DE FEVEREIRO DE 1955 581
Quer dizer: nos começos deste ano de 1955 o consumo de energia eléctrica em Bragança é ainda praticamente nulo! A electricidade continua, pois, a ser para aquelas longínquas terras simultaneamente um sonho e um luxo.
Não obstante ... não obstante dispõe da nossa maior fonte de energia: o Douro - o Douro, a que, enfim, acabou por chegar a vez de ser aproveitado, de ser posto ao serviço do progresso económico do País.
Mas, Sr. Presidente, a situação de Bragança no que respeita à electricidade não se notabiliza apenas por ocupar o último posto dos consumos per capita. Igual glória lhe cabe quanto a percentagem, das freguesias rurais electrificadas, distinguindo-se por apresentar uma percentagem (melhor seria falar em permilagem...) vinte vezes inferior à de Évora (!), que ocupa o penúltimo lugar da escala.
Se a isto acrescentarmos que toda a sua energia é de produção local, por se encontrar desligado da rede geral, terei dado um quadro expressivo da situação: o distrito de Bragança constitui uma mancha escura na geografia do consumo de energia entre nós!
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: Bragança vive, de há unos a esta parte, o sonho da sua electrificação. Tem esperado paciente e resignadamente a sua hora, que por vezes chegou a julgar próxima. De quando em quando surgia uma esperança, pronunciava-se uma possibilidade, mas ... era sol de pouca dura, esperança que rapidamente se desfazia ..., por isto ou por aquilo, por tudo e por nada, mais parecendo já por anátema do que por quaisquer dificuldades materiais concretas.
Entretanto, rodaram os anos e a esperança ia-se convertendo em descrença, o sonho só podia constituir uma manifestação de sebastianismo, porque luz, luz clara, nunca se conheceu outra que a do Sol que Deus nos dá.
Entretanto ... o mês de Setembro de 1952 faz renascer a esperança: o Pais toma conhecimento da proposta de lei do Plano de Fomento e... Trás-os-Montes vê incluída a electrificação da província nas tarefas a executar.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: posso dizer, com verdade, que tudo se alvoroçou: a esperança ia converter-se em realidade, o sonho ia materializar-se. Descrente não sei se ficou ainda a haver algum. Se ficou, emudeceu. Trás-os-Montes ia ser ligada à rede geral e, para além disto, via ainda inscrita uma verba de 200 000 contos na rubrica «Rede de pequena distribuição das zonas rurais e das urbanas dos concelhos pobres». Rejubilou. Rejubilou e ... aguardou. E ... aguarda já há mais de dois anos a hora da sua electrificação.
É certo que o Plano do Fomento diz respeito a seis anos e que a todas as tarefas há-de chegar a vez, mas também ú verdade que nem faltam disponibilidades de energia ou de dinheiro, nem planos, nem empresas interessadas.
Não ignoro - e seria injusto se o não referisse expressamente - estar o Sr. Ministro da Economia empenhado na pronta solução do problema, com que por mais de uma vez se tem preocupado, mas sei também ser ao Conselho Económico, nos termos da base m do Plano de Fomento, que incumbe a resolução dos problemas nele incluídos.
Por isso, daqui apelo para o Governo para que não demore a satisfação desta nossa aspiração - a concretização desta nossa urgente necessidade-, atrevendo-me a pedir no Sr. Ministro da Economia que para além dos esforços já despendidos, não deixe de se interessar pela electrificação de Trás-os-Montes, pois não deixará de encontrar no nosso anseio motivos para redobrado ânimo na definição da almejada solução do problema.
Sr. Presidente: a solução urge, dizia eu, urge porque dela depende a possibilidade de desenvolvimento económico e de melhoria social de uma região que, nem por ser longínqua, nesta pequena faixa continental, poderia ser votada ao esquecimento, continuar no ostracismo em que muitos e muitos anos a deixaram.
Mas urge também por razões de facto e de circunstância, que elevam ao paroxismo a desproporção entre o potencial da natureza e os meios de que os homens dispõem para o dominar e aproveitar. E não se faça a observação - descabida dentro dos princípios de acção governativa que definimos - de que, quem esperou até hoje, esperou muito, pode esperar mais algum tempo ... E não se faça essa observação, porque não pode nem deve esperar mais!
Para além das imposições de justiça distributiva e do dever de solidariedade nacional, indiscutidos e indiscutíveis, há, dizia, razões de facto e circunstância que multiplicam a urgência e tornam a resolução inadiável.
De facto ... enquanto nos últimos anos as soluções se entreabriam como clareiras e depois o Plano de Fomento deu corpo ao anseio, as câmaras municipais ficaram impossibilitadas, por uma simples questão de elementar principio de sã administração, ficaram inibidas de melhorar as suas centrais para acompanhar o ritmo de desenvolvimento do consumo de energia. Doutra forma teriam realizado vultosos investimentos (vultosos para as suas possibilidades financeiras...) que breve - tão breve quanto o distrito fosse ligado à rede geral - se perderiam, passando a constituir pesadíssimo ónus para a sua já trágica situação financeira.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: -Ainda se os municípios não tivessem acreditado nem antevisto a próxima realização do sonho ... talvez o problema não tivesse piorado, porque não teriam deixado de encontrar, mesmo com os cofres vazios, na coragem e na boa vontade de todos os meios necessários para não consentirem o agravamento da situação, mas ... acreditaram e ... esperam confiados.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Direi a V. Ex.ª, Sr. Presidente, que, mercê destas circunstâncias, há hoje em Bragança concelhos em que a iluminação pública se resume a uma dúzia de candeeiros ... uma dúzia que, no Inverno, não pode estar acesa sequer até a meia-noite; outros onde, com frequência, a luz pública tem de ser inteiramente sacrificada às exigências da iluminação particular; outros em que as soluções de emergência são de empréstimo e favor de empresas, etc., e todos vêem, de ano a ano, agravar-se a situação no que respeita a energia eléctrica.
Seria caso para dizer: como é possível piorar ainda uma situação que de começo classifiquei como de consumo de energia praticamente nulo? Seria, mas é verdade: a situação piorou e tornou-se insustentável. A população cresceu, as exigências da vida aumentaram e a produção de energia - produção cara e deficiente - não progrediu. Eis tudo.
Sr. Presidente: Trás-os-Montes continua a confiar e ... a esperar. Confia na acção do Governo e espera a rápida solução do seu problema.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E, se tem razões para confiar, não encontra motivos para esperar ...