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CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

SESSÃO DE 8 DE FEVEREIRO DE 1865

PRESIDENCIA DO EX.MO SR. CONDE DE CASTRO

VICE-PRESIDENTE

Secretarios, os dignos pares

Conde de Peniche

Mello e Carvalho

(Assistia o sr. ministro da guerra.)

Pelas duas horas e meia da tarde, tendo-se verificado a presença de 49 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da sessão antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Mencionou a seguinte correspondencia.

Officios do ministerio da fazenda enviando os autographos dos decretos porque se expediram as cartas de lei auctorisando a camara municipal de Villa Nova de Portimão a vender em hasta publica o edificio situado na mesma villa, denominado Guarda Velha, e applicar o seu producto ao acabamento do novo cemiterio.

- Auctorisando o governo a aforar ou subrogar os terrenos e predios urbanos separados, mas dependentes dos palacios, jardins e quintas pertencentes á casa real.

- Auctorisando a reducção a um por milhar do direito de 2 por cento a que estão sujeitas as baldeações de mercadorias.

- Concedendo aos directores geraes e aos chefes de repartição do thesouro publico a gratificação annual de réis 180$000.

- Approvando a pensão annual de 240$000 réis, concedida ao presbytero Manuel Antonio Rodrigues.

- Prorogando o praso estabelecido para a percepção do direito do mel, melaço, e melado estrangeiro, que entrar pela alfandega do Funchal.

ORDEM DO DIA

A INTERPELLAÇÃO DO DIGNO PAR O SR. SEBASTIÃO JOSÉ DE CARVALHO AO SR. MINISTRO DA GUERRA

O sr. Presidente: — O digno par Sebastião José de Carvalho tem a palavra.

O sr. S. J. de Carvalho: — Entende conveniente precisar os termos da nota de interpellação que ha poucos dias mandou para a mesa, e deseja que o digno ministro declare:

1.° Se s. ex.ª considera contrarias ás disposições disciplinares que regem no exercito as representações que os officiaes dos corpos de artilheria dirigiram ao commandante geral da sua arma.

2.° No caso affirmativo, qual é o acto do governo que desapprovou essas representações; e no caso negativo, qual é o acto do governo que revogou a ordem do exercito de 26 de julho de 1811, e a disposição n.° 51 do regulamento disciplinar de 31 de setembro de 1856.

Depois da resposta do sr. ministro fará as reflexões que lhe parecerem necessarias.

O sr. Ministro da Guerra (Ferreira Passos): — Não consta no ministerio da guerra, nem em parte alguma, que tenham sido dirigidas representações ao commandante geral de artilheria; o que consta é, que lhe foram dirigidas felicitações de alguns officiaes, e, como não ha lei nenhuma que prohiba aos officiaes felicitarem os seus superiores, o ministerio da guerra não podia nem devia tolher aos militares o direito de cidadão que por lei lhe pertence. Parece-me ter respondido ao digno par.

O sr. S. J. de Carvalho: — Usando largamente da palavra interpellando o sr. ministro da guerra, procurou provar que o illustre ministro não desapprovando as representações que ao commandante geral de artilheria haviam sido dirigidas por alguns officiaes da mesma arma, havia permittido a infracção da ordem do dia de 26 de julho de 1811 e artigo 51.° do regulamento disciplinar de 30 de setembro de 1856.

Tentou provar quo não estando revogadas por acto algum do governo as citadas leis militares, e estando comprehendidas na letra expressa das suas disposições as representações a que alludiu na nota de interpellação, o sr. ministro as tinha permittido por mera rasão de deferencia pessoal para com o general a que ellas se referiam. Indicando os factos que faziam prova d'essa deferencia, disse que o sr. ministro contra o estabelecido por uma praxe constante nomeara para commandante effectivo de artilheria o general Lobo d’Avila, havendo dois officiaes generaes mais antigos que pela praxe deviam preferir ao dito general. Que este facto era aggravado pela circumstancia de que o general a que alludia se achava na occasião da nomeação sob o peso de gravissimas accusações formuladas na imprensa.

Fazendo largas considerações sobre o facto de haver sido condecorado com a medalha militar o mesmo general, accusou o sr. ministro de haver infringido as disposições de regulamento de 22 de agosto do 1864.

Disse que pelo mesmo regulamento, a designação de especie da medalha cabia apenas ao supremo conselho de justiça militar, mas que referindo-se a consulta do mesmo tribunal apenas á concessão da medalha de prata, o illustre ministro havia infringido a lei que elle proprio referendara. E leu um documento onde lhe pareceu ver a officiosa intervenção de uma terceira pessoa, que não sabia quem seja por não o ter assignado.

O sr. Ministro da Guerra: — Se V. ex.ª dá licença eu dou já uma explicação.

O sr. S. J. de Carvalho: — Com muito gosto.

O sr. Ministro da Guerra: — É costume nas secretarias que qualquer objecto que a ellas é dirigido vá á repartição competente, para esta dar o seu parecer sobre elle. Ora este objecto de que se trata, é daquelles que o empregado competente não costuma assignar, isto não é officio nem consulta, é simplesmente uma exposição em que a repartição emitte a sua opinião, e com a qual o ministro se conforma, ou deixa de se conformar; se se conforma põe á margem, conformo-me, e se não se conforma, põe, não me conformo, e manda expedir o que julga conveniente. Este negocio correu com a maior regularidade, como todos os negocios na minha repartição. Estes papeis foram todos remettidos ao supremo conselho, para consultar.

Voltaram depois á repartição competente, que é dirigida por uma digna pessoa;, o tenente coronel do estado maior, Lacerda, insuspeito a este respeito porque não pertence ao partido que o general Lobo d’Avila segue, e que deu o parecer que vou ler (leu).

Julgo que isto é o mesmo que esta no papel que o digno par o sr. S. J. de Carvalho leu.

O sr. S. J. de Carvalho (continuando): — Disse que o sr. ministro havia feito a proposta da medalha militar ao general Lobo d’Avila, em 30 de setembro de 1864, e que por portaria da mesma data dirigida ao supremo conselho de justiça militar avocara a si todos os processos que naquelle tribunal se estavam preparando para a concessão das medalhas a differentes officiaes; e que subindo a quasi dois mil esses processos, o primeiro que o illustre ministro despachara fôra o do general Lobo d’Avila.

Fazendo varias considerações a este respeito, disse que este facto provava a inqualificavel deferencia do ministro para com o general; o que pela sua grande significação autorisava a suspeita de que a portaria de 28 de setembro de 1864, pela qual o sr. ministro irregularmente modificara uma disposição do decreto de 2 de outubro de 1863, que creára a medalha militar, só teve em vista fazer com que o dito general podesse, á face das disposiçoes da lei, ser agraciado com a mesma medalha. Que não insiste principalmente sobre este ponto por lhe não haverem sido fornecidos os esclarecimentos que pediu com relação a algumas notas que sabia acharem-se nos livros, da secretaria da guerra com referencia ao mesmo general.

Declarou que, se taes notas lhe não fossem fornecidas, proporia a nomeação de uma commissão de inquerito para o exame rigoroso dos livros onde essas notas devem estar lançadas.

O sr. Ministro da Guerra: — Sr. presidente, as notas ainda não estão acabadas de tirar, porque ellas dizem respeito a abonos e vencimentos dos officiaes; e como estão escriptas em muitos livros, por isso levam bastante tempo. Quando estiverem promptas eu as remetterei.

O sr. S. J. de Carvalho (continuando): — Logo que ellas cheguem ha de fazer uso dellas, seja qual for o estado d'esta discussão; e ainda depois de finda, apenas veja ensejo favoravel.

O orador tem mostrado que não deseja polluir a tribuna parlamentar com questões pessoaes. Hoje acha-se aqui uma, mas consola-o a lembrança de que não foi elle que a trouxe. Foi por um lado o sr. ministro da guerra, que respondeu á opinião publica indignada, reclamando uma satisfação á moral, escolhendo o general que deveria ter sido dispensado do commando interino, escolhendo-o entre mais de mil pretendentes para lhe conceder as medalhas militares, e nomeando-o para o commando effectivo; foi por outra parte o proprio general que, vendo a gravidade das accusações que se levantavam contra elle, suspendeu-se a si mesmo das funcções de legislador; passo honroso que o sr. ministro não quiz, ou não soube imitar, suspendendo-o tambem do commando...

O sr. Ministro da Guerra: — Sr. presidente, as accusações que o digno par o sr. Sebastião José de Carvalho me fez, parece-me que assentam em tres pontos. Primeiro, por tolerar as representações que se dirigiram ao commandante geral de artilheria; segundo, por ter concedido indevidamente a medalha de oiro ao general Francisco de Paula Lobo d'Avila; e terceira, por conservar o dito general no commando de artilheria, depois do que appareceu contra elle nos periodicos. Ao primeiro responderei o que já disse, isto é, que estas manifestações, saudações, ou felicitações, nunca se podiam chamar representações, nem estar comprehendidas nas ordens do exercito do marechal Beresford, que o digno par acaba de apontar, porque n'essas ordens falla-se em certificados, e estas manifestações não o são, nem são representações, por conseguinte não posso, como já disse, impedir que um official ou officiaes usem dos direitos de cidadãos, expendendo vocalmente ou por escripto os seus sentimentos, sem que isso offenda a disciplina militar. O segundo ponto é relativo á concessão das medalhas. O processo que diz respeito a este facto, foi mandado para a mesa e examinado pelo digno par. S. ex.ª encontra n'elle grandes irregularidades, eu não as encontro. O supremo conselho de justiça militar foi consultado antes de ser dada a medalha ao general Francisco de Paula Lobo d’Avila.

O sr. S. J. de Carvalho: — Foi a de prata, e não a de oiro.

O Orador: — Foi a de oiro, porque não me conformei com a consulta.

Sr. presidente, o digno par diz que o processo esta irregular, portanto quem ha de decidir esta questão?

Uma poz: — A camara.

O digno par diz, que eu não consultei o supremo conselho de justiça militar; consultei, e a prova esta ali no processo, mas não me conformei com essa consulta, porque segundo ella, pertencia ao general Lobo d’Avila a medalha de prata e foi-lhe concedida a de oiro, em vista do que esta expresso no § 1.° do artigo 4.° da lei de medalhas, que já li, e que não lerei outra vez para não cansar a camara. Isto é uma questão interminavel. O digno par diz que não cumpri a lei, eu digo que a cumpri; a camara é que ha de decidir.

Relativamente a conservar o general Francisco de Paula Lobo d’Avila no commando de artilheria, eu não podia nem posso exonerar um official do logar que exerce sem ser por conveniencia do serviço ou elle commetter um delicto, não consta no meu ministerio que este official tenha commettido delicto algum. A sua conducta esta illibada, e eu não posso fazer obra pelo que dizem os periodicos. Eu procedo segundo a lei, por conseguinte conservo o general no commando de artilheria, e hei de conserva-lo emquanto a lei me auctorisar. E o que tenho a responder ao digno par.

Sr. presidente, emquanto ás desconsiderações que o digno par disse que eu tinha tido com os officiaes generaes, permitta-me s. ex.ª que lhe diga que me fez uma grave injustiça, e appello para a consciencia dos dignos officiaes generaes a quem se referiu o digno par. Nunca desconsiderei pessoa alguma, nem hei de desconsiderar, principalmente generaes probos como aquelles que o digno par indicou. Se estes generaes não têem sido condecorados com as medalhas de valor militar que lhe pertencem, e de bons serviços e comportamento exemplar, é porque a não têem requerido. Eu ainda não propuz medalha a pessoa alguma sem que a requeresse, porque não sei se querem usar d'essa insignia; ha muitos officiaes que capricham em não as usar, isso é da consciencia de cada um. O official que requerer ser condecorado com a medalha de valor militar, de comportamento exemplar e bons serviços, ha de ser attendido sempre, como tem sido, e como consta dos processos que estão em andamento.

Emquanto a chamar os processos todos que estavam no