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11 DE FEVEREIRO DE 1955 585

Tem-se verificado que u erosão e menor naquelas terras em que a vinha está plantada.

O Orador: - Agradeço o aparte de V. Ex.ª, porquanto, repito, já aqui foi dito que vinha se acreditava que a vinha oferecesse defesa à erosão.

O Sr. José Sarmento: - Mas do que surge ó a dúvida se esses vinhos poderão ser tratados no mesmo pé dos vinhos das encostas.

Admitindo que a produção é superior ao consumo, o vinho das várzeas, produzido a baixo preço de custo, vai .provocar uma baixa de preços. Por isso os vinhos das várzeas terão de ser tratados diferentemente.

O Orador: - V. Ex.ª está querendo defender o vinho de encosta, que não é do que eu estou a tratar, embora, só quisesse, pudesse dar-lhe alguma resposta.

O Sr. Presidente: - Temos necessidade de caminhar com certa brevidade para o fim deste debate. Deve, por isso, introduzir-se uma certa disciplina nas interrupções que constantemente se estão fazendo ao orador, para que ele possa chegar ao fim da sua intervenção dentro da hora regi mental. Portanto, peço aos Srs. Deputados que façam ais suas interrupções nos termos regimentais, isto é, breves e oportunas.

O Orador: - Agradeço a observação do V. Ex.ª, mas não está na minha mão abreviar essas interrupções.

Voltando ao meu assunto, recordarei que também foi dito que o perigo das cheias no Ribatejo desapareceria praticamente com a regularização das a>lbufeirns construídas nos afluentes do rio, aqui e em Espanha. Foi afirmado isto lá fora e aqui retomado com vivacidade num aparte que me traz a pedir a atenção de VV. Ex.ªs para este outro ponto.

Ora atentemos na realidade dais coisas: com o represa meu to do Zêzere, da ribeira de Ocreza e dos rios espanhóis, onde estão sendo construídas albufeiras, vai conseguir-se um efeito regularizador sobre as inundações do Tejo, enquanto, mas só enquanto, as albufeiras não estiverem cheias.
Essas albufeiras são construídas ou para servir a rega ou para produção da energia eléctrica, e não apenas para fins de regularização, pelo que creio que não haverá nenhum responsável pela gerência de qualquer das ditas albufeiras que, chegadas as chuvas de Novembro a Fevereiro, deixe de armazenar quanto possa, das suas águas e de guardá-las ciosamente, sem cuidar mais em novas mas incertas afluências. De ânodo que, se sobrevierem fortes chuvadas de Primavera, a sua água, no caso de as albufeiras já estarem repletas - e será o mais normal, há-de passar os descarregadores e vir nos campos como se nada estivesse no seu caminho.
Ora as cheias de Março, Abril e, até, Maio são cousabidamente as mais danosas para o Ribatejo, e contra essas não deve contar-se com a regularização pelas albufeiras.

Aliás, ainda há dias, e no termo do primeiro período chuvoso do Inverno, tivemos os campos alagados: mais vinte e quatro ou quarenta e oito horas de chuva e seria uma grande cheia. Não há argumentos contra este facto.

Ainda lembrarei outra, demonstração do meu asserto de que ao longo do vale do Tejo varia enormemente a qualidade das terras, para chegar até àquelas que só a vinha; aproveitai economicamente: nas que continuam entregues à cercalicultura o valor do campo, reputado em função das quotas das searas dadas em parceria, varia do simples a mais do triplo.

Com efeito, dão-se na Golegã searas a um sétimo, enquanto em Sal vá terra se dão ao terço com menos sementeira. Quer dizer: além o senhorio recebe seis partes da produção, que pagam a terra, e o seareiro a sétima, para lhe pagar o trabalho; aqui são duas partes para o dono, apenas, e uma para o empresário.

Esta redução traduz o decréscimo da qualidade com u variação média da fertilidade das aluviões, prova provada da variabilidade dos depósitos.

Não, Sr. Presidente, se a vinha fosse no campo do Ribatejo aquela monstruosidade de benefícios que se tem insinuado, não seria só uma quarta parte dos terrenos que ela ocuparia!

Creio que nesta zona de clima já seco a vinha representa o aproveitamento lógico e natural das terras fracas e é o seu elemento fixador por excelência onde inundáveis. Nessas condições, parece que, como aliás reconhece o Sr. Deputado avisante, a disposição do decreto condicionante do plantio que autoriza a plantação onde a vinha tenha possibilidades fixadoras é em si mesma justa.

Não estou aqui para julgar se tem sido interpretada lata ou estritamente. É possível que se tenha exagerado um pouco - mas, em boa verdade e se tanto foi, muito pouco - perante as atracções da conjuntura, o que só seria humano; anãs isto .não quer dizer que em disposições futuras sobre plantio da vinha se deixe de providenciar adequada e justamente sobre as terras fracas, sujeitas a erosão e a assoreamento, dos vales dos nossos rios transbordantes.

Esta é a conclusão essencial que quero tirar.

Há outro ponto sobre que se fala frequentemente com alusões, se não ilusões, dirigidas aos vinhos de terras baixas: é o da qualidade. Qualidade considerada em absoluto e invocada neste dilema, posto como ponto final, têm-na os vinhos de encosta, não sei se os de charneca, mas não a têm, pura e simplesmente, não possuem o dom de qualidade, os vinhos de várzea.

Dilema terminante, fatal, decisivo, não o admito; repugna-me à inteligência e ao sentimento aceitar que a qualidade, como merecimento absoluto, esteja indissoluvelmente na dependência da orografia.

É decerto difícil discutir a qualidade, noção em parte de carácter subjectivo, que já a sabedoria popular entende não poder ser susceptível de argumentação; pura muito liga-se aos gostos, e estes não se discutem.

O Sr. Camilo Mendonça: - É uma questão subjectiva ... relativa.

O Sr. Mário de Figueiredo: -Na teoria de V. Ex.ª, é cada um de nós que cria a qualidade, portanto; o vinho do Porto não é do Douro, é feito por cada um de nós.

O Orador: - V. Ex.ª está a confundir qualidade com tipo.

O Sr. Mário de Figueiredo: - Eu não estou a discutir o problema em si mesmo, mas apenas certa maneira de o pôr. Se os gostos não se discutem e a qualidade é uma coisa que não tem consistência objectiva, por resultar da maneira como se comporta o sujeito a respeito da matéria, a qualidade, digo, somos nós que a fazemos.

Logo, não se pode falar de vinho do Porto, do Dão ou do Douro, visto que cada um de nós é que põe no vinho n qualidade que entende que ele deve ter, ou, só quiser, que cria o tipo.

Não é maneira de pôr uma questão aquela como a pôs - e digo isto com simpatia.

De resto, isto integra-se na teoria muito conhecida e de há muito discutida e que se exprime assim: é cada um de nós que cria o Mundo ou o Mundo existe mesmo