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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 53

O sr. Ministro da Fazenda: - Sr. presidente, a medida tomada pelo ministerio de 1868, em virtude da qual se impozeram as deducções nos vencimentos dos empregados do estado, foi uma medida de excepção, fundada unicamente nas circumstancias graves em que o paiz se achou.

O digno par lamentou que este projecto não viesse mais cedo, mas a causa da demora está nas rasões apresentadas por s. exa.

Para não voltarmos ás circumstancias de 1868, embora hoje estejamos em muito melhores condições, é que o governo andou com toda a prudencia, abolindo primeiro uma parte dessas deducções e propondo-se a eliminar o resto no futuro anno economico, como se acha proposto no orçamento. Entretanto, na camara dos srs. deputados apresentou-se uma proposta para que ellas cessassem desde já e o governo concordou com essa proposta, porque a despeza pouco póde influir no nosso estado financeiro.

O governo tem o maior desejo de que a situação, relativamente prospera em que nos achamos, se conserve; mas as circumstancias não são ainda de tal ordem, que não seja necessaria toda a cautela nas despezas; e ácerca destas divergem as opiniões.

Querem uns que se trate primeiro dos caminhos de ferro, outros da illuminação da costa, outros da reorganisação dos serviços, etc.; mas o parlamento é que ha de resolver por onde se deve começar o muito de que se carece e é necessario fazer.

Eu confesso que sou um pouco partidario, pelo estudo que tenho feito, e pela experiencia que tenho, de que os melhoramentos publicos, sobretudo os de viação, devem ser iniciados numa escala tão larga, quanto o permittam as circumstancias, sem comprometimento das finanças; porque de todas as despezas, que temos fazer, aquella é a que dá um resultado mais immediato.

Se nós passámos de uma situação má para uma relativamente prospera, devemo-lo aos caminhos de ferro e ás estradas; e as que de futuro se fizerem, hão de custar muito menos, porque nós já pagámos a aprendizagem, como a pagaram todas as outras nações.

O augmento da riqueza publica não provem só dos impostos, como está perfeitamente demonstrado nos cálculos que. se teem feito, mas tambem do augmento dos existentes, e esse augmento provem dos nossos melhoramentos materiaes, e por conseguinte do desenvolvimento da riqueza publica.

Qual é a rasão por que os impostos indirectos estão crescendo todos os annos? É pelo desenvolvimento da riqueza publica, e esse desenvolvimento é em grandissima parte devido ao que tem tido a viação publica, tanto a ordinaria, como a que é destinada ás communicações acceleradas. Portanto não receio que compromettamos o nosso presente ou o nosso futuro com as obras de viação, uma vez que não sejam emprehendidas com excesso; feitas porem regular e prudentemente, não podem resultar dellas senão beneficios para o paiz, sem de nenhum modo trazerem risco para a situação do thesouro.

Quanto ao mais, estou de accordo com o digno par, e partilho completamente das suas idéas de prudencia, para que não se comprometta a nossa situação financeira.

O sr. Conde de Bomfim: - Sr. presidente, quizera ser hoje orador para apresentar com a precisa eloquencia as minhas idéas; sabre a importante questão de que se trata; mas, longe de possuir esse dom brilhante, que concede a poucos a natureza, victima ainda de uma terrivel enfermidade, mais se me difficulta agora o uso da palavra. E nestas circumstancias que me cabe a honra de fallar pela primeira vez nesta respeitavel camara, e por isso peço a todos os dignos pares e ao publico a necessaria indulgencia, não só pelo que respeita aos defeitos da minha voz e do meu mal alinhavado discurso, mas tambem pela minha pouca experiencia das lides parlamentares.

Sr. presidente, temos presente um projecto de lei vindo da camara dos srs. deputados, que em harmonia com os desejos expressados no discurso da corôa acaba desde já as decimas nos vencimentos dos funccionarios publicos. Muito folgo de ouvir o digno par Bispo de Vizeu fazer uma declaração de que esta medida, bastante violenta, foi filha das difficeis circumstancias financeiras com que o ministerio então lutava, e que elle sempre desejou, e mesmo esperava, que um estado mais prospero do paiz podesse fazer cessar em poucos annos. Esta declaração honra por certo os nobres sentimentos do digno Bispo, e, depois de uma tão authentica e competente asserção, não me parece que haja alguem que possa impugnar este projecto de lei com fundamentadas rasões; mas é elle de tanto interesse para todos os servidores do estado e para os officiaes do exercito e da armada, que eu como cidadão e como soldado entendi não poder deixar de usar da palavra para sustentar tão justa e equitativa medida, desenvolvendo alguns argumentos em favor dos direitos dos meus camaradas de armas e desses empregados sobre quem pesa ainda um excessivo tributo.

Já em 1870, quando pela imprensa se discutia sobre as decimas, eu expressei nos jornaes dessa epocha a minha opinião a este respeito; e seja-me permittido repetir aqui, que no meu entender a decima sobre os vencimentos dos empregados civis e militares é contra todos os principios de direito; porque não é licito a quem se obriga a dar um certo salario por um serviço determinado, exigir depois de quem o recebe uma parte desse mesmo salario. O estado pôde; sim, diminuir os ordenados se os achar demasiados, ou se as circumstancias o exigirem; mas não pôde, nem deve, receber dos seus servidores parte dos salários estabelecidos; o que se torna não só uma verdadeira anomalia, e direi mesmo uma excentricidade financeira. Desta medida só podem resultar graves inconvenientes, e não verdadeira economia, pois, se houvesse neste paiz apenas os empregados restrictamente precisos, daria uma insignificante receita, e a inevitavel consequencia de que empregados mal retribuídos não prestam muitas vezes bom serviço, e teem forçosamente de distrahir-se dos seus deveres para procurarem por differentes especulações os meios que lhes faltam para a sua subsistencia, e das suas familias. Neste ramo de administração publica a economia está: na suppressão de empregos inuteis e logares supérfluos, e não em cercear os ordenados, pois é até um axioma de economia politica que um paiz bem administrado deve ter o menor numero de empregados, e o mais bem remunerados possivel.

Sr. presidente, a decima dos empregados ainda é um tributo mais pesado do que todos aquelles que pagam os outros cidadãos; porque, alem de collectados nos seus vencimentos, sobre elles pesam todos os outros impostos.

Quando é tributado o proprietario, elle eleva a renda das suas casas e fazendas, o commerciante o preço dos seus generos e mercadorias, o agricultor o preço dos cereaes e gados, e assim todas as outras classes e industrias, mas o empregado publico, victima de toda esta carestia, quando collectado nos seus vencimentos é só quem não póde elevar o seu rendimento para fazer face a este tributo.

Ainda outra consideração torna mais pesada, e injusta esta medida. Todos sabem, e é uma verdade reconhecida, que nenhum cidadão paga a decima inteira de todo o seu rendimento, talvez pela difficuldade deste ser exactamente sabido, ao passo que os empregados teem sido collectados, não só com a decima inteira dos seus vencimentos, mas ainda até ha pouco com decima e meia e mais, e ninguem deixará de reconhecer quanto isto é desigual, injusto e até mesmo anti-constitucional.

Mas quando tão graves defeitos não tivesse a decima, que se pretende acabar, fora dobradamente inconveniente e injusta a sua continuação para os officiaes do exercito e da armada.