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12 DE ABRIL DE 2023

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PROJETO DE LEI N.º 698/XV/1.ª

ALTERA O REGIME DO TRABALHO TEMPORÁRIO E REFORÇA OS MECANISMOS DE COMBATE AO

TRABALHO FORÇADO E A OUTRAS FORMAS DE EXPLORAÇÃO LABORAL

Exposição de motivos

A Lei n.º 28/2016, de 23 de agosto, resultou de um projeto do Bloco de Esquerda, apresentado em outubro

de 2015, e de um outro apresentado depois pelo Partido Socialista. As alterações então feitas ao Código do

Trabalho, ao regime jurídico da promoção da saúde e segurança no trabalho e ao regime jurídico do exercício e

licenciamento das agências privadas de colocação e das empresas de trabalho temporário tiveram como objetivo

a responsabilização de toda a cadeia de contratação pelas violações dos direitos dos trabalhadores, pelos

créditos e encargos sociais do trabalhador, bem como pelo pagamento das respetivas coimas. O objetivo era o

de que, numa obra, empresa ou exploração agrícola, a empresa que recorre ao trabalho temporário ou a

angariadores de mão de obra não pudesse invocar que não tem responsabilidade ou alegar desconhecimento

em relação ao que ali se passa. À época, era já conhecida a dimensão do trabalho forçado e da exploração

laboral, nomeadamente nas explorações agrícolas do Alentejo. Mas, apesar disso, nem todos acompanharam

este passo.

CDS-PP e PSD votaram contra o diploma. As quatro confederações patronais, CAP, CCP, CIP e CTP,

divulgaram um comunicado conjunto em que alegaram que «o diploma não se limita a circunscrever a

responsabilização àqueles que, por ação ou omissão, praticaram a ilegalidade, indo muito para além destes»,

considerando que «as empresas de trabalho temporário, as agências privadas de colocação e os respetivos

utilizadores ficam, na prática, proscritas, atento o enorme risco que passam a comportar». Tal comunicado era

revelador do quanto alguns segmentos dos patrões portugueses se haviam habituado à impunidade no recurso

a cadeias de subcontratação. A raiva das confederações patronais contra este mecanismo de responsabilização

foi também expressiva da importância que atribuíam à manutenção destes esquemas de subcontratação e

recurso ao trabalho temporário.

Com efeito, a responsabilização e penalização de toda a cadeia são essenciais no combate ao trabalho

forçado e aos crimes de tráfico de seres humanos. «Em casos extremos…», dizia então o Bloco, «… têm-se

registado fenómenos de trabalho forçado, com retenção de documentos de identificação dos trabalhadores,

circunstância que os coloca numa situação de total dependência, sem meios de subsistência, confrontados com

dívidas abusivas de alojamento e transporte, num País cuja língua não dominam. Este conjunto de fenómenos

traduz-se em grosseiras violações dos direitos humanos e configura o crime de tráfico humano, ou seja, a

escravatura em pleno século XXI».

Este problema, como se vê, não é, infelizmente, novo. A alteração dos padrões de produção agrícola e de

uso da água para o efeito deu lugar, há anos, em Odemira, por exemplo, a um nicho de enriquecimento feito de

horticultura superintensiva e, para lhe dar suporte, de um afluxo massivo de mão de obra hiperexplorada. A

rápida acumulação de lucro foi feita à custa dos baixos custos do trabalho: salários reduzidos, anulação de

direitos laborais elementares, fragilidade absoluta ou mesmo inexistência de vínculos contratuais, exploração.

Aos baixos custos do trabalho juntou-se a precariedade social em geral, sobretudo na habitação, com a

aglomeração obscena de dezenas de pessoas num mesmo espaço exíguo e sem condições mínimas de

habitabilidade, perante o crescimento de uma economia local que viu no aluguer de quartos uma «galinha dos

ovos de ouro».

O surgimento das empresas de trabalho temporário (ETT), que contratam trabalhadores não para si, mas

para serem cedidos a terceiros, coexiste com as designadas «prestadoras de serviços», que concorrem com as

ETT de forma ainda mais desregulada, constituindo-se, na prática, e à margem da lei, como empresas de

cedência de mão de obra, nomeadamente para explorações agrícolas e obras. Num primeiro momento, muitos

destes trabalhadores vinham dos países mais pobres da União Europeia (Roménia e Bulgária) e do leste

europeu (Ucrânia e Moldávia); nos anos mais recentes, multiplicam-se os trabalhadores oriundos de países

asiáticos (Tailândia) e indostânicos (Nepal, Paquistão, Índia e Bangladexe). Estes movimentos migratórios para

Portugal, essenciais para as explorações intensivas no setor primário, têm tornado os imigrantes presas fáceis

para as redes mafiosas de exploração e tráfico de mão de obra, muitas vezes encapotadas pela criação de

«empresas na hora», tituladas por falsos empresários que funcionam como meros testas de ferro.