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17 DE ABRIL DE 1961 1327

Tem inconvenientes essa forma de exploração?

Sem dúvida.

O arrendamento, escreveu-se entre nós, «facilita, provoca até, o absentismo dos proprietários, com todos os conhecidos inconvenientes deste fenómeno social» 1.

Importa não pôr, porém, o problema em termos demasiadamente pessimistas.

O locador não é necessariamente um absentista. Na sua pureza, o absentismo supõe o absoluto desinteresse pela terra, o que é raro verificar-se 2.

Por outro lado, como disse recentemente esta Câmara, «o proprietário absentista, instalado no País ou no estrangeiro, acalenta frequentemente o sonho de poder passar os últimos dias da vida no seu torrão natal. A sua pequena propriedade representa, assim, um vínculo que ele não veria sem desgosto ou mesmo revolta ser destruído.

Esse proprietário (modesto operário, pequeno comerciante ou funcionário que se viu forçado a abandonar a sua terra.) não é, muitas vezes, um desinteressado da pequena propriedade que teimou em conservar, por vezes com sacrifício, através da vida — como o revela a circunstância de ter renunciado a aliená-la, não obstante o magro rendimento que normalmente dela aufere. Ora a necessidade de rodear a legislação sobre a reorganização agrária de um adequado ambiente de compreensão e simpatia aconselha que se tomem em conta e respeitem os sentimentos legítimos daqueles que dela podem ser vítimas» 3.

De uma maneira geral é de reconhecer que as críticas que são dirigidas ao arrendamento ou dizem respeito ao absentismo, e não atingem o contrato senão em limitadas proporções, ou encobrem objectivos mais profundos: os vícios do capitalismo e os abusos da propriedade privada.

Afirmar-se, na verdade, que deve desaparecer a figura do senhorio só porque este recebe as rendas sem cultivar a terra é afirmar, no fundo, que devem desaparecer todas as formas de propriedade privada. O que colhe os dividendos de uma empresa que não administra, o que corta os cupões dos títulos de crédito, é, usando de uma expressão corrente, o mais contemplativo dos capitalistas, «que muchas veces ni sabe las finalidades de las acciones que tiene depositadas, ni mucho menos las características más essenciales de las empresas que ré-preseutan y se limita a cortar o cobrar el cupón, sin preocuparse de los obreros y empleados que trabajan y llevam la gestiou y administración de los respectivos negócios» .

Outras são, porém, ainda as razões invocadas contra o contrato de arrendamento rústico. Enumeremos algumas, as mais importantes:

a) Torna instável a «população rural, obrigada a mudar de local de trabalho e até de moradia pelos acasos da renovação ou da não renovação dos contratos»;

1 Prof. Henrique de Barros, ob. eit., p. 602: «Na prática todavia — diz-se mais adiante —, e para a grande maioria dos arrendamentos ... é inteiramente justo dizer que os proprietários de torras arrendadas são, ou acabam por tornar-se, absen-tistas integrais».

2 «Devemos dizer —escreve a Federação dos Grémios da Lavoura da Beira Alta em exposição enviada a esta Câmara — ser da nossa observação directa aqui e sem recurso a estatísticas talvez até não existentes que essa espécie de proprietário é muito menos generalizada do que frequentemente se afirma . . .».

3 Parecer n.° 82/VII, sobre emparcelamento da propriedade rústica, n.° 78.

4 V. Ascaya, Arrendamienlos Rústicos, p. 7, e Luís Martin-Ballestero y Costea, Del concepto legal de arrendamiento rústico al pago de Ia renta en espécie, em Temis, i, p. 82.

b) É factor de «relações de dependência que restringem a liberdade de iniciativa, e porventura até a liberdade pessoal, de muitos cidadãos prestimosos»;
c) Dificulta a realização e conservação de benfeitorias;
d) Dificulta a obtenção de capital conveniente à exploração;
e) Contribui para o aumento do custo da produção.

Nenhum destes inconvenientes, procedentes em maior ou menor escala, mas sempre em escala diminuta, pode considerar-se decisivo no sentido da condenação do contrato, e podem todos eles atenuar-se mediante uma regulamentação apropriada. E depois, sempre é certo que todos esses inconvenientes aparecem com m\uito maior acuidade em relação ao pessoal assalariado, do qual se não poderá facilmente prescindir em regime de conta própria.

Num dos mais recentes relatórios publicados pela Junta de Colonização Interna (1959), relativo à reforma agrária na Bélgica1, enquanto se nota que a forma de exploração por conta própria mostra tendência para diminuir naquele país, escreve-se:

Nos países de agricultura evoluída e com predomínio da empresa familiar parece hoje tomar corpo e generalizar-se cada vez mais o conceito de que o arrendamento, quando devidamente organizado, deve ser encarado como uma estrutura com apreciáveis vantagens económicas sobre a conta própria, por permitir maior elasticidade à exploração.

De facto, acrescenta-se:

a) Pode constituir obstáculo à excessiva. divisão das explorações, uma vez que, pelo falecimento do empresário, não há que partilhar a terra entre herdeiros . . .
b) Permite vencer mais facilmente o período crítico que coincide com a transmissão das funções de gerência para um herdeiro ...
De resto, com as suas vantagens e os seus inconvenientes, é de reconhecer que sem um cataclismo social que permitisse tirar as terras aos seus. actuais proprietários para us entregar, gratuitamente, em domínio pleno, aos rendeiros, a figura jurídica do arrendamento não poderá acabar. E diz-se gratuitamente, porque, tratando-se de transmissões onerosas, sempre as amortizações dariam à exploração uma fisionomia paralela, se não perfeitamente igual à dos actuais arrendamentos, condenados os locatários a desviar dos resultados da exploração, para pagamento do preço da aquisição, importantes verbas, normalmente até superiores às actuais rendas.

E, que se considere como sistema teoricamente ideal o de exploração da terra por empresas familiares em couta própria, sempre nos encontraríamos em face de uma situação que não podia manter-se sem uma reforma profunda de variadas instituições de direito privado, impedindo-se as partilhas mortas causa, proibindo-se as vendas ou quaisquer alienações que. conduzissem ao parcelamento ou à concentração da propriedade, etc. E não

1 Aspectos da Agricultura Belga — Principais Medidas de Intervenção no Campo da Estrutura Agrária, pelo Eng.° António José Cortês Lobão, p. 46. Cita-se em abono desta tese Denis R. Bergmann, «Lês unités economiquement viables en agriculture», in Revista Fatis, v, n.°s 5 e 6.