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samente nega a portaria já citada de 29 de Agosto passado, e que expressamente não afirma o encarregado dos negocios de Hespanha, pois que diz que por mais argumentos, que se queirão citar da nuliidade dos tratados se virá apurar em que existem defeito; e em que a não existirem, o interesse reciproco de ambas as nações exigia imperiosamente aquella entrega.

E hem se póde crer que não duvida a Commissão de que os crimes, de que são arguidos os dois Hespanhoes, estejão comprehendidos na letra, e espirito das nossas antigas concordatas, confirmadas pelo tratado de 1778, ou de que esse tratado obrigue actualmente a Nação, e os successores dos monarcas que o assignarão, o que inutilmente allega o encarregado dos negocios no seu officio; de que duvida, he que elle ainda hoje exista de direito, ou de facto.

E na verdade sebe doutrina corrente entre os publicistas, que quando uma nação rompe um tratado de paz, vem a perder os direitos adquiridos em virtude desse tratado, o qual fica de todo extincto, senão for expressamente renovado pelo novo, que se lhe seguir: quem poderá duvidar que o tratado de affiança firmado em 1778 ficou sem effeito pela guerra, que nos moveu Hespanha em 1801? e que não só não foi expressamente renovado pelo tratado de paz de Badajoz, que antes pelo contrario no artigo 10 deste tratado se obrigão os dois monarcas a renovar desde logo os tratados de alliança defensiva, que existião entre as duas monarquias, donde se vê que entretanto que não se renovavão devião ficar suspensos os tratados de similhante natureza, qual era sem alguma duvida, como se mostra pelo seu mesmo titulo o de 1778. Mas ainda prescindindo deste argumento he evidente que não só este, mas todos os tratados com Hespanha cessarão pelo celebre tratado, celebrado entre aquella potencia, e a França, de qual se seguiu a invasão de 1807; pois que tendo esta por objecto não uma guerra de governo a governo, ou de nação a nação, mas uma conquista, e inteira desmembração da Monarquia portugueza vinha esta, ainda quando não chegasse a perder a sua existencia, a ficar necessariamente desligada de todos os vinculos, e convenções, que até então a união áquellas duas potencias, em quanto aquelles não fossem expressamente renovados por novas relações de amizade, e estas por tratados solemnes de paz. Succedeu porem que com a França restabeleceu-se a harmonia, e firmou-se um tratado, mas com a Hespanha renovárão-se só as relações de amizade, mas não os antigos tratados, que só por outro posterior podião ser expressamente confirmados.

He verdade que ha tratados renovados por um consentimento tacito; mas este não se presume facilmente; e segundo os publicistas só se póde fundarem factos de natureza tal, que só possão ser motivados pelos tratados: porem a Commissão he de parecer que não só não existem factos, que provem a renovação dos antigos tratados com Hespanha, mas que existem alguns que provão que elles não forão renovados.

Nem os factos da entrega reciproca dos criminosos, feita pelas autoridades subalternas das fronteira dos dois Reinos, nem a convenção entre os governadores de Portugal, e Regencia de Hespanha em 1810, que allude aos privilegios, liberdades, e isempções, que se achão concedidos pelos tratados subsistentes entre as duas nações, podem provar a tacita renovação destes tratados, porque taes factos, e allusão geral, e indeterminada tinhão só por fundamento a reciprocidade de interesses e harmonia entre as duas nações, que então fazião causa commum contra os Francezes, e não a legal approvação dos dois soberanos.

A lei do asylo acima citada, feita pelas cortes de Hespanha, que he um dos argumentos, em que se funda o encarregado dos negocios tambem não prova a renovação dos tratados, porque ainda que seja certo que ella resalvasse os existentes com os outros governos, e que na 1.º das duas extensas discussões que houve sobre esta lei, o ministro dissesse que havia um tratado a este respeito com Portugal, he tambem não menos certo que o mesmo ministro confessa que não tivera tempo para examinar os tratados existentes; e que na 2.ª discussão aparece como doutrina corrente professada pelo ministerio, que os tratados deixão de existir pela guerra, e que um governo constitucional deve ser muito circunspecto na entrega das pessoas reclamadas por outro governo. Além disto he evidente que nem o texto da lei de asylo faia expressamente dos tratados com Portugal, nem uma nação póde reservar por si só os tratados, que fez com a outra.

Pelo contrario ha factos de outra muito differente natureza, os quaes assas mostrão que os antigos tratados com Hespanha perderão a sua observancia. Assim o entendêrão com effeito os plenipotenciarios de Portugal no Congresso de Vienna quando abertamente dizião perante o mesmo Congresso, que as duas nações sem nenhum tratado de alliança, nem se quer de paz que as ligasse, havião passado de um verdadeiro e legitimo estado de guerra ao da mais cordial, e mais intima união.

O territorio de Olivença, que de direito pertence a Portugal, pois que o tratado de Badajos de 1801 foi especialmente declarado nullo pelo manifesto de S. Magestade do 1.° de Maio de 1808, e por um artigo addicional do tratado de paz geral com a França em 1814; está ainda a pezar dos antigos tratados occupado de facto por Hespanha. Finalmente o futuro destino do territorio de Montevideo, occupado pelas tropas portuguezas desde o anno de 1816, parece não estar ainda definidamente regulado por mutuo consentimento de ambas as nações.

He pois manifesto á vista dos factos que ficão apontados, que entre Portugal e Hespanha existem vinculos fortissimos de sangue, amisade, boa fé, e interesses reciprocos, mas não existem tratados de alliança, ou de paz.

3.º Mas ainda suppondo que existem de direito, ou de feito os nossos antigos tratados com Hespanha; parece á Commissão que não he exacta aquella parte do officio do encarregado dos negocios, em que este afirma que os dois criminosos de que se trata, forão

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