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II SÉRIE-C— NÚMERO 12

Parlamento Paritário

0 Parlamento paritário, organizado e coordenado pelas Eurodeputadas portuguesas Maria Belo, Margarida Salema e Maria Santos, realizou-se na Assembleia da República, nos dias 31 de Janeiro e 1 de Fevereiro de 1994, tendo como objectivo debater a questão da participação política das mulheres, tornando-a mais evidente e natural nas mentalidades, e introduzir no vocabulário corrente a noção de paridade.

Em resultado do debate havido foram aprovados, em votação final, os três documentos que a seguir, se publicam.

Documento n.º 1

Recomendação sobre a cidadania

1 — Com a instauração do «pacto de fraternidade» pela Revolução de 1789, a nova classe política dela emergente julgou ter obtido um conjunto de direitos do homem e do cidadão que se perpetuaria num novo regime.

Mas isso significava também a exclusão radical do sexo feminino da esfera pública. Como conciliar então esta exclusão com os princípios da Revolução? No século xix e em parte do século xx assiste-se, assim, a uma tentativa de teorizar uma nova ordem democrática sem as mulheres, às quais é negado o voto.

Será necessário assistir à luta das sufragistas, a rupturas e a revoluções para que esse mais elementar direito de intervenção política seja generalizadamente reconhecido às mulheres, direito que se tornará posteriormente o símbolo da própria cidadania quando definida como um direito de participar normalmente nos assuntos políticos.

2 — Ser humano implica, por um lado, afirmar a identidade de maneira autónoma e, por outro, assumir as responsabilidades para com os outros e para com o mundo em geral. Cada mulher e cada homem devem ser simultaneamente livres e activos, ou seja, fiéis a si mesmos e capazes de contribuir para o desenvolvimento da cidadania.

3 — As liberdades próprias e as dos outros não devem ser definidas pela negativa, mas pela positiva, reforçando a identidade das pessoas. Não se trata, pois, de abolir diferenças entre mulheres e homens, enquanto tais, mas de garantir a igualdade de oportunidades para exercer a plena cidadania.

4 — Assim, a diversidade e o pluralismo da sociedade contemporânea devem permitir uma nova abordagem das liberdades individuais, suscitando a exigência do respeito pelas diferenças entre mulheres e homens.

5 — Não se trata, contudo, de substituir uma visão masculina, redutora, do mundo por outra simétrica, feminina, igualmente redutora; trata-se de reconhecer que todos, mulheres e homens, têm direito a aspirar a uma múltipla dimensão da vida — cívica, social, profissional e privada — em condições idênticas.

6 — À semelhança do que acontece noutras situações, também se verifica um défice democrático no exercício dos direitos e deveres da cidadania por parte das mulheres na nossa sociedade, particularmente evidente na sua diminuta presença nos órgãos do poder político.

7 — Apesar dos progressos feitos, o sistema partidário vigente ainda não alcançou, não obstante as suas virtualidades, nomeadamente ao nível local, os resultados desejáveis no capítulo da eliminação do défice democrático.

8 — Em Portugal, bem como nos diversos países ocidentais, há objectivos políticos que unem as mulheres para além das ideologias num combate comum pelo exercício da cidadania.

9 — A cidadania assume uma nova dimensão no Tratado da União Europeia, de que um dos principais objectivos é o reforço dos direitos, dos deveres e dos interesses dos nacionais dos Estados membros, mediante a instituição de üma cidadania da União.

10 — Qualquer pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado membro, definida por este, é cidadã da União. E a cidadania europeia acrescenta um conjunto de direitos e deveres àqueles que já decorrem da qualidade de cidadãos de um Estado membro. Estes passam a beneficiar do direito de eleger e ser eleito nas eleições municipais e europeias, qualquer que seja o Estado membro onde residam; a gozar de protecção diplomática e consular por parte das autoridades dos outros Estados membros, do direito de petição, do direito de se dirigir ao Provedor de Justiça, bem como do direito reafirmado da livre circulação.

11 — Esta nova dimensão conferida à cidadania significa o reconhecimento e aprofundamento dos direitos políticos e civis a nível comunitário, que, contudo, não assumirá a sua plenitude humana se excluir os imigrantes inseridos na sociedade de acolhimento, qualquer que seja a sua origem nacional.

12 — Cada nova transformação da geografia política na Europa e no mundo deverá ser acompanhada por uma aplicação clara do princípio da paridade como expressão natural e visível do exercício da cidadania.

13 — Para concretizar o pleno exercício da cidadania pela mulher e pelo homem, é necessário promover e alargar a educação cívica na escola e a cultura cívica na vida social, profissional e política. As instituições educativas devem assumir a educação para a cidadania como uma aquisição cultural adequada ao mundo contemporâneo.

Aprovada, em 1 de Fevereiro de 1994.

A Presidência em Exercício: Maria Belo — Pedro Roseta.

Documento n.° 2 Proposta a incluir na «Recomendação sobre cidadania»

As «declarações de defesa dos direitos do homem», sendo em si uma referência histórica e inultrapassável, devem ser lidas actualmente enquanto consagração de plena igualdade de direitos de homens e mulheres.

Nesse sentido, a referência a esses direitos deve entrar na linguagem comum como direitos humanos, direitos de toda a pessoa humana, em plena igualdade.

Foi, aliás, nesse sentido que recentemente se pronunciou a Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa ao aprovar uma recomendação relativa a este domínio.

Propomos, por isso, que, em nome da igualdade dos direitos universais, se passe a referir o histórico «direito do homem», mais rigorosamente, como direitos humanos ou direitos da pessoa humana.

Helena Torres Marques — Lourdes Pintasilgo — Alberto

Martins —Ana Maria Bettencourt—José Niza.