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166 DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Assim o ouvi ao sr. ministro do reino, e todavia ainda me custa a acreditar que s. exa. o dissesse!

Oh! sr. presidente, pois se essa reforma fosse legal, podia porventura o paiz recusar-se aos encargos que justamente se derivavam da lei? (Apoiados.)

Pois era licito ao governo dizer que engeitava esses decretos, por ser impossivel que ao mesmo tempo que se publicava o imposto de rendimento, que obrigava os contribuintes a novos sacrificios, se fosse exigir que uma parte doctes se applicasse á reforma de officiaes do exercito, que tinham, em ousados commettimentos, arriscado a sua existencia em serviço da patria, e que já no ultimo quartel da vida pediam que lhes fosse concedida, não uma recompensa, mas a retribuição que pelos serviços tinham merecido? (Apoiados.)

Pois isso é argumento que se possa adduzir, quando vemos que a pretexto de reformas se criam enormes quadros de empregados publicos, onde com largueza se contemplam os amigos e sustentaculos do governo? (Apoiados.)

Responda o governo: se a reforma era legal e justa podiam acaso os seus encargos tornal-a injusta e illegal? Não (Apoiados.)

Logo se o governo acceitou a doutrina do decreto de 10 de setembro ultimo, origem de todos os outros, em que se póde fundar agora para declinar de si a responsabilidade que inevitavelmente lhe proveiu da promulgação desses decretos? (Apoiados.)

Ora a questão não pára aqui, e é realmente original em todas as suas phases

Basta olhar para o decreto de suspensão. Este admiravel diploma da coherencia do governo, declara tendo-se suscitado duvidas ácerca dos decretos que haviam regulado a reforma que dos coroneis, os suspendia até serem ouvidas as estações competentes.

Quaes suo as estações competentes que o governo podia consultar sobre este assumpto? São tres.

Em primeiro logar junto do ministerio da guerra ha um auditor especial. O codigo de justiça militar diz a tal respeito o seguinte, no artigo 134.° § unico:

"Haverá igualmente, junto do ministerio da guerra um auditor especial."

O artigo 135.° § unico do mesmo codigo acrescenta:

"Ao auditor especial junto do ministro da guerra incumbe exercer as funcções que pelo presente codigo lhe são attribuidas, e responder verbalmente ou por escripto sobre os negocios em que pelo ministro for consultado."

Aqui temos portanto a primeira estação competente, que é o auditor especial junto do ministerio da guerra, actualmente um magistrado integerrimo, de elevada intelligencia e subidos conhecimentos juridicos. (Apoiados.)

Demais, não era a primeira vez que se consultava essa entidade de auditor especial junto do ministerio da guerra, em assumptos de tal natureza; já anteriormente, a proposito da primittiva reclamação do coronel Affonso de Campos, fora consultado quem então exercia esse cargo.

Mas não é essa a unica estação competente que o governo podia ouvir. Ha outra, que é o tribunal superior de guerra e marinha, composto de officiaes muitissimo distinctos, e que têem uma longa pratica dos negocias especiaes referentes ao exercito, (Apoiados.) podendo por conseguinte aconselhar o governo com proficiencia ácerca do qualquer deliberação que houvesse de tomar. (Apoiados.)

Finalmente, alem d'essas duas estações consultivas, ha ainda a procuradoria geral da coroa, para a qual, em virtude do decreto de 1870, passaram as attribuições que competiam á antiga secção administrativa do conselho d'estado.

Taes são as estações competentes que o governo podia ter ouvido, em execução do decreto que formulou. Mas não ouviu senão a procuradoria geral da corôa.

Porque ouviu só esta corporação? Porque é que, ouvindo-a, se encostou do preferencia á opinião da minoria, em vez de se decidir pelo parecer da maioria?

Sabe v. exa. porque? Sabe v. exa. porque, já depois de publicado o decreto da suspensão, o governo se deu pressa a resolver esse assumpto? Foi porque se acobardou! Foi por se temer de uma manifestação hostil, que se annunciava por parte do exercito! Foi porque já então era publico, que se iam apresentar requerimentos energicos, assignados pelos coroneis, cuja reforma havia sido concedida em generaes do divisão, requerimentos que o governo procurava por todos os modos evitar, que não sei mesmo se chegaram a dar entrada no ministerio da guerra, mas que posso affirmar que foram, se não todos, alguns pelo menos, entregues ao general commandante da respectiva divisão militar!
O governo sabia que nesses requerimentos era o seu procedimento qualificado com as mais severas palavras, com as mais amargas censuras! E, se não louvo a forma por que se expressou o descontentamento desses officiaes, não posso deixar de arguir e exprobrar a falta de coragem do governo em vista d'essa manifestação do exercito. É isso o que, mais que tudo, eu lamento e condemno. (Apoiados.)

E aqui está porque tudo correu assim; e porque, tendo-se promettido que se ia ouvir as estações competentes, apenas uma foi á pressa consultada!

Agora somos naturalmente chegados ao decreto que levantou a suspensão. Este decreto é, na verdade, singularissimo. O seu relatorio começa assim:

"Tendo-se suscitado duvidas ácerca do decreto de 10 de setembro ultimo, e dos mais que a elle se referem, entendeu o governo que devia decretar-se a suspensão d'esses decretos até que, depois de ouvidas as estações competentes, só adoptasse sobre o assumpto resolução definitiva."

Sr. presidente, quaes eram estas duvidas? Não podiam ser outras senão as que versavam sobre a illegalidade dos decretos. Porque, a serem legaes, forçosamente haviam de ser mantidos; e só duvidando o governo da sua legalidade é que podia entrar em duvida sobre a possibilidade ou conveniencia de os revogar ou modificar.

Isto é claro.

Mas continua o relatorio do decreto:

"Em cumprimento do decreto de 9 do corrente mez, foi com urgencia ouvida a procuradoria geral da corôa e fazenda, em conferencia, ácerca dos decretos, cuja execução fora suspensa, e meios de os modificar, ou direito de os revogar ou annullar guando se considerassem em desaccordo com a lei."

Por consequencia, a primeira cousa que o governo perguntava era se os decretos se deviam ter como legaes; só depois de decidida essa questão, essencial e previa, é que se poderia resolver se elles deviam ser modificados ou annullados.

Mas qual é o meu espanto, quando depois de ler estes dois periodos, chego a outro que diz o seguinte:

"Sem entrar na apreciação da legalidade dos decretos suspensos!!!"

Pois se a questão previa a decidir era a da legalidade dos decretos suspensos, como é que o governo se póde furtar a entrar n'essa questão? Pois se a primeira cousa que havia a resolver era se os decretos se deviam ou não ter como validos, como é que o governo se póde eximir a declarar o seu voto? Eu não quero, em attenção ao logar onde estou, dar largas aos commentarios que, aliás, bem poderia fazer ácerca d'essa tristissima phrase do relatorio. Só direi que, depois dos antecedentes que se deram, é absolutamente improprio de um governo que preza a seriedade das suas resoluções.

Mas o que é mais curioso, sr. presidente, é que, pretendendo o governo esquivar-se a dar a sua opinião sobre a legalidade dos decretos, deixa por ultimo escapar esta significativa advertencia: