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do a Carta, nem esta Camara, nem o Rei precisam de poder especial para conceder, ou negar a sua sancção, ou confirmação ás reformas da mesma Carta.
Estas reformas são feitas ou directamente pela nação, ou indirectamente pela mesma nação, quando as Côrtes com a sancção do Rei, como representantes della exprimem a vontade nacional. Mas aqui a reforma realisa-se tanto directa como indirectamente; directamente quanto á necessidade da reforma, quanto á primeira parte do processo: e indirectamente, quanto á segunda parte do mesmo processo.
A iniciativa que o Governo tomou em apresentar á discussão determinados artigos, foi um acto complementar, fazendo o que teriam feito as Côrtes, por uma lei, promulgada em fórma ordinaria, se fossem as Côrtes, e não a nação, as que tivessem reconhecido e decretado a necessidade da reforma na primeira instancia.
E nem póde por tanto dizer-se que a iniciativa da parte do Governo repugna com o veto, que a Carta attribue ao poder moderador; porque tendo-se a Corôa manifestado já pela approvação do acto addicional, não póde a Soberana responder, que quer meditar sobre elle.
Pois que a mesma repugnancia se daria então mesmo se a primeira parte do processo tivesse corrido precisamente, em tudo e por tudo, segundo a Carta; por isso que ã Corôa se teria tambem já manifestado pela reforma de certos e determinados artigos, concedendo a sancção á lei, que reconhecesse a necessidade da mesma reforma.
E tanto mais que a apresentação do acto addicional não importou mais, que um thema para a discussão, e agora o que temos presente é o projecto que veio da Camara dos. Srs. Deputados, que traz muitas alterações á proposta do Governo, o que demonstra ter havido liberdade na discussão deste objecto, e não se poder allegar o perigo de contradicção.
Estes são pois os fundamentos, pelos quaes eu intendo que a Carta não tem sido violada, e que muito, pelo contrario, ella tem sido fielmente cumprida, em tudo quanto podia ser, nas circumstancias em que nos achamos. Tambem não posso acceder á opinião dos dignos Pares, que pretendem desprender ou destruir os escrupulos de consciencia dos outros, dizendo — que no acto addicional se não contêem provisões, que sejam constitucionaes, á excepção do primeiro artigo que falla da regencia (O Sr. Conde da Taipa — apoiado]; que se póde votar porque já ha lei a esse respeito, e o voto não faz mais que confirma-la.
Sr. Presidente, percorrendo os artigos do acto addicional vejo nelles muitas cousas que são constitucionaes. O artigo 144.º da Carta, definindo o que é constitucional, e que assim não póde ser alterado, sem as devidas formalidades, pelas legislaturas, ordinarias, declara comprehender tudo quanto diz respeito a limites, e attribuições respectivas, dos poderes politicos, e individuaes dos cidadãos
Ora, Sr. Presidente, a constituição dos poderes politicos é essencialmente ligada com a attribuição e limites dos mesmos poderes; e, segundo a Carta, o poder politico, legislativo, é exercido por duas Camaras, sendo uma de eleição, verificada com certas e determinadas condições, ex-pressas na mesma Carta, que assim respeitam essencialmente aos limites e attribuições desse poder: assim como respeita essencialmente aos limites e attribuições dos poderes politicos, moderador e executivo, a designação da Augusta Dynastia da nossa Rainha, garantida neste nosso pacto fundamental.
Mudar pois as eleições de indirectas, para directas, é alterar as bases da Constituição de um dos poderes do Estado, o que não póde ser feito pelas legislaturas.
O Sr. Conde da Taipa — É um direito social, senão era um privilegio.
O Orador — Sr. Presidente, o digno Par póde ter essa opinião, eu tenho outra, os direitos politicos são estes, e direitos civis são outros; direitos politicos não são senão estes (O Sr. Visconde de Laborim — Apoiado). Na Carta é um direito politico votar e ser votado, a Carta falla de empregados publicos sem distincção, e exige o rendimento havido por ordenados ou por agencia, e o acto addicional restringe esse direito. Eu não entro nas conveniencias (O Sr. Conde da Taipa — Não é conveniencia). Tambem não seria attribui cão do poder politico, a determinada na Carta, para que se votem annualmente os impostos directos, e não já assim os indirectos?
Não será por tanto alterar um artigo constitucional, alterar-se pelo acto addicional o que dispõe a Carta a similhante respeito, para que nessa attribuição de votação annual pelas Côrtes se comprehendam os impostos indirectos, e um limite posto ás attribuições do executivo, que, pela Carta, os podia arrecadar, sem dependencia dessa votação? Responda o digno Par (O Sr. Conde da. Taipa — Não é: logo direi). Mas, Sr. Presidente, eu intendo o contrario, e penso, que nisto hei de ser seguido pela maioria desta Camara; e direi mais que é fazer uma gravissima injuria ao Governo, defender por tal fórma o seu acto addicional, porque então será preciso concluir, que o Governo sophismou completamente o facto da revolução, e que nessa beira foi acompanhado pelos Srs. Deputados; é preciso concluir que o Governo, para melhor illudir a nação, ordenou que os Srs. Deputados trouxessem nas procurações poderes especiaes, sómente exigiveis, quando se tracta de alterar artigos constitucionaes.
O mesmo facto pois do Governo repelle uma similhante doutrina, e. ou tenho já por mim i conceito que formou o Governo, ou hei de admittir contra o Governo, e contra a outra Camara, que eu respeito e devo respeitar, a terrivel ar guião de sofisma e simulação. Ainda outro exemplo. Pois não será um artigo constitucional o que respeita á previa rectificação dos tractados? O Governo tinha uma attribuição de fazer os tractados, antes da rectificação pelo poder legislativo, e agora não, e talvez que deste principio possam resultar grandissimos inconvenientes (apoiados). Por tanto, Sr. Presidente, não é por este lado que devo tranquilisar a minha consciencia.
Demais, não me julgo competente, para dizer que tal ou tal artigo da Carta, é ou não é constitucional; e pela mesma razão eu reputo constitucional tudo quanto se acha no acto addicional, e á excepção de tres ou quatro cousas, que vinham na proposta originaria do Governo, todas as mais são constitucionaes, porque é o Parlamento, e em ambas as Camaras, com a Sancção do Rei, quem póde decidir se um objecto se póde reformar, e se é ou não constitucional; se a reforma se ha de fazer por um acto legislativo, ordinario, ou pelos tramites marcados na Carta constitucional.
É por isso, Sr. Presidente, que eu tambem não posso admittir, pelas razões que produzo do meu voto, a doutrina apresentada pelo Sr. Ministro do Reino a este respeito. Disse S. Ex.ª (como argumento para mostrar corroborado o facto da revolução, que eu não ponho em duvida, e é meu voto) que tinha sim ordenado aos collegios eleitoraes, os poderes especiaes para a reforma, mas que os collegios eram livres de os conceder ou não.
Mas eu digo que os collegios eleitoraes não tinham, nem podiam ter essa liberdade. O facto da revolução estava consumado, o Governo tinha restricta obrigação e necessidade de tirar desse facto as legitimas consequencias, e por tanto o Decreto eleitoral sendo o desempenho de uma obrigação governamental, produziu o direito á obediencia, e uma obrigação correlativa para com os ditos collegios, que haviam necessariamente conformar-se com essa parte do Decreto, que é uma formalidade que a Carta exige (apoiados).
Sr. Presidente, reservo-me para a especialidade dos artigos, e então apresentarei algumas observações a respeito de alguns que eu rejeito, por altas considerações, e que lamento estejam no acto addicional. — Por ora digo que a minha convicção é que as opiniões dos dignos Pares são sempre dignas de louvor, assim como o seu zêlo pela guarda inviolavel dos preceitos consignados na Carta constitucional da monarchia.
Neste desejo, nessas intenções estou eu, e por isso não posso deixar de approvar a emissão do seu voto; eu manifestaria um voto similhante, com igual coragem e franqueza, se tivesse a mesma convicção dos dignos Pares.
E tendo dado a hora o Sr. Presidente disse que continuaria a mesma ordem do dia na sessão de quarta feira (30), levantou apresente sessão. — Eram quatro horas.
Relação dos dignos Pares que estiveram presentes na sessão de 26 do corrente. Os Srs. Cardeal Patriarcha, Silva Carvalho Duque de Saldanha, Duque da Terceira, Marquez de Ficalho, M. de Fronteira, Marquez de Loulé, Marquez das Minas, Marquez de Ponte de Lima, Arcebispo Bispo Conde, Arcebispo de Palmyra, Conde das Alcaçovas, Conde de Alva, Conde de Avilez, Conde de Bomfim, Conde do Casal, Conde de Linhares, Conde de Mello, Conde da Ribeira Grande, Conde de Rio Maior, Conde de Semodães, Conde do Sobral, Conde da Taipa, Conde de Tavarede, Bispo do Algarve, Visconde de Algés, Visconde de Almeida Garrett, Visconde Benagazil, Visconde de Castellões, Visconde de Castro, Visconde de Fonte Arcada, Visconde de Laborim, Visconde de Sá da Bandeira, Barão de Chancelleiros, Barão de Porto de Moz, Barão da Vargem da Ordem, Pereira Coutinho, D. Carlos de Mascarenhas, Pereira de Magalhães, Silva Ferrão, Tavares de Almeida, Aguiar, Larcher, Duarte Leitão, Fonseca Magalhães, Margiochi.