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30 DE OUTUBRO DE 1992 181

Curiosamente, o Prof. Jorge Miranda, quando aqui esteve, também fez considerações a este propósito, aceitando que a prática e eventualmente o que está implícito quer no artigo 231.°, n.° 2, quer no artigo 229.°, n.° 1, alínea u), já bastam para permitir que os órgãos de governo próprio se pronunciem sobre questões de âmbito comunitário que digam respeito às Regiões Autónomas.

A introdução específica desta matéria, eventualmente bem intencionada, tem o perigo de pôr em causa esta amplitude, podendo até criar graus de incerteza noutras áreas. E era bom que esta incerteza não se introduzisse. Daí que não possamos votar favoravelmente esta disposição. Mas, atenta a minha posição em relação às Regiões Autónomas e aceitando que há aqui uma boa intenção de explicitar também esse poder e não propriamente o de o trazer como inovação à Constituição, vou, pessoalmente, abster-me na votação desta proposta. Contudo, o PSD votará contra.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Guilherme Silva, na primeira leitura desta norma, não pude travar com V. Ex.a o diálogo que gostaria. Provavelmente, não é esta a altura de o fazer, mas gostaria de colocar-lhe uma pergunta. Se bem entendo, V. Ex.a considera que esta proposta terá tido pelo menos o mérito de introduzir uma clarificação. De facto aquilo que acaba de verter para a acta é uma leitura que diria de interpretação actualista - isto é no mínimo e não estou a dizer-lhe que essa leitura mereça qualquer espécie de discordância pela minha parte - de uma norma constitucional que oferece dificuldades de interpretação - o artigo 229.°, n.° 1, alínea u). E porquê? Porque a norma do artigo 229.° que citei estabelece precisamente que as Regiões Autónomas têm o poder de se pronunciar "por sua iniciativa, ou sob consulta dos órgãos de soberania, sobre as questões da competência destes", órgãos de soberania, "que lhes digam respeito".

Ora, o que está - e estará cada vez mais - em causa no panorama europeu é que, além das decisões dos órgãos de soberania, há outras, oriundas dos órgãos próprios das Comunidades Europeias e da futura União Europeia. Algumas dessas decisões, designadamente as que assumem carácter legislativo ou paralegislativo, são o resultado da actuação da entidade com poderes legislativos no concerto comunitário, o Conselho, em que o Governo Português tem a sua representação e em que pode intervir, outras não.

Por outro lado, além das questões de cunho tipicamente legislativo ou paralegislativo, há todas as outras questões, das mais diversas naturezas, da competência dos órgãos da União Europeia, algumas das quais podem até originar actos com aplicação directa no território das Regiões Autónomas, e, portanto, exercer um efeito de penetração nas respectivas ordens jurídicas através dos meios de sedimentação jurídica normais.

Foi isto que nos levou não a rejeitar a leitura que o Sr. Deputado acaba de fazer da norma constitucional, mas a adoptar uma cautela, que V. Ex.a pode, porventura, considerar sobreabundante, mas não estou a censurar isso. Repare que a fórmula proposta pelo PS visa conferir às Regiões Autónomas o poder de se pronunciarem sobre propostas de actos comunitários, o que é uma decorrência da vontade de não colocar as Regiões Autónomas, também neste domínio, perante factos consumados.

Há, perante esta proposta, duas atitudes e, seguramente, a nossa nunca seria catastrofista. V. Exa. pode ter 10 redacções melhores do que esta - a formulação não é fácil neste domínio. Mas há que optar.

A sua posição de abstenção pessoal, enquanto Deputado eleito por uma Região Autónoma, será sensibilizadora do ponto de vista político-pessoal mas não resolve a questão política constitucional que está equacionada.

Portanto, de qualquer das formas, o saldo deste debate só pode ser um de dois bons saldos: o primeiro, é uma ligeira correcção de uma palavra, conducente à supressão de qualquer dúvida; o outro, será uma interpretação clarificadora, actualista, que, evidentemente, tem o valor que tem para os trabalhos preparatórios de um processo de revisão constitucional. Devo dizer que não posso esconder qual é a minha inclinação...

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - O Sr. Deputado José Magalhães com o à-vontade, o conhecimento e a habilidade, que lhe são conhecidos, defendeu os méritos, e apenas estes, da proposta.

Assim, dir-lhe-ei que a clarificação se deve mais ao debate do que à proposta em si, embora sem deixar de reconhecer que foi a proposta que gerou o debate. Em todo o caso, a proposta considerada isoladamente teria, se o debate não fosse calrificador, os perigos que lhe apontei mas, sem dúvida alguma, que há um saldo positivo - e nisso concordo consigo - na clarificação introduzida.

No rigor jurídico-formal e institucional com que o Sr. Deputado coloca a questão da distinção - e ela existe - entre as competências dos órgãos de soberania portugueses e das instituições comunitárias, é óbvio que, nesse rigor, esta proposta poderia traduzir-se num mais positivo, só que, penso, na realidade, a questão tem de ser vista com a tal interpretação actualista que referi e, neste sentido, Portugal, pelo facto de estar na Comunidade Europeia e de reconhecer - agora até em grau mais avançado, eventualmente - competências alargadas aos órgãos comunitários distintas das dos órgãos de soberania internos do Estado Português, isso não significa que não tenha e que a própria estrutura comunitária não assegure a participação portuguesa nessa co-decisão que os órgãos comunitários vão formulando.

Assim, essa participação tem de ser vista de baixo para cima em todo o processo decisório interno português, designadamente com a presença veiculada da opinião dos órgãos próprios das Regiões Autónomas quando se trate de questões que entrem nessa esfera, mais externa do que interna, mas sempre com ligação às responsabilidades dos órgãos de soberania internos responsáveis pela Administração Portuguesa e pela participação no âmbito comunitário.

Penso que esta clarificação basta, sem haver necessidade de consagrar mais qualquer normativo, e que é consensual esse sentido interpretativo. Portanto, ficamos com a acta da reunião como elemento bastante para se chegar àquilo que, eventualmente, o PS pretendia através de uma expressão mais concreta no normativo que propôs.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, esta intervenção do Sr. Deputado Guilherme Silva suscitou-nos, numa rápida troca de impressões, uma dúvida: será que o Sr. Deputado teria o mesmo tipo de reacção a uma fórmula que se limitasse a fazer o expurgo de três palavras constantes desta alínea u) do artigo 229.°?

Para dar provimento total à sua observação, para não prejudicar em nada aquilo que ficou vertido para a acta e também para não prejudicar aquilo que decorre do n.° 2