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4 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 41

prios, resignado ante a incompreensão ou as reticências e indiferente ante a ligeireza com que em geral se aprecia entre nós o homem público, tinha no entanto absoluta confiança no sentimento de gratidão do povo diante de um Estado que deixou de ser uma abstracção ou um estôrvo, para tomar decididamente a peito servir o real, o tangível interêsse de todos.
Apesar disso tive de sacrificá-lo uma vez na constituïção do Govêrno. Ai dos povos que não suportam a superioridade dos seus grandes homens! Infelizes ainda mais aqueles cuja política não está ordenada de modo que os homens de raro valor possam servir a nação! Responsável pela nossa, não estava por mim disposto a sacrificá-lo mais. Deus o levou. Curvo-me ante a sua vontade.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Sebastião Ramires.

O Sr. Sebastião Ramires:- Sr. Presidente: depois das palavras que acaba de proferir o Sr. Presidente do Conselho, melhor seria guardarmos um silencioso recolhimento do que pronunciar desataviadas considerações que apenas poderão enfraquecer o seu significado ou apoucar a justíssima homenagem que, por meio delas e de maneira excepcional, acaba de se prestar a um dos maiores obreiros da Revolução Nacional.
Circunstâncias especiais forçam-me a pronunciar algumas breves palavras.
Eram muito velhas as nossas relações. Conhecia desde criança Duarte Pacheco; vivemos ambos no Algarve, fomos companheiros no Instituto Superior Técnico e, quando do primeiro Govêrno da presidência de Salazar, camaradas na árdua função de Servir. Discordámos por vezes; aqui e além, cada um de nós percorreu os seus trilhos, que nem sempre foram iguais, mas nunca deixámos de ser amigos.
Embora seja muito extensa a obra admirável de realizações levada a cabo pelo falecido Ministro das Obras Públicas, não é fácil dar uma nota inédita sôbre a sua vida ou sôbre a sua obra, porque uma e outra estão bem patentes aos olhos de todos os portugueses.
Filho do seu trabalho, o engenheiro Duarte Pacheco abriu rápida carreira na vida pública e política, para em poucos anos ser elevado aos mais altos cargos da Administração.
Dotado de uma inteligência invulgar, com faculdades de trabalho excepcionais, nunca conhecendo a fadiga nem temendo o cansaço, a acção por êle desenvolvida no Ministério das Obras Públicas e Comunicações abrangeu o País de lés a lés.
Com a rara flexibilidade do seu espírito e a imperturbável serenidade do seu temperamento, dominava com excepcional aptidão e competência todos os complexos e variados problemas ou questões que corriam pelo Ministério.
Quando à sua volta bramiam as cóleras mal reprimidas e as paixões indómitas estavam a ponto de romper em aberta e violenta explosão, o seu conselho e a frieza das suas reflexões conseguiam desarmar os mais exaltados e trazer a soluções conciliatórias as opiniões mais extremas e mais opostas. Não sacrificava a popularidade do momento ao que considerava como sendo o seu dever. Como servidor do Estado, entendeu que o melhor era servi-lo exclusivamente.
E quando alcançara a plenitude das suas possibilidades físicas e intelectuais, quando aliava às suas faculdades naturais o conhecimento mais aprofundado das realidades, uma maior experiência dos homens, maior segurança no estudo dos problemas e do meio onde desenvolvia a sua acção, a morte veio inutilizá-lo, quando podia prestar ainda maiores serviços do que aqueles com que ennobreceu o País.
Foi um facho que infelizmente se extinguiu.
Morreu no seu pôsto, como soldado ferido em pleno campo de batalha. Morreu como aquele operário do Evangelho, a quem deram um talento e que não só restituiu o que lhe deram, mas centuplicado em obras e realizações.
Ouvem-se ainda lá fora os dobres de finados, não soará ainda a hora da justiça, mas já se sente o vácuo imenso da perda de um Homem.
É profunda a minha dor e grande a minha saudade, porque, se é sempre dolorosa a perda de um homem de talento e de valia, esteja êle onde estiver, maior é quando se trata de um companheiro, de um camarada, de um amigo.
Sempre os homens de Estado em Portugal têm sido principalmente notados pela sua honradez e isenção e, diga-se, pela sua pobreza, no fim de uma vida toda consagrada a servir o mesmo Estado. Com Duarte Pacheco esta regra teve uma extraordinária e retumbante, confirmação.
Este rapaz, a quem prococemente embranqueceram os cabelos, perdera também a sua mocidade e sacrificara ao País o legítimo direito de viver uma vida tranqüila e feliz.
Não quero terminar sem recordar, saudosamente, um dos grandes colaboradores do Ministro das Obras Públicas, que a morte quis manter unidos no mesmo terrível abraço - o engenheiro silvicultor Jorge Gomes de Amorim -, a quem o País, e principalmente Lisboa, fica devendo a reforma dos seus parques e jardins, onde as crianças brincam descuidadamente, embaladas pelo sôpro de um requintado bom gôsto e de um amor paternal.
Ambos morreram em serviço público, e entre as homenagens que pela Nação lhes são devidas será indiscutivelmente bem cabida a que, por qualquer forma, atenue, no aspecto material, a falta irreparável que para os seus representa o desaparecimento prematuro e inesperado de quem lhes era guia e amparo.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Melo Machado.

O Sr. Melo Machado:-Sr. Presidente o Srs. Deputados: o falecimento do Sr. engenheiro Duarte Pacheco, pela forma brusca e emocionante como sucedeu, trouxe repentinamente o País ao conhecimento do extraordinário valor que tinha perdido.
Só assim se explica a grandiosa manifestação que foi o seu funeral.
De um momento para o outro o País teve a consciência de que havia perdido um dos maiores obreiros da grande Revolução Nacional.
Eu, Sr. Presidente, não teria nenhuma qualidade que me recomendasse para proferir algumas palavras nesta sessão a propósito de tam ilustre servidor do Estado, se não se desse a circunstância de ter aqui, nesta Assemblea, algumas vezes criticado diversos actos dêsse Ministro.
Devo, todavia, dizer a V. Ex.ª que então, como sempre, eu reconheci as extraordinárias qualidades de trabalho, de inteligência, de actividade e de acção que tinha o Sr. engenheiro Duarte Pacheco.
Não estou arrependido das ligeiras observações que fiz à sua obra, porque quando as fiz foi na intenção de colaborar, e nunca na de o ferir. Repetiria hoje exactamente as mesmas críticas se fôsse caso disso.