1048 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 103
Deve elucidar-se que se mantém a coincidência do âmbito territorial de jurisdição dos tribunais com as áreas dos distritos, continuando a admitir-se também que este princípio sofra, eventualmente, alterações, quando o aconselhe a conveniência do serviço ou o exija a comodidade dos povos.
No que se refere ao recrutamento dos magistrados, não se há-de perder de vista que, a par da competência técnica, é mister considerar como requisito indispensável uma segura formação social. Imprime-se, contudo, às bases que o regulam a maleabilidade suficiente para que, sob condição daquela competência, se possam tomar em conta outros factores de qualificação.
Quanto aos tribunais colectivos, perfilha-se o critério de que não devem funcionar, em caso algum, sem a intervenção de, pelo menos, um juiz privativo.
Os vencimentos dos magistrados e dos serventuários são revistos, em certos casos, através de uma justa equiparação, considerando-se ainda, além das condições de vida das cidades sedes dos tribunais, o movimento processual e as peculiaridades que, com reflexo no serviço, distinguem os distritos do País e fazem variar a importância e a complexidade dos litígios. Para o efeito, arrumam-se, praticamente, em três grupos os tribunais do continente e das ilhas adjacentes.
Para afastar os embaraços resultantes da pluralidade das atribuições da Inspecção Judiciária, que mais apropriadamente se designa, na proposta, por Inspecção Superior dos Tribunais do Trabalho, prevê-se ainda o alargamento do seu quadro de inspectores e a criação de uma secretaria.
A reforma virá permitir, por outro lado, a criação dos lugares de agentes do Ministério Público privativos em nove tribunais que ainda os não têm, o aumento do número de varas em Lisboa e Porto e o desdobramento de algumas secretarias em secções centrais e de processos, a exemplo do que se verifica nos tribunais comuns. Pela leitura dos quadros anexos a este relatório (quadros n.ºs 4 a 8) melhor se poderá avaliar da amplitude da reorganização prevista na proposta ou a desenvolver no novo Estatuto dos Tribunais do Trabalho.
10. Sublinhe-se, por último, que se espera atingir um mais sensível descongestionamento do serviço dos tribunais do trabalho, dispensando-os da apreciação de numerosos litígios de pequeno valor, através da remodelação das comissões corporativas, a qual se encontra presentemente em estudo, tendo em vista a necessidade de se procurar, tanto quanto possível, a solução de conflitos de trabalho pela via mais fácil e natural, que, também aqui, é a corporativa.
Com a promulgação do Código de Processo nos Tribunais do Trabalho, em 1940 (Decreto-Lei n.º 30 910), o princípio da jurisdicionalidade foi tornado extensivo às comissões paritárias previstas nos contratos e acordos colectivos de trabalho, muito embora para ser aproveitado unicamente na solução dos conflitos decorrentes da aplicação destas convenções. Ensaiava-se a experiência do que pode chamar-se o foro corporativo, estabelecendo-se em termos da maior simplicidade o processo a observar e reservando-se às partes o direito de recurso para os tribunais do trabalho.
Não ficaram, porém, aquelas comissões a dispor de pessoal que lhes assegurasse regular, funcionamento. As providências administrativas de que se lançou mão para sanar este mal não puderam dominá-lo inteiramente. Por este motivo, ou por outros, considerou-se necessário reintegrar nos tribunais a plena jurisdição (Decreto-Lei n.º 33 345, de 20 de Dezembro de 1943, artigo 5.º).
Apesar disso, não se pode negar que a nenhum órgão se amoldam melhor do que a estas comissões - de raiz, estrutura e sentido corporativos - quer o exercício de funções de natureza consultiva e técnica,, quer, sobretudo, o poder de intervenção conciliatória nos dissídios verificados nas relações do trabalho.
Foi assim que, pouco mais de três anos decorridos sobre a data do diploma que as privou de competência jurisdicional, um novo decreto-lei (Decreto-Lei n.º 36 173, de 6 de Março de 1947) atribuiu expressamente às comissões corporativas funções conciliatórias e de informação, execução e estudo técnico, consagrando, sem reservas, a sua competência na matéria como o meio mais adequado à espontânea realização da justiça.
É que, por mais clara que resulte a redacção dos contratos e acordos colectivos, não será possível prevenir sempre as situações marginais que se produzem no mundo do trabalho, à medida que se vai desenvolvendo e rodeando de crescente complexidade e delicadeza a própria vida económica e social. A aprendizagem, a classificação profissional, a organização dos quadros das empresas, a graduação e atribuição de pontuações e percentagens, por exemplo, criam dificuldades, as quais, sem a acção das comissões corporativos, poderiam transformar-se em litígios, que cairiam na alçada dos tribunais, criando perturbações ao bom entendimento entre os empresários e os trabalhadores, com perniciosos reflexos para a produção e até para a paz social.
Não é, pois, indiferente confinar, dentro do possível, na zona de influência de comissões paritárias, constituídas ao abrigo das convenções colectivas, as pequenas e bem numerosas questões que, dia a dia, nascem da sua própria interpretação ou aplicação. Pelo contrário, é mister conferir-lhes, cada vez mais, papel de relevo, dando-lhes carácter e sentido autenticamente corporativos, de tal sorte que os fins da política social se alcancem, sempre que possível, não por actos decisórios coercivos, mas pelo natural e voluntário ajustamento dos interesses em presença aos ditames da justiça e da solidariedade entre os homens.
Confia-se, assim, em que a futura reforma destas comissões, permitindo articular utilmente a sua acção no sistema da justiça do trabalho, alivie, de facto e por forma palpável, os tribunais das suas já tão pesadas e extensas tarefas.
11. Estas as finalidades mais salientes que se têm em vista atingir com a presente proposta de lei.
Uma vez eliminadas as causas que, em maior ou menor grau, têm impedido o regular funcionamento dos tribunais do trabalho, é de esperar que estes possam ocupar a posição condigna que de direito lhes cabe na vida judiciária portuguesa.
De resto, numa época como a nossa, de tão acentuada evolução social, eles são chamados, cada vez mais, a interpretar e a aplicar, com equilíbrio e com ponderação, um direito flexível, verdadeiro jus novum de marcada inspiração e sentido sociais - o que exige uma organização especial adaptada às realidades do mundo do trabalho e servida por um escol devidamente preparado, para que em tudo sejam activos e fecundos instrumentos de conciliação, de paz e de justiça.
Ao procurar-se dotar os tribunais do trabalho dos meios necessários ao desempenho da sua difícil e nobre tarefa é, principalmente, a tão alta finalidade social que se pretende, antes do mais, dar ampla satisfação.
Ê neste espírito que o Governo tem a honra de submeter a apreciação da Assembleia Nacional a seguinte proposta de lei:
BASE I
O julgamento das questões que se suscitem no domínio da legislação do trabalho, da previdência social e da disciplina e organização corporativas, nos termos