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23 DE ABRIL DE 1955 885

sejo recordar que h«á vários anos um Chefe de Estado de Portugal quis aliar a sua pessoa à glorificação do justo e legítimo título de maioridade do Brasil, levando consigo o sentimento geral do seu país e dizendo ali palavras cujo eco não se extinguiu ainda. Foi nobre, foi gentil na fluência do seu verbo assinalável e como cumpria à sua alma e à sua elevada posição política. Agradeçamos à sua memória ter permitido esta jornada que V. Ex.ª empreendeu, mas não hei-de só prender a esse facto a nossa consciência de hoje e a nossa benquerença de sempre. O homem é uma carne inteligente, já o disse um poeta, e, como tal, um conjunto de afeições, um nódulo de afagos que estreitam e enlaçam a sua capacidade de compreensão. Por isso, o que lhe fala ao coração integra-se potencialmente na própria concepção da vida e rasga-lhe os olhos para as imagens de sua adoração.

(Apoiados gerais).

Senhores! Tenho presente, em nítida representação mental, todo o desenho e recorte espiritual dessa terra eleita e bem amada cuja face se alonga na outra margem do mar-oceano, terra do Brasil, pela qual o nosso coração se alvoroça e lateja com amor fraterno. Como a não evocarei, se bem conheço o tom das águas, o perfil dos montes, a capacidade da inteligência, a afectividade estreme ? De Norte a Sul a percorri mais do que uma vez, com devoção e respeito, com alegria e orgulho, colhendo em mim saudades fundas e também derramando filiais esperanças de voltar.
Ninguém pode sentir-se indiferente em terra acolhedora e boa, e ademais se nela habita uma alma gémea, uma consciência próxima, um sentimento irmão. Aí tudo nos fala, se insinua, e mostra com naturalidade, de impressiva e fácil transposição, de peito a peito, em cordial e grata sinceridade. Pois é isso que nos atrai e prende a essa terra, de tão doce trato e carinho brando, cuja alma vem brincar nos olhos dos seus filhos com vivacidade e alegria. Povo de. carácter bem temperado nos esforços prodigiosos para atingir o alto plano das nações mais avançadas na cultura e no domínio económico, não cede os valores essenciais da sua formação moral às fala/es tessituras políticas e sociais que cometeram pecados tremendos no mundo presente. Onde o espírito se perde fácil é perderem-se os bens e a fartura. Onde as garantias de direito natural se escusaram o homem se despenha na servidão e na barbaria.

(Calorosos aplausos).

Povo feliz aquele que não olvida as razões profundas da sua existência e se esforça por rejuvenescer e aprumar-se na consideração alheia, que gasta a sua inteligência e emprega o seu valor sem menosprezo da simplicidade da vida habitual, consciente de quanto vale e mirando ao futuro de todo imprevisível. Esta consideração em que envolvo o povo brasileiro é o que poderia chamar-se o significado constante, quase intemporal, das virtudes e do casticismo de um povo com arreigada consciência nacional e apurado sentido cívico, para o qual os testemunhos da sua incidência não minimizam, antes estimulam e impelem a rasgos insuperáveis de progresso e modernidade. Reconhecer isto é louvá-lo, compreendê-lo e amá-lo.

VOZES : - Muito bem!

Na pessoa, do seu venerando Chefe de Estado, o Brasil inteiro está hoje em nossa companhia, e é propícia a hora para de coração aberto proferirmos uma palavra de comovido agradecimento porque factos recentes a justificam e reclamam.
Eu estava no Brasil quando se cometeu contra a soberania portuguesa uma violência a que só chamarei de negregada, atentatória dos mais legítimos direitos que a consciência internacional diz respeitar. Tais direitos só os não vê, e não resguarda, quem abandonou, ou desrespeita, os valores que fizeram a honra e a dignidade internacionais, quem sobrepõe a interesses espirituais a cobiça e a ambição, quem usa a força bruta da sem-razão e da iniquidade, quem se move na esfera mordicante e desagregadora que trouxe ao Mundo a inquietação permanente, a inconstância do pensamento ordenador, a desconfiança e ressalva da palavra dada, a ineficácia da execução amigável, enfim, a ruína dos conceitos morais que guiaram a acção dos homens como justos juizes da ordem e da segurança entre as nações. Eu estava no Brasil quando nessa hora ingrata, se alanceou o povo português no mais vivo e sensível da sua consciência militante pelo bem da civilização humana e se procurou iludir a consciência sã com uma acção dolosa com rosto de vindicação nativa. A bocarra enorme do gigante dispunha-se a tragar o pequenino e já cristão David. Óh, as fauces tremendas como causam espanto! Para quê tanto estrondo e arreganho?
Só conhece quão dobradas são as dores do sentimento patriótico quem se viu agravado e ausente da sua terra, ainda que na mesma doce fala lhe cheguem consolações e palavras de fé. Mas há uma coisa que eleva o coração e enobrece o sentimento: é ver com quanta força e generosidade a gente amiga repudia a feia acção maldosa e se ergue com ímpeto vibrante a condenar o acinte injustificado e cruel. Jamais o coração português poderá olvidar a expressão pública do sentimento do nobre povo brasileiro e ninguém em Portugal deixou de sentir o latejar desse peito amigo, dessa alma fraternal, como se fora da sua própria alma batida noutro cristal.

(Vibrantes aplausos).

A mágoa e a dor prendem os homens em laços muito fortes e basta uma palavra ou um ligeiro aceno para criar entre eles um solidário entendimento espiritual. E tanto mais robusto quando nada os separa, nada os aparta do mesmo tronco familiar, braços irmãos do mesmo ramo atlântico, originários de igual descendência espiritual, carne do mesmo veio ocidental, gritando às procelas da vida o mesmo vernáculo e bendizendo a Deus com a mesma força interior. Aqui está o plasma vivificador do nosso perpétuo entendimento e de nossa enternecida estima, que torna sensível o acordo de duas nações de maneira tão simples e tão grande. Eis aqui onde vai dar a fonte de nossos bens comuns, na qual o espírito e o coração descobrem sem intermitência novas razões de compreensão e de amor e onde se conjugam castamente interesses superiores, bem entendidos na concordância e na fidelidade ao pensamento ordenador das leis particulares.
Os Portugueses costumam ser agradecidos, e tanto mais quanto a justiça o pede. Bem haja o Brasil pela sua solidariedade numa ocasião inesquecível para o coração do nosso povo.

(Grande manifestação de apreço ao Chefe do Estado do Brasil).

No ano passado festejou o Brasil algumas datas fundamentais da sua história, e, como era próprio de festa de família, não podia Portugal estar ausente. Coube-nos, pois, uma parcela nessas comemorações grandiosas e solenes e permitiram elas que figuras destacadas no nosso meio intelectual pudessem aproximar-se e conviver com os seus pares do Brasil. O Governo Português, na clara observância do seu dever moral, a que,