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Sessão de 23 de Abril de 1849.

Presidiu — O Em.mo e Rev.mo Sr. Cardeal Patriarcha.

Secretarios — Os Srs. Simões Margiochi

V. de Gouvêa.

(Summario— Correspondencia — Ordem do dia. Parecer n.º 112 sobre a Proposição de Lei n.º 57, estabelecendo as aposentações da Magistratura judiciaria.)

Aberta a Sessão pouco antes -das duas horas da tarde, estando presentes 32 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão — Esteve presente o Sr. Ministro da Justiça. Mencionou-se a seguinte

Correspondencia.

1.º Um officio do Ministerio do Reino, participando que o Beija-Mão pelo Anniversario da Outhorga da Carta Constitucional da Monarchia, teria logar no Paço das Necessidades pela uma hora do dia 29 do corrente.

2.° Outro officio do Ministério da Guerra, enviando sanccionado um dos Authographos do Decreto de Côrtes Geraes, fixando a Força do Exercito para o anno economico de 1849 a 1850.

Remetteu-se para o Archivo.

Ordem do dia.

Parecer n.º 112 sobre a Proposição de Lei n.º 57, estabelecendo as aposentações da Magistratura judiciaria, cuja discussão começada a pag. 493, col. 2.º, proseguiu a 514, 1.ª — 520, 3.ª —548, 3.ª —562, 1.ª — e 572, 1.ª, versando directamente sobre a Proposta do Sr. Pereira de Magalhães (pag. 493, col. 4.ª) e a do Sr. V. de Sá (pag. 548, col. 4.ª) O Sr. Pereira de Magalhães — Sr. Presidente, sinto a maior satisfação em ter apresentado a minha Proposta, para que este Projecto voltasse á Commissão, não só para o addicionar com as provisões necessarias para as habilitações dos Delegados do Procurador Régio e candidatos á Magistratura judicial, como tambem pelo que diz respeito a accessos e promoções; porque, se eu não apresentára a minha Proposta, nem a Camara, nem eu, teriamos lido a satisfação de ouvir os eloquentissimos discursos de muitos dignissimos Membros da Commissão, nos quaes desenvolveram os principios mais luminosos não só sobre o assumpto especial deste Projecto, mas sobre toda a Administração Publica;, e sem a minha Proposta, este Projecto, que e de uma magnitude incalculavel, teria passado nesta Camara quasi imperceptivelmente. (O Sr. Fonseca Magalhães— Nada!)

Mas, Sr. Presidente, não ha satisfação completa, ou como diziam os nossos antigos — não ha gosto sem desgosto; porque, eu a par da satisfação que senti, pelos motivos que referi, tambem experimentei um grande desgosto, e foi o ver, que sendo apresentado algumas observações a este Projecto de Lei com a maior franqueza, com a maior sinceridade e com o maior desinteresse, vi as minhas observações todas, ou uma grande parte dellas, transtornadas naturalmente por não terem sido intendidas pelos D. Pares; experimentei desgosto, Sr. Presidente, porque tendo feito essas considerações sobre o Projecto com o fim unicamente, de que sahisse daqui esta obra a mais perfeita possivel, vi a maior parte das minhas considerações transtornadas, para sobre ellas se formarem argumentos, que na verdade eu gostei de ouvir pela sua doutrina, mas a que eu não tinha dado causa: ha com tudo nisto um facto inexplicavel.

Os illustres Membros da Commissão, que estão assentados ao pé de mim, não me intenderam, em quanto os Tachygraphos, que estão a maior distancia, intenderam me muito bem, porque, em abono da verdade, eu vi os meus pensamentos fielmente escriptos por elles; e da falta dos D. Pares me não terem intendido, resultou imputarem-me: primeiro, que eu taxava o Poder Judicial de absolutamente desorganisado, concluindo daqui que eu me oppunha ás aposentações dos Juizes; que as julgava desnecessarias ou mesmo que as não queria; porque até se chegou a dizer, que não podia deixar de haver da minha parte algum resentimento, por dizer o que tinha dito.

Sr. Presidente, eu nunca estudei discursos, não os faço, e tudo o que digo é aquillo que me occorre no momento; não tenho habilidade para fazer discursas, confesso o meu pouco geito para isso. Uma vez que quiz fazer e estudar um discurso, declaro que o principiei uma, duas e trez vezes, e a final não o pude levar a cabo: então póde bem ser, que nos meus improvisos diga algumas cousas que não quero dizer, e que as diga até muito mal; mas a convicção que tenho é, de que quando as digo é com toda a sinceridade, é a mesma com que me tenho pronunciado sobre o objecto que se discute. Todavia, Sr. Presidente, eu já poderia dizer que consegui um grande triumpho, porque vejo que a illustre Commissão está resolvida a alterar, ou a mudar a base deste Projecto no seu artigo 1.º, o que talvez não estivesse resolvida a fazer, se eu não apresentasse a minha Proposta; e ainda espero da illustre Commissão, quando tractarmos do Projecto na sua especialidade, que ha de admittir mais alguns aperfeiçoamentos: ao menos eu assim o espero da sua illustração,

Tambem não tenho já hoje a sustentar a minha Proposta; porque, tendo-se affirmado nesta Casa, como se affirmou, que o Sr. Ministro havia apresentado na outra Camara um Projecto tendente a regular, os accessos e promoções, não me parece conveniente que vamos aqui apresentar e discutir outro sobre o mesmo fim; e forçoso e por conseguinte esperar, que esse Projecto venha a esta Camara para aqui o approvarmos ou rejeitarmos, segundo a Camara intender: limitar-me-hei neste caso a rectificar algumas das minhas observações, porque não quero, não desejo e nem mesmo posso querer nem desejar, que me façam dizer aquillo que eu não disse, nem que me façam pensar aquillo que eu não pensei nem penso; porque terei talvez muitos defeitos, mas em principios faço sempre toda a diligencia para os ter verdadeiros; e então, repito —limitar-me-hei a algumas rectificações, respondendo aos argumentos que se fizeram ás minhas observações alteradas.

Sr. Presidente, eu nunca disse, nem o podia dizer, que o Poder Judicial estava desorganisado, porque depois de se lerem feito tres organisações, tres Reformas Judiciarias, seria eu ser muito falto de memoria para dizer, ou para querer aqui sustentar, que o Poder Judicial não estava organisado: está organisado, Sr. Presidente, e é por elle estar organisado talvez (ao menos eu assim o penso), que apparece no nosso estado um mal a que não é possivel dar remedio: eu me explico.

O Governo Constitucional do Estado á uma machina composta de tres rodas: uma é o Poder Legislativo, outra • o Poder Judicial, e a outra é o Poder Executivo: ora se n'uma machina qualquer se concertar uma das rodas e se aperfeiçoar, deixando-se as outras em máo estado, segue-se que a machina não póde funccionar. O Poder Judicial foi organisado em 1834, 1836 e 1840; foi organisado perfeitamente; mas não se organisou o Poder Executivo, e daqui tem resultado o Poder Judicial ter muitas vezes invadido o Poder Executivo, assim como o Poder Legislativo, a cuja invasão nem um nem outro destes dous Poderes podem dar remedio; e ainda não ha muitos dias que nesta Camara disse um seu dignissimo Membro, que fóra Ministro de Estado por muito tempo, que propozera um Projecto de Lei ás Côrtes, o qual fóra approvado e sanccionado, mas que o Poder Judicial o não quizera executar; de maneira que tivera de vir ás Côrtes pedir que reformassem a Lei! Se o Poder Judicial póde não executar uma Lei, ou dizer que a não quer executar, considere-o a Camara. Veja-se bem que resultados póde ter este procedimento o facto que referi foi dito por um Membro desta Camara que já foi Ministro de Estado, facto que se passou achando-se elle nos Conselhos de Sua Magestade, e eis-aqui o que resulta do Poder Judicial estar organisado e os outros Poderes não o estarem. Eu podia referir outros factos de invasão do Poder Judicial, assim como >dos outros Poderes. Este mal existe, os factos que provam a sua existencia são notorios, as causas são conhecidas; mas o remedio não apparece!

Ora isto não é querer dizer, que eu não queria o Poder Judicial organisado: pelo contrario quero que seja bem organisado; mas tambem queria que os outros Poderes fossem organisados ao mesmo tempo, a fim de se dar o verdadeiro e indispensavel equilibrio aos Poderes do Estado; isto é, que a machina do Estado funccionasse perfeitamente. Este é o meu pensar, póde ser que esteja em erro, mas é isto o que eu vejo, a vejo mais ainda, porque vejo que o Poder Judicial, sendo independente e dizendo-se elle mesmo independente. esta sua independencia leva-o tão longe, que faz com que os outros Poderes do Estado não possam marchar com a harmonia, que convém que marche o Governo da Sociedade.

Sr. Presidente, eu quero que os Magistrados Judiciaes assim como todos os Empregados Públicos sejam "bem pagos, e tenham as suas reformas, aposentações e jubilações; ainda não dei provas algumas em contrario disto; e por esta occasião agradeço muito ao D. Par, que descubriu um Projecto que eu apresentei á Camara dos Senadores em 1840 sobre a organisação judicial no primeiro grau: agradeço-lhe muito, porque me não lembrara que linha feito tal Projecto, de maneira que até fiquei surpreendido quando o D. Par começou a argumentar com elle. O D. Par, fazendo delle aqui a sua leitura, disse que eu então era mais generoso do que me tinha mostrado agora sobre o Projecto que se discute: estimo isso muito, porque é a maior prova que me podia dar, d» que eu quero aposentações; de que quero que os Magistrados sejam bem pagos; e que as suas viuvas tenham alguma cousa: por conseguinte, esse Projecto foi o melhor documento que o D. Par aqui podia trazer a meu favor, uma vez que pretendia inculcar que eu era contrario ás aposentações dos Juizes.

Verdade é que o D. Par destacou algumas proposições pára habilmente censurar esse meu Projecto; mas, Sr. Presidente, tudo neste Mundo tem uma historia; aquelle Projecto tambem tem a sua historia particular, que eu não repito, porque não quero enfadar a Camara; mas sempre direi, que as circumstancias geraes que se davam em 1840 não são as mesmas que se dão em 1849; e que então, além dessas circumstancias geraes, davam se tambem circumstancias especiaes: as circumstancias porém tanto geraes como especiaes, mudaram inteiramente, são outras; porque se hoje se dessem as mesmas, eu nenhuma duvida teria em o sustentar em todas as suas partes e disposições, mesmo aquellas que o D. Par Ião habilmente destacou, chamando até a attenção da Camara sobre um trecho, em que, produziu uma certa hilaridade na Camara, censurando-me porque eu dava em certo caso a preferencia aos casados, quando é certo que sempre, por toda a nossa Legislação antiga, o casado sempre tivera uma certa preferencia nos Empregos publicos; e, em quanto aos Magistrados e officiaes de Justiça, a Lei exigia que fossem casados, obrigando-os até a casar dentro de um anno, e prohibindo ao Desembargo do Paço conceder-lhes dispensa.