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576 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 35

evangelizadora fora uma obra de saque e de pilhagem; que a Inquisição era um tenebroso tribunal da Igreja; que D. João III era um fanático imbecil; D. Sebastião um paranóico; D. João IV um beato e um covarde; D. Miguel um usurpador, de baraço e cutelo, e D. Carlos - sobretudo D. Carlos- um monstro de defeitos e de vícios.
E a nossa dissolução momo povo independente viria se não fora, quase no último extremo, a arrancada do 28 de Maio e, sobretudo e principalmente, se, após a revolta militar, não tem aparecido o Homem que idealizou, estruturou e consolidou a Revolução, no mais nobre significado que esta palavra pode encerrar.
E só a obra de Salazar atinge, mo campo material, quase o fastígio dos granules milagres, onde, para mim, ela mais se avantaja - e não está feito tudo!- é na exaltação, por ora inacabadamente realizada, doe princípios imutáveis e eternos que presidiram à nossa formação, nortearam o nosso crescimento e fizeram a nossa glória.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Onde essa obra mais se ilumina é mo regresso ao culto da nossa tradição e do nosso passado, para que as ancestrais virtudes da grei voltem a florir na alma e no coração dos portugueses.
Onde essa obra reveste aspecto de maior transcendência é no indefesso e teimoso esforço para a reconquista da nossa unidade espiritual; é na criação do clima propício à revisão da nossa história - da história que durante tanto tempo não passou duma conspiração contra a verdade; é na reparação e na justiça feitas aos nossos caluniados reis, que fizeram, restauraram e continuaram Portugal.
E porque a hora é de reparação e de justiça, venho pedi-las para o mais vilipendiado dos monarcas e que foi um dos maiores reis da nossa história - o Sr. D. Carlos I.
Não houve calúnia que contra ele não tivesse sido bolçada; não houve doesto e insulto que lhe não fosse dirigido; não houve infâmia que lhe não fosse assacada; não houve defeito ou vício que lhe não fosse imputado, até que, com o seu filho e seu sucessor, caiu varado pelas balas disparadas, numa emboscada, por dois bandidos, executores de uma sentença friamente lavrada, no negro e tenebroso antro da Maçonaria.
E ainda depois da morte lhe foi feita a suprema injúria de se homenagear publicamente a memória dos seus assassinos, com a construção de um mausoléu, onde foram torpemente apelidados de libertadores da Pátria portuguesa, vergonha que só o Estado Novo, num gesto de imperativa sanidade moral, fez acabar.
E, no entanto, nunca houve ninguém como o rei D. Carlos I que tivesse de esperar tão pouco tempo no túmulo para que se fizesse inteira luz sobre a sua gigantesca figura e o seu vulto enorme se projectasse em toda a sua grandeza na história da sua e da nossa pátria e nela fosse ocupar o alto e honrado lugar que lhe pertence.
Iniciado o seu reinado sob o signo do brutal ultimato inglês, o rei, através de mil dificuldades e amarguras, conseguiu liquidar a magna questão com a possível felicidade e salvar para o nosso país tudo o que humanamente podia ser salvo.
Percorreu, em pleno triunfo, as principais capitais europeias e devido ao seu prestígio pessoal vieram a Lisboa, em viagens de amizade e de homenagem, os primeiros soberanos e chefes de Estado da Europa.
Pela sua acção directa e pela acção dos diplomatas que ele fez, criou para o nosso país, no concerto internacional, uma destacada posição, raras vezes atingida no decurso da nossa história.
Do Exército, que desde a Guerra Peninsular e das «saldanhadas» perdera a tradição de se bater e se transformara num corpo militar de parada e «espada-arrasto», fez o rei uma escola de heróis, escolhendo, animando e dirigindo essa plêiade de bravos que praticou a gesta soberba da pacificação e ocupação das nossas possessões ultramarinas.
E, como condigna cúpula da epopeia africana, mandou o rei às nossas províncias do continente negro o seu filho D. Luís Filipe, numa triunfal viagem de soberania e para que no juvenil espírito do príncipe ficasse bem vincada a ideia de que Portugal se não confina nesta pequena nesga europeia, mas é constituído pelos portentosos territórios que temos espalhados pelo Mundo.
Da nobreza, que, desprovida da sua moral e dos seus compromissos de classe, havia perdido a sua missão histórica, tentou o rei fazer uma escola de valores que servissem a sua casa e a sua pátria.
Apoiados.
Vendo que o País se afundava por virtude de uma política partidária sem horizontes e sem grandeza, o rei, na plena consciência do que devia a Deus, à sua pátria e a si mesmo, reagiu resolutamente contra os vícios de um parlamentarismo suicida e, retomando as prerrogativas da realeza, de que pelo liberalismo havia sido despojado, chama ao Poder o grande estadista João Franco, que, rodeado dos melhores e maiores homens da sua época, inicia uma valorosa obra de resgate, que só o monstruoso crime do regicídio fez malograr.
No belo e justo dizer de Ramalho, D. Carlos amou muito a sua pátria como rei e amou-a talvez mais enternecidamente ainda como paisagista e como lavrador. Foi um intelectual, um artista, exaltado mesmo pelos mais truculentos e azedos críticos do seu tempo; foi um gentleman farmer; foi um alto espírito e um grande chefe de estado.
A sua lhaneza, a sua afabilidade, a sua valentia, o seu inteiro desprezo pelo perigo, a simplicidade do seu viver, que tão vivo, e impressionantemente ressalta da quase pobreza dos seus aposentos no palácio ducal de Vila Viçosa, fazem dele bem o símbolo e o guia de uma raça, da nossa raça.
D. Carlos I viveu e morreu pela Pátria.
E se a História lançou já o seu veredicto definitivo sobre o rei D. Carlos, nós, que somos os herdeiros da sua obra e do seu espírito, ainda não soubemos pagar, em devoção cívica, o que devemos à memória do egrégio e sacrificado monarca.
Por isso apelo para V. Ex.ª, Sr. Presidente, apelo para o Governo da Nação, para a Câmara Municipal de Lisboa e para todos os portugueses para que se perpetue no bronze o nome e a varonil figura do que foi um dos maiores reis da história de Portugal.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Eu tenho a honra do sugerir, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que numa das principias praças de Lisboa se exija unia estátua a D. Carlos I, para que, contemplando-a, nós e os que depois de nós vierem, evoquemos e aprendamos a magistral lição da vida e da morte do que foi um grande português e um grande rei.
E porque se trata de uma dívida nacional, parece-mo naturalíssimo e oportuno que nesta Assembleia, que pé chama e é nacional, alguém levante a sua voz a pedir que essa dívida seja paga.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.