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Discurso que devia ler-se a pag. 88, col. 2.ª, lin. 44, da sessão n.º 8 do volume V.

O sr. Pereira Garcez: — Sr..presidente, quando ainda! echoam n'esta sala as vozes dos dois illustres oradores, que hontem fallaram n'esta grave questão, a mais importante talvez de quantas até hoje têem occupado o parlamento portuguez, quando tantos outros distinctos oradores, de um e outro lado da camara, sustentando, ou combatendo os projectos que se discutem, levaram já a discussão a tamanha altura, grande ousadia é por certo a minha usar da palavra para entrar no debate, em materia para mim tão estranha, tão inteiramente nova, tão immensamente complicada, envolvendo objectos tão variados, tão complexos, de que só longa pratica, e muito e mui serio estudo poderia dar perfeita idéa.

O que a prudencia me aconselhava portanto, sr. presidente, era desistir de fallar, e foi este o meu primeiro impulso, quando me chegou a palavra: eu devêra, talvez, sr. presidente, ceder a este impulso, a este alvitre da prudencia; e de feito estava prestes a faze-lo, quando duas considerações me detiveram. A primeira foi o receio de mostrar que desconfiava da generosidade com que esta camara sahe desculpar erros da intelligencia: a segunda, e a mais forte, foi o desejo, a nobre ambição de ver o meu nome obscuro, desconhecido n'esta terra dos meus avós, figurar, posto que humildemente, a par dos nomes illustres dos caracteres respeitaveis, que occuparam a tribuna n'este gravissimo assumpto. (Vozes: — Muito bem.)

Sr. presidente, vou pois fazer ouvir a minha voz, a voz humilde de um portuguez, nascido entre os palmares da India, que vem d'essas regiões asiáticas unir-se á dos seus irmãos da Europa, n'este momento solemne, em que os eleitos do povo são chamados a pronunciar-se sobre os futuros destinos da nação, que podem envolver-se, n'esta questão, em mui serias difficuldades; (Vozes: — Muito bem.) e isto no começo de um novo reinado, tão rico de grandes esperanças, (Apoiados.) de um novo reinado, cuja aurora, ainda ha pouco, por tantos titulos, alegremente saudada por acclamações unanimes de um povo inteiro, tão risonha, tão prospera, tão esperançosa assomara no horisonte da patria; Vozes: — É verdade, muito bem, muito bem.) porquanto, sr. presidente, com a fazenda publica, com a nação completamente empenhada, ou a impossibilidade absoluta de governar, ou o abysmo do descredito, no remedio extremo da bancarrota, se porventura a essa unica taboa da salvação, em caso de inevitavel naufragio, nos podermos soccorrer, em relação á divida publica externa, o que pelo menos e muito duvidoso. (Apoiados.)

Sr. presidente, começo por declarar franco e lealmente que não entro na materia movido de sentimentos de affeição ou desamor; sentimentos tão mesquinhos em objectos d'esta ordem foram indignos do homem que tem a honra de occupar um logar n'esta camara. Tão incapaz sou eu, sr. presidente, de hostilisar systematicamente medidas que me pareçam convenientes e justas, como de apoiar, por systema, as que tiver por prejudiciaes aos verdadeiros interesses da nação; em qualquer d'estes dois extremos, sr. presidente, deparo com um vicio, que se não combina com a moderação dos meus principios. (Vozes: — Muito bem.) Fiel aos sentimentos politicos da verdadeira India, os unicos, a meu ver, admissiveis nas provincias ultramarinas, o meu partido unico; sr. presidente, é adhesão firme e sincera á ordem» á legalidade, á liberdade legal, á justiça, á moralidade ao meu paiz, á minha nação, e:ao meu Rei. (O sr. Passos (Manuel): — Muito bem.) Folgo e folgarei sempre de podér prestar o meu fraco apoio ao governo, sejam quaes forem os homens que o componham, uma vez que possuam qualidades que os tornem dignos da estima e da confiança d'esta camara, como acontece certamente em relação aos cavalheiros distinctos que se sentam naquellas cadeiras, (apontando para as cadeiras do ministerio) e com especialidade, sr. presidente) quando eu vir, como vejo actualmente á lesta d'elles um caracter respeitabilissimo, um nome historico, um nome europeu, um general coberto de gloria e de serviços, o nobre duque de Saldanha, por quem tenho a mais profunda veneração, e, confesso-o ingenuamente, uma sympathia que mal se póde exceder. Mas, sr. presidente, prefiro e preferirei sempre as cousas aos homens, as cousas que não morrem, aos homens que passam. Respeitos, affectos, ou desaffeições humanas, entendo que não devem ser trazidos para aqui: n'este logar só pertenço á nação. (Vozes: — Muito bem.) É assim que comprehendi sempre a missão honrosa que recebi dos povos, é assim que espero cumpri-la sempre; e por isso mesmo quando uma tremenda responsabilidade vae pesar sobre os eleitos do povo, quando a voz do dever appella para a consciencia do deputado em hora solemne como esta a que hoje chegâmos, então acho que é indispensavel que cada um de nós se apresente no seu posto de honra, firme nas suas opiniões, isento de sentimentos apaixonados, superior a quaesquer considerações pessoaes, para votar pura e simplesmente segundo lhe dictarem as suas convicções profundas, para votar com a mão na consciencia. (Vozes: — Muito bem.)

É assim que procederam de certo todos os meus illustres collegas que têem fallado pró ou contra a materia, é assim que certamente hão de votar todos os illustres membros d'esta camara, e é com estes mesmos sentimentos que eu hei de acompanha-los. (Vozes: — Muito bem.)

É possivel, sr. presidente, é mais que possivel, é até muito provavel, que eu tenha avaliado falsa e erradamente esta grave questão; o defeito será todo intellectual, mas a consciencia ficará tranquilla. (Vozes: — Muito bem.) É possivel, sr. presidente, é mais que possivel, é até mais que muito provavel, que eu me lenha enganado na justa e devida apreciação da materia; mas a culpa não será minha, e Deus perdoará os erros da minha intelligencia; o perjúrio, a quebra do meu juramento, é que Deus me não perdoava. (Vozes: — Muito bem.)

Não apresentarei, sr. presidente, largas considerações sobre a materia, que muito incompetente me reconheço para o fazer, nem me aventurarei a seguir os illustres oradores que trataram o assumpto n'esses pontos elevados sobre que discorreram; em terreno humilde e rasteiro, e adaptado á minha certeza intellectual, é que assentarei os meus raciocinios, para conseguir o meu fim, que é motivar o meu voto, para conseguir o meu fim, que é mostrar, que tendo chegado a convencer-me de que n:esta questão era necessario optar entre o paiz e o governo, a opção não podia ser para mim duvidosa; optei pelo paiz. (Apoiados.) Sr. presidente, não discorrerei pelo vasio campo da politica, objecto que me parece completamente estranho ás questões economicas e financeiras que nos occupam, (Apoiados.) nem tratarei de discorrer sobre a virtude da tolerancia.

A belleza da tolerancia, sr. presidente, está em si mesma. A tolerancia é uma idéa associada aos principios liberaes; a intolerancia e a liberdade são duas idéas que se não casam, são duas idéas que mutuamente se repellem. (Vozes: — Muito bem.) Mas porventura a tolerancia da actual administração, que reconheço, será a prova da excellencia das medidas que discutimos? (Uma voz: — É verdade.) Parece-me que ninguem dirá que sim; assim como da boa gerencia da actual administração, se não póde de modo algum concluir, que se devem infallivelmente approvar estas medidas: assim como a mesma conclusão nos não leva tambem por certo á consideração das vantagens economicas, que hão de provir dos caminhos de ferro: assim como do facto de se rejeitarem estas propostas, se não póde de maneira alguma inferir, que se não querem caminhos de ferro,