DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 319
seja o pretexto, pois que sómente ao presidente d'ella compete regular os seus trabalhos.
Qualquer dos membros d'esta casa tem direito a ser attendido, e não me parece que um ministro da corôa, que de mais não é membro d'esta camara, possa deixar de responder sobre um assumpto qualquer a que é chamado para dar explicações.
Eu sou n'isto imparcial, sr. presidente, e assim como desejo manter a dignidade da camara, tambem não desejo que se diga, que eu pretendi ou pretendo collocar o governo em má posição, como tambem não quero collocar a camara.
Dadas estas explicações, tornarei a pedir ao digno par o sr. Manuel Vaz Preto que em attenção, não á minha pessoa, mas á camara, e ao systema representativo que todos respeitâmos e desejâmos conservar dignamente, que nos diga duas palavras, que possam influir para nos fazer saír d'esta posição.
Eu estimaria muito que estas questões particulares se não trouxessem para aqui, (Apoiados.) que se collocassem as entidades politicas em posição de se respeitarem mutuamente, o que repito ainda mais uma vez, concluindo por dizer ao digno par o sr. Vaz Preto, que espero do seu cavalheirismo que nos possa fazer saír da situação embaraçosa em que nos achâmos collocados.
(O orador não reviu este discurso.}
O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, como a maior parte dos dignos pares não ouviram as palavras que eu proferi, é bom que as repita, se a camara assim o quer, para que se saiba bem o motivo d'este incidente, e todos fiquem inteirados.
O sr. Presidente: - Peço ao digno par que se limite a explicar o sentido das suas palavras.
O Orador: - Para condescender com v. exa. não ponho a questão como ella é, e limito-me a declarar que, nas palavras que tenho proferido n'esta casa, hoje e sempre, nunca tive a intenção de offender a camara, nem o poder executivo, embora ellas tenham sido dirigidas a qualquer ministro. Repito, respeito a entidade camara, e a entidade governo, e se alguem se julga offendido, isso é com elle.
Aproveito a occasião para agradecer ao sr. Fontes Pereira de Mello o modo cavalheiroso por que se me dirigiu, tanto mais que s. exa. está collocado, em relação a mim, n'uma posição especialissima.
O sr. Presidente: - Dado este incidente por terminado, continua a discussão.
(Apoiados de varios lados da camara.)
Tem a palavra o sr. ministro da guerra.
O sr. Ministro da Guerra (João Chrysostomo): - Pareceu-me que nas palavras proferidas pelo digno par, o sr. Vaz Preto, havia offensa para um dos meus collegas no gabinete, e n'esta situação entendi que a dignidade do governo requeria que essas palavras fossem retiradas. O digno par acaba de declarar que, nas suas palavras, não teve intenção de offender nenhum membro do poder executivo, e, portanto, julgo findo este incidente.
Estou completamente de accordo com as reflexões feitas pelo digno par e meu amigo o sr. Fontes Pereira de Mello, de que qualquer membro do governo não deve deixar de satisfazer com o que cumpre a um ministro da corôa, em presença do parlamento, dando as explicações necessarias ácerca dos negocios publicos, e que ahi lhe forem pedidas; mas parecia-me que a dignidade do governo tambem não permittia que eu d'esse explicações, sem primeiro se aclarar o sentido das palavras empregadas pelo digno par o sr. Vaz Preto.
O sr. Vaz Preto: - O sr. ministro da guerra fallou apenas do incidente já terminado, e não disse nada ácerca do assumpto que está em discussão. Não disse se acceitava ou rejeitava a minha proposta, que é igual a uma apresentada ha annos pelo sr. marquez de Sá da Bandeira, cuja competencia em assumptos militares todos reconheciam. Aquelle nosso fallecido collega tambem entendia que o exercito podia ter instrucção e fazer o serviço com a força de 18:000 homens.
Eu desejava saber a opinião do sr. ministro.
O sr. Ministro da Guerra (João Chrysostomo): - Sr. presidente, eu não tenho duvida em responder ás observações que acaba de fazer o digno par; mas creio que essas observações terão mais cabida quando se tratar de um outro projecto de lei, pois aqui só se trata da fixação da força. A questão do recrutamento vem de certo a proposito do projecto que diz respeito ao contingente que ha de ser submettido á camara, e por isso quaesquer considerações sobre o assumpto afiguram-se-me inopportunas.
O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, eu sinto divergir da opinião do sr. ministro da guerra com respeito á opportunidade da minha prsposta.
O sr. marquez de Sá, que de certo não póde deixar de ser um testemunho insuspeito para s. exa., apresentou aqui a sua proposta em condições perfeitamente identicas, e foi approvada, note v. exa., por uma grande parte dos homens que se sentam n'essas cadeiras.
Ainda ha pouco retirei uma proposta para livrar o governo do embaraço em que estava em face da manifesta divergencia entre os srs. ministros da guerra e da marinha; agora vejo-me na necessidade de proceder pela mesma fórma, retirando tambem esta proposta, para que o governo se não colloque na contradicção de rejeitar uma proposta apresentada pelo sr. marquez de Sá, o chefe politico de um dos grupos de que se compõe o actual partido progressista, que s. exas. representam n'essas cadeiras.
Peço, pois, a v. exa., sr. presidente, licença para retirar a minha proposta.
O sr. Ministro da Guerra (João Chrysostomo): - Eu desejo simplesmente dar uma explicação. A lei a que se refere o digno par, e que foi proposta pelo sr. marquez de Sá, não está em execução, a que o está é a do anno passado, e agora apresenta-se uma proposta no mesmo sentido; já tive a honra de declarar á camara, que nas circumstancias actuaes o licenciamento das praças de pret não deve reduzir a força effectiva do exercito a menos de 20:000 homens, porque de contrario seguir-se-íam graves inconvenientes. Mas o licenciamento não tem nada com a fixação da força do exercito em pé de paz, que sempre tem sido de 30:000 praças de pret de todas as armas.
O sr. Presidente: - Vou consultar a camara sobre o requerimento do sr. Vaz Preto para retirar a sua proposta.
Consultada a camara, resolveu affirmativamente.
Não havendo mais nenhum digno par inscripto, leu-se na mesa o projecto; e sendo submettido á votação, foi approvado tanto na generalidade como na especialidade.
Leu-se na mesa o parecer n.º 46, que é do teor seguinte:
Parecer n.° 46
Senhores. - A commissão de guerra examinou o projecto de lei n.° 16, vindo da camara dos senhores deputados, que tem por fim fixar o contingente militar com que os districtos do reino devem concorrer para a composição do exercito e armada, no corrente anno.
O governo pediu, na sua proposta, 10:350 homens, sendo 10:000 para o exercito, e o restante para a armada, e pela camara dos senhores deputados foi acceita e approvada esta proposta.
Não se attendeu n'este pedido ás falhas e desfalques que é costume verificarem-se sempre nas fileiras, procedidas de differentes causas, e que não poderão ser computadas em menos de 2:000, porque, não estando reunida nos corpos maior força que aquella que é auctorisada na lei de meios, sempre muito inferior aos 30:000 homens que constituem a força effectiva do exercito, os recrutas que vem a mais chegam para compensar aquellas falhas ou desfalques.
Alem d'isso, a conveniencia de conciliar, quanto possi-
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