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174-(2) DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 122

II

O caso previsto no projecto

1.º) Inconstitucionalidade do § 2.º do artigo 5.º do decreto n.º 28:003, de 3 de Agosto de 1937

2. E que se passa no caso que constitue objecto deste parecer?
Nos termos do artigo único do decreto-lei n.º 23:514, de 22 de Janeiro de 1934, os sócios correspondentes, nacionais, da Academia Nacional de Belas Artes são escolhidos entre os artistas, eruditos e críticos de arte residentes em Portugal.
Ora, segundo o § 2.º do artigo 5.º do decreto regulamentar n.º 28:003, de 31 de Agosto de 1937, a escolha deve recair necessariamente em artistas, eruditos e críticos de arte não residentes em Lisboa.
Quere dizer, emquanto, pelo regime do decreto-lei, os artistas, eruditos e críticos de arte nacionais residentes em Lisboa podiam ser escolhidos para sócios correspondentes da Academia Nacional de Belas Artes, pelo regime do decreto regulamentar a escolha deve recair sempre em nacionais não residentes em Lisboa.
Há, assim, manifesta discrepância entre o regime do decreto-lei e o do decreto regulamentar.
Mas os decretos regulamentares, salvo o disposto no artigo 14-1.º, a que mais adiante nos referiremos, não podem revogar leis ou decretos-leis, visto serem elaborados «para a liou execução das leis» (artigo 109.º, n.º 3.º, da Constituição).
Portanto, o preceito regulamentar - preceito contra legem - deve dizer-se inconstitucional: segundo a Constituição, e salvo, repetimos, o disposto no artigo 141.º, as leis e decretos-leis só por outras leis ou decretos-leis podem ser revogados.
E nem se diga que estamos diante de simples ilegalidade e não de uma verdadeira inconstitucionalidade, pois os regulamentos ilegais, ou, talvez melhor, os regulamentos contra legem, só não são válidos porque a Constituição os não permite. O Governo, para revogar leis ou decretos-leis, tem de fazê-lo mediante decretos expedidos no uso de autorizações legislativas: decretos-leis autorizados, ou em casos de necessidade pública urgente: decretos-leis de urgência (artigo 109.º, n.º 2.º, da Constituição).
Mas o Govêrno, invocando para a elaboração do decreto n.º 28:003, de 31 de Agosto de 1937, não o n.º 2.º do artigo 109:º da Constituição, mas o n.º 3.º, revelou expressamente que era ele expedido no uso do seu poder regulamentar poder normal- e não no uso do seu poder legislativo-poder extraordinário.
E assim, ou porque se entenda haver incompetência do 'Governo (inconstitucionalidade orgânica) ou porque se julgue que este se serviu de meio constitucionalmente impróprio, de meio ilegítimo J(inconstitucionalidade formal), à Assemblea Nacional, e só a ela, compete conhecer dessa inconstitucionalidade.

3. Se porém houvesse dúvidas quanto ao alcance do preceituado no § único do artigo 123.º da Constituição, pelo que toca à inconstitucionalidade dos decretos regulamentares ilegais, todas elas deveriam desaparecer, cremos, diante da história daquele.
No texto primitivo o artigo 122.º, correspondente ao actual artigo 123.º, tinha a seguinte redacção:

Artigo 122.º Nos feitos submetidos a julgamento não podem os tribunais aplicar leis, decretos ou quaisquer outros diplomas que infrinjam o disposto nesta Constituição ou ofendam os princípios nela consignados.

1.º A constitucionalidade da regra de direito, no que respeita à competência da entidade de que dimana ou à forma de elaboração, só poderá ser apreciada pela Assemblea Nacional e por sua iniciativa ou do Governo, determinando a mesma Assemblea os efeitos da inconstitucionalidade, sem ofensa porém das situações criadas pelos casos julgados.
§ 2.º A excepção constante do parágrafo anterior abrange apenas os diplomas emanados dos órgãos da soberania.
Esta redacção foi substituída pela actual.
E porquê?
No parecer da Câmara Corporativa acerca da proposta de lei n.º 185, que veio a transformar-se na lei n.º 1:963, de 18 de Dezembro de 1937, de onde consta a actual redacção do artigo 123.º, lê-se:

Destinam-se estas alterações - informou o Governo - a pôr termo às divergências de interpretação que o actual § 1.º do artigo 123.º provocou e que se traduziram praticamente na diversidade das respostas dados à seguinte pregunta: podem ou não os tribunais negar aplicação às negras jurídicas que, devendo constai- de leis ou decretos-leis, constam de decretos regulamentares?
O Tribunal de Contos, no caso a que se refere o decreto n.º 25:104, de 7 de Março de 1935, pronunciou-se pela afirmativa, o contrário decidindo o Governo, que, em nome da incompetência própria, e dos tribunais paxá conhecerem da inconstitucionalidade formal dos decretos regulamentares, manteve o acto a que aquele Tribunal negara o visto.
A tese do Governo era essencialmente a seguinte: com o § 1.º do artigo 123.º pretendeu-se atribuir à Assemblea Nacional o conhecimento de todos as inconstitucionalidades não substanciais, não materiais, não doutrinais, isto é, de todas as inconstitucionalidades que, não tocando na regra de direito em si mesma, não revestindo a natureza de vícios de fundo, devam ser integradas na inconstitucionalidade orgânica (usurpação, ou, se quisermos, incompetência) ou na inconstitucionalidade formal (moio de forma), empregada a expressão no seu mais extensivo significado. O Prof. Dr. Marcelo Caetano (Manual de Direito Administrativo, pp. 461-462), secundando a jurisprudência do Tribunal de Contos, considerou sofísticos os fundamentos em que o Governo se firmara, por isso que, em seu entender, quando no § 1.º do artigo 123.º se fala em forma de elaboração da regra de direito, visa-se somente as t formalidades do processo por que se origina a mesmas e não a «forma do acto».
Não pretende a Câmara Corporativa tomar posição nestas divergências, atenta a desnecessidade de o fazer. O simples facto de existirem bosta, na verdade, para mostrar a conveniência de lhes pôr termo, evitando que, de futuro, os nossos tribunais entrem em hesitações sobre a sua competência fiscalizadora em matéria de inconstitucionalidade das regras de direito.
Fala-se, poisem, de inconstitucionalidade orgânica e de inconstitucionalidade formal.
Que deverá entender-se por estas expressões?
Não há que hesitar na resposta: a inconstitucionalidade orgânica abrange a inconstitucionalidade derivada da incompetência constitucional do órgão
de que a regra dimana, e a inconstitucionalidade