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DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

tamente infundadas, contra esses actos, a que nem quero dar nome, é porque então os membros d'esse partido, os homens liberaes, que não pelejavam nos campos de batalha, ou haviam encontrado lá morte gloriosa em defeza da liberdade, ou estavam deportados na Africa ou encarcerados nos porões dos navios de guerra, ou nas masmorras dos presidios militares (muitos apoiados).

Aqui tem o sr. Pinheiro Chagas o motivo por que essas phrases injustas não eram repellidas pelos progressistas de então.

Espanta-se o sr. Pinheiro Chagas, de que nos admiremos dos actos arbitrarios praticados pelo governo, sem que elle chegasse a suspender as garantias como é pratica em Hespanha, e n'outros paizes que se reputam não menos liberaes! Realmente, sinto-me quasi disposto a mandar para a mesa, e a pedir á camara que vote uma moção de louvor ao governo, porque não chegou a deportar-nos! (Riso.) E se tambem o governo, segundo é pratica na Hespanha, nos não manda fuzilar, apesar de nos atrevermos a pensar de maneira differente das suas idéas, isso é realmente motivo para lhe agradecer! (Riso.)

Aconselhou então porventura a opposição que se suspendessem as garantias?

Uma voz: — Aconselhou.

O Orador: — Não fui de certo eu, nem o partido a que me honro de pertencer. Mas se alguma parte da opposição aconselhou esse procedimento e se merece censura, é porque se deixou illudir com as affirmações do governo (estrepitosos apoiados). A opposição só aconselhava a suspensão das garantias quando um governo, que reputava serio, lhe dizia que a ordem publica estava profundamente ameaçada (apoiados).

A opposição só aconselhava que se suspendessem as garantias quando se lhe dizia — que a dynastia, que tinha sido collocada no throno á custa do sacrificio e do martyrio de tantas victimas, e dos horrores das continuas revoluções que duraram um quarto de seculo, estava em perigo de caír e com ella as instituições liberaes, que ella symbolisava (apoiados).

O sr. Luiz de Campos: — E a independencia!

O Orador: — Aconselhou finalmente a opposição que se suspendessem as garantias quando o governo affirmava que estava compromettida a propria independencia da nação (apoiados). Pois uma nação que durante nove seculos tem firmado essa independencia á custa de tanto sangue e de tanta lagrima, de tanta viuvez e de tanta orphandade, de tantos e tão dolorosos sacrificios, deixava perder essa independencia só porque não se atrevia a adoptar o meio que a libertava d'esse tremendo perigo? Porventura a suspensão das garantias era a destruição de todos os direitos politicos do paiz? Pois ignoram os srs. ministros que a carta constitucional, mesmo n'esta hypothese gravissima, marca ao governo a norma de conducta que elle devia seguir?

A opposição aconselhou ao governo aquelle acto persuadida de que o governo não illudia o povo (apoiados), dizendo-lhe que existiam crimes que não podiam existir n'esta terra (apoiados). Não lhe censurem o conselho, censurem-lhe a credulidade.

Quando se affirma a existencia de sentimentos de radicalismo demagogico, ninguem se póde referir a este lado da camara. Esses sentimentos ou estão do lado do governo ou é d’ali que elles se geram. É da compressão das idéas, da constante compressão do sentimento popular, e do constante sophisma com que são praticados pelo governo todos os actos que se referem ás manifestações da vida constitucional dos povos (apoiados), que nasce o radicalismo demagogico.

A historia ha de impor ao segundo Cesar de França a mais grave responsabilidade pelos actos ali praticados depois da queda do imperio. Não foi a multidão desvairada que praticou os vandalismos da communa, foi o tyranno que pretendeu e conseguiu desvairar a opinião.

Citou-se tambem a Italia para justificar o procedimento do governo. Podia citar-se a Russia e a Turquia...

O sr. Pinheiro Chagas: — A Italia é liberal.

O Orador: — Pois a Italia que era liberal deixou de o ser no dia em que destruiu o primeiro direito popular (apoiados).

Pois no paiz mais liberal do mundo, se houver um homem que tente contra a liberdade, porque esse homem commetteu esse crime, segue-se que estamos auctorisados, nós tambem, a attentar contra ella. Eu protesto contra essa doutrina com toda a energia de que sou capaz.

Disse-se: «Só os jornaes da opposição se assustaram com o apparato das medidas extraordinarias adoptadas pelo governo». Porventura os jornaes da opposição estavam em intima convivencia com o governo para saberem que apenas se tratava de uma farça burlesca? (Apoiados.) O que os jornaes da opposição não sabiam, e o que os jornaes do governo cuidadosamente, occultavam, era que tudo o que se estava passando era apenas uma farça burlesca, que não tinha importancia nem gravidade, que era realmente cousa só para rir; portanto não admira que os jornaes da opposição se assustassem com as providencias do governo, que a final não eram senão um meio de prolongar a sua triste existencia. O que admira é que houvesse um governo que se lembrasse do dizer ao povo que o seu rei tremia d'elle.

Um rei portuguez nunca tremeu! (Apoiados).

O povo portuguez não tenta contra o seu rei (apoiados). Povo, rei e dynastia são entidades solidarias, porque esta emana d'aquelle; porque o rei é o primeiro representante da soberania nacional, porque é o mandatario do poder do povo, e tem n'elle a mais segura garantia de segurança para a sua pessoa.

Ora, quem visse as precauções militares tomadas entre nós; quem visse todo esse apparato militar tomado apenas contra uns moinhos de vento, julgaria que era repetido entre nós aquelle reinado a que já fiz referencia, durante o qual se escrevia nas esquinas de Londres:

«Rex fuit Elisabeth, nunc est regina Jacobus

Error naturae sic, in utroque fuit.»

Não era isso, não se illuda ninguem com essas apparencias, porque debaixo d'ellas está uma cousa séria e positiva que é exactamente a contraria. Um rei portuguez nunca tremeu dos seus inimigos, quanto mais do povo, que é o seu primeiro e mais leal amigo (muitos apoiados). Perante o povo só tremem tyrannos.

Mas quem nos havia de dizer que isto, que eram só farças burlescas, havia de ser pretexto para que um ministro se condecorasse a si proprio, como muito bem disse hontem o sr. Luiz de Campos!

Pois representa-se no paiz uma farça burlesca, pinta-se com negras cores o scenario, aspecto carregado os farçantes quando a representação, a fallar verdade, não passava, não obstante os esforços empregados, de uma farça, e dão-se condecorações a alguem por isto?!... Isto é serio? (Apoiados.)

Ninguém censurou tanto o procedimento do governo como o proprio sr. Pinheiro Chagas, n'aquella designação do espectaculo representado perante a nação.

Por ultimo defendeu ainda o illustre deputado o governo, dizendo que a conspiração iberica contra a nossa independencia foi qualificada pelo poder judicial.

Está enganado o illustre deputado. Peço perdão de lh'o dizer. Muito antes de ser levada esta questão aos tribunaes appareceu a qualificação nos jornaes do governo (apoiados). Não foi portanto o poder judicial que a apresentou, antes foi o poder judicial quem a desmentiu. Ahi estão os factos que fallam mais alto do que a asserção do sr. deputado. Esta é a verdade.

O illustre deputado póde ter muito empenho em defender os seus amigos politicos, mas não conseguirá destruir a verdade dos factos. S. ex.ª sabe que ha um accordão da relação onde essa accusação está completamente destruida.