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24 DE FEVEREIRO DE 9984

O Orador: -Desempenhar a primeira função do Estado, que é defender militarmente com autonomia os seus interesses exclusivamente nacionais, não temos meios para o fazer, porque a marinha é fraca, a aviação, escassa, não tem utilidade sem a primeira, as forças terrestres possuem um orçamento que praticamente é de subsistência do contingente.
A primeira reacção que estes factos provocam no plano político é habitualmente a de procurar demonstrar que a culpa não pertence a quem governa, pertence sempre ao passado, como os liberais faziam com os legitimistas, os republicanos com os liberais, os corporativistas com os republicanos, os neocapitalistas com os corporativistas, os abrilistas com os neocapitalistas e, desde 1974, cada governo com os anteriores, mesmo que as pessoas circulem de uns para outros. O mais acertado parece ser assumir a realidade em cada momento, procurar-lhe remédio, se possível, e deixar esses exercícios para os historiadores da crise que ou vencemos ou nos apaga do processo histórico activo. Porque estes indicadores aquilo que nos mostram, e não parece que haja o direito de o esconder, é que está em causa a nossa viabilidade independente, e que não faltam razões para se estar preocupado com a própria identidade nacional, vítima de uma erosão que a escola não combate, e que se esconde sob a polémica dos interesses de grupos políticos, da colocação dos gestores nomeados pelos políticos, da degradação dos padrões políticos, da produção de factos políticos, da interpretação dos factos políticos produzidos e até de inesperadas invenções antropológicas e genéticas que ligam as opções ideológicas ao nascimento, a criatividade ao trabalho e a incapacidade à gestão em todos os níveis. Falta realmente um conceito estratégico nacional, falta um conceito estratégico militar, mas isto não são problemas exclusivos do Ministro da Defesa, e são os responsáveis pelas Forças Armadas que não se cansam, sem grande êxito até agora, de clamar que se trata de uma questão que envolve toda a comunidade, porque, se esta não tem objectivos claros para a sua função independente no mundo, não há de onde deduzir objectivos para a função da defesa, a definição desta será inoperante se o rendimento nacional não suportar a despesa, e o facto é que não a pode pagar, não pode sequer constituir uma reserva estratégica, na medida em que depende da agricultura, nem assegurar o mínimo em tudo quanto depende da importação.

Vozes do CDS: - Muito bem!

O Orador: - Estas preocupações perfilam-se num momento em que os factores exógenos, que não podemos modificar ou dominar, parecem conjugar-se com a probabilidade da alteração qualitativa da crise interna portuguesa. Como se disse, mas a repetição é necessária, esta foi inicialmente política, manteve este carácter ao mesmo tempo que se desenvolvia no sentido de uma crise económica e financeira, e atingiu nesta direcção um ponto agudo que já fica situado numa crise social, e também ética, que ameaça envolver tudo numa crise do sistema político que praticamente atinge essa situação antes de entrar em vigor. Parece haver um consenso geral sobre a gravidade da situação económica, com todos os indicadores conjugados para um deslizar acelerado, mas não desaparece do nosso panorama nacional o facto de que a batalha mais permanente, nunca interrompida, é a de procurar substituir rapidamente um governo por outro, sem cuidar em que cada mudança deve custar ao País um preço superior ao de uma barragem. Não produzimos aquilo que comemos, mas produzimos em abundância candidatos declarados ou presumidos à presidência da República, secretários de Estado que são candidatos a ministros, candidatos a gestores das empresas públicas, e conseguimos que a única classe bem identificada pela opinião pública seja a chamada classe política, de composição estratificada e conhecida, gerindo menos mala presença nos órgãos do poder, mas gerindo mal a viabilidade independente do País, a viabilidade económica da sociedade civil, a viabilidade moral da comunidade e a própria identidade nacional.

Aplausos do CDS.

Não parece racional admitir, nem sequer para cobrir escaramuças políticas sem grandeza, que a sorte tenha apostado numa safra dos piores para lhe entregar a pilotagem de todos estes domínios dos interesses de uma comunidade nacional doente. Parece mais verdadeiro reconhecer com Raymond Aron que estamos a sofrer as consequências de "o falso idealismo das abstracções inaplicáveis, o falso realismo que leva a sacrificar os interesses permanentes a combinações aparentemente astutas".
Do que resulta que o fenómeno mais grave e acelerador da degenerescência é a falta de confiança, a falta de confiança do exterior no País, que se chama credibilidade, a falta de confiança do País na gestão do sistema, que se chama decisão, a falta de confiança dos Portugueses no futuro, que se chama esperança.

Aplausos do CDS.

E não resulta tudo dos factores exógenos que avultam na demorada conjuntura, nem tudo são reflexos da crise económica e estratégica mundial, nem tudo fica para além daquilo que está ao nosso alcance e responsabilidade. Nem sequer tudo resulta da Constituição, naquilo que concerne ao domínio da economia, porque as constituições mais se fazem do que se escrevem, embora a nossa exija revisão e seja um factor importante da situação em que nos encontramos.

Aplausos do CDS.

Ela não resultou no domínio económico sequer, de um compromisso com a realidade social portuguesa, foi antes uma imposição do equilíbrio de forças internas da época, que nada tinha a ver com a vontade popular e o poder de sufrágio. O gonçalvismo introduziu na lei fundamental a concepção da NEP, expressa em normas que não podem ser revistas, e deixou a gestão desse sistema aos governos que aceleradamente vão caindo, e a fiscalização ao poder de mobilizar a desorganização da regularidade da sociedade civil. Temos recebido frequentes declarações de que o governo em exercício é severamente contra a marxização da sociedade portuguesa, mas os factos continuam a resistir à intenção regeneradora, porque na imagem pública está fixada a imagem da realidade