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EXTRACTO DA SESSÃO DE 9 DE FEVEREIRO.

Presidencia do Em.mo Sr. Cardeal Patriarcha. Secretarios, os Srs. Visconde de Benagazil Margiochi. (Assistiram todos os Srs. Ministros.)

Pelas duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 31 dignos Pares, declarou o Em.mo Sr. Presidente aberta a sessão. Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

Mencionou-se a seguinte correspondencia: Um officio do digno Par Visconde de Oliveira, participando que, tendo-se-lhe aggravado os seus ….. padecimentos, não póde, por ora, concorrer ás sessões da Camara.

-do digno Par Macario de Castro, participando que em officio de 12 de Dezembro do anno passado comunicára que o seu máo estado de saude não lhe permittia v ir tomar parte nos trabalhos desta Camara logo no principio da sessão, e como até agora não tenha visto que aquelle seu officio fosse apresentado, por isso repete aquelle enunciado, que fundamenta com certidão de facultativo.

do Ministerio do Reino, participando que,

por Carta regia datada de 13 de Janeiro proximo passado, Houve Sua Magestade a Rainha por bem Nomear Par do Reino ao Sr. Deputado da nação portugueza Joaquim Larcher.

De todos ficou a Camara inteirada.

O Sr. Silva Carvalho mandou para a Mesa a Carta regia, pela qual Sua Magestade a Rainha Houve por bem Nomear Par do Reino ao Sr. Deputado Joaquim Larcher.

O Sr. ('residente nomeou os dignos Pares Silva Carvalho, Visconde de Castro, e Marquez de Ficalho para examinarem a mesma Carta regia.. (Os dignos Pares, membros da commissão, saíram da sala.)

Ordem do dia.

Continua a discussão do projecto de resposta ao discurso do Throno.

O Sr. Ferrão — Sr. Presidente, tomo a palavra segunda vez; e nem podia deixar de o fazer depois de ter ouvido o discurso do Sr. Ministro da Fazenda. Eu farei per ser conciso, tanto quanto o permittam os differentes pontos que tenho a tocar; e seguirei a mesma ordem que adoptou o Sr. Ministro da Fazenda no seu discurso. S. Ex.ª começou lançando uma especie de desfavor não só sobre o meu discurso, mas tambem em relação á minha pessoa: eu peço a S. Ex.ª que rectifique qualquer relatorio que eu faça das suas palavras, a fim de que tambem eu não discorra sobre uma base falsa; para este fim pode S. Ex.ª interromper-me á sua vontade, tantas quantas vezes tiver por conveniente.

O Sr. Ministro da Fazenda disse que tinha experiencia do Parlamento desde muito tempo, e que ainda não tinha ouvido proferir um discurso tão violento como aquelle que eu proferi. Eu intendo, Sr. Presidente, que S. Ex.ª foi um pouco, não digo exaggerado, mas um pouco excessivo nesta sua qualificação; por quanto eu tambem tenho alguma experiencia do Parlamento, e tenho tambem aquella que resulta da leitura dos papeis publicos, que dão conta das sessões do Parlamento. É verdade que discursos tem havido muito mais violentos, violentíssimos, não direi violentíssimos, escuso de citar exemplos; mas quando assim não fóra, a violencia do meu discurso, permitta-me S. Ex.ª que lhe diga, corresponde ao seu objecto. Tractava eu de combater o Decreto de 3 de Dezembro, a respeito do qual no discurso do Throno, qualificando-lhe os effeitos, se usara das palavras — tão violentos sacrificios = e uma vez que eu estava, como estou cada vez mais convencido da injustiça, da inconveniencia desse Decreto, as minhas palavras correspondiam á minha convicção.

' Mas ainda tinha havido uma circumstancia que occorreu nesta Casa, para que eu fosse um pouco mais energico que de principio, e foi a muita interrupção que nella havia, um certo desassocego, e uma grande distracção, cuja causa eu então ignorava.

S. Ex.ª, em relação á materia que eu tractei no meu discurso, lançou-lhe igualmente desfavor, dizendo que eu tinha empregado muito mal a expressão (Riso – Apoiados). = Eu já tinha dado a explicação desta palavra quando a empreguei; mas repito ainda — não usei della no sentido de offender os Srs. Ministros; é um erro em politica, e em finanças, como qualquer outro; e os Srs. Ministros estão tão Sujeitos a elle como eu, e todos os membros desta Casa; pois é certo que todos podem ser mal guiados nas consequencias que tiram de principios verdadeiros, ou na adopção de principios falsos.

S. Ex.ª disse ainda que este modo de me explicar era tanto mais inconveniente, quanto eu me deveria lembrar que tinha sido collega dos quatro cavalheiros que são actualmente Ministros; e me devia lembrar, alem disso, que eram elles que me tinham aberto estas portas. Assim lançou S. Ex.ª uma especie de insinuação de ingratidão

contra mim; firmou-se, é verdade, na confissão que eu fiz desta fineza; mas a confissão que fiz podia-a eu fazer, era da minha delicadeza faze-la; mas eu intendo que os dignos Pares, que uma vez tomam assento nesta Casa, tem depois a presumpção de que não são aqui trazidos senão em consequencia dos seus serviços, e merecimentos; nenhuma outra consideração mais elles podem ter depois, que não seja o cumprimento dos seus deveres no desempenho do juramento que prestaram, a defeza das leis, á observancia da Carta constitucional, e a promoção dobem geral do Estado.

Tambem eu, Sr. Presidente, podia dizer que abri as portas do Parlamento a muitos dos dignos Pares que me escutam; aqui estão não menos de quatro — direi, não menos de tres (porque senão acha presente o Sr. Visconde de Algés), os Srs. Barão de Chancelleiros, Duarte Leitão, e Ministro do Reino, Rodrigo da Fonseca Magalhães; mas longe de mim dizer tal, foram unicamente os seus merecimentos, qualidades, e serviços que os trouxeram aqui; se o não tivessemos feito, eu e os meus collegas, aqui estariam de certo estes cavalheiros; nós só temos a gloria de havermos aconselhado a Sua Magestade a nomeação.

Porém eu, Sr. Presidente, anda aggravarei mais esta qualificação que S. Ex.ª apresentou contra mim; lembrarei que entre esses quatro cavalheiros está o nobre Marechal, o Sr. Duque de Saldanha, a quem eu professo sentimentos de uma amizade tão sincera que até chega a idolatria!

O Sr. Ministro da Fazenda, passando a falar sobre o Decreto de 3 de Dezembro, disse — que ainda não tinha tido um só momento de se arrepender da medida que tinha adoptado — e eu digo que depois de ter ouvido a S. Ex.ª, se alguma cousa carecesse ainda para me confirmar mais na convicção contraria a esse Decreto seria o ter ouvido o discurso de S. Ex.ª; e assim convidando S. Ex.ª para que respeite á minha convicção, assim como respeito a sua, faço votos ao céo para que ele dissesse as densas nuvens que obscurecem infelizmente o entendimento de S. Ex.ª, a fim de que os males deste Decreto possam ser obviados.

Eu faço este voto, Sr. Presidente, porque o meu erro não é prejudicial, mas é o de S. Ex.ª, porque a medida foi decretada dictatorialmente, e está sendo executada, ou pelo menos estão-se dando as ordens necessarias para a sua execução.

Sr. Presidente, não é tanto a nova applicação, ou a distracção dos fundos que eu combato — o Governo prensa recursos, e não são esses que eu hei-de regatear em occasião de necessidade — é a capitalisação, essa capitalisação contra a qual não podia deixar de me pronunciar.

S. Ex.ª tendo tocado no Decreto de 10 de Novembro de 18 Í9, que organisou a fazenda, julgou-se con9t.tuido no dever de defender esse Decreto, dizendo — que tem encontrado nas repartições a seu cargo sensiveis melhoramentos na administração da fazenda publica. Eu direi a S. Ex.ª, que não respondeu a nenhuma das observações, que eu fiz nos pontos especiaes que tractei; e muitos mais poderia eu ind car, que me tem desde muito na convicção de que effectivamente esse Decreto, em logar de organisar a fazenda publica, a tem desorganisado.

Disse mais S. Ex.ª que a questão tem sido trazida ao Parlamento fóra de tempo. É verdade, Sr. Presidente, ella será mais competentemente trazida a esta Casa, quando S. Ex.ª, o que eu lhe rogo encarecidamente, trouxer este Decreto ao Parlamento para ser franca e lealmente examinado, mas que o traga destacado, e desprendido do plano geral de fazenda, e de outras medidas com as quaes parece querer-se confundir; entretanto o discurso do throno, tendo fallado em geral nas medidas adoptadas durante a dictadura, fez uma especial menção deste objecto, pela sua importancia; e por isso tambem a resposta ao discurso especialisou esta materia, e assim, insistindo nas considerações que já emitti da primeira vez que fallei, é necessario que nos avaliemos os termos que correspondem a esta parte do discurso.

Tinha eu, Sr. Presidente, proposto uma emenda a este paragrapho do discurso do Throno, e tinha por essa occasião notado a impropriedade das palavras = Sacrificios que todos partilhámos =, e ao mesmo tempo notado que a illustre commissão da resposta ao discurso do Throno tinha corrigido a expressão, mencionando unicamente — sacrificios a que são obrigados os credores do Estalo —; S. Ex.ª porém intendeu que devia sustentar as palavras = que todos partilhamos. Mas permitta-me S. Ex.ª que lhe diga que confundiu na sua argumentação o credor com o contribuinte. Quando o Estado desce a contractar com um individuo, seja nacional, seja estrangeiro, coloca-se na mesma linha do direito commum que rege transacções de similhante natureza entre particulares, porque a justiça é uma só. Quando se falla dos credores da nação é como se fosse de um mundo á parte; de um individuo moral para com um individuo physico. Esses credores da nação, quando subditos della, são contribuintes nesta qualidade como os outros cidadãos, de sorte que ainda assim ficariam inexactas as palavras todos partilhamos =, porque seriam feridos com desigualdade relativa, duplicadamente, como credores, e como contribuintes.

Além disso a palavra — partilhámos — refere-se ao preterito, e vè-se portanto que exprime sómente os sacrificios impostos aos credores, e de modo algum ás imposições que hão-de ser propostas de futuro, para satisfazer aos encargos creados pela capitalisação.

S. Ex.ª disse — que se tinha levantado um panico contra o Decreto, mas que isso era uma guerra da agiotagem. — Ora, eu penso, Sr. Presidente, que S. Ex.ª fez uma grande injuria, sem o querer, contra todos aquelles, que reclamaram contra o Decreto de 3 de Dezembro. Os juristas, por exemplo, são uma das classes dos credores do Estado, que soffre mais em consequencia das

disposições deste Decreto: os juristas 'da divida interna por uma somma de mais de trinta e cinco mil contos de inscripções, e os da divida externa por uma somma de mais de quarenta e dois mil contos de bonds. Ora, não é possivel que estas tão importantes sommas estejam em poder da agiotagem; e S. Ex.ª conhecerá isto muito facilmente se mandar averiguar qual é a porção destes titulos, que se acham em poder dos cambistas, que compram de manhã para vender de tarde; talvez não ache cem contos de réis no mercado. Se S. Ex.ª tiver empenho de fazer uma compra superior a cem ou duzentos contos não o consegue desde logo; precisa commetter esse negocio aos corretores da praça, e se fizer essa transacção produzirá uma subida immediata no preço do mercado.

Tanto estes capitães se acham em poder de pessoas não agiotas, que para se ver que o não são, basta lançar os olhos a mil e duzentas assignaturas, que contém a representação que se fez contra aquelle Decreto.

Mas, Sr. Presidente, uma outra affirmativa vou eu hoje fazer, e é que muito pelo contrario a agiotagem não se levanta contra o Decreto, mas que o favorece. Corre como certo que em tempo se compraram muitos papeis especialmente da marulha, para entrarem na capitalisação; e hoje é certo que sp procuram com grande avidez papeis no mercado a 20 e 2i por cento para entrarem igualmente na capitalisação.

Mas para mostrar ainda que este Decreto é pasto da agiotagem, e que lhe vai crear um alimento muito mais abundante que qualquer outro, é dar alguma attenção ao que se diz no relatorio que acompanha o mesmo Decreto, e S. Ex.ª repetiu no seu discurso, que para attenuar o prejuizo que os juristas podem soffrer com a internação dos pagamentos dos seus juros, a venda dos titulos dos quatro semestres lhes ha-de valer no mercado uma somma superior aos juros cobráveis de um semestre sómente.

Logo é claro que este Decreto entrega os juros destes quatro semestres aos agiotas.

Disse mais S. Ex.ª que era devida aos descontos que soffriam os servidores e pensionistas do Estado, a lamentavel situação em que muitos delles se acham; que esta divida sujeitada á capitalisação andaria por tres mil contos, dos quaes metade havia sido presa dos descontos. S. Ex.ª tomou um termo medio destes tres mil contos, e disse que este termo medio eram 40 por cento. Aqui já me parece que ha uma inexactidão, pois que S. Ex.ª misturou as classes activas com as inactivas: os vencimentos das classes activas andam por quatorze mezes de atrazo, e tinham no mercado um preço mais subido do que os titulos das classes inactivas, que tinham vinte e tantos mezes de atrazo; e S. Ex.ª parece que devia procurar o termo medio em cada uma das classes, não misturando umas com outras, e então se assim o procurasse veria que o termo medio do desconto dos vencimentos das classes activas nos mezes que decorreram até a extincção dos pagamentos com regularidade era tal, que ainda se realisavam a favor dos possuidores, de cédulas ou recibos, 60 por cento, e em Agosto chegaram a valer os de toda a serie 70 por cento.

S. Ex.ª excitou o sentimentalismo a favor da industria, dizendo que pela sua medida promovia, que os capitães em logar de se empregarem na agiotagem, fossem prestar-se á industria e agricultura por um juro modico.

É muito pelo contrario, como já notei. O Decreto favorece, alimenta a agiotagem, e portanto continua a attrair para ella os capitães. Mas S. Ex.ª ao mesmo tempo que exprimiu estes sentimentos, consentiu que o Decreto ferisse despistadamente o banco de Portugal. O banco de Portugal, Sr. Presidente, é o unico estabelecimento hoje, que não podendo levar mais de 5 porcento de juro nas suas transacções, sustenta em Lisboa e fóra della estabelecimentos utilissimos com o seu fundo; ha industrias muito bem montadas e estabelecidas, que estão sendo soccorridas com o fundo do banco de Portugal ao juro moderado de S por cento: todavia o banco de Portugal é ferido por umas poucas de maneiras pelo Decreto de 3 de Dezembro; é ferido em ISO contos de réis em relação ao semestre corrente do emprestimo dos 4:000 contos, e é ferido como os mais juristas, em quanto possuidor de inscripções!

Disse tambem S. Ex.ª que a baixa dos fundos em consequencia da promulgação daquella medida não podia produzir o panico que produziu, porque aqui entrava a politica, a agiotagem, e outras cousas avessas ao governo, que promoviam este panico; e dizia isto porque em Inglaterra não se tinha sentido esse panico, e os nossos fundos tinham sido cotados como antes da publicação do Decreto de 3 de Dezembro. Ora, permitta-me S. Ex.ª que lhe diga — que não pode comparar o mercado de Londres com o de Lisboa a similhante respeito; lá militam causas especiaes para manter o preço dos nossos fundos até certo ponto, e nestas circumstancias a differença é o dividendo que se está satisfazendo, actualmente. Em segundo logar, alli, como S. Ex.ª sabe muito bem, a propriedade predial acha-se muito mal dividida, sendo mui pequeno o numero de familias proprietárias em bens de raiz em relação á população; e existe por isso uma grande quantidade de capitães fluctuantes sem emprego, e portanto uma maior facilidade de haver sempre tal ou qual procura em certa ordem de fundos especialmente sobre os nossos fundos não convertidos, em virtude da lei de 19 de Abril de 18 55, porque não só estão recebendo o primeiro semestre de 1830, alem dos bonds do 4.ª semestre capitalisaveis, mas se lhes aproxima a escala ascendente, e por consequencia o augmento do juro de um por cento, de que resulta o encargo para o Thesouro de 70 contos no segundo semestre do futuro anno econômico, encargo, que seguindo-se a ordem chronologica do pagamento, ficaria ainda affastado para d'aqui a dous annos. De-