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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 227

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, eu pedi a palavra depois que ouvi as novas explicações do sr. ministro. Já não são os factos e os acontecimentos que vem esclarecer a questão, factos tão manifestos e acontecimentos tão palpaveis que todos podem muito bem avaliar; hoje são necessarias interpretações cerebrinas ou antes a suppressão da hermeneutica para que o governo possa sair desta posição difficil em que está collocado. A camara ouviu as novas explicações do sr. ministro, explicações que embrulharam mais a questão, e tornaram mais critica ainda a situação do governo.

Sr. presidente, o sr. ministro tinha declarado que o contrato era definitivo, e declarou ainda ha pouco que o contrato era provisorio; e em seguida pediu a palavra para declarar que o contrato já não era provisorio, nem definitivo, mas. meio provisorio e meio definitivo. Meio provisorio e meio definitivo! Note a camara, eu pela minha parte não comprehendo esta nova distincção jurídica! Não comprehendo mesmo que possa haver um contrato com duas partes, uma provisoria e outra definitiva, e muito menos ainda que a parte provisoria seja no que é favoravel ao banqueiro, e a definitiva no que é oneroso para o governo e para o paiz! Nos contratos desta ordem as condições costumam ser bilateraes, e quando se pede auctorisação ao parlamento para a sua ratificação é porque elles são definitivos entre as partes contratantes.

Pela analyse do documento que nos foi distribuido com o projecto em discussão eu notei que o contrato do supprimento de 517:240 libras faz uma parte importante e essencial do grande emprestimo de 18.000:000$000 réis, portanto constitue um todo harmonico inseparavel, pois a grande operação para se fazer tinha por base este supprimento; neste caso pois as declarações do sr. ministro só servem para demonstrar a leveza com que similhante negocio foi tratado, e em logar de simplificar a questão e esclarecer o debate, o torna mais complicado, e mais confuso e escuro.

A camara póde e deve observar que todas estas difficuldades que envolvem o actual gabinete não lhe teem sido creadas pela opposição, mas pela sua propria administração e votos. Nunca se levanta das suas cadeiras um ministro que não complique a questão, e que pelos seus argumentos contradictorios não de uma prova clara e evidente da pouca consciencia que tem do que defende.

De um lado, diz o sr. conde de Samodães: o contrato é provisorio; do outro, vem o sr. ministro do reino e diz: é definitivo;- votem no, se não querem pagar a multa. Depois apparece ainda o sr. ministro da fazenda a dizer que o contrato é meio provisorio e meio definitivo, e que começou nesta parte já a executar-se.

Se assim é, como vem s. exa. dizer á camara que possue e lê um documento do banqueiro em que elle declara ser provisorio? Se assim é, como ignora s. exa. que governo algum póde executar definitivamente um contrato sem ser auctorisado pelo parlamento? Se assim é, e carece de uma auctorisação, como quer por esta ratificar este contrato, quando ella não contem todas as forças deste mesmo contrato? Pois desconhece e ignora s. exa. o que &e dispõe no artigo 4.° do projecto em discussão, e o que está exarado no artigo do contrato Goschen emquanto á indemnisação dos portadores de obrigações do caminho de ferro do norte?

Portanto a declaração do sr. ministro em que nos assegura que elle póde tratar com os interessados do caminho de ferro a seu bello prazer é falsa e inexacta. Não o póde fazer sem ser de accordo com o banqueiro contratante. Esta declaração desculpa-se a s. exa., porque tendo sido os seus estudos mathematicos, ignora quaes sejam as regras de direito e a força de um contrato, emquanto toda a gente sabe que as duas partes contratantes ficam obrigadas ás condições que estão exaradas no contrato, e que não se podem fazer alterações sem ser de commum accordo. Então como quer o governo fazer um accordo com a companhia, sem tratar previamente com a casa bancaria? Como quer pois dar motivo a que o banqueiro possa pedir uma indemnisação, ou ir ao tribunal arbitrai mostrar que o governo faltou ás suas condições?

Eu sinto que dos logares dos srs. ministros se façam estas declarações. S. Ex.as devem ter idéas firmes e fixas, muito principalmente quando se trata de transacções desta ordem.

Eu vejo pela confusão das declarações do governo, que os srs. ministros não sabem bem qual é o valor do contrato, nem até que ponto elle póde obrigar o governo; nem sabem se o contrato é definitivo ou provisorio; nem mesmo percebem que sendo provisorio não tem força para obrigar, e sendo definitivo tem maior valor e obriga a uma e outra parte contratante. Não fallo em relação á camara; para ella qualquer contrato que o governo apresente é sempre provisorio; depois da sua approvação é que elle fica ratificado e torna-se definitivo.

Por consequencia, sr. presidente, neste ponto a questão está cada vez mais complicada, e eu desejo mesmo que o governo saia por uma vez deste estado de duvida, e nos declare o que quer e pretende, e as rasões em que se funda.

Até aqui mostrei as contradições do governo e a sua pouca persistencia, mesmo no que mais lhe convem. Emquanto porem á questão eu só direi, que concordo com o sr. Casal Ribeiro, isto é, que nós, votando esta auctorisação, votámos o contrato Goschen, se elle o quizer fazer.

Ora, vimos nós dar uma auctorisação para o governo fazer um contrato dependente da casa bancaria, e não da sua vontade, confesso ingenuamente que é humilhante para os poderes publicos, que nos colloca em má posição e faz alem disso com que qualquer outra casa bancaria que venha contratar com o governo, lhe imponha condições ainda mais duras e humilhantes e mais gravosas e peiores para o paiz.

Vozes: - Deu a hora.

Como deu a hora dou por terminadas as minhas considerações, e se amanhã o julgar conveniente pedirei de novo a palavra.

O sr. Presidente: - A primeira sessão será amanhã, continuando a mesma ordem do dia e á mesma hora.

Está levantada a sessão.

Eram mais de cinco horas da tarde.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão de 8 de julho de 1869

Os exmos srs.: Conde de Castro; Marquezes, de Alvito, de Fronteira, de Sá da Bandeira, de Vianna, de Vallada; Condes, das Alcáçovas, d'Avila, da Azinhaga, de Fonte Nova, de Fornos, da Louzã, da Ponte, do Rio Maior, de Samodães, de Thomar; Bispo de Vizeu; Viscondes, de Benagazil, de Fonte Arcada, de Monforte, de Porto Covo, de Seabra, de Soares Franco, da Vargem da Ordem, de Villa Maior; Mello e Carvalho, D. Antonio José de Mello, Costa Lobo, Teixeira de Queiroz, Rebello de Carvalho, Pereira de Magalhães, Silva Ferrão, Larcher, Braamcamp, Reis e Vasconcellos, Lourenço da Luz, Casal Ribeiro, Rebello da Silva, Preto Geraldes. Miguel Osorio, Menezes Pitta, Fernandes Thomás, Ferrer.

1:206 - IMPRENSA NACIONAL -1869