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1524 ACTAS DA CÂMARA CORPORATIVA N.º 117

Câmara Corporativa relativo à Lei n.º 1969, de 20 de Maio de 1938 (ensino primário). Neste parecer, a Câmara mostra-se concordante com a orientação do Governo, atendendo a que «a coeducação se adopta de preferência nos países nórdicos, corresponde a tipos étnicos determinados, a concepções diferentes do moral sexual e a tendências ginecocráticas por demais conhecidas» 24.
Mas este parecer da Câmara só pode ser interpretado, trinta e quatro anos depois, se se recuar até à óptica educacional portuguesa que decorre de 1926 a 1947, e abrange, portanto, a data da encíclica Dirini [...] Magistris e a dos diplomas que estabelecem a obrigatoriedade rigorosa da separação dos sexos no ensino primário.

Note-se, entretanto, o êxito da experiência realizada ao Liceu de Pedro Nunes, entre os anos de 1931-1932 e 1948-1949, em que era formada uma turma mista em cada ano do curso e a educação orientada por uma filosofia coeducacional que se infiltrava nas aulas, nos recreios e em todas as actividades escolares. O processo educativo deu oportunidade a esses jovens de tomarem consciência dos problemas de relação que necessàriamente se levantam quando rapazes e raparigas trabalham e se distraem em conjunto, ensinando-os a respeitarem-se e a estimarem-se.

A evolução social da população portuguesa num sentido francamente é facto indiscutível e nos últimos anos o público tomou mesmo posição de mercado interesse por assuntos de educação. O Secretariado da Reforma Educativa recebeu 101 documentos preconizando a instituição, ou a reinstituição, do sistema educacional 25, dos quais 11 de grupos de professores do ensino primário, 20 de escolas preparatórias, 15 de liceus ou professores do ensino liceal, 6 de associações de educadores, 1 do colóquio promovido pela Ludus, A Liga Operária Católica, o Colégio Marista de Carcavelos, o Externato de S. João de Brito manifestaram-se também a favor da coeducação. Um grupo de pais, de Lisboa, alega «um melhor equilíbrio das crianças e dos adolescentes e uma melhor integração social»: a «Comissão para o estudo de educação e sexualidade» diz:

A coeducação é uma das condições prévias essenciais para uma educação sexual válida.

A par das vantagens indiscutíveis que este parecer põe em relevo, há a considerar alguns incovenientes 26. Assim, juntar crianças e pré-adolescentes dos dois sexos pode criar situações difíceis que exigem uma acção educativa mais atenta dos corpos docente e directivo. A evolução afectiva e sexual do escolar passa por fases muito difíceis, que requerem daquele pessoal conhecimentos psico-pedagógicos mais profundos e um carácter muito equilibrado.
Pela importância que de facto assumem nesta problemática da coeducação, transcrevem-se algumas conclusões do trabalho citado na nota 26: «A titulo experimental, que ela seja permitida já a curto prazo nos estabelecimentos oficiais e particulares»... «desde que esses estabelecimentos tenham comprovado ou comprovem que o seu corpo directivo e docente, assim como todo o demais pessoal, possuem idoneidade na sua formação humana...» e , mais adiante «que nesses estabelecimentos o corpo directivo e docente possua comprovada formação psico-pedagógica. Essa formação será obrigatória para os directores e maioria dos professores».

9. É indiscutível que o ambiente onde se processa a coeducação tem que propiciar, com os devidos cuidados clínicos e psico-pedagógicos, a aproximação e a compreensão entre jovens de sexos diferentes, levando-os a situarem-se mais objectivamente nas relações que têm de estabelecer uns com os outros e a desembaraçarem-se mitos que, mais tarde, criariam barreiras difíceis de transpor.
Insiste-se que «escola mista», ou mesmo «turmas mistas», não implica coeducação. Este sistema procede de uma doutrina em que se postula o valor específico, mas complementar, de cada sexo; a sua igualdade de méritos tem implicações muito importantes na ordem social, porque conduz a reconhecer os mesmos direitos a homens e mulheres.

Mais ainda que uma filosofia de educação, é um acto de fé que, baseado na colaboração dos dois sexos, se projecta num estilo de vida feito de confiança mútua, de aceitação recíproca e de respeito.
Mas a coeducação não se improvisa. Requer ambiente social próprio e professores que, além de uma superior formação psico-pedagógica, tenham a generosidade necessária para se debruçarem, com interesse e lucidez, sobre os complexos problemas dos jovens.
Embora a coeducação seja um processo lento, mas inevitável, de adaptação da escola à sociedade, pelo que não cessa de progredir, não pode resolver os problemas de todas as crianças, tais como os que têm origem na própria natureza humana ou em falhas graves de educação familiar.
Nos meios portugueses que apresentam um relativo grau de evolução, mulheres e homens participam nas mesmas actividades, concorrem aos mesmos empregos, preparam os mesmos exames, entram em competição em todos os domínios, são eleitores e elegíveis, ocupam postos de comando. Está, pois, criado um novo tipo de relações humanas que, como consequência do ritmo acelerado de industrialização e do desenvolvimento de actividades terciárias, sucessivamente se alargará a uma população cada vez maior. Preparar adultos de todos os meios sociais que sejam elementos válidos desta sociedade, homens e mulheres que se compreendam e respeitem e dêem consequentemente aos casais uma maior estabilidade, é a função da escolha. Aceites os postulados, expostos sob múltiplas facetas, conclui-se forçosamente que o sistema escolar tende para ser coeducacional.

II

Exame na especialidade

1. Do estudo a que se procedeu na apreciação na generalidade do projecto de decreto-lei n.º 12/X, há que concluir:

1.º O regime escolar da coeducação, já experimentado num número muito avultado de Estados de características económicas, sociais e políticas totalmente diferentes, tem-se revelado o mais adequado ao condicionalismo da época presente;
2.º A Câmara não conhece directamente e em pormenor o resultado das experiências coeducacionais realizadas em escolas portuguesas, mas o

24 Diário das Sessões, n.º 165, de 5 de Março de 1938.
25 Cf. documento do Secretariado da Reforma Educativa (S. R. E.), 8-1 (M. E. N.)
26 Cf. Silveira Botelho, Coeducação. G. E. P. A. E. (M. E. N.)