1330 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 130
Trata-se, portanto, de um estudo em que não podem deixar de intervir os juristas, porque estão em causa precisamente problemas políticos e morais, e não simplesmente económicos. Há que chegar, pois, ao ponto de equilíbrio e de justiça social, fixar a meta conveniente na evolução natural dos institutos que, como o da propriedade privada, marcam uma civilização que se não pretende abolir.
El sistema de reformas parciales - escreve Ortega Pardo - no puede ser recomendado sino para necesidades urgentes, que no puedan esperar a ser satisfechas el largo período que una reforma general requiere. Con este método, ai no mudar los principies generales y fundamentales de los Códigos, se destrave Ia sistemática dei Derecho privado in-troduciendo en él la mayor desarmonia. Siguen tenieiido actualidad las palabras que en el ano 33 escribió el gran civilista espanol Castan: «Cada reforma ocasional, a trueque de introducir un cierto progreso, presenta el peligro de desorganizar el Derecho y produeir nuevas antinomias. Solo una reforma orgânica y unitária puede sentar Ias bases de um Derecho Civil acomodado a Ias exigências de nuestra época 1.
Todas estas considerações conduzem a Câmara Corporativa à convicção de que o projecto de alteração do regime do contrato de arrendamento rústico, instituto puramente de direito privado, deveria ser estudado e preparado para ser integrado no futuro Código Civil no ambiente calmo das Faculdades de Direito, encarregadas da sua elaboração, e não numa secretaria de Estado.
Mas será esta razão bastante para que se negue o acordo à discussão do projecto?
Parece que não.
Dá-se a circunstância, em primeiro lugar, de estarem convocados para a sua apreciação vários membros da Comissão do Código; dá-se também a circunstância de já estar publicado um anteprojecto sobre o arrendamento rústico que pode ser aproveitado e confrontado com a actual proposta; dá-se ainda a circunstância de não ficar o Governo, com a publicação de uma lei especial, inibido de integrar e regular no futuro código o mesmo contrato, aproveitando algumas lições da experiência, e, por último, parece de toda a conveniência, em face de um projecto de técnica legislativa e de soluções tão discutíveis, que a Câmara Corporativa preste desde já a sua informação ao Governo.
6. Arrendamento de coisas produtivas e não produtivas. - Dentro da generalidade que a esta Câmara cabe em primeiro lugar apreciar, importa dizer ainda alguma coisa acerca do campo de aplicação do regime proposto.
Que ele se refere aos contratos de arrendamento de prédios rústicos, di-lo expressamente a base I e a epígrafe do título I. Na base XXIV exceptuam-se, porém:
a) Os arrendamentos de propriedade rústica que, pelos rendeiros, seja destinada a fins não agrícolas;
b) Os arrendamentos de jardins e pastagens, salvo, quanto a estas, se representarem a forma normal de exploração da propriedade;
c) Os contratos de caça e pesca;
d) Os arrendamentos em que o Estado intervenha como arrendatário;
e) Os que digam respeito à realização fortuita de culturas, continuando o senhorio a fruir as terras nos períodos em que não estão ocupadas por estas culturas, quando as parcelas arrendadas no mesmo prédio não abranjam mais de um quinto da respectiva superfície.
Mostra-se o intuito de subtrair ao regime do projecto todos os arrendamentos que não tenham rigorosamente a natureza agrária, os quais ficarão sujeitos a um regime geral - o do contrato de locação - ou a um outro regime especial, tal como acontece com os arrendamentos do Estado (senhorio ou inquilino), por força do artigo 12.º do Decreto n.º 5411, de 17 de Abril de 1919 1.
Corresponde, fundamentalmente, assim, o contrato visado, ao denominado no anteprojecto do futuro Código Civil, locação de coisas produtivas, que tem a sua regulamentação especial nos artigos 69.º a 85.º
Esta distinção entre locação de coisas produtivas e não produtivas é tradicional no direito germânico 2, foi discutida na Itália, durante a preparação do Código Civil de 1942 3, e foi a solução consagrada neste código 4 e nas legislações mais modernas 5.
Independentemente da análise das cinco alíneas da base XXIV, o que se fará no estudo da especialidade, parece desde já à Câmara Corporativa de apoiar a distinção, e a consequente especialização do contrato rural.
Embora mostrem certas disposições do Decreto n.º 5411 que estava no pensamento dó legislador, ao fixar, nos artigos 61.º e seguintes desse diploma, o regime especial dos arrendamentos de prédios rústicos, a ideia de que o contrato teria sempre como objecto prédios destinados à cultura 6, o certo é que no § 1.º do seu artigo 1.º se dá um conceito de prédio rústico puramente formal e jurídico - o maior valor da parte rústica, quando o contrato abranja também uma parte urbana. Fixou-se, portanto, o legislador na doutrina consagrada no Código Civil (artigo 374.º), de que
1 «La revisión del Código Civil Português, aportación para la reforma española», no Boletim da Faculdade de Direito, vol. XXIV. Veja-se. no mesmo sentido, Prof. Vaz Serra, «A Revisão Geral do Código Civil - Alguns Factos e Comentários», no mesmo Boletim, vol. XXII.
1 Cf. artigo 1604.º do Código Civil e artigos 8.º e 11.º do Decreto-Lei n.º 25 547, de 27 de Junho de 1935.
2 §§ 535.º e 581.º do Código Alemão e artigos 253.º e 275.º do Código Suíço das Obrigações.
3 Vide Garrara, ob. cit., pp. 170. e segs.
4 Artigo 1615.º: «Quando la locazione ha per oggetto il godimento di una cosa produttiva, mobile o immobile, l'affittuario deve...».
5 Vide, por todos, o Código Civil Grego de 1941, artigos 619.º e seguintes, e o artigo 1.º, n.º 2, do regulamento espanhol para a aplicação da legislação sobre arrendamentos, rústicos, aprovado pelo Decreto de 29 de Abril de 1959, que preceitua: «A los efectos de la legislación especial de arrendamientos rústicos, tendrán Ia consideración de arrendamientos todos los actos y contratos, cualquiera que sea su denominación, por los que voluntária y temporalmente una parte ceda a otra el disfrute de una finca rústica o de alguno de sus aprovechamientos, mediante precio, canon o renta, ya sea en metálico, ya en espécie o en ambos casos a la vez, y con el fin de dedicaria a la explotación agrícola o ganadera». Adiante se citarão as leis de outros países (França, Holanda, Bélgica, etc.) que seguiram a mesma orientação.
6 Vide o artigo 62.º («o arrendatário de prédios rústicos é obrigado a cultivá-los ...»), o § único deste mesmo artigo («esta disposição é aplicável ao arrendamento de prédios urbanos quando tenham parte rústica que à data do arrendamento esteja cultivada ou que o arrendatário se tenha obrigado a cultivar»), o artigo 63.º («... nunca se presumirá que fosse feito por menos tempo que o necessário para uma sementeira e colheita, conforme a cultura a que tenha sido aplicado»), o artigo 64.º («o arrendatário não pode exigir diminuição de renda com o fundamento de esterilidade extraordinária, ou de perda considerável dos frutos pendentes ...») e o artigo 65.º («... a haver do senhorio o valor das benfeitorias agrícolas ...»).