O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

10 | II Série RC - Número: 009 | 3 de Fevereiro de 2011

tradição nórdica é um órgão que controla o funcionamento da Administração, mas sobretudo — e isso tem sido muito acentuado nos últimos anos na Europa e em termos internacionais — é um órgão de protecção dos direitos humanos que vive da sua capacidade de influência, do mérito e da argumentação ou fundamentação das suas recomendações. Portanto, é um órgão que, quanto menos poder tem, mais poder tem. Aliás, tradicionalmente, o Provedor de Justiça assenta nesse paradoxo de viver muito em função da pessoa que ocupa o cargo e da sua capacidade argumentativa no sentido de levar avante as suas recomendações e as suas propostas.
A proposta que é apresentada pelo Partido Comunista Português, ao referir-se às «intimações», deixa-me com muitas dúvidas no que respeita à sua razoabilidade, desde logo, porque cai numa contradição literal ao dizer, no n.º 1 do artigo 23.º, que o Provedor de Justiça «apreciará sem poder decisório» «intimações», quando se sabe que, se algo caracteriza as intimações, é, precisamente, terem poder decisório e não poder recomendatório ou poder meramente persuasivo.
No entanto, o principal problema desta proposta, na minha humilde opinião, é o de levar a uma judicialização do Provedor de Justiça e o Provedor de Justiça nunca poderá ser um órgão judicial, porque o conceito de intimação, como o próprio proponente disse, é um conceito judicial e não tem que ver com um órgão de defesa dos direitos humanos, um órgão independente e um órgão fora da Administração e fora do próprio poder judicial. Aliás, o Sr. Deputado citou um paralelo na lei do Tribunal de Contas que refere, precisamente, as intimações, mas podia citar outros paralelos no âmbito da legislação do contencioso administrativo, como, por exemplo, a intimação para um comportamento ou a intimação para entrega de certidões. Ora, esse é um conceito judicial que, a meu ver, não faz nenhum sentido na natureza que o Provedor de Justiça tem neste contexto.
Há ainda outra coisa que é preciso dizer: o Provedor de Justiça não actua apenas num critério de legalidade. Se há algo que também diferencia o Provedor de Justiça e lhe dá uma grande importância é o facto de actuar com base numa apreciação do mérito das queixas que recebe. Portanto, se ele pudesse fazer «intimações», significaria que extravasaria, a meu ver, de um modo excessivo, em relação a um critério de actuação que, na prática, vai muito para além de um critério de mera legalidade.
O problema que o PCP aqui quer suscitar é real, mas penso que já está resolvido pela legislação, pelo próprio Estatuto do Provedor de Justiça, porque o Provedor de Justiça, embora emita recomendações não vinculativas — e pode fazê-lo por mote próprio, isto é, sem depender de queixa — e não possa revogar actos da Administração, desenvolve certo tipo de actividades em relação às quais há uma obrigação de colaboração por parte da Administração. Por exemplo, os poderes de inspecção que o Provedor de Justiça tem no âmbito de conhecer a realidade dentro da Administração vinculam, necessariamente, a Administração e em relação a eles não pode haver recusa de colaboração, porque isso até seria um crime. Portanto, a ideia de reforçar a actuação do Provedor de Justiça para ele poder conhecer os problemas da Administração já está resolvida na legislação. Por outro lado, tornar as suas decisões como sentenças judiciais, a meu ver, seria, de facto, perigoso e poderia corresponder a um desvirtuamento completo da sua natureza, da sua história e do que tem feito do Provedor de Justiça uma instituição tão importante na defesa dos direitos humanos e, precisamente, uma instituição que não é de natureza judicial.
Em relação à proposta do PCP para o n.º 3, a questão do mandato de seis anos não renovável, é evidente que se pode discutir. É um assunto interessante para reflectirmos todos, para além do que já foi dito no que respeita à constitucionalização desta regra. No entanto, é preciso considerar o seguinte: neste momento, a mesma pessoa pode exercer funções de Provedor de Justiça durante oito anos, ou seja, dois mandatos de quatro anos, e com esta proposta só poderia exercer durante seis, o que é de menos. O paralelo mais próximo que há é o dos juízes do Tribunal Constitucional que, com a alteração de 1997, passaram a poder exercer um único mandato de nove anos, sem renovação (passaram de seis para nove anos).

O Sr. João Oliveira (PCP): — Propomos a alteração de quatro para seis e não de oito para seis!

O Sr. Jorge Bacelar Gouveia (PSD): — Pois, eu sei, mas penso que seis anos é, manifestamente, pouco.
Alguém que exerceu bem as funções de Provedor de Justiça deve poder exercer mais tempo essas funções.
Em relação ao que propõe o Bloco de Esquerda, queria também fazer três breves comentários.

Páginas Relacionadas