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11 DE FEVEREIRO DE 2025

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A extensão dos horários também se verifica em alguns setores industriais, devido à continuidade do processo

produtivo, tendo a sua utilização vindo a ser cada vez mais comum também em grandes superfícies comerciais.

De facto, nos últimos anos, a Europa tem assistido a uma liberalização dos horários de trabalho, levando, por

exemplo, a maioria dos espaços comerciais a funcionar até mais tarde e a abrir ao domingo. Estando mais de

20 % dos trabalhadores estão enquadrados por este regime. Este prolongamento dos horários não pode deixar

de ser problematizado.

Em Portugal, o trabalho em regime noturno e por turnos abrange vastas áreas da produção, assegurando o

funcionamento de setores fundamentais da sociedade. A produção, transporte e distribuição de energia, o

sistema de saúde, a distribuição de água e alimentos, as telecomunicações, a segurança (das pessoas, da

cadeia de logística e dos bens), os transportes públicos e de mercadorias e os espaços comerciais são alguns

exemplos de setores de atividade onde o trabalho noturno e por turnos assume uma expressão significativa.

O trabalho por turnos está a aumentar e é uma realidade cada vez mais presente nas organizações laborais,

abrangendo, no nosso País, mais de 950 mil pessoas. Trata-se de um aumento significativo, tendo em conta

que, em 2009, o número não ultrapassava os 500 mil. Entre outras consequências sociais, ele comporta custos

elevados na dinâmica social e familiar dos trabalhadores. Em Portugal, a trivialização das autorizações para a

laboração contínua tem permitido uma expansão muito pouco criteriosa de regimes de trabalho que passam por

horários cada vez mais alargados.

O tema do trabalho por turnos e noturno tem sido sucessivamente relegado, sem que nada de concreto

aconteça para garantir melhores condições de trabalho e maior proteção social a estes trabalhadores. Apesar

de na Lei do Orçamento do Estado para 2020 – e por pressão do Bloco de Esquerda – ter ficado inscrita, no

artigo 250.º, a necessidade de realização de um estudo sobre o impacto do trabalho por turnos, tendo em vista

o reforço da proteção social destes trabalhadores, o facto é que até hoje esse estudo não existe e os

trabalhadores por turnos não viram nenhuma melhoria concreta acontecer.

Passados mais 4 anos, as debilidades já existentes do ponto vista social e laboral são evidentes e, no entanto,

nunca foi dado a conhecer qualquer resultado e a proteção social dos trabalhadores por turnos e em regime

noturno não foi reforçada.

Investigações de âmbito académico têm demonstrado que o horário de trabalho por turnos, especialmente

quando envolve a realização de trabalho noturno e/ou períodos muito valorizados familiar e socialmente, pode

representar para o/a trabalhador/a dificuldades acrescidas do ponto de vista biológico, psicológico e/ou familiar

e social. Boa parte das dificuldades experienciadas resulta, por um lado, da necessidade de inversão do ciclo

sono-vigília (i.e., ter de dormir de dia e de trabalhar à noite) e, por outro, do desfasamento entre a estruturação

do tempo social e certos horários de trabalho, donde se salienta os períodos ao final do dia e aos fins de semana.

Embora os diferentes efeitos tendam a interrelacionar-se, podem ser agrupados em três grandes dimensões:

saúde (perturbações na saúde física e psicológica, incluindo perturbações nos ritmos circadianos); efeitos

sociais (interferência na vida familiar e social) e ocupacionais (em especial, as perturbações circadianas do

desempenho e a sua relação com a segurança ocupacional).

Diversos estudos científicos sobre a realidade do trabalho por turnos e o trabalho noturno têm dado um

contributo inestimável para um mais profundo conhecimento deste fenómeno e das suas consequências

humanas (designadamente, perturbações do sono, gastrointestinais, cardiovasculares, do humor, fadiga

crónica, problemas metabólicos, sociais e familiares, acidentes de trabalho por vezes mortais e catastróficos,

absentismo, diminuição da capacidade laboral e envelhecimento precoce). Por isso mesmo, esses estudos têm

vindo a interpelar os poderes públicos sobre a necessidade de uma maior regulação desta modalidade de

organização do trabalho. Apesar de as empresas garantirem que cumprem a lei, verifica-se, por exemplo, que

aspetos básicos da regulação do trabalho por turnos, como o intervalo de pelo menos 11 horas nas mudanças

entre os turnos, como recomendado na Diretiva europeia 93/104/CE, não são, de facto, respeitados.

No dia 1 de maio de 2023, entrou em vigor a Agenda do Trabalho Digno que, apesar de ter sido apresentada

pelo Governo como uma importante reforma laboral, manteve inalteradas matérias essenciais, como é o caso

do trabalho por turnos e noturno. O Partido Socialista uniu-se à direita para rejeitar as propostas apresentadas

pela esquerda que incidiam exatamente sobre estas matérias.

A negociação e a contratação coletiva são um espaço privilegiado para regular estas matérias. Mais uma

vez, as sucessivas revisões do Código do Trabalho em matéria de negociação e contratação coletiva tiveram

como efeito desequilibrar, a favor do patronato, a legislação laboral, diminuir a capacidade de negociação dos