DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 85
cão? Pois faz-se. Era preciso este honroso pacto? Pois concluiu se. Era preciso dar grande um exemplo de moralidade, desmentindo publicamente, ante o povo d’aquelle districto, pelo facto da sua alliança com os regeneradores as accusações affrontosas que lhes dirigiram? Pois deu-se..
A questão era ganhar as eleições.
O partido progressista queria apresentar candidato pelo, circulo de Castello Branco. Eram fracos os seus elementos de combate leal, e menores ainda aquelles com que podia contar para a victoria.
Era-lhe por isso,, necessaria uma alliança, e alliou-se. Mas isto não era bastante; soccorreu-se, pois, a todos os expiedientes que o sr. Luciano de Castro condemnára o anno passado, com toda a vehemencia, e vigor da sua palavra. Mas tudo isto não era ainda bastante para vencer! as eleições: era necessario reconsiderar e retractar-se de tucto quanto tinha sustentado na camara dos senhores deputados, e esquecer as falsificações de Villa Velha e Fratel, e lançar mão dos falsificadores, e dar-lhes toda a forçai para que, em correrias pelo concelho, podessem intimidar; os eleitores da opposição e impedidos de ir á urna!
A maior parte d’estes falsificadores, contra os quaes corre ainda um processo, são empregados publicos. Esta cohorte, com todos os mais empregados de administração, da fazenda, ias obras publicas, da canalisação do Tejo, furiosos galopins eleitoraes, percorriam em magotes o pobre concelho de Villa Velha, cujos habitantes, pela maior parte timidos e modestos, não tinham coragem nem força para resistir ás ameaças de toda a qualidade, e ás vexações de todos os momentos.
Sr. presidente, para se formar idéa do que. se fez, e dos meios de que se serviu o governo, basta dizer que o administrador do conselho é individuo, contra o qual o governo transacto mandou instaurar um processo, como posso provar pelos documentos que aqui tenho processo que o governador civil do sr. José Luciano tinha obrigação de mandar, instaurar, uma vez que tinha sido demittido o governador civil seu antecessor. Como lhe conheceram as prendas eleitoraes, não sómente deixaram de lhe instaurar o processo, mas inclusivamente conservaram á frente da administração do concelho de Villa Velha.
Serviu-se, pois, o governo, para galopins, eleitoraes, de falsificadores, publicamente reconhecidos como taes, e de todos os empregados administrativos e de fazenda de Villa Velha, de todos os empregados das obras do Tejo e da propria camara municipal, que percorriam q conselho ameaçando os eleitores com as contribuições, com o recrutamento e com coimas; afugentando os com boatos atterradores; fazendo alarde de vexames e violencias; e levando assim a perplexidade a todos os espiritos, e q susto a todos os animos. Eis como o sr. José Luciano garantia a independencia do voto e mantinha a liberdade da uma no districto de Castello Branco.
Pois, sr. presidente, nem mesmo usando d’estes meios e procedendo d’esta fórma, o governo póde vencer n’aquelle circulo, como era o seu desideratum.
Eu bem sei que o sr. ministro me dirá: Pois se isso tudo é verdade, se tudo isso se fez. porque se não instauraram processos?
É verdade. Não se instauraram processos. Mas porque se não instauraram?
Quer v. exa. e a camara saber a rasão? É muito simples: era impossivel instaurai-os, porque a auctoridade judicial era suspeita; porque não havia nem ha em Castello Branco juiz de direito desde que o actual governo subiu ao poder. O sr. ministro transferiu até o proprio delegado, mandando para aquella comarca um outro, que já ali se tinha tornado celebre — exactamente como o actual juiz substituto — protegendo visivelmente a demora do processo dos. falsificadores de Villa Velha.
N’esta deploravel situação em que se achava a administração da justiça, que fazer? Em Castello Franca o juiz de direito era entidade que não existia; o delegado de procurador régio fora transferido muito de proposito, de forma que no districto a justiça era... o que v: exa. acaba de ouvir! E acredite v. exa. que eu conto exactamente o que se passou; acredite v. exa. que eu não carrego as cores do quadro. E queriam processos! Pois se as cousas chegaram a tal estado, que desde que este governo; existe, ainda lá não appareceu juiz de direito, como queriam que se instaurassem processos? Para que serviria isso? Quer v. exa. saber o que é que resultaria da instauração? Absolutamente nada, a não ser a despeza de quem tal intentasse. Os desgraçados processos soffreriam a sorte de outros similhantes, seriam irremediavelmente archivados, como succedeu com o de Villa Velha, por despacho do actual substituto. Felizmente houve recurso para a relação, e espero que a rectidão d’este tribunal ha de desaggravar a justiça offendida.
Sr. presidente, a intolerancia subiu a tal auge, que bastava suspeitar-se que qualquer empregado publico tinha mais ou menos sympathia pelo partido constituinte, para ser logo ameaçado com a transferencia ou demissão.
Sr. presidente, eu entendo que os empregados não devem intrometter-se na lucta eleitoral, trabalhando pró nem contra os governos. Mas se se admitte que elles podem trabalhar a favor do governo, não vejo motivo que os demova, de trabalhar a favor das opposições, se tal for a inclinação, da sua consciencia. É preciso que o governo saiba, que os empregados publicos são empregados do estado e não do sr. José Luciano.
A minha opinião, a minha intima convicção, é que os empregados sirvam o paiz, nos cargos que occupam, com zêlo e actividade, que votem com inteira liberdade; porém, que fiquem estranhos a estas luctas. Mas desde o momento que os funccionarios da mais alta gerarchia são os primeiros a dar lhes o exemplo, não se póde, nem se deve estranhar que elles vão para onde os chama a sua sympathia partidaria.
Sr. Presidente o que admira, o que me surprehende, o que me causa assombro, é que o sr. José Luciano, ministro do reino hoje, director dos proprios nacionaes hontem, seja o propugnador da intolerancia, o perseguidor dos empregados, esquecendo-se que são seus collegas, que são como elle servidores do estado, e que gosam com certeza dos mesmos direitos. Esquece porventura o sr. Luciano de Castro o seu passado? Não se recorda já do seu proceder na outra casa do parlamento? Não sé recorda dos ataques ao governo transacto na phrase a mais desabrida? Já esqueceu as moções de censura, que propunha e votava na camara dos senhores deputados? Já se não lembra dos manifestos e das circulares que dirigia, aos eleitores, das representações que promovia contra o governo, da guerra, sem tréguas que lhe fazia? E comtudo, o sr. «José Luciano era nada menos que director dos proprio nacionaes o sr. José Luciano occupava um logar de confiança d’aquelle governo! Outro qualquer que não fosse o sr. Luciano de Castro, julgaria que a dignidade, que o dever, que o brio, que a honra, lhe impunham a obrigação de se exonerar de um logar, que só conservava por tolerancia, por generosidade e commiseração dos seus adversarios,.
Se procedesse assim, poderia apresentar-se de cabeça erguida, confirmava os bons principias, e defendia com os seus actos a sã doutrina.
Mas o sr. José Luciano fez exactamente o contrario, foi conservando o logar, e hoje ameaça, persegue e exerce vinganças sobre os empregados que lhe não são affectos. Assim é que o sr. ministro do reino é tolerante e coherente.
Q sr. José Luciano serviu-se precisamente dos mesmos meios, que havia condemnado aos seus antecessores; assim, promettia subsidios a parochos, e a igrejas; promettia obras, empregos, titulos, tudo emfim quanto servisse para angariar aptos aos seus candidatos.
Mas isto tudo não bastava. O sr. ministro do reino reco-