14 DE DEZEMBRO DE 1943 33
São claras e significativas as expressões usadas pelo Chefe do Govêrno, que, uma vez mais, cumpre exemplarmente o dever de prevenir a Nação das ameaças - umas já visíveis e próximas, outras apenas previsíveis e distantes - que resultam da grave situação agora atravessada pelo mando. Perante os males que descobre ou adivinha, aponta os remédios eficazes. Antes de nenhum, o aperfeiçoamento da organização do exército. Mais uma aplicação daquela velha regra de senso comum lucidamente actualizada, um dia, pelo marechal Lyautey quando exortava a França a mostrar a sua força «para não ser obrigada a servir-se dela». Semelhantemente, é no intuito de manter a dignidade e a segurança da nossa paz que devemos ter um exército bem preparado e bem equipado - afirmação da consciência da nossa força e do direito, que possuímos e não queremos posto em dúvida, à consideração e respeito dos outros povos.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Mas o Sr. Presidente do Conselho indica-nos, também, a conveniência de se intensificar a defesa civil do território. Não me surpreende que o faça. Trata-se, com efeito, de uma das mais importantes e urgentes tarefas a que nos cumpre meter ombros.
Atravessei em Julho, por duas vezes, a Europa, em quási toda a sua extensão. Pude observar o que se passa em alguns dos países envolvidos na guerra e noutros que se conservam à margem do conflito. Nos primeiros como nos segundos há a preocupação dominante de garantir o funcionamento tam perfeito quanto possível dos serviços de defesa civil do território. E não apenas naquilo que se refere à protecção das vidas e dos haveres, objectivo imediato - mas ainda, e sobretudo, naquilo que interessa às finalidades superiores da disciplina cívica e dai coesão moral. Tudo isto é, certamente, defesa civil do território. De pouco vale reduzir ao mínimo os prejuízos materiais se não se evitarem os efeitos dos violentos golpes do adversário quanto ao enfraquecimento do espirito combativo e da vontade de resistência das populações.
A defesa civil do território abrange, assim, dois sectores distintos, mas complementares: o da defesa meramente física de um património individual e colectivo e o da defesa espiritual desse mesmo património - não já tal como se concretiza nas gerações e nos bens presentes, mas tomado como herança recebida da História, herança a conservar e a transmitir.
Esta guerra - sabemo-lo todos - é diferente das outras na medida em que alarga o campo de batalha à totalidade do território de cada país. Nunca foi tam evidente o imperativo da solidariedade entre os povos - que se vêem atacados não apenas nas linhas de fogo mas onde quer que o inimigo procure atingir-lhes as fontes de riqueza, de trabalho ou, simplesmente, de vida.
Daqui resulta a necessidade absoluta de uma permanente mobilização de todo o conjunto social, para acudir às brechas abertas, restabelecer a normalidade alterada, reparar os danos sofridos, manter-se vigorosamente contra todos os assaltos. Mobilização permanente, de corpos e almas, já que se visa, a toda a hora, em toda a parte, em todos os domínios, o seu potencial de energia, as soas condições de existência e sobrevivência.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Assim é compreendida entre nós a defesa civil do território: como verdadeira mobilização de todos os não combatentes. Sejamos gratos aos pioneiros desta idea, que souberam defini-la, impô-la, traçar um plano de acção, dar os primeiros passos - os mais difíceis.
Para um povo que se encontra - graças à clarividente prudência dos seus governantes - numa «zona de paz» entre o mundo em luta, e por isso tem sido poupado, até agora, às directas e terríveis consequências da guerra total, a defesa civil do território reveste-se do duas características fundamentais:
Tem o sentido preventivo de instruir a população dos seus deveres e dos sons recursos para o caso - sempre possível, visto não depender só de nós - de, em qualquer momento, a guerra vir ter connosco.
Tom o valor ético de erguer ao primeiro plano aquilo que, no prefácio ao 3.º volume dos Discursos, Salazar intitula só sentimento da comunidade». Êsse «sentimento da comunidade» no perigo e na acção contra o perigo restitue-nos a consciência de sermos uma grande família, em que, se cada qual se defende a si e ao que é seu, defende, simultaneamente, o que é de todos.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Foi como grande família - fiel aos mesmos ideais, obediente aos mesmos chefes, presa aos mesmos destinos - que executámos, na História, uma das maiores obras de que legitimamente a humanidade se orgulha, no esforço para edificar a civilização do Ocidente. É ainda como grande família - unida, solidária, sem dissidências e sem fracturas - que poderemos e saberemos vencer a nova tormenta e criar, por nossas mãos, o futuro que merecemos.
Este o alcance da campanha nacional da defesa civil do território, se formos capazes de integralmente a compreender e de integralmente a realizar.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Algumas palavras, para concluir, sobro a Legião Portuguesa.
Pelo decreto-lei n.º 31:956, de 2 de Abril de 1942, foi-lhe confiada, sob a direcção superior do exército, a organização da defesa civil do território. Testemunho eloquente, por parte dos Poderes Públicos, da importância da continuidade da sua missão na sociedade portuguesa.
Formou-se a Legião - ninguém o ignora, mas vem a propósito lembrar - por um imperativo de consciência de muitos dos melhores portugueses, em 1936, quando, na Espanha devastada pelo vandalismo marxista, o general Franco e os seus companheiros iniciavam a cruzada libertadora. De uni instante para outro, as hordas vermelhas podiam atravessar a fronteira: chegou a haver, no Alentejo, incursões alarmantes. Sentiu-se que soara a hora de todos se aprontarem para eventual defesa da integridade nacional. E assistiu-se ao belo espectáculo de milhares de pessoas, de todas as idades e classes, envergarem um uniforme, sujeitarem-se - sob a égide fraternal e competente de oficiais do exército - à difícil e rápida aprendizagem da instrução militar e, em pouco tempo, constituírem, de norte a sul, forte milícia, disposta a ser incondicional auxiliar da força armada em tudo quanto fosse exigido para a salvaguarda da Pátria Portuguesa.
Afastados, de momento, os perigos, vitoriosa em Espanha a cruzada de Franco, não tardou a estalar o conflito europeu, mais tarde alargado a conflito mundial. Com inteira razão se considerou indispensável manter os legionários firmes e prontos, já que no duro e incerto «clima de guerra» as ameaças se ampliam, se multiplicam e cada nação tem de apelar para a dedicação vigilante de todos os seus filhos.
Vozes: - Muito bem, muito bem!