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346 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º68

Mais adiante e nas mesmas instruções, para os não profissionais, já se admite surdez total de um ouvido com o outro normal, condicionada á localizarão do volante.
Para quê a localizarão do volante, se a redução da audição nestes casos é apenas da ordem de 1/8 da audição normal?
Apreciemos agora outro aspecto da questão.
Admite-se a correcção visual; porque negar a correcção da faculdade auditiva? Porque a primeira correcção é mais eficiente? Concedo (para os serviços de saúde chamados a pronunciar-se a segunda não é admissível), mas vejamos qual a mais importante.
Exemplifiquemos, e. para isso, volto a apresentar o meu caso.
Tomo o carro e inicio uma viagem.
A certa altura um insecto que entra 110 carro, ou outra qualquer circunstância, obriga-me a um gesto intempestivo e quebro os óculos. Que devo fazer? Continuar a viagem, sujeito a todos os riscos para mim e para os outros, provocados pela minha visão insuficiente:' Não; a prudência manda, que encoste o carro e aguarde socorro. Em consciência não tenho outra, alternativa.
Mas agora não são os óculos que se inutilizaram, foi o meu aparelho do audição que entrou em panne. O que me sucede: Continuo a viagem com :a mesma segurança, com mais segurança até, porque tal circunstância me obriga a prestar redobrada atenção àquilo que vou a fazer.
E desde que a minha visão se mantenha corrigida eu estou em condições de seguir o meu caminho sem perturbar ninguém e sem correr qualquer risco.
Findo o percurso por estrada, entro, por exemplo, em Lisboa. Aqui o trânsito é intenso e a minha atenção tem de ser maior ainda, mas falia-me o ouvido. Que se me depara entoo no meio desta babilónia:' A proibição de utilizar sinais acústicos.
E agora pergunto eu a VV. Ex.ª: em que me auxilia a audição, a mim ou a qualquer pessoa normal:? Em nada, pura e simplesmente.
Creio, pois, ter demonstrado que a instrução a que me tenho referido é injusta e, mais do que isso, desumana.
Injusta porque nega uma realidade tangível â existência e eficiência dos aparelhos de prótese na correcção de certas insuficiências de audição.
Desumana porque, negando as possibilidades da correcção do ouvido, pude prejudicar muita gente a quem um simples aparelho de prótese permite fazer vida normal, inibindo-a, por esta disposição legal, de conduzir automóvel.
Não exagero ao afirmar que a deficiência de audição (não digo surdez total) torna mais seguros os condutores de veículos automóveis, porque prestam mais atenção à prática de conduzir, e até não devemos esquecer que casos há em que a acuidade auditiva melhora consideravelmente quando a pessoa se encontra no meio de ruídos tais como sejam os do motor de um carro em marcha.
Dispensamo-nos de falar no problema da valorização humana, que mereceu um capitulo especial da Lei de Meios há bem pouco apreciada e aprovada por esta Assembleia, permitindo que os seus mais brilhantes valores nos tivessem dado a feliz oportunidade de ouvir e apreciar os seus judiciosos comentários, as suas subias e oportunas considerações.
A surdez, mais do que uma deficiência física, é um mal que acarreta para aqueles que dela são vítimas um sentimento de inferioridade que muitas vezes leva ao desespero, por sentirem o abandono, o desprezo daqueles que os cerram, Comparamo-la com outra deficiência dos sentidos: a deficiência de visão.
Quanto sentimento de piedade nos inspira! Quanta protecção nos merece! Aliás justíssima.
A humanidade acorre em teu auxílio, montam-se institutos de protecção, de tratamento de recuperação; tudo u que lhes diz, respeito nos comove.
E o surdo? Foge-se dele como de um importuno que todos evitam. Nem institutos de protecção, de tratamento ou de recuperação nem movimentos de auxílio, nem manifestações de piedade singular ou colectiva.
Nada; apenas u desprezo, que sente como um proscrito.
Para bem deles, hoje já não é bem assim. Especialmente lá fora os mais eminentes cientistas preocupam-se com a sua sorte e a técnica tem posto os seus mais extraordinários recursos ao seu serviço para os aliviar do sofrimento moral e físico em que vivem.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Mesmo entre nós, uma plêiade de distintos especialistas de otorrinolaringologia da mais elevada estirpe está a consagrar o melhor da sua atenção ao problema da surdez.
De resto, este problema tem tanto maior actualidade quanto é certo que as condições em que somos forçados a viver hoje em dia imersos em ruídos constantes, poderão ser responsáveis pelo crescente aumento do número de surdos.
Graças porém, a ciência aFada a técnica, foi impossível reabilitar muitos, tornando-os aptos para a vida activa que lhes fugia, e, mais ainda, com o mérito de os arrancar ao desespero de se verem banidos, postos à margem da sociedade em que viviam.

Vozes: - Muito bem!

O Orador:-Para concluir, Sr. Presidente e meus senhores, devo afirmar que estes meus reparos de modo algum podem atingir nem de leve o prestígio de S. Ex.ª o Sr. Subsecretário de Estado da Assistência Social espírito lucidíssimo que todos nós conhecemos pelas suas inigualáveis virtudes de homem de coração, de carácter e inteligência, nem tão-pouco a S. Ex.ª o Sr. Ministro das Comunicações.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - E estou certo de, que os serviços responsáveis pelas instruções que mereceram os comentários que aqui apresentei, ao apreciá-los, não deixarão de reconhecer a razão que os ditou e. como homens dignos que são, ao serem chamados para as rever, não deixarão de concordar que um pouco de humanidade pode muito bem aliar-se à regulamentação de qualquer disposição legal, sem quebra do rigor ou da justiça que é indispensável manter.
E se, em vez de os banir, a Direcção-Geral de Saúde se tornar um foco de irradiação de um movimento em prol dos deficientes de audição, só merecerá louvores, porque praticará uma obra de justiça a todos os títulos meritória e que se baseia nos mais claros fundamentos de ordem científica.
Disse.

Vozes: - Muito bem, muito bem !
O orador foi muito compreendido.

O Sr. Bartolomeu Gromicho: - Sr. Presidente: depois da explanação do brilhante e oportuníssimo aviso