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10 DIÁRIO DA CAMARA DOS DEPUTADOS

Se desde o início da República, êsse Ministério existisse, talvez agora não tivéssemos a lamentar o aspecto fragmentário e a falta de coordenação, que tanto caracterizam as reformas pedagógicas do Govêrno Provisório.

Além dos motivos, que para D. António da Costa justificam a criação do Ministério da Instrução Pública, há ainda a acrescer a imprescindível necessidade de coordenar o ensino técnico e profissional, hoje a cargo do Ministério do Fomento, e o ensino colonial, a cargo do Ministério das Colónias, com o ensino scientífico e literário que está sob a dependência do Ministério do Interior.

E, como se tudo isto não bastasse para evidenciar a necessidade do Ministério da Instrução Pública, há ainda a atender que os negócios da instrução, pela sua complexidade e delicadeza, não devem estar entregues ao acaso do primeiro homem que aparece para os dirigir, tantas vezes sem a necessária competência, só porque os baldões da política o determinaram.

As questões do ensino público devem estar entregues a especialistas com uma preparação grande e com uma bela educação filosófica para que saibam coordenar com um elevado critério todos os ramos e graus do ensino.

E, se tal se fizer, mais uma vez se provará que as democracias, escolhendo os seus governantes entre os especialistas, não são amibianos nem são regimes de incompetentes, como pretende provar Faquet numa das suas últimas obras; como consequência de se querer entregar o Ministério da Instrução a um especialista em assuntos pedagógicos, resulta que êsse Ministério deveria estar fora da órbita da política partidária para que a orientação e o espírito de direcção das questões de ensino tivessem sequência - o que não acontecerá se êsse Ministério estiver, como qualquer outro, sujeito às fluctuações da política.

Por isso desejaríamos propor que o cargo de Ministro da Instrução fôsse desempenhado por comissão temporária. Porem a Constituição da República tal não permite, confiando nós que o patriotismo e o alto critério dos poderes do Estado saberão confiar a pasta da Instrução Pública a quem dela seja digno pelo saber e pela honestidade.

Escusado será dizer que pensamos que o cargo de Ministro deverá ser desempenhado por um professor do ensino oficial, ou ainda, mas excepcionalmente, por uma individualidade que, pelos seus méritos, claramente comprovados em trabalhos de carácter pedagógico, se mostre digna dêsse tal mester.

Como no projecto se verá, ligamos a maior importância ao recrutamento do pessoal superior do Ministério, pois entendemos que não é só o Ministro que deverá ser um profundo conhecedor nas questões de instrução, mas tambêm os directores gerais e chefes de repartição deverão ser escolhidos com o maior cuidado entre os especialistas e profissionais do ensino.

Como acima se diz, um dos principais objectivos dêste projecto de lei é conseguir a coordenação do ensino scientífico com a instrução técnica e profissional.

Hoje mais do que nunca, é actual o pensamento do profundo Comenius no Methodus Linguarium Novíssima ao dizer que: "ao espírito que pensa e à língua que fala, é preciso associar a mão que produz", sendo tambêm oportuno lembrar a idea de Spencer ao dizer que o destino humano consiste "em viver uma vida completa", e a concepção doutros pedagogistas como Lock, Rousseau, Base dow e Kindermann, que são unânimes em considerar o ensino como uma síntese e a escola como uma antecâmara da vida. E, se tal facto é verdadeiro sob o aspecto pessoal do ensino, hoje chamado integral ou completo, não o é menos sob o seu aspecto geral da educação pública. Todos os grandes viajantes, isto é, aqueles que se deslocam, não para serem vistos, mas sim para ver, para estudar como J. Huret, V. Leroy-Beaulieu, Oiner, Buyse, Paul Adam, P. Rogier e Firmin Roy, são unânimes em dizer, a respeito da educação nos Estados Unidos da América do Norte, que a primeira função da escola americana, é preparar para a vida, a segunda, é preparar para a vida nacional".

O que êsses jornalistas, economistas, sociólogos e pedagogistas tem dito a respeito da educação americana outros, e êles próprios o dizem da educação alemã, holandesa, belga, suíssa, etc.

Nas altas regiões do pensamento e da especulação pura quer se trate do racionalismo, do intelectualismo e do positivismo dum Levy-Bruhl e dum Durkeim, ou do pragmatismo anglo-americano dum William James ou dum Bergsons, o conhecimento e a acção tão unidos andara, - discutindo-se apenas a questão da precedência - que nenhuma escola filosófica já hoje admite a sciência pela sciência, porque unanimemente só se compreende neste momento a sciência pelas suas aplicações. E quando passamos ao campo mais comesinho da vida prática, onde a questão económica passa como dominadora, é que vemos bem que se o fim interior da educação é como entende Herbart a cultura dum carácter moral, constante e enérgico, objectivo esterno dessa educação é, na realidade preparar para a vida e para a vida nacional, como diz Firmin Roy, da educação americana.

Não é mistério para ninguêm, que o nosso ensino com raras excepções só prepara para a vida... burocrática. Tal facto é um mal maior que à primeira vista parece, originando dum lado um enorme despovoamento das carreiras chamadas práticas, como a agricultura, o comércio e a indústria, e provocando por sua vez uma asfixiante repopulação nas chamadas carreiras liberais. O resultado é que, à medida que a nossa vida económica estaciona, a burocracia medra a olhos vistos.

Se desejamos ser um país florescente e digno do regime que implantámos impõe-se uma completa transformação de costumes, de orientação e por isso uma completa mudança de educação, isto é, de ideal educativo.

E ao encontro de tais desejos que vimos com o presente projecto de lei.

A criação do Ministério de Instrucção Pública, tendo em vista a coordenação da instrução scientifica com o ensino técnico e profissional torna assim possível uma maior divulgação dêste e o mais completo e perfeito encadeamento entre essas duas ordens de cultura.

E necessário não esquecer um momento que é esta penetração do ensino scientífico pela instrução profissional. que a Bélgica, a Suíssa, a Holanda, a Suécia e a Finlândia devem os extraordinários progressos da sua vida económica, para não falarmos já dos Estados Unidos, da Alemanha, da Inglaterra, da Itália e da França.

Como se vê, é mais que uma questão de coordenação pedagógica que se tem em vista com a criação do Ministério, porque é duma verdadeira questão de sinergia económica nacional que se trata aqui.

Alterando um pouco a frase de Firmin Roy, não esqueçamos nunca que a primeira função da escola portuguesa a preparar para a vida, e a segunda é preparar para a vida nacional.

Eis, quanto a nós, o que justifica neste momento a criação do Ministério de Instrucção Pública, em Portugal.

TÍTULO I

Da organização dos serviços

Artigo 1.° É criado o Ministério da Instrução Pública, tendo em vista centralizar e coordenar, numa só Secreta-