscrito no orpamerjio do Ministério da Educação.
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O Sr. Presidente: — Para uma intervenção concisa e precisa, ou seja, exemplar, tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Coelho.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Sr. Presidente, espero não o desiludir quanto ao carácter exemplar c sucinto da minha intervenção — em relação ao sucinto, seguramente que não; já quanto ao exemplar, modéstia seria admitir que V. Ex.8 tem razão.
Quero colocar quatro questões muito simples, a primeira das quais se dirige ao Sr. Presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano. Creio que esta Comissão'deve, em próximo orçamento, sugerir ao Presidente da Assembleia da República e ao presidente das comissões especializadas permanentes que as reuniões com os membros do Governo, em sede de apreciação na generalidade, sejam também gravadas. Isso evitará a duplicação de discursos, a projecção de vaidades e a confusão dos momentos. A discussão na generalidade é a discussão na generalidade e a discussão na especialidade é a discussão na especialidade — isto que parecia tão simples é, afinal, tão complicado na prática.
A minha segunda questão, já dirigida ao Sr. Ministro, é a seguinte: o Sr. Ministro da Educação apresenta-nos, no orçamento do sistema de ensino propriamente dito, um aumento assinalável no ensino superior, aliás bastante maior do que no ensino não superior, quer sob o ponto de vista do aumento, quer no que diz respeito à comparação do aumento deste ano com o do ano passado. No ano passado era de 17.4 e este ano é de 24.5.
É verdade que parte deste aumento é conseguido com uma substancial evolução no PIDDAC — o PIDDAC, no ensino superior, sobe quase 90 %, o que é de assinalar e de elogiar—, mas, Sr. Ministro, isto é uma faca de dois gumes, pois se, por um lado, permite a V. Ex.» e ao Governo retirar validade ao argumento da oposição de que o Governo está a deixar «cair» a educação do conjunto das suas prioridades, por outro, podemos cair no discurso das facilidades, dizendo que este esforço apenas cabe ao Estado, o que não é verdade. Não deixa de ser tristemente assinalável que as receitas próprias do ensino superior baixam, em valor real e em valor nominal, relativamente ao ano passado. E não quero aqui enxertar a discussão das propinas, pois haverá um momento para a fazer, mas apenas recordar que o debate cm que todas as bancadas participaram, aquando da aprovação da Lei da Autonomia Universitária, pressupunha que a autonomia das universidades significaria também a capacidade de, no terreno da autonomia financeira, angariarem receitas próprias. De facto, não vejo aqui um esforço no sentido da obtenção dessas receitas próprias e creio que se o Estado dá o exemplo, ao aumentar significativamente, em termos de valor real e de valor nominal, o investimento no sistema de ensino, e particularmente no superior e universitário, devemos também fazer um discurso de exigência em relação às instituições que, gozando de autonomia, estão em condições de angariar as receitas próprias.
A segunda questão que quero colocar ao Sr. Ministro refere-se ao parque escolar. O Governo também aumenta, e bem, na minha opinião, em perto de 50 %, as dotações para a conservação e remodelação do parque escolar, no âmbito das direcções regionais de educação — assim, de 2 milhões de contos passa praticamente para 3 milhões de contos. Neste âmbito, não tenho dúvidas em relação ao valor, mas, sim, relativamente à forma de aplicação destas verbas. Devo dizer-lhe que sou muito céptico quanto à eficácia da burocracia do Estado e também de alguma burocracia do Ministério da Educação. No passado, ex-
perimentaram-se processos de transferência de pequenas obras para a responsabilidade das escolas, em vez de as fazer depender da decisão das direcções regionais de educação, de acordo com um plano, a que aliás o Sr. Ministro já fez referência em discursos públicos, de aumentar a autonomia das escolas de nível não superior.
A questão que quero colocar-lhe é a seguinte: qual é a tradução orçamental deste esforço? Ou seja, estes 3 milhões de contos para pequenas obras e obras médias vão ser, em 90 %, orientados pela burocracia do Ministério, ou vai haver aqui uma descentralização de competências com reflexos orçamentais? Diz-nos a experiência que essa transferência significa uma economia de meios.
Relacionada com esta questão há também uma verba que cresce muito — de 100 000 contos para 620 000 contos — na intervenção de emergência da Direcção-Geral da Administração Escolar. Trata-se, pois, de um aumento para seis vezes mais. Gostaria que o Sr. Ministro precisasse se se trata apenas de uma maior dotação no tipo de intervenção de emergência que era feita ou se se pretende uma revalorização do conceito de intervenção de emergência com o alargamento das competências que eram tidas como incertas nestas verbas em orçamentos anteriores.
A última questão tem a ver com a acção social escolar, Sr. Ministro. Quero elogiar V. Ex.» e o Governo por as verbas destinadas ao ensino não superior registarem um maior aumento do que as que cabem ao ensino superior. Foi uma crítica que alguns Deputados do PSD e eu próprio fizemos em orçamentos anteriores. O universo dos abrangidos é muito desigual para verbas iguais — praticamente 6 milhões de contos para a mesma realidade, para vários milhões de estudantes no ensino não superior e para algumas centenas de milhares no ensino superior. Constato, e bem, que o orçamento da acção social escolar no ensino não superior aumenta numa percentagem substancialmente superior àquela que se verifica no ensino superior. Mas o mesmo não se passa com os investimentos do Plano. Aí, o aumento continua a ser muito desigual. Presumo que isto tenha a ver com a rede do ensino superior politécnico, ainda um pouco rarefeita, sob o ponto de vista das infra-estruturas sociais, mas gostaria que, se assim não fosse, o Sr. Ministro me esclarecesse da razão da subida de 172 % no ensino superior e de apenas 60 % nos outros graus de ensino.
Sr. Ministro, isto não tem a ver directamente com a discussão neste momento, mas com uma questão de fundo que me parece ser azada colocar, que é o problema da eficácia da aplicação das verbas com a acção social escolar. Julgo que, oportunamente, o Sr. Ministro deveria determinar um estudo quanto à eficácia das verbas que aqui aprovamos e a sua repercussão na área social. Tenho receio de que a máquina administrativa «coma», sobretudo nalguma área do sistema de ensino, parte substancial das verbas que deveriam ser «sentidas» na base pelos estudantes. Portanto, haveria talvez que optimizar a tramitação administrativa, de forma que parte substancial daquilo que estamos a consignar em orçamento para.a acção social escolar não fique «esvaziado» na máquina administrativa, com prejuízo evidente daqueles que deveriam beneficiar das verbas aqui aprovadas. Creio que o Ministério da Educação deveria fazer essa avaliação, para que, em futuras discussões do Orçamento do Estado, pudéssemos ajuizar da validade das verbas que estamos a orçamentar.
O Sr. Presidente: — Estou inteiramente de acordo com a sua sugestão, Sr. Deputado, embora os pressupostos sejam diferentes. Não falaria em vaidades, mas, sim, em
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eficácia política. Penso que os Srs. Deputados desejam que as suas mensagens, em termos de eficácia política, sejam registadas. E não se trata só de as gravar, mas também de as reproduzir e publicar. No entanto, julgo que, sendo V. Ex." um dos distintos membros da direcção do seu grupo parlamentar, tem aí especiais responsabilidades, podendo pôr esta questão à consideração da conferência de líderes parlamentares. Por mim, julgo que é uma boa sugestão, que talvez pudesse contribuir para que os trabalhos, em sede de discussão na especialidade, decorressem mais rapidamente.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins.
O Sr. Guilherme Oliveira Martins (PS):—Começo por manifestar a minha concordância com a sugestão do Sr. Deputado Carlos Coelho, sendo certo que isso também decorre da lei de enquadramento orçamental.
A questão que pretendo colocar é apenas uma e tem a ver com o facto de a prioridade educativa não poder ser uma mera questão contabilística. Os anos de 1992 e seguintes vão ser fundamentais para a aplicação da reforma do sistema educativo — e quando digo «reforma do sistema educativo» reporto-me à necessidade de acompanharmos essa mesma reforma, uma vez que é desse acompanhamento que resultarão as correcções, designadamente no tocante aos currículos, aos programas e à formação de professores —, mas a verdade é que encontro um discurso educativo vago, pobre e fragmentário, como, aliás, ficou hoje aqui patente.
A minha questão reporta-se ao apoio e desenvolvimento pedagógico, mais precisamente à referência específica no Orçamento às tarefas ligadas à reforma do sistema educativo, uma vez que, além de se estar perante uma diminuição em termos nominais dos investimentos do Plano neste domínio, há uma distribuição um tanto estranha, sobretudo nestes anos que vão ser decisivos na aplicação da reforma do sistema educativo, no tocante às verbas previstas no orçamento de financiamento para este efeito.
Vejamos: enquanto no Gabinete do Sr. Ministro da Educação e no do Sr. Secretário de Estado do Sistema Educativo temos verbas, respectivamente, de 250 000 e de 280 000 contos, a verdade é que no Instituto de Inovação Educacional temos apenas 179 000 contos e nas direcções regionais de educação apenas 60000 contos. Parece-me que se trata aqui de uma distribuição um tanto incompreensível, sobretudo, repito, neste especial momento em que nos encontramos.
A minha questão é apenas esta: porquê esta distribuição? Porquê esta colocação da questão da reforma do sistema educativo em termos demasiado centralizados e não em termos de desconcentração ou, até, de descentralização?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António José Seguro.
O Sr. António José Seguro (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: Quero somente colocar três ou quatro questões bastante precisas e tecer algumas críticas à forma como o Sr. Ministro se apresentou nesta Comissão para discutir o orçamento da educação do seu Govemo.
Fujo à tentação matemática de analisar os números e pergunto-lhe como é que o Sr. Ministro consegue traduzir nos números da proposta de orçamento que submete ao Parlamento, e, neste caso, à apreciação desta Comissão, os desafios que enumerou e que vêm elaborados no Programa do Govemo.
Passo a concretizar: como é que pensa vencer a batalha da qualidade do ensino neste país com as escolas degradadas e sem pavilhões gimnodesportivos para a prática da educação física, com a situação deficiente a nível da formação dos professores, com a necessidade que há de investimento nos estabelecimentos de ensino superior público, em Portugal—citei-lhe o exemplo de Coimbra aquando da interpelação do PS em matéria de educação? Onde é que está neste orçamento a tradução desse desafio que, com certeza, todos nós e todos os portugueses partilhamos com o Sr; Ministro? É que, de facto, nós não a vislumbramos. E seria interessante saber, Sr. Ministro, se a perpectiva de concretizar esse desafio vai no sentido de construir mais escolas C+S, ou no de, por exemplo, fazer obras nas instalações que existem e naquelas onde entra água, como, por exemplo, na Escola Secundária de Palmela, no distrito de Setúbal, ou se vai construir pavilhões desportivos, ou se, enfim, vai ter outra estratégia para conseguir esta qualidade, quer no ensino secundário, quer no ensino superior.
A segunda questão tem a ver com a acção social escolar, que também é politicamente relevante para nós. Sr. Ministro, fala-se demasiado em propinas. Estou convencido de que o Sr. Ministro, ontem, quando ouviu o programa Conversa Afiada, certamente sentiu um mal-estar quando percebeu que aqueles dois telefonemas de Braga talvez fossem uma brincadeira e pudessem de certo modo lançar a confusão nos jovens portugueses.
O que é que isto quer dizer, Sr. Ministro? Por que é que o Govemo e V. Ex.' não dizem definitivamente o que pensam sobre as propinas? Por que é que deixam existir esta confusão — isto tem a ver com o Orçamento do Estado—junto dos jovens portugueses, dos pais e junto de todas as pessoas ligadas à área do ensino? Sr. Ministro, o que é que querem em matéria de propinas? Elas vão avançar no sentido dos custos reais ou não? É para o ano?
Outra questão importante prende-se com o apoio social ao estudante. O Govemo percebeu que não podia falar em propinas, pelo menos muito, sem falar alguma coisinha no apoio social ao estudante. De facto, há aqui uma subida na área do apoio social ao estudante. Mas isso, traduzido em termos de atribuição de bolsas e empréstimos, será suficiente ou não será? Quanto é que se gasta em estruturas? Não pensa que teria sido bonito e politicamente relevante dizer que estava a pensar em reestruturar os serviços sociais, nomeadamente no ensino superior? Como é que pensa fazer essa remodelação e quais são as verbas previstas no Orçamento para proceder a essa mesma reformulação? Que rentabilização é que prevê, nomeadamente do espaço físico, e não só, dos recursos humanos nessa matéria e qual é a fórmula que os serviços sociais têm, por exemplo, para poder controlar algumas aberrações que sempre existem na solicitação desses tipos de empréstimo. Seria interessante saber, nesta discussão política do Orçamento — e não dos números —, onde 6 que podemos encontrar essa realidade.
Gostava ainda de saber — também em relação a esta matéria da acção social escolar — se vamos enveredar pela construção de mais cantinas ou não. O jornal diário Correio da Manhã publicava hoje alguns números sobre a construção de cantinas e de snacks, e se não me falha a memória — porque estou a citar de cor — dizia que nos últimos quatro anos construíram-se cinco cantinas!...
Não sei se é verdade ou não — o Sr. Ministro irá corrigir-me—, mas gostava de saber se este ano vão ser construídas mais cantinas ou se vamos apostar em termos de redes de apoio social na construção de residências para
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estudantes do ensino superior. Qual é o modelo? O que é que V. Ex.6 pensa sobre esta matéria e onde é que isso está traduzido no Orçamento? Era importante que nos informasse.
A última questão prende-se com o acesso ao ensino superior, nomeadamente com a abolição do numerus clausus. Sr. Ministro, de que maneira é que este Orçamento traduz a promessa eleitoral feita pelo partido da maioria no sentido de, progressivamente, reduzir e acabar com o numerus clausus em Portugal? Ou seja, no inicio do próximo ano lectivo, com este Orçamento, quantos jovens é que terão acesso às universidades portuguesas e isso representa, em termos deste Orçamento, que esforço feito por este governo?
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, sem prejuízo de concordar com a generalidade das intervenções que apontam no sentido de, por vezes, se verificar aqui um desvio em relação ao verdadeiro objectivo desta sessão, queria lembrar-lhes uma coisa que muitas vezes é esquecida: é que não estamos a discutir só o Orçamento do Estado para 1992, mas também as Grandes Opções do Plano para 1992.
A maior parte das intervenções que aqui são qualificadas como sendo de generalidade têm, a meu ver, pleno cabimento em discussão na especialidade das Grandes Opções do Plano. Normalmente, esquecemo-nos das Grandes Opções do Plano e estamos apenas ligados à questão das verbas e do Orçamento, mas, como sabem, as duas propostas são discutidas em conjunto na especialidade.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): — O Sr. Presidente concordará que há coisas que não têm a ver nem com uma coisa nem com outra!
O Sr. António José Seguro (PS): — O Sr. Deputado Carlos Coelho estava influenciado pela cultura do Ministro das Finanças.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Apolinário.
O Sr. José Apolinário (PS): — Sr. Presidente, respeitarei o debate c os apelos para que se façam perguntas só no âmbito da especialidade.
Em primeiro lugar, gostava de fazer abrir um parêntesis antes de efectuar qualquer pergunta: é natural e normal que o Governo e a maioria parlamentar que o suporta sublinhem aquelas rubricas e aqueles casos em que há uma subida orçamental. No entanto, penso que Portugal precisa de subir mais e de aumentar mais o investimento na educação. Portanto, é desnecessário repetir as subidas percentuais em cada área, porque penso que todos estamos de acordo em que é necessário mais. A nossa diferença é que, eventualmente, em termos de prioridade aumentaríamos mais na área da educação.
A primeira questão que gostaria de colocar prende-se com o Projecto VIDA. Registo a subida de 35 000 para 90 000 contos da verba inscrita no Projecto VIDA. Tal, contudo, em 10 dígitos, representa 0,00136363 do orçamento global do Ministério da Educação, isto é, 5 % de um dia de gastos do Ministério da Educação e cerca de 10 % daquilo que se calcula que seja o valor global do tráfico de droga, por dia, em Portugal. Quer dizer, se existirem entre 80 000 e 100 000 toxicodependentes em Portugal e se gastarmos um média de 10 000$ com cada
um desses toxicodependentes, sabendo que, por exemplo, um consumidor de heroína pode gastar seguramente 20 000$, isto representa 10 % do valor global do tráfico de droga por dia.
Por outro lado, no passado, a verba orçamentada no Ministério permitiu apoiar projectos em 60 escolas, o que, desde logo, coloca aqui uma primeira questão. Atendendo à verba ora inscrita, qual é o número de escolas que vai ser abrangido pelas acções do Projecto VIDA, qual a sua distribuição a nível de direcções regionais de educação e qual a repartição de despesas entre pessoal e as iniciativas? Para justificar este sub-item, devo dizer que a verba inscrita era de 35 000 contos, mas 11 000 contos eram para os destacamentos e 24 000 contos, é que eram para os projectos em concreto. Portanto, agora, em relação aos 90 000 contos, qual é a repartição entre gastos de estrutura e gastos de iniciativas? Em suma, mantém-se a filosofia?
Não basta ir à televisão dizer que há uma directiva no sentido de que a polícia dê mais cobertura às escolas. Quer dizer, estamos a assistir em Portugal a uma bola de neve já que todos os dias há manifestações sobre segurança nas escolas e é necessário não apenas responder do ponto de vista mediático, mas a jusante, ou seja, na área da prevenção primária. Portanto, gostava de saber qual é a filosofia que vai ser implementada já que, certamente, do ponto de vista orçamental, isso tem custos.
Sr. Ministro, dou-lhe mais outro número baseado em informação pública e que diz que no ano passado se candidataram 220 escolas para esses projectos. Mesmo assim, os 90 000 contos, mantendo-se a mesma percentagem de estruturas e de iniciativas, não seriam suficientes para apoiar o conjunto de projectos presentes ao longo do ano de 1991. Portanto, este é um conjunto de questões a propósito de droga.
A segunda questão prende-se com a artigo 9." da proposta de lei do Orçamento do Estado, que prevê a cessação dos destacamentos em 31 de Agosto do corrente ano. Sr. Ministro, gostava de saber em que medida é que isso está previsto, do ponto de vista orçamental, em termos financeiros, já que a informação de que disponho é que todos os responsáveis da tutela quando chegaram ao Ministério propuseram-se acabar com os destacamentos. Mas o problema é saber se depois haverá as verbas necessárias para os quadros técnicos das direcções regionais de educação, etc.... No caso concreto da Direcção Regional de Educação do Algarve, quero saber se está prevista, finceiramente, a existência de um quadro técnico sob pena de o Governo, ao apresentar esse n.B 1 do artigo 9.B da proposta de lei do Orçamento do Estado, estar a apresentar algo que não vai, de facto, praticar.
Ainda sobre a Direcção Regional de Educação do Algarve, gostava de saber se a verba de 205 000 contos, inscrita no PIDDAC, vai permitir instalações próprias e condignas para a referida Direcção Regional de Educação e se, no Orçamento, estão previstos os custos financeiros decorrentes da publicação de uma lei orgânica, que terá necessariamente consequências do ponto de vista orçamental, e que, segundo o Sr. Ministro já informou, está para ser publicada.
Há casos concretos de candidaturas ao PRODEP apresentadas pelas autarquias que não vêm referenciadas. Admito que do ponto de vista orçamental não tivessem que vir descriminadas. Mas penso que a Comissão de Educação, Ciência e Cultura e a Comissão de Economia, Finanças e Plano deviam ser informadas do quadro geral da gestão do PRODEP, uma vez que, por exemplo, no caso
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do Algarve, a informação que tenho é de que as escolas C+S de Armação de Pêra ou de São Brás de Alportel não estão inscritas no PIDDAC aqui presente, mas são candidaturas ao PRODEP apresentadas pelas autarquias. Presumo que haverá muitos outros casos no País. Penso, pois, que, estando em sede de discussão na especialidade, a Comissão deveria ser informada sobre quais eram esses casos. Portanto, desde já ficava essa sugestão.
Uma última questão relaciona-se com os quadros de pessoal administrativo nas escolas. É um tema que está neste momento a ser muito associado à questão da segurança, uma vez que as escolas não têm pessoal administrativo auxiliar e, portanto, prescindem das portarias, etc.... Só para dar um número ao Sr. Ministro, calcula-se que só na região do Algarve faltem abrir concursos para 800 vagas. Isto são números de Dezembro de 1991.
Portanto, gostava de saber o que é que, em termos orçamentais, está previsto nesta área específica, uma vez que me parece que, se o Sr. Ministro não der saltos positivos nesta área, as manifestações sobre a questão da segurança continuarão tal como na área da administração.
O Sr. Presidente:—Tem a palavra o Sr. Deputado António Martinho.
O Sr. António Martinho (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, acontece que vou deixar de parte as questões relacionadas com a educação pré-escolar, que já foram aqui abordadas, e passar a questões relacionadas com o ensino básico e secundário. Algumas prendem-se com a situação do decréscimo das verbas atribuídas, por exemplo, a instalações nos ensinos básico e secundário, em que se verifica um decréscimo de 3 milhões de contos, e ao apetrechamento de novas salas de aula, onde também se verifica um decréscimo de 450 000 contos.
Isto tem a ver com a qualidade das condições cm que decorre o trabalho na escola porque, convenhamos, será muito mau exigir às crianças e aos professores que estejam em salas de aula onde chove.
Este problema tem a ver, ainda, com o quadro do pessoal auxiliar da acção educativa. Penso que é a este quadro que o Sr. Deputado José Apolinário se referia mais concretamente.
As dificuldades com que as escolas se debatem neste momento são grandes. O problema da segurança das escolas não se resolverá só mandando a polícia montada para junto das mesmas. Penso que, em termos de prevenção, o alargamento do quadro de pessoal auxiliar da acção educativa pode ser um bom contributo para resolver algumas questões da segurança nas escolas.
É costume dizer-se, em resposta às questões do ensino básico, que as autarquias têm aí um papel a desempenhar. Gostaria de lembrar que as autarquias se queixam de terem sido defraudadas em 55 milhões de contos no actual Orçamento porque consideram que teriam direito a mais do que esse montante nas verbas relativas à comparticipação do Orçamento do Estado para o orçamento das autarquias. E um problema que urge levantar. E se compararmos o documento que nos foi distribuído na sessão de há dias com o documento similar do ano passado, constatamos que há uma rubrica no Orçamento do Estado do ano passado que dizia «FEDER/Autarquias — 2,3 milhões de contos». Isto poderia ser uma forma de proporcionar meios às autarquias para obstar a problemas ligados ao ensino básico, só que no Orçamento de 1992
nada consta. Assim, agradecia que o Sr. Ministro se pronunciasse sobre estas questões que acabei de levantar.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Fernando Pereira Marques.
O Sr. Fernando Pereira Marques (PS): — Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: Vou ser muito breve e gostaria de colocar, em termos meramente orçamentais, algumas questões entretanto já aqui abordadas por outros colegas, mas que não posso deixar de colocar.
Relativamente à questão da difusão da língua e da cultura portuguesa no estrangeiro existe, de facto, uma redução no Orçamento, na medida em que, no Orçamento de 1991, a dotação prevista aumentava em 32 % a relativa ao Orçamento de 1990. De facto, este ano, a dotação atribuída a esta rubrica significa uma quebra de 4,73 % relativamente ao orçamento inicial de 1991, porque esses 17,2 % a que se refere o Sr. Ministro dizem respeito à dotação deste ano em relação à verba executada no Orçamento do ano passado, o que levanta uma outra questão, qual seja a de que houve um excesso de economia e um excesso de ineficácia naquela que é considerada uma prioridade do Governo: a difusão da língua e da cultura portuguesa.
Quanto a esse cada vez mais fantasmático Instituto Camões, que já não sei se é instituto, se é centro ou se é liceu, o facto é que, no Orçamento deste ano, não existe qualquer rubrica específica sobre esse instituto, que, mais uma vez, foi realçado na intervenção do Sr. Ministro. Em sede de comissão, o Sr. Ministro explicou-nos que as verbas se iriam buscar ao ICALP e à Direcção-Gcral de Extensão Educativa. Só que, se formos comparar a dotação do ICALP para este ano com a do ano passado, verificamos que existe uma redução, pois a dotação desse instituto, no ano passado, era de 1,222 milhões de contos e a deste ano é de 810 600 contos.
Por outro lado, quanto à Direcção-Geral de Extensão Educativa, existe, de facto, um aumento, pois, no ano passado, a dotação era de 4 196 972 contos e a deste ano é de 4,4 milhões de contos. Ou seja, se de facto se acentua de tal maneira a importância desse tal instituto, centro ou liceu — talvez fosse preferível chamar-lhe a «coisa» —, não existe uma coerência entre essa prioridade estratégica e as dotações orçamentais atribuídas.
Sobre a questão do ensino da educação artística, queria simplesmente pedir ao Sr. Ministro que explicasse a redução da dotação atribuída ao GETAP, que passou de uma verba de 2,31 milhões de contos, no ano passado, para 990 000 contos, este ano, o que aconteceu possivelmente por boas razões, mas gostaria de as ouvir.
Gostaria ainda de saber se esta equipa ministerial continua a considerar como suas prioridades, no domínio da educação artística e do ensino artístico especializado, as prioridades definidas em Outubro de 1991 pela anterior equipa e, nessa medida, se pensa implementar as propostas de decretos regulamentares relativos à música, à dança, à expressão dramática, ao teatro, ao cinema e ao audiovisual. Em caso afirmativo, gostaria de saber onde é que está a tradução orçamental para essas medidas tão importantes e renovadoras.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, quero informá-los que já se encontra no Palácio o Sr. Ministro da Indústria e Energia. Como é óbvio, não posso deixar de dar a palavra ao Sr. Ministro da Educação — foi para ser ouvido que ele cá veio — e, assim sendo, pedia ao Sr. Deputado Lemos Damião, a quem darei de seguida a palavra para
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uma segunda intervenção, que fosse rápido no seu pedido de esclarecimento. Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Lemos Damião (PSD): — Com certeza, Sr. Presidente, serei muito breve.
Sr. Ministro da Educação, não há dúvida nenhuma de que a grande preocupação dos pais, dos professores e dos alunos é, de facto, a segurança nas escolaa. E sentimos isso porque cada vez é maior o número de marginais que invadem os estabelecimentos de ensino. Por essa razão, coloco-lhe já a minha primeira dúvida: sendo os edifícios escolares invadidos por essa espécie de gente — pelos amigos do alheio —, pergunta-se se o Orçamento do Estado não deveria contemplar também uma verba para que todos os edifícios escolares fossem seguros.
Em segundo lugar, colocar-lhe-ia a seguinte questão: parece-me haver uma discrepância muito grande entre o seguro escolar para o ensino básico e secundário e o do ensino superior. Verifico que, no ensino básico e secundário, existe uma verba para seguro escolar de 3000 contos e, para a promoção da educação, uma verba de 5000 contos, mas que, no ensino superior, só para prevenção de acidentes, é atribuída uma verba de 112 000 contos. Ora, parece-me que teremos de dar um pouco mais de atenção as crianças que frequentam o período da escolaridade obrigatória.
Depois, Sr. Ministro, uma outra questão que lhe queria colocar é relacionada com aquela que nos obriga a reconhecer que a educação tem este ano o maior «bolo» de sempre, só que sabemos bem também que, para a educação, o dinheiro nunca chega, motivo por que me dá mais tranquilidade saber que o dinheiro que vamos ter vai ser bem gerido do que o facto de haver mais dinheiro. Mas, nisso, confio inteiramente em V. Ex.a e na sua equipa, por que, de certeza absoluta, teremos melhor gestão, uma vez que já nos deu alguns indícios disso.
No entanto, não posso deixar de colocar-lhe algumas questões, como, por exemplo, a das colocações dos professores.
O Sr. Ministro e o País sabem que muitas das vezes, por deficiência de uma colocação mal feita, algumas escolas chegam a ter 11, 12, 13, 14 ou 18 professores, o que leva a, por vezes, quatro alunos ficarem ao País eu sei lá por quantos milhares de contos por ano, motivo por que a minha pergunta é inevitavelmente esta: o Sr. Ministro pensa, de facto, rever a colocação dos professores, tendo em vista criar um verdadeiro poder autóctone para que estes possam ficar colocados, se possível, na sua terra ou, pelo menos, na sua região, no seu concelho, no seu distrito? E que, assim, teríamos a certeza absoluta de que, quando colocássemos um professor, ele ficaria nessa escola todo o ano.
O problema da mobilidade dos professores é outra questão que o Sr. Ministro colocou muito bem, mas que penso que terá de ser ascendente e descendente. O que é preciso é que os professores tenham uma formação básica comum, que tenham um tronco comum. Por isso mesmo, permito-me saudá-lo pelo facto de ter programado cursos de quatro anos, pois, assim, haverá uma maior aproximação, tendo em vista a criação de apenas uma categoria de professores, para que estes possam, finalmente, ter não um estatuto de carreira mas um estatuto de função.
Depois, julgo que teremos de ter em conta o aproveitamento de algumas instalações que sobram e que nos podiam permitir, uma vez que ficam vagas, alargar a rede do ensino p&primário. Creio, Sr. Ministro, que é imperioso darmos uma certa atenção a esse problema, tanto mais que, por vezes, se trata de uma questão de gerir precisamente os meios que temos, ou seja, gerir edifícios que ficam
abandonados e que poderiam permitir, com alguns professores, neste caso educadores — que também são capazes de estar desaproveitados —, alargarmos a rede do ensino pré-primário.
O Sr. Ministro falou também numa outra questão que me parece ser importante, ou seja, que é preciso começarmos a pensar nas aldeias pedagógicas. E isto porquê? Porque se as criássemos — e poderíamos fazer uma experiência piloto —, poderíamos aproveitar melhor a rede dos transportes escolares. Muitas vezes os autocarros destinados a esse fim vão meio cheios ou com um terço da sua capacidade e poderiam ser usados para deslocar as crianças de outros escalões etários, o que seria bastante positivo.
Depois, queria colocar-lhe ainda duas questões, estas mais melindrosas, mas não me vai levar a mal que lhas coloque. Uma delas refere-se ao n.fi 1 do artigo 9.°, ou seja, ao problema dos destacamentos. Temos consciência de que o problema do pessoal destacado é um problema ancestral, temos mesmo conhecimento de que alguns serviços, se lhes tirarem os elementos destacados, não poderão efectivamente funcionar, mas também sabemos que há destacamentos e destacamentos. Aqueles que, por ventura, produzem trabalho com eficiência, com dedicação e, ao mesmo tempo, com rentabilidade, não entende o Sr. Ministro que deveriam ser mantidos? Seria uma forma de aproveitar os seus serviços.
Sabemos quantas vezes os funcionários se servem de subterfúgios, de falsas doenças — e deixe-me falar assim — para fazer que fazem e, ao fim e ao cabo, vamos deixar em texto de lei a possibilidade que as pessoas não sejam destacadas para produzir obra séria?
Para terminar, pedia-lhe o seguinte: creio que todos somos sensíveis ao problema de os professores, quando motivados, renderem muito mais. Ora, se a educação é um investimento, como o Sr. Ministro diz e muito bem, queria pedir-lhe que me autorizasse a que lhe faça o pedido formal de investir nos professores, não só na sua formação, mas, fundamentalmente, em reparar algumas injustiças. Creio que seria possível — e tenho pena de que não se encontre já presente a Sr.' Secretária de Estado do Orçamento, pois dirigir-lhe-ia este pedido — serem distribuídos mais alguns para a educação, tostões que se destinariam à reparação da situação de injustiça daqueles professores que, fruto dos Decretos-Leis n.°* 408/89 e 409/89, não vêem todo o tempo de serviço que prestaram ser-lhes contado. Isso pouco mais dinheiro custaria c seria bom que fosse feito.
E termino dizendo ao Sr. Ministro o seguinte: somos, de facto, muito sensíveis aos problemas do ensino especial. Sabemos que essa matéria tem sido tratada com amor, com carinho e todos os anos somos subsidiados para atender a todas as crianças que carecem desse ensino. Se o Sr. Ministro puder ajudar estes colégios, para que eles continuem com as portas abertas, fico-lhe muito grato e fica justificada a minha repulsa de há pouco porque ela deveu-se, única e exclusivamente, ao facto de, ainda há dias, cu ter recebido na Comissão de Educação, Ciência e Cultura o representante destes colégios e estar preocupado por a Sr.* Deputada não ler aparecido.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Educação. Sr. Ministro, peço-lhe que introduza também nesta sua resposta final as questões que foram levantadas pelo Sr. Deputado António Filipe, que, há pouco, por minha sugestão, não falou nelas.
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O Sr. Ministro da Educação: — Começarei por responder ao Sr. Deputado Fernando de Sousa, que referiu aqui algumas questões, nomeadamente a do aumento dos vencimentos dos professores. Como sabe, Sr. Deputado, está planeado haver um acrescento para estes aumentos. Quanto aos escalões, obviamente que o seu financiamento e o respectivo pagamento está previsto neste orçamento. Mal seria que o não estivesse!
Em relação ao IN1C, que o Sr. Deputado também referiu, posso dizer-lhe o seguinte: obviamente que o Governo e o País precisam da investigação e, se olharmos para os diversos orçamentos, nomeadamente para o agora proposto e se soubermos quais os dinheiros do PEDIP, do PRODEP e do Projecto Ciência, é muito fácil chegarmos à conclusão de que nunca houve tanto dinheiro para a investigação. E ainda bem que assim é!
Não dramatizemos a situação. Nunca houve tanto dinheiro para a investigação como haverá em 1992, de modo que não dramatizemos esta situação, nomeadamente a do INIC. O que se quis fazer com esse instituto foi aumentar a coordenação do sistema. No fundo, é um movimento parecido com aquilo que se quis fazer também com o Instituto Camões. A actividade do INIC precisa de ser coordenada com a da JNICT, pois existiam muitas comissões paralelas e muita representação no exterior onde, por vezes, se encontravam um membro português a representar o INIC e um outro a representar a JNICT. Ora, isto não pode acontecer.
Assim, o que se verifica neste momento é uma acção no sentido de ser realizada uma maior coordenação na investigação. Ninguém pode falar em diminuir a verba para a investigação científica em Portugal, antes pelo contrário, essa verba será muito aumentada.
A Sr.e Deputada Edite Estrela falou numa certa confusão que eu terei lançado sobre a orgânica do Instituto Camões e sobre os orçamentos. Gostaria de referir que há efectivamente um aumento de financiamento e de valor para a divulgação da cultura e da língua portuguesas. Trata-se de um aumento que resulta dos dinheiros do ICALP e da Direcção-Geral da Extensão Educativa e que é, no total, de cerca de 20 %. Em lado nenhum um aumento de 20 % se pode considerar pequeno, quando, aliás, o valor de base já nem é muito pouco. Temos, assim, previsto um aumento de 20 %.
Não posso também deixar de referir que haverá necessidade de o Instituto Camões ter um certo tempo para a sua implementação. Ele foi aprovado em Conselho de Ministros, mas ainda nem sequer saiu o respectivo decreto-lei. Julgo, em suma, que um aumento de 20 % para uma iniciativa que ainda nem sequer está vertida no Diário da República não deixa de ser significativo.
Em relação ao Instituto Camões, aos centros, aos liceus, etc, talvez seja oportuno voltar a abordar a questão. Fi-lo muito rapidamente porque julguei que já tinham conhecimento do que se planeia fazer ligado ao Instituto Camões.
Vai haver, em Portugal, uma estrutura muito leve — o Instituto Camões — que terá o Ministério da Educação por tutela. Essa estrutura irá ter grande coordenação com dois outros ministérios, o Ministério dos Negócios Estrangeiros e a Secretaria de Estado da Cultura. O que se pretende é que esta leve organização, em Portugal, tenha delegações noutros países, nomeadamente em França, no Luxemburgo e naqueles países onde há predominantemente um maior número de emigrantes portugueses. Pretende-se que haja uma estrutura local em cada um desses países, porque não queremos estar, de Lisboa, a comandar constantemente o que se passa na divulgação da cultura e da língua portuguesas em todo o mundo. Tem de haver centros locais.
É sob este prisma que existe o Instituto Camões, como organização central, leve, sediada em Lisboa, e irão depois existir Centros Camões nos diversos países.
E natural e muito desejável que nalguns deles apareçam escolas secundárias, às quais, com um certo saudosismo e até lembrando a existência do Liceu Camões, que frequentei, se poderá chamar «Liceus Camões». Seria, de facto, muito digno que em Luanda, em Maputo e noutras cidades aparecessem as «Escolas Secundárias Camões» ou «Liceus Camões», o que não faria nada de mal. Em Lisboa, temos, por exemplo, o Liceu Francês, o Instituto Franco-Portugais, a Alliance Française e o Goethe Instituí. Trata-se de uma iniciativa nova em Portugal que, todavia, se tem mostrado muito positiva noutros países. Iremos, pois, tentar fazer uma iniciativa semelhante usando o referido Instituto Camões.
Falou a Sr.' Deputada Lourdes Hespanhol...
A Sr.' Edite Estrela (PS): — Peço desculpa por o interromper, Sr. Ministro, mas não respondeu à questão do acordo ortográfico, por mim colocada.
O Orador: — Sim, Sr.* Deputada, responderei de imediato.
Para isso, há neste momento montantes inscritos nos gabinetes, nomeadamente no meu e no do Secretário de Estado, cuja razão de ser é a de haver uma certa flexibilidade. Pretendemos fazer gastos em matéria de acordo ortográfico, dependendo da sua evolução.
Trata-se, contudo, de um assunto em relação ao qual, segundo julgo, a Assembleia da República não pode pedir ao Estado que faça tudo. Não pode pedir ao Estado que, designadamente, faça dicionários e promova a publicação de livros. Muitas dessas tarefas são da área da iniciativa privada, não devendo o Estado, nomeadamente através do Orçamento, querer fazer com que todas as iniciativas que se verifiquem nesta área ocorram no âmbito do Ministério da Educação. Deixemos também a iniciativa privada evoluir e trabalhar nesta matéria
Referiu a Sr.1 Deputada Lourdes Hespanhol que o Orçamento foi aprovado, na generalidade, apenas com os votos do PSD. Julgo que a Sr.1 Deputada cometerá um erro se não apoiar este Orçamento.
Risos.
Peço-lhe, pois, que apoie também o Orçamento. Tenha confiança no futuro. Apoie este Orçamento e verá que no próximo ano todos estaremos melhor. Acredite em nós!
A Sr.* Lourdes Hespanhol (PCP): — Não acredito, porque há nele coisas inacreditáveis!
A Sr.1 Maria Luísa Ferreira (PSD): — Não acredita porque só quer fazer oposição!
O Orador: — Olhe que não é preciso milagres para que Portugal evolua rapidamente, Sr.1 Deputada Lourdes Hespanhol! Temos é de gerir bem, ter o Orçamento apropriado e objectivos bem definidos...
A Sr." Lourdes Hespanhol (PCP): — Onde é que eles estão, Sr. Ministro? Não brinque connosco!...
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados e Sr. Ministro da Educação, solicitar-vos-ía que evitassem o diálogo, por estarmos muito atrasados nos nossos trabalhos e não ser justo fazer esperar os titulares da pasta ministerial Cuja discussão se segue.
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Além disso, os Srs. Deputados sabem perfeitamente que podem convocar, convidar ou pedir ao Sr. Ministro que compareça na Comissão de Educação para responder às questões que eventualmente não fiquem esclarecidas.
Faça favor de continuar, Sr. Ministro.
O Orador: — No que se refere às diversas iniciativas na área de Beja, folheámos os nossos dossiers, enquanto a Sr.8 Deputada referia esse assunto, e verificámos que há bastantes iniciativas a tomar na área de Beja. O que lhe posso dizer é que a Sr.8 Deputada está de parabéns por ter sido eleita pelo círculo de Beja, porque vai haver muitas iniciativas positivas em Beja e nos seus arredores.
A Sr.5 Lourdes Hespanhol (PCP): — Os seus dossiers são diferentes dos meus!
O Orador: — Confiemos, então, em que os nossos estejam mais certos, para que Beja veja lançadas muitas iniciativas em 1992.
No que loca ao Programa MINERVA e a outros programas aqui focados, gostaria de referir que o Programa MINERVA, depois de há vários anos ter tido montantes significativos, irá ter, para 1992, 1,1 milhões de contos, o que não é pouco. O montante de 1,1 milhões de contos para este programa é realmente significativo.
Há que referir que este programa existe já há vários anos e, além do mais, não nos podemos esquecer que estão planeadas outras actividades na área da informática, nomeadamente ligadas à administração e gestão das escolas, para lançar em 1992. Considero haver um montante significativo para lançar na área do Programa MINERVA e na área circundante, ou seja, na área da informatização das escolas.
Quando a Sr.8 Deputada fala em cortar o tempo de duração nos cursos, dir-lhe-ía que isso tem de acontecer...
A Sr.9 Lourdes Hespanhol (PCP): — Eu não digo que não!
O Orador: — Certo, satisfaz-me saber que a Sr.8 Deputada Lourdes Hespanhol também está de acordo em que se corte na duração dos cursos. Óptimo, porque também eu estou de acordo...
A Sr.8 Lourdes Hespanhol (PCP): — E que não se espere!
O Orador: — É claro que não se espera! Não poderíamos esperar anos e anos para depois lançar a formação contínua. Estamos a pensar lançar — e lançaremos — a formação contínua já em 1992. Também em 1992 trabalharemos, obviamente, no sentido de diminuir a duração dos cursos, o que tem de acontecer. Seria muito mau para a juventude portuguesa, para Portugal em geral e para todos nós que o País estivesse desnecessariamente a prolongar os cursos. Os jovens querem ir trabalhar e têm o mercado de emprego à espera deles. É, pois, muito má gestão manter os jovens no sistema educativo para além daquilo que é necessário terem.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): — A Sr.8 Deputada já percebeu!
O Orador: — Como, além disso, as minhas palavras ficaram gravadas, talvez não seja necessário voltar a abordar esta questão.
Em relação ao PRODEP, existe muita informação que poderemos facultar aos Srs. Deputados. É até frequente aparecerem nos jornais os resultados de diversos concursos que surgem no âmbito do PRODEP. Não nos podemos esquecer, por outro lado, de que este programa está sujeito— e frequentemente assim acontece — a auditorias da Comunidade. Não há grande perigo — a Sr.8 Deputada pode estar tranquila nesse aspecto — de se registar alteração nas verbas do PRODEP. Não se prevê que venha a haver qualquer alteração nessas verbas.
Quanto às questões colocadas pelo Sr. Deputado Carlos Coelho, acho bem que, para evitar estarmos constantemente a falar do mesmo assunto, estas reuniões sejam gravadas, porque tal facto permite que possamos depois ler as actas em casa, voltar a verificar as diversas questões abordadas e estudá-las. Para além das tais trinta e cinco horas por semana, podemos ainda estudar os textos em casa e analisar com cuidado o que foi dito e registado.
Relativamente aos aumentos assinaláveis, nomeadamente no ensino superior, quero salientar que o aumento da verba inscrita para este efeito ronda os 85 % do PIDDAC e resulta efectivamente das actividades do PRODEP, no âmbito do qual temos um programa, destinado ao ensino superior, para fazer infra-estruturas em grande quantidade. Iremos gastar mais de 40 milhões de contos em infra--estruturas no ensino superior, o que tem de ter a contrapartida portuguesa. É por isso que o PIDDAC é, nesse aspecto, um pouco superior no ensino superior do que no ensino não superior. De qualquer modo, mesmo em relação ao ensino não superior, o aumento é de mais de 20 %, o que também é aumento significativo.
No que concerne as propinas e às receitas próprias, esta questão foi já referida por várias vezes. Só não tenho abordado aqui e nos órgãos da comunicação social a questão das propinas, assim como a da acção social escolar, por se tratar de assuntos que irão ser objecto de uma lei que terá de ser apreciada na Assembleia da República. Julgo que teria um mau comportamento, como ministro, se começasse a passar para a comunicação social, que está constantemente à procura destes valores, informações sobre essa matéria sem ela ser discutida e trabalhada. Estamos já a fazer isso com o Conselho de Reitores e com o Conselho Coordenador dos Politécnicos, esta semana voltaremos a receber as federações e os estudantes e temos vindo a trabalhar com as associações de estudantes no sentido de se discutir esse problema de uma forma coordenada e ponderada.
Ninguém pode pensar que um aumento que não se verifica há 50 anos possa agora ocorrer de um momento para o outro, sem haver uma certa preocupação. Temos de nos preocupar com esta matéria e não ir para os jornais dizer que vamos aumentar «isto», «aquilo» ou «aqueloutro», porque esse problema tem de ser trabalhado e planeado.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Muito bem!
O Orador: — O Sr. Deputado José Apolinário acabou de exibir um recorte de jornal com um artigo sobre a acção social escolar, no qual se diz, segundo julgo, que na passada sexta-feira houve uma reunião com o Conselho de Reitores onde se falou da acção social escolar e da proposta de lei que estamos a planear nessa matéria e que será apresentado na Assembleia da República. Nessa proposta de lei procuramos promover a eficácia da acção social escolar e queremos alterações significativas ao que acontece neste momento.
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Já agora, conto-lhe uma peripécia. Quando teve de haver orçamento suplementar, verificou-se que na área da acção social escolar quase um terço do montante era para vencimento dos funcionários. Assim, esperamos que a Assembleia da República nos ajude a alterar esta situação, pois não queremos pagar a mais funcionários c chamar--Ihe acção social escolar. O que queremos é que os montantes gastos em acção social escolar sejam para bolsas de estudo, para apoio a cantinas, a residências e, eventualmente, a bibliotecas. Enfim, queremos que os montantes promovam efectivamente o bem-estar dos estudantes nas escolas e nas universidades.
Antes de vos apresentarmos uma lei, temos dc trabalhar com os reitores, com o Conselho Nacional de Educação e com os estudantes, de modo que, quando o projecto vier aqui, já esteja bastante discutido com as diversas forças em causa, esperando que nessa altura os Srs. Deputados nos ajudem. Para já, não queremos divulgar muito o que estamos a planear, mas trabalharemos no sentido da eficácia e da eficiência da acção social escolar.
O Sr. Carlos Coelho (PSD): — Muito bem!
O Orador: — O Sr. Deputado Guilherme Oliveira Martins focou a questão da prioridade da educação e da reforma educativa. Repito que a nossa prioridade é a de lançar rapidamente no sistema de ensino os novos curricula. Pretendemos que no ano de 1994-1995 todos os alunos estejam já a utilizá-los e julgamos que um período de menos de três anos, que é o tempo que estamos a planear para alterar completamente o que se passa nos ensinos básico e secundário, é um exagero. Assim, espero que a Assembleia da República e os Srs. Deputados nos ajudem, no sentido de promover as alterações que têm de fazer-se.
O Sr. Deputado António José Seguro falou em críticas e disse que fugia à tentação matemática de apreciação dos números. Na minha opinião, julgo que não é de fugir, pois, no fundo, todos temos de trabalhar com números e com dinheiro. Portanto, no âmbito das iniciativas que vamos ler, julgo que o Sr. Deputado não quer trabalhar com os números porque não lhe interessa, uma vez que o orçamento até é bom.
Vamos, então, falar em números, pois só temos a ganhar com isso. Ganha o sistema educativo, ganhamos todos, enfim, ganha o País.
Risos.
É verdade, o orçamento é bom!
Em relação à acção social escolar, não vale a pena voltar a referi-la porque já falei nesta matéria.
Gostaria agora de referir que temos de fazer um reenquadramento do orçamento. Isto porque, se olharmos para o orçamento, verificamos que grande parte dele é gasto em pessoal e só uma pequena parte é gasta em funcionamento. Temos, pois, de alterar esta situação, em benefício do sistema educativo. Consideramos estar muito ambiciosos em relação ao desenvolvimento total e integral do sistema educativo, não só nos ensinos básico e secundário mas também no ensino dos mais velhos. No entanto, há uma preocupação que temos de ler — a preocupação orçamental, ou seja, primeiro temos de ver se existe ou não um «cano» com alguns buracos por onde fogem os valores e só então chamamos o canalizador para tapar os referidos buracos, conforme ouvi dizer ontem à noite.
O Sr. Deputado falou também na abolição do numerus clausus. Nesta matéria, julgo que o que se pretende não é
a sua abolição, pois isso não faz sentido. O que acontece é que temos universidades que, caso entrassem todos os candidatos, teriam de fechar, em virtude do grande número de alunos que pretende frequentá-las. Deste modo, o numerus clausus tem sempre de existir, mas o que se pretende é um bocadinho diferente. Pretende-se que todos os estudantes possam ter acesso ao ensino superior. Por seu lado, o conceito de numerus clausus significa algo isolado para cada instituição, ou seja, é o mesmo que dizer que para medicina podem ir 500, para engenharia podem ir 1000, para não sei quê podem ir não sei quantos...
A Sr.! Julieta Sampaio: — Nós sabemos, Sr. Ministro.
O Orador: — Aquilo que pretendemos, no global, é que o número de vagas seja semelhante ao número de estudantes que querem entrar, o que é diferente do actual numerus clausus.
A Sr.' Julieta Sampaio (PS): — E as opções de cada um não contam, Sr. Ministro?
O Orador: —Contam, é óbvio que contam. Por isso, temos de comparar as opções, as provas dadas, aquilo que cada um pretende fazer e o que as instituições conseguem dar a cada um. A Sr.1 Deputada não pode querer incluir 5000 ou 10 000 alunos numa escola de medicina que, por exemplo, só pode comportar 500. Isto é óbvio e a Sr.B Deputada deve compreendê-lo!
O Sr. Deputado José Apolinário falou no Projecto VIDA, que julgo ser um projecto de grande significado. Em relação a esta matéria refiro-lhe que os 90 000 contos dc que dispomos são verbas de funcionamento, e permita--me uma chamada de atenção para o sucesso que aquela iniciativa tem tido nas 60 escolas em que foi aplicada.
Gostaríamos que o que se passou nestas 60 escolas fosse estendido, este ano, a outras tantas. É óbvio que ainda não podemos estender o programa «Viva a Escola» a todas as escolas que gostariam de estar envolvidas, mas vamos fazer um grande esforço para chegar perto da duplicação do número que referi.
O Projecto VIDA é um projecto que realmente trata de um assunto muito importante para a sociedade portuguesa, envolve vários ministérios e é considerado um projecto de grande capacidade, que lem tido resultados bastante positivos. Na área da educação continuaremos, pois, a implementar as iniciativas no âmbito do projecto «Viva a Escola».
Em relação à questão dos destacamentos, e já o disse mais do que uma vez, o País gasta muito dinheiro na formação de um professor e, portanto, esse professor, que foi formado para ensinar, deve ir para a escola. O que pretendemos com o corte dos destacamentos é isso mesmo. Os professores devem ir para as escolas ensinar e dar-lhes vida. Não queremos que haja professores a fazer trabalho administrativo, pois isso é algo que não tem sentido, que não é mais do que um desperdício de professores e de dinheiro.
O Sr. Carlos Coelho çpsd): — Muito bem!
O Orador: — Em relação ao quadro de pessoal administrativo, temos uma boa notícia, que é a homologação cs 2000 contratos em 1992.
A questão da segurança nas escolas é muito importante e estamos a tratá-la com todo o interesse e com grande
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reflexão. Estamos a trabalhar conjuntamente com o Ministério da Administração Interna no sentido de promover acções nas escolas. Por outro lado, estamos a reforçar o
gabinete coordenador da segurança nas escolas e a trabalhar para que se actue na área da prevenção da segurança. As iniciativas são várias e permitam-me que ainda não as divulgue aqui, mas planeámos, para 1992, várias acções no sentido de dar o maior conforto e a maior segurança aos estudantes.
Quanto às artes, permita-me que refira o seguinte: estamos bastante interessados no desenvolvimento das artes e ofícios e encarregámos o Gabinete de Educação Tecnológica, Artística e Profissional (GETAP) de continuar a trabalhar nesta matéria, mediante a atribuição de um montante que regista uma subida significativa. Existe, de facto, uma grande preocupação da nossa parte em desenvolver estas novas áreas.
Em relação à colocação de professores, que o Sr. Deputado Lemos Damião referiu, trata-se de um assunto que pretendemos desenvolver em 1992, uma vez que há efectivamente bastante a fazer nesta área. É evidente que aquilo que fizermos agora só terá aplicação para o ano, mas estamos a planear apresentar, nos próximos meses, novos processos, novas metodologias, sobre a colocação dos professores, no sentido de lhes possibilitar um maior bem-estar perto das suas zonas de interesse.
Esta é uma questão importante, uma vez que deparamos com a situação de haver escolas por onde passam 10 e 15 professores por ano, os quais, sendo poucos, ainda geram um acréscimo de despesas, uma vez que todos apresentam atestados médicos ou tentam várias maneiras de não ir para estas zonas. Temos, pois, de trabalhar no sentido de melhorar esta situação, quer no âmbito da forma de colocação dos professores, quer no âmbito do fenómeno da rede de escolas, como o Sr. Deputado referiu.
A mobilidade dos professores foi o que pretendemos conseguir com um destes diplomas que divulgámos. Pretendemos essa mobilidade para cima e para baixo, ou seja, do 1.° ciclo para o 2.9, do 2.° para o 3.fl, do 3.9 para o 4.°
Em relação aos destacamentos, e para terminar, pretendemos valorizar os professores. Não se trata de, pelo facto de não termos dinheiro, darmos um professor, uma vez que um professor tem um valor enormíssimo. Quando haja professores que tenham de trabalhar, eles irão para o ensino especial ou até mesmo para o ensino e divulgação da língua portuguesa no estrangeiro mas não lhe chamemos coisas que não têm valor. Um professor tem imenso valor e o que pretendemos é dar o seu ao seu dono.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, parece-me que há ainda uma ou duas questões do Sr. Deputado António Filipe para responder, que ia até referir inicialmente, não sei se está recordado.
O Sr. Ministro da Educação: — Já respondi, mas posso tornar a responder. Relativamente ao descongelamento de escalões, mal seria da nossa parte que o não tivéssemos planeado neste orçamento de 1992. Obviamente que está!
Quanto ao PRODEP, também já foi referido que, para além dos 44,5 milhões que existem no PIDDAC, existe um montante de cerca de mais 18 milhões de contos, pelo que o investimento global rondará os 62 milhões de contos.
Relativamente à educação pré-escolar, neste momento existem cerca de 40 000 crianças a receber apoio, o que corresponde aproximadamente a 40 % do total de crianças
nessa idade. Queremos incentivar e multiplicar este número e tomaremos em consideração a sugestão do Deputado Lemos Damião. Desejamos que os alunos vão para a escola o mais cedo possível, porque esta medida é também uma maneira de diminuir as desigualdades entre os jovens. Quanto mais cedo os jovens forem integrados no sistema educativo, mais igualdade de possibilidades e de acesso se verificarão entre eles.
O Sr. Presidente: — Quero agradecer a presença do Sr. Ministro da Educação e dos Srs. Secretários de Estado.
O Sr. António Filipe (PCP): — Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado António Filipe, pede--me para intervir novamente, mas, como sabe, não posso dar-lhe a palavra.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, é só para anunciar que irei formular, todas as questões que coloquei e não foram respondidas através de requerimento, dado que não tenho outra solução.
O Sr. Presidente: — Mais uma vez agradeço ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado a vossa colaboração.
Srs. Deputados, vamos prosseguir a discussão do Orçamento com o Sr. Ministro da Indústria e Energia, pelo que peço para não se ausentarem.
Entretanto, quero informar os Srs. Deputados da Comissão de Economia, Finanças e Plano e os interessados que amanhã reuniremos no Hemiciclo, às 9 horas e 30 minutos, com o Sr. Ministro da Administração Interna e, às 11 horas e 30 minutos, com o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações.
Pausa.
Srs. Deputados, vamos iniciar a audição com o Sr. Ministro da Indústria e Energia.
Quero começar por agradecer a presença do Sr. Ministro, que em relativamente pouco tempo é a terceira ou quarta vez que participa em reuniões connosco. Penso, aliás, que, sem prejuízo da iniciativa dos Srs. Deputados e das questões que quiserem colocar, os trabalhos estão de algum modo facilitados, uma vez que tivemos recentemente oportunidade de reunir duas vezes com o Sr. Ministro, sendo que a segunda reunião foi já muito próxima
do debate do Orçamento, pelo que algumas questões já lerão sido indiciadas.
De todo o modo, peço ao Sr. Ministro que faça uma pequena exposição introdutória e depois os Srs. Deputados usarão da palavra, se o entenderem.
Tem a palavra o Sr. Ministro da Indústria e Energia.
O Sr. Ministro da Indústria e Energia (Mira Amaral): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou fazer uma breve exposição, visto que não me quero repetir em relação àquilo que já disse por duas vezes em reunião com a Comissão de Economia, Finanças e Plano, uma por iniciativa do Governo, outra já no âmbito dos trabalhos de discussão do Orçamento e das Grandes Opções do Plano.
Gostaria apenas de dizer, em termos gerais, que considero ser Ministro da Indústria de um governo que aposta na iniciativa privada como motor do desenvolvimento industrial. E é nesse sentido que estou totalmente sintonizado com as preocupações da redução do défice público, que.
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penso, trazem boas notícias para as empresas portuguesas, no sentido de reduzir a pressão do sector público sobre o mercado de capitais, o que pode provocar uma distensão em termos de taxa de juro, que é extremamente positiva para a indústria portuguesa.
Como tem acontecido, e tenho-o dito nos últimos anos, considero que, de facto, a questão das taxas de juro é essencial para o desenvolvimento das empresas e é nesse sentido que o orçamento do Ministério da Indústria e Energia está feito de acordo com esta estratégia governamental. Neste orçamento pretendemos ter um esforço muito grande de contracção das despesas correntes, por forma a podermos acomodar as despesas de investimento, isto é, o PIDDAC do Ministério.
Portanto, o orçamento corrente do Ministério é estabilizado a valores do ano passado, sendo até ligeiramente inferior, isto sem contar com os aumentos de vencimento dos funcionários.
Em termos do ano passado, diminui ligeiramente, mesmo em termos nominais, depois o orçamento de capital do PIDDAC tem um aumento devido à necessidade das contrapartidas nacionais para os fundos estruturais do FEDER e do PEDIP geridos pelo Ministério da Indústria e Energia. Nesta perspectiva do PIDDAC, para podermos acomodar efectivamente as contrapartidas para os fundos estruturais geridos pelo Ministério, também tivemos que fazer alguns compromissos em lermos de PIDDAC Tradicional, relativamente ao que teve de haver contenção por forma a podermos acomodar o PIDDAC financiado pela CEE.
Foi esta a estratégia base no Ministério: contenção no orçamento corrente, por forma a poder acomodar o orçamento de investimento do PIDDAC, e, em termos de orçamento de investimento do PIDDAC, previlegiámos naturalmente o PIDDAC financiado pela Comunidade, o que implicou alguma compressão no PIDDAC Tradicional não financiado pela Comunidade.
Em resumo, foi isto basicamente o que se passou. Penso que não vale a pena repetir mais aquilo que longamente expliquei nas duas últimas reuniões sobre a estratégia do Governo no âmbito do Ministério da Indústria e Energia e a sua correspondente consagração em termos do orçamento corrente e do PIDDAC.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Ferro Rodrigues.
O Sr. Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Ministro, como já foi dito pelo Partido Socialista em várias reuniões, é pena que, no quadro deste debate do Orçamento e do Plano, não seja possível fazer um balanço relativamente aprofundado sobre a situação da indústria portuguesa, em concreto sobre os problemas estruturais da indústria e a forma como terá evoluído a indústria portuguesa desde a adesão de Portugal à Comunidade Europeia.
Infelizmente, ainda não há um conjunto de estudos suficientemente aprofundados que nos permitam tirar conclusões definitivas sobre a evolução em termos tecnológicos e de especialização internacional. Ficaremos à espera de outras oportunidades para podermos discutir essa questão, que é talvez a mais substantiva, mais do que a sua esperança na queda das taxas de juro como resultado da menor necessidade de o Estado recorrer ao mercado de capitais. Porque aí, enfim, penso que neste momento dificilmente poderemos ir mais longe do que dizer que há, porventura, demasiada fé do seu lado. Mas esta é uma leitura diferente que fazemos sobre a situação macro-
económica e haverá certamente muitas oportunidades para podermos fazer uma avaliação concreta do qual tem sido a evolução do País ao nível industrial nos últimos cinco anos.
Como sabe, a minha perspectiva nesta matéria não é optimista. Alguns sinais indirectos relacionados com os salários pagos na indústria, com o tipo de contratação que continua a fazer-se, com os horários de trabalho que são praticados em muitas áreas e em muitas regiões, não me levam a ser optimista.
Sei, de qualquer forma, que o Ministério da Indústria e Energia tem partilhado a responsabilidade da evolução da indústria portuguesa, do ponto de vista político, com outros ministérios. Durante muito tempo foi condicionado, por critérios impostos pelo Ministério das Finanças — em 1986-1987. Mais tarde, alguns critérios, ditos de desenvolvimento regional, chocavam claramente com o avanço da qualidade dos empreendimentos industriais e, por outro lado, há uma questão de fundo em tudo isto, a própria capacidade da classe empresarial portuguesa, ao nível da indústria, e as dificuldades que essa classe empresarial tem tido com as políticas de taxas de juro que têm sido seguidas nos últimos anos.
Todos estes aspectos são complexos e levam a que haja várias dúvidas que permanecem. No entanto, gostaria de saudar a sua presença aqui e, mais uma vez, lembrar que o diálogo da Comissão de Economia, Finanças e Plano consigo tem sido sempre frutuoso e importante para todos nós.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Ministro, efectivamente V. Ex.1 fez uma intervenção completa e bastante detalhada, muito sincera, diga-se, envolvendo aspectos muito concretos da intervenção do seu ministério, na reunião prévia à discussão na generalidade, o que também quero sublinhar e agradecer.
Aliás, sou dos que me congratulo com a diminuição do peso do seu ministério no contexto da Administração Pública portuguesa. Nunca mais me esqueço que, aqui há uns anos, houve um Deputado que defendeu mesmo o desaparecimento do Ministério da Indústria, porque, numa óptica de desconcentração e descentralização das funções do Estado, a existência de uma política industrial podia perfeitamente ser protagonizada por outros ministérios e não necessitava de um ministério que tem sempre um vago sabor de tutela.
Mas verificamos que o Sr. Ministro está principalmente preocupado com duas áreas de actuação neste momento, sendo uma a das privatizações — desfazer-se do resto desse peso que ainda faz apelo às suas funções de tutela. Gostaríamos que, se pudesse, nos falasse novamente sobre isso e fizesse uma síntese do que é o seu programa de privatizações para 1992, bem como qual o sucesso que pensa ter nesse programa. Trata-se de um tema fundamental em matéria de menor peso da dívida pública no mercado de capitais, como sabe, porque efectivamente a receita daí proveniente vai ser decisiva nessa matéria.
Por outro lado, Sr. Ministro, há outro aspecto importante na actuação do seu ministério, na acção que possa existir de apoio à reestruturação industrial do País, isto é, à necessidade de adaptação da estrutura produtiva da indústria a novos desafios que lhe são feitos pelo mercado único. Neste caso, V. Ex.* deu algumas respostas, com a habilidade que lhe é conhecida e com o seu poder dialéctico.
Noutro dia falei-lhe num caso concreto, de intervenção pontual, e de que volto a falar, o caso Coelima. O Sr. Mi-
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nistro respondeu que se tratava de um caso normal de recuperação dc empresas, ao abrigo das normas próprias
de um diploma que existe nessa matéria e que é uma legislação paraprocessual — aliás, fomos confrontados com alterações a essa legislação muito recentemente, concedendo determinados benefícios fiscais a esse tipo de actuação —, portanto, deixou-nos a ideia de que tudo se tinha passado, digamos, fora da esfera pública de intervenção do Governo, da Administração Pública.
Ora, sabemos que um papel importante desempenhado nesse programa concreto de recuperação de uma empresa ao abrigo de uma lei, num processo — reconhecemo-lo — pré-falimentar, foi fundamentalmente protagonizado por empresas de crédito do sector público.
Assim, pergunto ao Sr. Ministro se, na verdade, estão pensadas mais actuações deste tipo e se essas instituições do sector público se manterão nele e terão capacidade de intervenção neste domínio.
Concretamente, as duas sociedades de capitais de risco ligadas ao PEDEP mantêm capacidade para intervir ou teremos de esperar pelo fundo de que o Sr. Ministro também nos falou e que revela coerência da sua política — defende a constituição de um fundo, mas suponho que isso é qualquer coisa situada num futuro mais ou menos longínquo —, para desempenhar o mesmo tipo de actuação? Ou pensa que haverá muitas empresas que possam ter o mesmo tipo de actuação?
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, uma vez que não há mais inscrições, para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Indústria e Energia.
Lembrava, no entanto, que esta reunião se distingue um pouco das duas anteriores em que o Sr. Ministro esteve
presente, na medida em que as intervenções são gravadas e depois transcritas em acta. Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro da Indústria e Energia: — Vou começar por responder ao Sr. Deputado Ferro Rodrigues na sequência da já longa e frutuosa troca de opiniões que lemos mantido sobre a indústria portuguesa e que vem, se não me engano, desde 1980. De facto, há muito que andamos a discutir e muitas vezes a reflectir em conjunto sobre essas questões.
É evidente que ainda é cedo para avaliar o impacte do PEDIP e dos outros fundos estruturais sobre a estrutura produtiva portuguesa, nomeadamente sobre a indústria, porque a maior parte dos projectos existentes estão no início e o seu impacte sobre essa estrutura só se verá mais tarde.
Mas, em todo o caso, já se pode saber se o PEDIP foi bem ou mal gerido. Hoje em dia é pacífico que o PEDIP foi bem gerido. É um caso de sucesso no quadro dos programas comunitários e o recente relatório que o Presidente Delors apresentou no Parlamento Europeu sobre o Pacote Delors 2 é bem claro na referência elogiosa ao PEDIP.
Quais os efeitos que, em termos futuros, vai ter na indústria portuguesa? Essa é uma matéria que, neste momento, ainda não podemos avaliar com lodo o rigor, até porque está a ser feito um estudo, que terei todo o gosto em disponibilizar a esta Comissão assim que esteja concluído.
E repito: há um conjunto de projectos — a maioria, porventura — que ainda não está implementado. Portanto, só quando estiverem concretizados e as empresas modificadas na base desses projectos é que podemos ter consciência do impacte do PEDIP e dos outros fundos sobre a estrutura industrial portuguesa.
Em todo o caso, há um aspecto que já é particularmente nítido. Refiro-me àquilo a que chamo os factores dinâmicos de competitividade — a qualidade, o design, as preocupações pelos recursos humanos mais qualificados, pela inovação e pelo desenvolvimento tecnológico. Já se nota a existência dessas preocupações em algumas empresas face a projectos financiados pelo PEDIP e, da análise que fizemos, verificámos também que há aumentos de produtividade significativos nas empresas que beneficiaram dos apoios financeiros do PEDIP. Esse é um facto significativo!
Em termos de diversificação sectorial, também é um facto curioso que—e falo pela primeira vez numa informação que obtive muito recentemente—, à medida que o PEDIP ia evoluindo e íamos sendo mais selectivos e rigorosos em termos da apreciação dos projectos industriais, o que é natural com a evolução do programa, a distribuição sectorial dos incentivos do PEDIP foi-se alterando, diminuindo mais no sector têxtil, no do vestuário e no do calçado e aumentando no sector metalomecânico, das máquinas eléctricas e não eléctricas. Os últimos dados que tenho referentes ao ano de 1991 mostram que a metalomecânica e as máquinas já têm, nos projectos apoiados pelo PEDIP, um peso relativo superior ao do têxtil, ao do vestuário e às confecções.
É evidente que esta situação mostra outro facto, que, aliás, está de acordo com a estratégia dos sectores têxtil e do vestuário, já que, posteriormente, é necessária toda uma tarefa de reestruturação e de conversão destes sectores tradicionais.
Em lermos de PEDIP, começámos — e bem — a ser muito mais selectivos, apoiando menos projectos de menor qualidade, e já se nota no PEDIP o peso de uma aplicação sectorial diferente.
Como também já lhe disse, na última reunião, este trabalho fica incompleto sem o SIBR, porque este programa actua numa faixa substancial do País. Daí que a análise conjunta PEDIP/SIBR pode e deve ser feita.
Posso dizer que essa análise está a ser feita neste momento e que o próximo relatório de análise mensal do IAPMEI sobre guias de intenções de investimento já faz a agregação PEDIP/SIBR, pelo que o Sr. Deputado já poderá ver a repartição sectorial do investimento apoiado pelos fundos comunitários.
Em suma, notamos que há, de facto, grandes preocupações no domínio da qualidade e do aumento da produtividade. Em relação aos empresários portugueses, não notamos ainda uma grande diversificação industrial ou preocupações de fazerem projectos noutras áreas. É também por essa razão que lemos de recorrer ao investimento estrangeiro.
E tão curioso como isso é o Fundo de Apoio às Iniciativas de Jovens Empresários (FAIJE), que não é do PEDIP, mas que também tem uma comparticipação do Ministério através do IAPMEI. O que vemos nesse fundo para apoiar as iniciativas dc jovens empresários é, de certo modo, uma continuação das tendências do passado. Até em cerimónia pública, já tive de chamar a atenção aos candidatos ao FAIJE dizendo que esperava deles uma contribuição significativa para a diversificação da nossa estrutura industrial e que não se limitassem a acomodar nas tendências do passado, em termos de sectores industriais tradicionais. Inclusivamente, já disse ao próprio Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares, responsável pelo sector da juventude, que o FAIJE tem de ser apertado nos seus critérios, por forma a não acomodarmos com apoios públicos as tendências espontâneas do mercado ou dos empresários em Portugal.
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Sejamos realisias porque, para ajudar a mudar a nossa estrutura produtiva, temos de contar com o investimento estrangeiro, desejavelmente em joint-ventures com portugueses— é essa a estratégia do Governo—, mas é óbvio que, numa pequena economia aberta como a nossa, não podemos pensar que o faremos sozinhos. Devemos ter alguma capacidade de controlo e de associação, mas não pensemos
que, sozinhos, o conseguiremos fazer nesta matéria.
O Sr. Deputado referiu-se ao facto de haver problemas
com os critérios do PCEDED. Como sabe, no Governo anterior, os critérios do PCEDED foram retirados dos sistemas de incentivos quer do SINPEDIP quer do SIBR. Também isso contribuiu para que se operasse aquela mudança da repartição sectorial e para que se apoiem bons projectos, não numa óptica de recuperação de divisas, que, obviamente, facilitava projectos dc pior qualidade nos sectores industriais tradicionais.
Como o Sr. Deputado também sabe, o Sistema de Incentivos de Base Regional foi harmonizado, em termos de relevância industriai, com o SINPEDIP. Portanto, a relevância industrial é exactamente a mesma, o que significa que a fasquia a partir da qual os projectos passam ou não é a mesma no SINPEDIP e no SIBR. Neste último programa apenas existe o bónus regional para incentivar investimentos nos concelhos menos industrializados.
Fizemos uma excepção que, em todo o caso, considero correcta: os projectos do SIBR assentes sobre recursos da região, os chamados recursos endógenos, podiam não ter a pontuação industrial suficiente, mas, por despacho dos dois ministros, podiam ser aprovados. Porquê? Porque consideramos que são projectos assentes sobre os recursos da zona e é evidente que não devemos ser tão exigentes do ponto de vista industrial como relativamente aos projectos que não têm recursos endógenos. Os recursos existem, há que aproveitá-los e depois, naturalmente, vai-se sofisticando o tipo de projectos e a capacidade empresarial a eles associada.
Em termos de sectores industriais tradicionais, preocupava-me que não espalhássemos pelo País um modelo que já temos no vale do Ave, porventura, excessivo, de concentração nesses sectores, mas, como o SIBR já tem a mesma selectividade industrial do SINPEDIP, ficou totalmente harmonizado nessa matéria.
É evidente que também há aqui um problema, como o Sr. Deputado referiu, de capacidade empresarial. Esse é sempre o grande problema que existe numa economia de mercado, porque os empresários não se fazem por decreto--lei. No entanto, considero que este desafio se coloca a toda a sociedade portuguesa e não apenas ao Ministério da Indústria e Energia, e que, inclusivamente, é da responsabilidade do sistema educacional.
No fundo, este problema de gerar recursos empresariais dinâmicos começa na escola e é nesse sentido que, pela primeira vez, em Portugal, o Ministério da Indústria e Energia, através do PEDIP, apareceu a financiar o sistema formal de ensino, quer o secundário quer o superior, patrocinando cursos de relevante interesse para a indústria. Posso dizer por exemplo, quanto ao ensino superior, que estão a ser feitos mestrados em gestão da produção industrial, mas é o PEDIP que está a pagar esses cursos. Se não fosse isso, só havia mestrados em gestão financeira e em negócios internacionais.
Disse às escolas superiores: «O PEDIP paga, desde que façam cursos de interesse para a indústria.» Era uma lacuna grave que havia na gestão da produção industrial.
Como sabe, há outros cursos. Numa escola que conhece bem, existe o mestrado em Gestão com a componente de Design, financiado pelo PEDIP. É a nossa tentativa para alterar o estado de coisas e ter também um modelo educacional mais consentâneo com as nossas preocupações cm termos industriais.
Outro aspecto que, nesta matéria, me parece curioso e
sobre o qual gostaria de chamar a vossa atenção, bem a ver com as sociedades de capital de risco.
No fundo, temos dois tipos de sociedade de capital de risco: duas sociedades, do PEDIP, têm recursos financeiros suficientes para acorrer a um conjunto de projectos significativos em Portugal; outras não têm recursos suficientes, dispõem de capitais sociais escassos, da ordem de 300 000 contos, e algumas delas apareceram criadas pela banca, apenas para fazerem crédito bancário com outro invólucro, com outra imagem dc marca. É esta a realidade. Ainda surgiram outras com o fim de beneficiarem de incentivos fiscais, mas não fazem verdadeiro capital de risco.
Estamos confrontados com a necessidade de instrumentos para ajudar as pessoas que têm talento empresarial mas que não dispõem de dinheiro e que, portanto, necessitam de capital de risco. Porém, há aqui um problema tão importante como este, dc mentalidade empresarial: é que mesmo naqueles projectos que podem ser apoiados pelo capital de risco, muitos empresários ainda não gostam de abrir a sua empresa a um parceiro de risco. Temos tido projectos que poderiam ser apoiados, mas tem havido resistência, sobretudo das pequenas e médias empresas, a abrirem o seu capital, a sua empresa, à entrada de parceiros de risco. Esta é a realidade dos factos.
Em todo o caso, esta batalha já começou e tem de ser continuada, porque os mecanismos dc capital de risco são essenciais para também ajudarmos a desenvolver e a consolidar novos talentos empresariais.
Face à experiência que temos da gestão de programas de apoio à indústria, verificamos que há um conjunto de projectos, já do ponto de vista tecnológico, adequados c dc qualidade. Muitos até, não tantos quanto gostaríamos, são feitos em colaboração com as universidades, mas vemos que continua a faltar dramaticamente uma componente de marketing aos projectos submetidos ao sistema de incentivos, aos programas de apoio à indústria. Isto é, mesmo quando do ponto de vista tecnológico já são projectos válidos, toda a área do marketing talha redondamente.
Outro aspecto que se nota de forma nítida nestes projectos está associado ao problema dos recursos humanos. No fundo, os empresários continuam a esquecer-se, muitas vezes, quando compram equipamentos ou têm tecnologias modernas, que têm de ter recursos humanos compatíveis e, nesse sentido, por vezes, há uma overdose de modernização, pois, apesar de terem equipamentos, não têm recursos humanos adequados.
Considero que, nos próximos programas de apoio à indústria, a noção de condições de acesso deve compreender os recursos humanos e não se pode limitar apenas às condições financeiras da estrutura da empresa. Isto é, há um conjunto de projectos em relação aos quais temos de verificar, quando forem feitos com novos equipamentos, se dispõem de recursos humanos adequados na empresa para poderem acomodar esse equipamento. É matéria que temos de melhorar nestes programas de apoio.
Em termos gerais, é basicamente o que tenho para dizer.
É evidente que não esquecemos o problema dos sectores industriais traâicionais. Aliás, as GOP falam de for-
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ma clara nos programas de reestruturação sectorial, que são nítidos no têxtil c no do vestuário e das confecções, e que
impõem um programa assente, por um lado, numa vertente
de modernização e de reestruturação e, por outro, numa
vertente dc reconversão de unidades que süo inviáveis c
que só estão a empatar o jogo do mercado hoje em dia,
ra2âo pela qual vão desaparecer. Aliás, já deviam ter desaparecido há muito tempo da economia portuguesa, mas como não sc funcionava com o conjunto de mecanismos normais numa economia de mercado, isso permitiu que um conjunto de unidades, que só com muito boa vontade sc podem chamar hoje empresas, ainda subsista.
O facto de não pagarem a segurança social e energia eléctrica, de haver barreiras à saída c de os mecanismos fundamentais não funcionarem, tudo isto permitiu manter na estrutura industrial portuguesa um conjunto de unidades que não têm razão de existir.
Como o Sr. Deputado sabe, muitas vezes pagam salários abaixo do salário mínimo nacional. Esta também é a realidade social dos factos. Tão grave quanto isso, ou mais ainda, distorcem a concorrência e prejudicam um conjunto de empresas boas que existem, que não podem deixar dc ser afectadas por elas.
É por essa razão que digo que alguma redução de capacidade instalada em sectores tradicionais portugueses não significa que haja diminuição do valor das vendas, da facturação, porque há outras empresas que estão em melhores condições de crescimento, não tendo essas unidades a empatar o jogo- e a dificultar-lhes, com uma concorrência desleal, a sua situação.
Em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito, tenho a dizer-lhe que concordo totalmente consigo. Não vejo a eficiência do Ministério pelo peso da sua máquina no quadro da Administração Pública, antes pe/o conirário, sempre gostei de estruturas pequenas, leves, flexíveis e eficientes.
Gosto de apreciar os organismos e as empresas pela sua eficiência e não pela sua dimensão. Se quiserem, foi uma visão que sempre tive e que continuo a ter a avaliação faz--sc não pela dimensão mas pela eficiência. Considero — e tem sido sempre o meu esforço — que o Ministério tem dc ser uma estrutura pequena, leve e flexível. O exemplo do PEDIP desta minha filosofia mostra-o de forma clara: constituí uma equipa de 10 pessoas com um gestor à frente, todas mentalizadas e mobilizadas para um objectivo. Foi isso que fizemos com esta pequena equipa e, assim, conseguimos arrastar todos os outros organismos do Ministério, implementando um programa que é considerado com grande sucesso na Comunidade. É esta a minha filosofia!
Reconheço que há rigidez na função pública e que não foi possível fazer o mesmo em todos os organismos do Ministério — já expliquei claramente o que acontece nesta matéria —, mas demos passos decisivos nesse sentido. Lembro a transformação do IAPMEI, cm que, com cerca de 260 pessoas espalhadas por todo o País, conseguimos gerir sistemas de incentivos que, neste momento, já vão em pagamentos da ordem dos 260 milhões de contos c ainda fazer toda a política de apoio às PME. São estruturas destas que nós defendemos no Ministério. Não meço, por isso, a contribuição do Ministério pelo desenvolvimento industrial português, pela repartição do orçamento corrente que exista no Orçamento do Estado.
Por outro lado, o Sr. Deputado colocou a quesiüo da existência da politica industrial, mas considero que isto é um conceito que no passado era mal vendido ou mal explicado em Portugal, porque não se pode confundir
política industrial com Estado-empresario e era isso que, infelizmente, acontecia em Portugal.
Como o Sr. Deputado sabe, nada na vida é perfeito e
também o mercado não é perfeito. A nossa filosofia é a de
que o mercado 6 um instrumento para o desenvolvimento
económico c social. 0 mercado não é um fim absoluto, essa
6 a nossa filosofia. Conhecemos falhas dc mercado c quando há falhas dc mercado há razões para a intervenção do Estado na economia. Logo, há razões, mesmo em economia de mercado, para a existência de uma política industrial como complemento dos mecanismos de mercado, ajudando os empresários e não substituindo-se a eles. E é isso que tenho andado, ao longo de quatro anos, a explicar de forma clara que é a política industrial no quadro de uma economia de mercado. Sc, depois, há um ministério da indústria, ou da economia, ou disto, ou daquilo, isso, obviamente, são opções do Sr. Primeiro-Ministro c não dos membros do Governo. O que posso explicar — e já o escrevi várias vezes, aliás, o Sr. Deputado, com a gentileza que sempre tem para os meus escritos, já o leu certamente, porque eu consigo explicar facilmente a existência de uma política industrial no quadro de uma economia dc mercado — é óbvio que existe a política industrial no quadro de uma economia de mercado, mas não é a de um Estado-cmpresário.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Foi isso o que eu disse, Sr. Ministro. Efectivamente, ela poderia ser protagonizada de outra maneira, por um ministro da economia, por exemplo, que abarcasse outras políticas no domínio da economia, mas não por um ministro da indústria, por um ministro da agricultura, por um ministro do comércio, etc.
O Orador: — Sr. Deputado, o que posso dizer-lhe é que V. Ex.! vê que, nos países com estado de desenvolvimento idêntico ao nosso, se verifica a existência de ministérios da indústria, e, em países com desenvolvimento superior, como é o caso da Alemanha ou da Dinamarca, há ministérios da economia Nos países com o nosso nível dc desenvolvimento, tem sido opção dos governos ou dos primeiros-ministros, que são os primeiros responsáveis, haver ministérios da indúsiria — vejam-se o caso português c o espanhol.
Quanto à questão das privatizações, penso que consegui, ao longo dos quatro anos passados da actuação deste Ministério, não ser reconhecido como «o Ministro da Siderurgia», ou «da Quimigal», ou «da Setenave»... Considero que toda a minha filosofia política e toda a minha actuação me fizeram reconhecer junto da opinião pública como ministro do desenvolvimento industrial privado, embora pelo meio, infelizmente, ainda tivesse umas empresas públicas «penduradas» no Ministério, mas não como ministro dessas empresas. Penso que isso será pacífico, isto é, que toda a nossa estratégia no Governo e no Ministério tem sido essa.
E é nesse sentido que posso dizer-lhe que o Ministério da Indústria, como sabe, iniciou o primeiro processo de privatização ainda em termos informais, sem ser ao abrigo da actual Constituição. Quando vendemos a EPSI e alugámos a CNP, o complexo petroquímico foi, no fundo, em termos ideológicos, não constitucionais, um processo de privatização feito por um sector público português. Nós iniciámo-lo nessa fase, com o sucesso conhecido — aliás, ainda hoje fui a Sines inaugurar mais uma unidade de expansão desse complexo petroquímico inaugurado pela NESTE.
Para responder concretamente à sua pergunta, nós, nas empresas industriais energéticas, tivemos uma fase diferente
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daquilo que havia cm muitas empresas financeiras e de seguros, isio é, tivemos de fazer um «trabalho de casa» prévio porque havia toda uma acção de reestruturação de «elefantes brancos» da nossa economia sem a qual depois não se podia privatizar essas empresas. Essa acção foi feita e por isso estamos cm condições de dar o impulso decisivo nesta matéria c já começámos a dá-lo no fim do Governo
anterior. Estamos neste momento em plena fase de privatização da PETROGAL, já foi lançado o caderno dc encargos— os concorrentes tem 45 dias para responder a esse caderno de encargos — e está constituído o júri que analisará as propostas para a vencia dc 51 % da PETROGAL nesta 1." fase; estes 51 %, como é que süo constituídos? Esperamos fazer a operação em duas tranches: uma primeira dc 25 % e outra de 26 %. Portanto, quem ganhar o concurso pode comprar agora 25 % e depois lem até três anos para comprar mais 26 %. Em relação a estes 25 % iniciais, como é que se vai fazer? São 20 % para aumento de capital da empresa e 5 % de capital actual da PETROGAL. Desta l.! tranche, é a empresa que recebe maior encaixe, os 20 %, e indo os outros 5 % para o Tesouro; da 2' fase, da 2' tranche, os 26 % são encaixe para o Tesouro, visto que é a venda de capital.
O Sr. Deputado poderia colocar uma questão pertinente; não o fez, mas eu antecipo-me: por que é que, em relação à PETROGAL, não lançamos ao mesmo tempo o processo para os trabalhadores e pequenos accionistas, tal como previsto nos termos constitucionais? Porque a empresa não vai dar lucros nos próximos anos e quem a compra nesta fase compra-a numa perspectiva de controlo da empresa ou, única c exclusivamente, numa perspectiva dc rendimentos. Isto é, compra numa perspectiva dc controlo agora para ter rendimentos futuros, obviamente!, ao passo que os pequenos accionistas e trabalhadores, sc fossem comprar agora, seriam iludidos, visto que a empresa não vai gerar lucros nos próximos três anos, portanto, não ia dar dividendos. Foi no interesse deles que nós atrasámos esse processo porque não iam obter dividendos do papel com que ficassem nesta 1." fase.
O primeiro processo já foi começado e estamos a trabalhar de forma acelerada para começar também o processo de privatização da Siderurgia Nacional. O modelo está definido, aliás já tinha sido proposto pelo Ministério da Indústria ao Ministério das Finanças em Novembro dc 1990, c passa basicamente por isto: venda de 80 % do capital em concurso público, 10 % para trabalhadores e pequenos accionistas, em termos constitucionais, ficando 10 % reservados ao Estado, como uma golden share, para impedir certos actos de gestão que consideremos lesivos do interesse nacional. É este o modelo de privatização da Siderurgia aceite pelo Ministério das Finanças, pelo que está neste momento a ser feita a reavaliação da empresa, o que estará terminado no início de Abril por forma que tenhamos entretanto o decrcto-lci feito e possamos iniciar o processo dc privatização da empresa.
Quanto à PORTUCEL, também esperamos que este ano comece o processo, mas isso passa por uma fase inicial de restruturação. Está a ser estudado — aliás, já está neste momento em análise entre nós e a própria administração da empresa — o modelo futuro da PORTUCEL.
Como sabem, a PORTUCEL linha vários negócios e chegou-se à conclusão de que era necessário transformá-la numa holding; essa holding tem participações em unidades estratégicas de negócios, e são essas unidades estratégicas que serão objecto de privatizações especiais de acordo com o perfil dc cada uma delas. Este modelo dá muito mais flexibilidade para privatização visto que privatizar
parcialmente uma área dc pasta de papel e floresta não é a mesma coisa que privatizar a embalagem ou o cartão canelado — é outro o úpo dc parceiros que é necessário. Dentro deste contexto, deste universo da holding nós iniciaremos o processo de privatização da PORTUCEL. Há também um problema prévio, de reequilíbrio financeiro visto que a empresa está desequilibrada financeiramente nesta situação conjuntural difícil, que, como sabem, existe no mercado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Ministro, nessa perspectiva e ao defender que a privatização terá de ser feita por sectores na fileira produtiva do papel, porque os interessados, porventura, poderão ser diferentes e a concorrência à privatização não terá muilo a ver num caso com o outro, lerá havido então um erro da política industrial do «Estado-cmprcsário», aliás recente, ao levar as empresas de pasta de papel portuguesas a tomarem interesses na área do fabrico do papel propriamente dito? Estaremos a desfazer esse erro? Será essa uma das «curas» que a «clínica pré--privalização» que é o seu Ministério terá de fazer antes da privatização da PORTUCEL?
O Orador: — Uma coisa não tem a ver com a outra, Sr. Deputado! O que nós dizemos é que na PORTUCEL existe uma área estratégica de negócios clara, que tem a floresta c a pasta de papel, e depois existe todo o sector da embalagem e do cartão canelado, que é outra história.
Pois bem, dentro desla área é que poderemos ver como é que aumentamos o respectivo valor acrescentado; aumentar o valor acrescentado significará o quê? Maior integração de pasta em papel.
Essa é uma tendência que os países mais desenvolvidos tem seguido c foi isso o que a SOPORCEL fez, mas, como em tudo na vida, é preciso equilíbrio e bom senso e não é realista podermos integrar toda a pasta de papel, até porque não temos know-how na comercialização do papel. Portanto, o que temos dito é que poderá haver alguma integração de pasta em papel, no senüdo de aumentar o valor acrescentado, mas deve ser uma acção prudente, dadas as dificuldades por que a PORTUCEL tem passado.
Lembro que o projecto da SOPORCEL é anterior à minha passagem pelo Ministério da Indústria, já vem do passado. Na PORTUCEL, o que nós definimos foi que, numa perspectiva de médio e longo prazos, se integrarmos 50 % da pasta em papel, já não será mau. Mas temos de fazê-lo de forma prudente e realista, no sentido de aumentar o valor acrescentado, com a consciência dc que nós — e o relatório mostra-o de forma clara — não necessitamos de qualquer parceiro industrial em termos do negócio da pasta do papel. Nós temos a capacidade tecnológica e temos o domínio dos mercados internacionais cm pasta de papel; quando vamos integrar pasta em papel, é óbvio que, cm lermos comerciais, já não lemos esse domínio. Portanto, há que ter muita prudência nessa passagem.
O Sr. Deputado, na linguagem que utilizou, disse que se cu tivesse uma visão voluntarista, mecanicista da política industrial... Bom, eu diria que, com a tese do valor acrescentado, vamos integrar já; nüo o disse nem o recomendei, portanto sejamos prudentes! O que está em causa na reestruturação/privatização da PORTUCEL é esta divisão em áreas estratégicas e nada impede que esta orientação do maior valor acrescentado possa ser seguida na área da pas\a ôe papel, por exemplo. Ainda não houve vontade, mas pode vir a haver, de pôr em prática uma ideia que é a da integração cm papéis térmicos, daqueles ligados às tecnologias
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de informação, que, como sabe, é um nicho do mercado de hoje de alto crescimento. São ideias que estão na mesa
c que podem vir a ser concretizadas ou não, mas isto
dentro desta área estratégica. Portanto, é isto que está em causa na PORTUCEL.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Ministro, nunca foi pensado, nessa perspectiva do papel, porque, sem dúvida, 6 realmente um sector importante no contexto da nossa economia, o alargamento da influência da indústria do papel a montante, para as indústrias do equipamento e da própria concepção e de engeneering da indústria? Tenho a impressão de que, nessa matéria, estamos a perder esse comboio. Isto é, trata-se de uma indústria em que fomos inovadores, em que tivemos uma grande influência nos mercados mundiais, em que temos o domínio da tecnologia dos mercados mundiais, mas se ela um dia acabar — e ela está em crise neste momento, não sabemos o que é que vai acontecer—, se lambem essa marchar para o Sul, para África, por exemplo, o que é que nos fica? Enquanto noutros países, como na Finlândia, ficou, por exemplo, a tecnologia do equipamento e a tecnologia da própria concepção, no nosso caso o que é que fica? Há ou não essa preocupação na sua política industrial? Aí, justifico inteiramente a existência de uma política industrial!
O Orador: — Sr. Deputado, essa é uma questão pertinente. Foi por isso que nós, no quadro do PEDIP, desenvolvemos um programa, o Programa de Desenvolvimento da Indústria de Bens e Equipamento (PRODIBE), que justamente listava, de uma forma talvez voluntarista, quais os casos em que nós apoiamos e majoramos os apoios, damos todas as facilidades.
Posso dizer que na Finlândia tentei convencer, por exemplo, a VALMET a investir em Portugal neste sector. Não consegui tudo, mas ela veio investir em tractores! Consegui que viessem fazer a fábrica de tractores no Montijo, isto é, foi na sequência dessa minha viagem que eles vieram para Portugal com os tractores. Não consegui que viessem com as máquinas, até porque, na altura, estavam a vender a máquina à SOPORCEL. Era essa uma das ideias que tínhamos.
Mas o problema que temos aqui, como disse há pouco, é o de que os industriais portugueses sozinhos não o fazem, não serão capazes, possivelmente! Não o conseguimos alé agora, mesmo com estes programas, majorando e dando maiores apoios do que no quadro normal do PEDIP. Aliás, em lermos de investimento estrangeiro, também não conseguimos ainda captar projectos para Portugal nesta área. Mas não lenha dúvidas de que é uma das nossas prioridades,
com todas as dificuldades que isto tem. Corremos o risco de uma indústria destas poder emigrar devido às dificuldades e de ficarmos sem ter domínio sequer sobre os bens e o equipamento, tal como acontece com os outros.
Aliás, nesta matéria, há outra grande discussão sobre a integração da pasia em papel, ou seja, se essa integração deve ser física ou se deve ser em lermos dc mercado. Como sabe, há outras estratégias, em lermos de empresas de pasta de papel que não integram fisicamente em papel ou que vão comprar papelarias nos mercados para os quais exportam. No fundo, é uma integração junto do mercado consumidor. Isso constitui uma discussão que é feita, mas compreendo que, no quadro de uma empresa que era pública, é muito difícil ter estratégias destas.
Portanto, temos estas três empresas — a PETROGAL,
a Siderurgia c a PORTUCEL — que estão, neste momen-
to, numa fase mais adiantada de privatização; lemos tarrs-bóm os estaleiros navais de Viana do Castelo, e temos a reestruturação da EDP, que está a ser feita, e da qual podem
depois sair empresas que poderão sei õbjèCtò dfe pva&açãG parcial. Mas os Srs. Secretários dc Estado da Indústria e da Energia poderão acrescentar algo sobre esta matéria.
Ainda antes de terminar, cu gostaria dc falar sobre o problema que me colocou acerca da COELIMA e dos sectores industriais «tradicionais», solicitando desde já aos Srs. Secretários de Estado, respectivamente, da Indústria e da Energia que, depois, completem as minhas palavras no que toca a estas duas matérias.
Sr. Deputado, da última vez que estivemos reunidos, levantou o problema da COELIMA, tendo-lhe eu respondido — e essa é a verdade — que esta matéria foi tratada ao abrigo do decreto-lei sobre a gestão controlada. O que aconteceu foi que houve um conjunto de bancos que aceitaram reduzir os seus créditos para valores da ordem de 10 % do total. Claro que se põe aqui o problema de saber o que é o valor de mercado de um crédito. É óbvio que os créditos não têm o valor nominal por que estão inscritos. Então, quanto valem?
Alé hoje, infelizmente, tem havido um grande drama para conseguir reestruturar financeiramente as empresas. Ora, tenho experiência deste problema, até por ter trabalhado na banca e saber o que acontecia no passado. É que os bancos não estavam provisionados para estes créditos incobráveis, portanto, resistiam a fazer write-off, fugindo disto como «o diabo da cruz». Assim, em termos dos seus resultados, havia uma excelente cosmética. Alé acontecia que os resultados melhoravam porque inscreviam juros de mora do que já eram créditos incobráveis. A situação chegou a tal ponto que um governador do Banco de Portugal me disse que os bancos estavam com activos extremamente rígidos, tendo-lhe eu respondido: «Sr. Dr., em linguagem de engenheiro, isso significa que não têm clientes, mas só devedores.» Portanto, era isto que sc passava nos tempos difíceis da economia em Portugal.
Felizmente, a recuperação da economia portuguesa que se registou e também o seu crescimento permitiram à banca fazer provisões sobre os tais créditos incobráveis. Assim, hoje em dia, a banca lem à-vontade e facilidade de fazer write-off, visto que isto já está provisionado.
Portanto, Sr. Deputado, não deve admirar-se de que, neste momento, a banca possa fazer operações que, em termos de solução financeira, não conseguia fazer há uns anos atrás.
Agora, o problema que se põe — ainda não foi resolvido nem a solução vem nos livros — é o de saber qual é o valor de mercado destes créditos. A discussão é simples:
se a empresa for à falência, os bancos nada recebem, pelo que os créditos valem muito menos do que o seu valor nominal inscrito.
No caso da COELIMA, foi assim que os bancos públicos procederam, alé porque eram os que tinham créditos sobre esta empresa, pois, como sabe, a banca privada só começou a trabalhar há pouco, pelo que não teve tempo para participar em operações deste tipo, à excepção de um ou outro caso, mas de pouca monta. Portanto, este problema envolve, naturalmente, bancos públicos porque são os que já existiam na estrutura nacional.
O Sr. Deputado poderá é dizer que, quanto a esta matéria, poderá ter havido algum interesse por parte de algum membro do Governo que terá estimulado os bancos públicos a procederem a uma avaliação de mercado dos seus créditos. Mas é óbvio que os bancos aceitaram
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um valor pelo seu crédito e é importante explicar-lhe como funcionou este organismo.
Nos estatutos das sociedades de capital de risco do PEDIP estava escrito que os bancos que entrassem com capital poderiam fazê-lo, não através de cash, mas de créditos, e isto foi particularmente visível na NORPEDIP. Esta empresa entrou na COELIMA com 600 000 contos, dos quais apenas 280 000 contos cm cash, enquanto os outros 320 000 contos foram em créditos. Como? É que
havia bancos com créditos sobre a COELIMA que ainda não tinham subscrito a totalidade do capital que deviam na NORPEDIP. Então, tendo-se negociado o valor dos créditos, os bancos entraram com estes para o capital da NORPEDIP, pelo que esta empresa detém todos os créditos e converte-os em capital da COELIMA. É esta a actuação das sociedades de capital de risco do PEDIP, a qual, aliás, estava pensada desde o início da entrada em vigor do PEDIP.
Posso referir outro caso em que se procedeu da mesma forma, embora não tenha vindo a público. Há uma empresa da Covilhã, a FISEL, em relação à qual a NORPEDIP e a SULPEDIP tiveram uma acção conjugada deste tipo, há tempo, utilizando o mesmo tipo de mecanismo. Claro que o Sr. Deputado pode voltar a dizer que terá havido algum estímulo por parte de um membro do Governo no sentido de ajudar os bancos públicos a terem consciência de que o valor daqueles créditos não correspondia ao valor nominal que estava inscrito, mas que era muito menor.
Sobre esta matéria, há um aspecto para o qual é importante chamar a sua atenção: é que para os empresários, antigos donos da COELIMA, o processo foi como se se tivesse tratado de uma falência. Não houve qualquer prémio para os empresários. Quando muito, poderá considerar-se que foi concedido um prémio à empresa, porque esta conversão de créditos em capital expulsou o antigo capital da empresa. Portanto, todos aqueles empresários ficaram sem o que quer que fosse na empresa, pelo que este processo funciona exactamente como se se tratasse de uma falência. Digamos que não chegámos à falência, mas, no quadro da gestão controlada, houve, dc facto, uma substituição completa da estrutura accionista da empresa, que passou a pertencer a um sindicato financeiro de que estão credores os bancos e as sociedades de capital de risco. O que acabei dc explicar é o que foi feito relativamente à COELIMA.
O Sr. Deputado veio levantar a questão, extremamente pertinente, de saber se pode proceder-se da mesma forma em relação a mais sociedades. Respondo-lhe que pode, só que as duas sociedades do PEDIP já não têm muitas mais possibilidades de fazê-lo. É que, neste momento, de 27 participações que a NORPEDIP detém em empresas, 9 são em empresas do sector têxtil e do vestuário, o que, embora constitua um terço do total das suas participações, equivale a cerca de 50 %, em termos dc valor das participações. Isto é, neste momento, 50 % do valor da carteira de participações da NORPEDIP situa-se no sector têxtil e de vestuário — na SULPEDIP a percentagem é um pouco menor, o que se compreende porque actua numa zona distinta do País —, o que levanta um problema lógico quanto à gestão de uma sociedade deste tipo, que, aliás, já há vários meses me foi colocado pelo presidente da NORPEDIP.
E que não estamos cm condições de afectar mais recursos ao sector do têxtil e vestuário senão, às tantas, transformamos a NORPEDIP numa empresa unicamente vocacionada para este sector, o que não é correcto pois temos de actuar em sectores diversos. Por isso, já há vários
meses, a NORPEDIP propôs-me — e aceitei a ideia — a constituição de um fundo de capital de risco, subscrito por outras entidades, e que seria dirigido por esta empresa devido à experiência que já tem em processos do género do da COELIMA. Eu próprio transmiti a proposta da NORPEDIP, ao Ministério do Planeamento e da Administração do Território.
Assim, ainda antes das eleições e mesmo da acalorada discussão que tivemos na EXPONOR, em 11 de Setembro, a Sr.* SêCrétána de Estado do Planeamento tinha ido a Bruxelas indagar da possibilidade de o FEDER e os fundos estruüjrais poderem fazer parte de um fundo de capital de risco deste tipo. Só que não divulguei nada disto porque, se o tivesse feito publicamente, é evidente que, em termos de opinião pública, tal notícia significaria uma pressão para outros ministérios contribuírem com dinheiro para a constituição do fundo de capital de risco. Portanto, calei-me.
Posteriormente, esta matéria veio a público porque o Ministro do Planeamento e da Administração do Território e eu próprio pedimos ao Dr. Miguel Cadilhe a elaboração de um documento de reflexão sobre isto, em que aquela ideia foi retomada, embora já não fosse nova e, como informei, tivesse tido origem na NORPEDIP, uns meses antes. Aliás, é fácil explicar o desencadeamento deste processo, dado que as sociedades de capital de risco já estavam «afuniladas» no sector têxtil, pelo que a solução lógica era a de avançar para os fundos de capital de risco.
Certo é que o processo veio a público e daí é que se desencadeou esta grande operação de marketing acerca dos fundos de capital de risco, embora a ideia já viesse do passado.
Neste momento, os Ministérios das Finanças e da Indústria e Energia estão precisamente a trabalhar na constituição de um fundo de capital de risco, embora não com os valores avançados pelo Sr. Dr. Miguel Cadilhe — de 50 a 100 milhões de contos. Na verdade, se neste momento conseguirmos constituir um fundo com valores entre 20 e 25 milhões de contos, considero que não é nada mau para começar. Recordo-lhe, Sr. Deputado, que, após três anos de funcionamento, as sociedades de capital dc risco do PEDIP já detêm participações em empresas do sector têxtil c de vestuário da ordem de 1,6 milhões de contos. Portanto, se constituirmos um fundo de 20 milhões de contos, já há um grande aumento em relação aos mecanismos actuais dc intervenção no sector têxtil através do capital de risco.
Portanto, Sr. Deputado, basicamente, o que está a ser feito é o que acabei de expor.
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro tinha sugerido que tanto o Sr. Secretário de Estado da Indústria como o Sr. Secretário dc Estado da Energia usassem da palavra imediatamente a seguir a si próprio, no contexto desta matéria. Assim, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Indústria.
O Sr. Secretário de Estado da Indústria (Alves Monteiro): — Sr. Presidente, ainda no seguimento da questão que o Sr. Deputado Nogueira de Brito colocou quanto às empresas públicas, quero informar que só restam mais quatro empresas. Uma delas é a QUIMIGAL, que, como sabe, foi sujeita a um processo de reorientação estratégica, de recentragem estratégica e de saneamento financeiro, c em relação à qual posso afirmar ter-se tratado de um caso de grande sucesso.
De facto, em 1986, não se sabia o que iria acontecer no dia seguinte à QUIMIGAL, sendo o mais provável o
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encerramento da própria empresa, com 80 milhões dc contos de passivo e 10 000 trabalhadores. Hoje em dia, e após um exercício complexo também do ponto dc vista legal, foi possível fazer uma reccniragem estratégica, tendo-se constituído empresas autónomas, quer libertando
divisões que a QUIMIGAL tinha quer alienando muitas das áreas de negócios que nao constituíam arcas estratégicas para a própria empresa.
Assim, em 1991, a QUIMIGAL vai ter um resultado líquido da ordem de 10 milhões de contos, não sendo este número significativo porque, obviamente, resulta de mais--valias apuradas nas alienações. Muito mais importante é que, através das operações previstas para 1992 — e uma destas, a da venda da ANEGRTNA, é de montante significativo —, a QUIMIGAL, que devera ter um passivo total que, em 1991, não vai chegar a 20 milhões de contos, chegará, ao fim de 1992, com um passivo à volta de 11 milhões dc contos.
Hoje em dia, a QUIMIGAL é uma holding, detendo participações cm empresas associadas, e as receitas que esta holding vai ler são suficientes para sustentar a empresa em termos normais. Isto significa que o saneamento financeiro esiá concluído e que se rentabilizaram muitas das áreas de negócios que, caso contrário, certamente teriam de fechar.
Como exemplo do bom sucesso destas operações, digo--vos que, antes de ler começado a haver redução dc pessoal — recordo que a QUIMIGAL reduziu o pessoal dc 10 000 trabalhadores para menos de 5000, sem que tenha havido qualquer ruptura social —, o parque industrial do Barreiro, que eslava em degradação, com indústria pesada distribuída por aquela área, tinha cerca de 2800 trabalhadores. Hoje em dia, com a constituição da QUIM1-PARQUE — de momento, tem à volta dc 5000 trabalhadores — e o estímulo ao aparecimento de novas empresas, há cerca de 150 empresas instaladas naquele parque. Na verdade, isto constitui uma boa prova de que uma reorientação estratégica e uma alteração completa da lógica da QUIMIGAL lambem tiveram bom resultado, no que diz respeito à dinamização do parque industrial, à diversificação que este hoje tem em termos de actividades económicas, e, por outro lado, ao seu papel como fomentador da criação de emprego não sustentado por razões não económicas.
Por isto diria que, no final de 1992, a QUIMIGAL estará em condições de prosseguirmos no sentido da privatização da holding. A nossa ideia é a dc que a QUIMIGAL — Adubos certamente vai manter-se ligada à holding, dado constituir a razão lógica da existência da própria QUIMIGAL. Assim, a privatização da QUIMIGAL — Adubos terá lugar ao mesmo tempo que a da holding.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado, para além da Qutmigal — Adubos, o que resta, neste momento, na holding?
O Orador: — Neste momento, na holding existe uma empresa ligada a produtos químicos, a QUIM1TECNICA, e existem ainda a AGROQUISA, ligada a pesticidas, a PLASQUISA, ligada a plásticos, e a ANILINA, ligada à produção de anilina, que funciona junto à ISOPOR, em Estarreja. Há lambem algumas empresas associadas, como, por exemplo, a FISIPE, cm que a QUIMIGAL continua a deter participações financeiras. Mas, essencialmente, 50 % do volume de negócios é ligado aos adubos eco que, certamente, se manterá c que será objecto de privatização em simultâneo com a da holding QUIMIGAL.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): — Sr. Secretário de Estado, a participação que a QUIMIGAL detém na FISIPE também será privatizada nessa altura?
O Orador: — Sr. Deputado, isso depende, porque não
queremos delapidar o património da QUIMIGAL e, neste momento, as colações da FISIPE estão muito por baixo. No entanto, se subirem e desde que se encontre um valor
aceitável para as respectivas acções, certamente que a operação poderá fazer-se. Mas enquanto tal não acontecer não há razão, em termos económicos, para vender participações que, hoje, têm cotação inferior ao seu próprio valor contabilístico. Portanto, dc momento, nem sequer se justifica encarar a hipótese de venda dessas participações.
Há uma outra empresa, a SETENAVE, de que, hoje cm dia, já não se fala. Neste caso, tomou-sc uma opção, semelhante à da CNP, que foi a dc entregar a concessão do estaleiro. Claro que há problemas, só que não são de índole semelhante àquelas que teríamos caso a SETENAVE ainda fosse delida pelo sector público.
Presentemente, a SETENAVE é gerida pela SOLGENOR e, no primeiro ano de exercício da sua concessão, a empresa teve um resultado francamente negativo, mas que teve a ver com problemas internos da própria SOLGENOR. Em 1991, que foi o ano de exercício completo após o primeiro ano de arranque, a empresa já vai ler um resultado positivo, o que significa que os problemas foram superados, pelo que, hoje cm dia, a SETENAVE c uma unidade que funciona pelos seus próprios meios e não foi mais necessário o Estado acorrer, através de um esforço financeiro, como foi no passado, para que a SETENAVE tivesse de garantir os vencimentos. A evolução será, obviamente, o contrato, que continuará. Assim que haja oportunidade, a empresa poderá ser vendida e a entidade que, de imediato, leria preferência seria, como é lógico, a que tem o contraio de concessão. Mas, enfim, é uma operação na qual não lemos grande pressa. Sc a operação se puder fazer far-se-á, mas hoje não é fácil privatizar estaleiros, muito menos os daquela dimensão. É evidente que, se encontrarmos interessados, estaremos em condições de avançar com a operação de privatização, mas, neste momento, não há realmente interessados na compra do estaleiro, nem a própria entidade que tem a concessão da SETENAVE se mostra muito interessada na sua compra.
As outras duas empresas na área das minas são a EDM (Empresa de Desenvolvimento Mineiro), holding mineira, e a ENU (Empresa Nacional de Urânio).
A EDM assume, neste momento, o papel de holding mineira, lem participações na Carbonífera do Douro, nas Pirites Alentejanas e na SOMINCOR, e está em posição dc ser privatizada numa posição minoritária a 49 %. O seu processo de privatização está em estudo, associando, eventualmente, entidades que possam vir a desenvolver, também sob o ponto dc visla tecnológico, mais as participações e as empresas do que a própria EDM tem. Como disse, é um processo que está cm estudo, mas numa fase que não é Ião avançada quanto o da Siderurgia Nacional.
A ENU é uma empresa com uma situação realmente delicada, porque neste momento o urânio não se vende, e a vender-se sê-lo-á a preços muito baixos, que representam 50 % do valor real do minério, e o Governo entendeu integrá-la na holding mineira que tem. Essa é a forma dc minorar os problemas da própria ENU, permitindo que algumas sinergias que as participadas da EDM têm possam, eventualmente, vir a beneficar das actividades por onde a ENU avançou. A ENU avançou em algumas
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preservações na área das rochas ornamentais c como a EDM também o fez pode haver vantagens em que a ENU seja também coordenada pela própria EDM, porque realmente não há qualquer vantagem em que empresas deste tipo, ou outros, sejam tuteladas directamente pelo Governo. Por isso 6 que, se existe uma holding mineira, há todas as vantagens em que essa holding mineira tenha a responsabilidade da ENU.
Portanto, por um lado, privatizar a ENU neste momento não faz muito sentido, tendo cm conta que a empresa tem realmente problemas financeiros e económicos complicados,
e, por outro, nao haveria interessados em tomarem conta
dela. Mas este problema poderá ser muito minorado ao serem encontradas outras vias no âmbito da tutela da EDM, e é isso que se vai ser feito.
Sendo assim, tem de fazer-se a avaliação das acções da ENU, que é o que falta ser feito, para se saber de quanto c que tem de ser o aumento de capital da EDM, aumento de capital esse que vai ser realizado pelas acções que o Tesouro detém na ENU.
Como o Sr. Ministro já se referiu as restantes questões, isto é tudo o que eu tinha a dizer.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário dc Estado da Energia.
O Sr. Secretário de Estado da Energia (Luís Conceição Pereira): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em relação às três empresas do sector da energia, o Sr. Ministro já se referiu com detalhe a uma delas, a PETROGAL, pelo que, creio, nada mais será necessário acrescentar.
Em relação às outras duas empresas do sector da energia, a Gás dc Portugal e a Electricidade de Portugal (EDP, E. P.), posso dar aos Srs. Deputados uma breve ideia do que sc pensa fazer nestas empresas.
Relativamente à Gás de Portugal, tencionamos, de facto, promover a sua privatização. No entanto, o seu liming ainda não está completamente definido, terá ainda de ser combinado com o Ministério das Finanças. De qualquer forma, pensa-se que o curto prazo para a privatizaçüo não seja o momento ideal, visto a empresa estar agora num processo dc «digestão» de um grande projecto, o do gás cm Portugal, dc que a Gás de Portugal faz pane, quer ao nível
do projecto dc alta pressão, portanto da construção do terminal e do gasoduto que se estenderá de Setúbal a Braga, quer, ainda, como participante cm todas as outras empresas distribuidoras, ou seja, da rede de distribuição local.
Deste modo, pensamos que o mais adequado é preparar a privatização, avançando com a avaliação da empresa, para, talvez mais para o final deste ano, se poder, então, passar ao processo de privatização no seu aspecto essencial.
No entanto, trata-se de uma empresa que vai ter um papel importante na área do gás c, mais a mais, em relação a um combustível que tentamos introduzir em Portugal, agora dc uma maneira mais generalizada, que é o gás natural, que não existe — a única coisa que hoje lemos é o gás dc cidade e apenas na zona da Grande Lisboa.
No que loca à EDP, pensa-se numa estruturação da empresa com alguns objectivos, cm que um deles — talvez q mais importante — é o de fazer cessar a sintonia, ou a conjunção, entre a EDP e o sector eléctrico. Em nossa opinião, a identificação entre o sector eléctrico e a EDP não é boa para o País, pelo que há necessidade dc reestruturar a empresa nos seus diversos sectores ou subsectores de actividade em que se decompõe, a saber: a produção, o iransporte — que inclui a rede de alta tensão — e a distribuição.
Neste momento, irata-se dc tentar definir quais ou quantas as empresas, eventualmente privatizáveis, que se vão criar na área da produção, embora deva dizer-lhe, Sr. Deputado, que a iniciativa privada já foi chamada a colaborar. Isto porque esperamos que seja já a iniciativa privada a ter um papel importante nos acréscimos de potência dc que o País necessita, quer em relação à Tapada do Outeiro, que é um projecto dc gás, quer em relação à Central do Pego. Aliás, só para dar-lhe uma ideia dos números, o País precisa por ano, em números redondos e
até ao final da década, de 300 MW/ano, o que é, mais ou
menos, a produção da Central do Pego, ou seja, qualquer coisa, a preços dc 1991, como 75 a 80 milhões de contos/ ano. Isto é, o País para fazer face ao seu crescimento projectado necessitará de 300 MW/ano, o que significa, mais ou menos, 75 a 80 milhões de contos/ano, pelo que, cm nossa opinião, a iniciativa privada pode ter um papel importante, não estando excluída, como é óbvio, a sua participação nas empresas de produção. E digo empresas porque neste momento ainda não é perfeitamente pacífica a questão de saber se vamos criar uma empresa que tome parte de lodos os centros elcctroprodulorcs da EDP, quer térmicos quer hidroeléctricos, ou se optaremos pela criação dc mais uma empresa, provavelmente uma para a área térmica e outra para a da hidroelectricidade.
Em relação ao outro subsector também importante, contido na EDP, o dos transportes, que diz respeito à rede de alta tensão e ao despacho, esse é o sector que vai coordenar, regular todas as relações entre as entidades actuantes no sector eléctrico. Neste caso, a ideia é a de constituir uma empresa, uma única, com uma participação importante do sector público, visto ter de regular interesses quer de empresas que, provavelmente, no início terão dc continuar na órbita pública, sc não houver participação da arca privada, quer, digamos, de regulação global do sistema. Em nossa opinião, a empresa a criar, que se chamará, provavelmente, Rede Eléctrica, terá de ter uma fone participação do sector público.
E no sector da distribuição que existem mais interrogações e, neste momento, estuda-se a possibilidade dc se criarem várias empresas. Como sabe, na área da distribuição existem autênticos monopólios naturais e não faz senudo que numa determinada região opere mais do que uma empresa.
Portanto, as empresas que criarmos terão de levar isso em linha de conta.
Mas existem outros problemas. Por exemplo, precisamos dc saber se vamos ou não manter uma tarifa única, o que vai condicionar — e muito! — o número de empresas a criar na área da distribuição.
Porém, neste momento estamos ainda em fase de estudo c pensamos concluí-lo, ou seja, ter ideias assentes, definidas, até meados deste ano, altura em que poderemos avançar mais profundamente.
Em termos muito sintéticos mias esclarecedores, penso que esie é o ponto da situação das empresas na área energética.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.' Deputada Apolónia Teixeira, a quem peço que seja breve'.
A Sr.» Apolónia Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, a minha pergunta é, dc fació, curta, mas objectiva, c gostaria que o Sr. Ministro ao responder-lhe também o fosse.
E do conhecimento público que as conclusões do relatório da OCDE sobre Portugal não são de facto optimis-
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tas. Neste quadro, entre outras questões, prevê um processo de falências de empresas no nosso país.
Pergunto: a confirmar-se tal previsão, quais são os sectores da indústria nacional que vão ser atingidos? Que repercussões e consequências terá na nossa economia?
Sr. Ministro, gostaria de ver esta questão esclarecida.
O Sr. Presidente: — Para responder, se assim o entender, tem a palavra o Sr. Ministro da Indústria e Energia.
O Sr. Ministro da Indústria e Energia: — Sr. Presidente, Sr.- Deputada Apolónia Teixeira, deduzi que não precisasse de ler o relatório da OCDE, pois bastava ter ouvido as minhas palavras de há pouco para saber que irá haver falências no sector da indústria. Isto só não tem acontecido porque a economia não tem funcionado de acordo com os parâmetros normais de uma economia de mercado. O problema é esse!
Logo, a partir do momento em que a economia portuguesa se aproxima desses parâmetros normais, em que se acaba com os mecanismos da desvalorização sistemática do escudo, do crawling-peg, que só fazia afunilar a especialização industrial portuguesa e ter um modelo assente cm salários baixos, é evidente que há toda uma lógica dc funcionamento da economia, uma mudança dc gestão empresarial, que tem de ser feita e alguns não conseguem, pelo que ficam, naturalmente, pelo caminho. Portanto, como 6 óbvio, as empresas ineficientes e inviáveis vão desaparecer. Isso é natural!
Não era preciso ter lido o relatório da OCDE para se chegar a essa conclusão.
E como tudo isto está a ser feito num quadro de crescimento económico de confiança e de estabilidade política, todo este processo pode ser gcrivcl nesta pers-
pectiva. Aliás, têm desaparecido empresas em Portugal e lá por isso não tem havido problemas porque se têm criado formas rápidas de absorção desses postos de trabalho. É evidente que os sectores com maior volume de emprego são os que têm processos com maior incidência, como é o caso dos sectores industriais «tradicionais». Nesse sentido, o Governo está a trabalhar, como já foi explicado
cm Plenário e vem nas Grandes Opções do Plano, num
programa de reestruturação e modernização desses sectores que também coincide com uma componente muito importante de conversão.
Aquando da discussão, na generalidade, do Orçamento do Estado no Plenário, eu disse que, no quadro de uma economia de mercado, com preocupações de justiça e de solidariedade social, o que o Governo tem de fazer quando uma empresa é inviável não é continuar a apoiar essa pseudo-empresa mas, sim, apoiar esses trabalhadores com uma rede social de protecção e com todas as acções de reciclagem e de formação profissional. E esta a nossa estratégia, que é clara, e é nisto que vamos continuar a trabalhar. Como exemplo, posso dizer-lhe que no vale do Ave já existem mecanismos do Ministério do Emprego e da Segurança Social que possibilitam fazer tudo isso.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, informo que os nossos trabalhos recomeçarão amanhã pelas 9 horas e 30 minutos, na Sala do Plenário, com a apreciação do orçamento do Ministério da Administração Interna.
Está encerrada a reunião.
Eram 20 horas e 40 minutos.
A Divisão de Redacção da Assembleia da República.
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